Almanaque Raimundo Floriano
Fundado em 24.09.2016
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)
Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, dois genros e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.
Xico com X, Bizerra com I terça, 01 de dezembro de 2020
UM DIA,M HOUVE FUTEBOL (CRÔNICA O POETA E COMPOSITOR XICO BIZERRA, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Vi ontem um jogo na TV e amanheci saudoso. Sou do tempo de Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe. Vi-os jogar. Assim como vi o brilhantismo de um Botafogo dos anos 60/70, com Garrincha e Didi, Paulo César e Jairzinho, além de Manga e Quarentinha. Vi os Santos Djalma e Nilton, o Santos Neves a quem chamavam de Gilmar. Quem viveu Rivelino, Gerson, Ademir da Guia, Dirceu Lopes e Zico tem justificada saudade. Por essas bandas de cá existiam os Chiquinhos, Juninhos, Ramons, Lucianos, Givanildos, Leonardos … Isso tudo sem falar em Nado, Bita, Nino, Ivan e Lala. Tudo tão diferente dos Camutangas, Brocadores e Piticos hoje idolatrados. Sou do tempo das chuteiras pretas, que emolduravam a arte dos virtuosos e das bolas sem cor, que não maquiavam os pernas de pau. Sou do tempo em que havia futebol e a bola se entregava, sôfrega e docemente, aos pés (e à mão) de Diego Maradona, o mais humano dos Deuses na visão de Eduardo Galeano. Acho o hoje muito estranho e sinto saudades. Talvez por que eu seja do tempo em que existia futebol.
Toda a obra de Xico Bizerra, Livros e Discos, pode ser adquirida através de seu site Forroboxote, link BODEGA. Entrega para todo o Brasil.
Xico com X, Bizerra com I terça, 24 de novembro de 2020
ARIOSTO E SEU PLANO DE SAÚDE (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Muito pior que os caça níqueis da Universal, mais podres que os parlamentares que enlameiam Brasília, tão fedorentos quanto os banqueiros inescrupulosos. Este, o conceito que meu amigo Ariosto faz desses ‘comerciantes’ que comandam os Planos de Saúde, ávidos insaciáveis de lucros em detrimento da pobreza crescente e do estado de miséria em que se encontra o povo. E ele tem razão. Esses vermes se aproveitam da falência total da saúde estatal para explorar a população, seja aumentando as mensalidades, seja excluindo direitos adquiridos que só são reconhecidos mediante recurso ao direito. Clássico exemplo do que se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. Lamenta Ariosto que o tempo tenha deixado escapulir dos braços da ‘ceguinha’ os pratos viciados, quando ela, ao despir-se da toga, desvenda os olhos e abre as pernas e cai na folia como se carnaval fosse. Único consolo que resta ao meu amigo é saber que, Pastores, Deputados e Banqueiros não podem se livrar da senhora fatal que, mais cedo ou mais tarde, os abraçará, como a um mortal comum. Nesse dia, até os ‘comerciantes da saúde’ serão iguais a Ariosto.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 17 de novembro de 2020
A BENGALA DO FLORISVALDO (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Recebi um apelo curioso de um amigo de Salvador. Um Poeta, seu amigo, em passeio no Recife, esqueceu sua inseparável bengala em algum lugar dessa Veneza. A bengala, braço amigo do Florisvaldo, perdeu-se na selva do Recife. Ela esteve, junto com seu amigo, no Seu Boteco, que fica defronte ao Centro de Artesanato, e de lá saiu num táxi até o Recife Praia Hotel, no Pina. Andavam sempre juntos, Florisvaldo e sua bengala, acostumada a acompanhá-lo, seja em Paris, seja em Salvador. Iam sempre se acompanhando, ele e a bengala, no amor de sempre … Pediu-me o amigo que inserisse a bengala do amigo nas redes sociais. Sem bengala, a vida do Poeta Florisvaldo de Mattos fica sem rima e sem verso. Não me acanhei de fazer um apelo via redes sociais (já vi gente apelando por cachorrinho desaparecido). E pedi a quem encontrasse uma bengala por aí, sem dono e chorando a ausência dele, avisasse-me pelo Facebook. Eu, Florisvaldo e a bengala ficaremos gratos. E a Poesia agradecerá. PS: A bengala ainda não apareceu mas ainda acredito na bondade de quem a encontrou, triste e solitária, longe de Florisvaldo.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 10 de novembro de 2020
ESTRELA NUM CÉU SEM ESTRELAS (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Você é minha última estrela num céu delas desabitado. Entardece-se lentamente até que eu descubra o rumor noturno se achegando, lentamente, descalço e com as vestes próprias do dormir. Traz-me o escuro das noites que sonhei para, depois da negritude, acordar-me bolero suavizando uma festa de rock in roll. E aí, enfeita meus ouvidos com zumbidos, gemidos e zoadas que só os animais amantes produzem, quando no cio. Que a noite seja preguiçosa e se demore a ir embora, fazendo-nos companhia e insistindo em dizer que o amor está nas noites e dias de quem se dispuser a amar, que o carinho é apenas um complemento nas tarefas da bem-querença. Que continues estrela nesse meu céu, ou lua acesa quando o instante fugaz do prazer pensar em dizer até logo.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 03 de novembro de 2020
BARALHO DE CARTAS DESMARCADAS (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
É um jogo. Apenas um jogo maluco em que nos deparamos com um terno de reis pouco ternos. E a ternura? Melhor seria um duque de vassalos amigos, fiéis e alegres, além de ternos, com suas damas sorridentes e igualmente fiéis e alegres. Sempre soube que Ouro e Copas não combinam, nunca combinaram. Ainda que se tenha às mãos uma trinca de espada e valete, de nada valerá se no fundo do peito não imperar a bondade e o amor. Nesse baralho da vida a canastra difícil se montará com cartas não marcadas pela dor e pelo sofrimento. Valerão apenas as cartas da bondade e do amor, não importa se vermelhas ou pretas, sequenciais ou não, mas que guardem em si a marca da felicidade. E a canastra será real.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 27 de outubro de 2020
A COR DAS PALAVRAS (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Nos tempos atuais, em que tanto se discute a questão das colorações partidárias, dos matizes ideológicos, cabe a dúvida: palavras tem cor? Entendo que não. As palavras são de toda cor, são caleidoscópios de vários matizes. Juntas, formam um mosaico colorido capaz de se inserir num verso, de ser uma rima, de virar poesia, ou, como prosa, de transformar-se em uma crônica, em um conto ou até mesmo em um romance caudaloso e, por isso, multicolorido. São mutáveis as cores, ao bel olhar pessoal de cada um que as vê. Amarelo do sol das manhãs ou Azul de uma noite terna e calma, pouco importa. Só os privados de visão crítica e plenos de ignorância política atribuem cor política às palavras. Interessa-me, muito mais que a eventual cor das palavras, o valor do que escrito está. E viva o literário Arco-Íris.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 20 de outubro de 2020
BARCOS E PORTOS (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Para que servem Barcos sem Portos? E de que adianta Portos sem Barcos. Um haverá sempre para que o outro exista. Mas ainda assim, havendo Barcos e Portos, haverá de ter o barqueiro, o navegante a ditar o rumo da embarcação e de seu destino, do condutor e do Barco. Tempestades, mares bravios se contraporão às calmarias, às pequenas ondas e marolas. E a âncora imaginária do tempo, em algum instante, fará com que tudo pare ao redor para o gozo de um momento bom. Depois, a aventura da vida prosseguirá por outros mares, outras águas, outros mundos, outros sonhos. Sem mapas e sem bússolas. O barco, o porto, o barqueiro. O homem, a mulher, o amor. O destino à deriva.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 13 de outubro de 2020
A PALAVRA E O AMOR (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Escrever, para mim, é um ato de amor. Pouco importa se poesia ou prosa, interessa mesmo é o gesto da escrita. É a troca de carícias entre o texto e o autor, o lápis e o papel, o cuidado de um com o outro, a simbiose perfeita entre o prazer e o querer bem. Papel e lápis à mão (ou teclado aos dedos), rabiscos preliminares antecedem parágrafos ou versos eretos com todas as estrofes molhadas, num gozo pleno de sílabas e palavras, um orgasmo poético, luxúria lasciva das letras. E assim faz-se o tempo, consuma-se o prazer, traduz -se o amor e a paz é apenas uma consequência. Simples, como tudo que tem por origem a inspiração, que tem por fim a felicidade. Que nem o amor. Que nem a palavra.
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Xico com X, Bizerra com I quinta, 08 de outubro de 2020
BRILHO NO OLHAR DO AVÔ (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Neto é aquela criaturinha que faz o olho da gente brilhar, quando ele chega por perto com seu sorriso moleque e sotaque de anjo. Ele pede o que quase não pode e a gente dá mesmo sabendo do quase não dever dar. Aquele bombom que maltrata os dentes, aquele chocolate ou até, crime maior, um pouquinho de coca cola, tudo escondido do pai e da mãe. Tudo dentro daquele Contrato de Cumplicidade que em seu artigo primeiro diz: ‘Não revelar aos Pais nada do errado que seu avô comete’. Até porque quando eles forem avós farão o mesmo com os filhos do meu neto. Parece que estou vendo. A gente ensina a paz, mas não resiste a uma luta de espada imaginária entre dois super-heróis, ele e eu. Doces encargos do avô. Esse homem de cabelos brancos nunca cansa de ver o mesmo filminho, repetidas vezes, sabendo o final tanto quanto o neto que lhe obriga a isso. Mas, se ele gosta, é bom ver aquele mesmo filminho, repetidas vezes, sabendo o final tanto quanto ele. Contar histórias é outra tarefa própria dos avós. E a gente conta uma, duas, três, dez vezes a mesma história. Não sei qual dos olhos brilha mais, se o nosso ou o dele. Certo mesmo é que quando ele reconta para nós a história que contamos, é nosso olho que brilha mais. E o avô ri grande que nem menino pequeno. De alegria porque percebe que ele assimilou direitinho os conceitos de união, paz, amizade, amor que a gente tentou passar nas histórias que a gente contou. E aí, inevitável, uma lágrima molha o brilho do olhar de avô. São 7 anos e ele continua, cada vez mais, a inventar cheiros para o meu jardim. Como não me plantar num inverno de alegrias para florar risos no meu olhar de avô? Salve Bernardo, que me dá a alegria de ser avô. Feliz 7 anos, meu amiguinho/amigão, meu imenso companheiro. São 2555 dias inventando cheiros no meu pé de alegrias.
Xico com X, Bizerra com I terça, 06 de outubro de 2020
ANJOS E AMENDOINS (CRÔNICA DE XICO BIZERRA, POETA, COMPOSITOR E COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Amendoins, não os como. Não me atrai comê-los. Tampouco suporto suas cascas e seu pelo. Nem mesmo a crença popular sobre seus poderes afrodisíacos, segundo a qual, na versão de Aldir Blanc, ‘ajuda a levantar o manche mancho dos machos caidinhos’, são suficientes para despertar em mim o desejo de degustá-los. Ofereci-os ao anjo que me visitava. Sou educado. Mas aquele anjo pouco entendia de amendoins e sequer quis libertá-los da casca. Disse-me preferir as azeitonas, sem caroços. Terão dentes os anjos? Não sei. Sei, isso sim, que aquele anjo presunçoso pensava saber de amor. Também não sabia. Insistia em dizer e repetir que o amor acabou. Estranhou quando disse-lhe que o amor não acabou. Mal sabe ele que o amor é uma das poucas coisas da vida, tal qual a matemática, definitivamente imutáveis e exatas. Como um mais um, que pode ser três ou quatro…
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Xico com X, Bizerra com I terça, 29 de setembro de 2020
Manhã de domingo. Meu amigo acordou às 6 pensando nas coisas frágeis que resistem e nas duras superfícies que explodem, como ele próprio filosofa. Reconheceu uma saudade não sabe de quê, silenciosa, brutal e burlesca. Sentiu-se incapaz de uma única palavra. Um espetáculo de angústia misturado com medo. – Que estranho esse nó na garganta, murmurou. Apertou o pescoço, o nó desceu para o peito. Achou que ia morrer. E pelado – meu amigo mora só – disse de si para si: – Não posso morrer assim, pelado e sozinho. Precisava de ajuda, ligar para alguém. Mas, para quem? Dizer o quê? Bateu a ideia. E, sem medir consequências, foi fazer um café. Até hoje está por aqui contando sua aventura. Ruim mesmo foi comigo. Acho que sugestionado pela história do amigo, acordei às 3 e meia da manhã, sintomas iguais aos dele, nó enganchado na garganta escapulindo para o ao redor do peito, com a diferença que eu vestia cueca samba-canção (menos mal: não morreria nu). Estava em viagem a serviço, longe de casa, dentro de um apartamento alugado, e ainda que quisesse providenciar um café faltavam o pó, a chaleira e, pior, o jeito: nunca soube fazer café. Só passou a agonia quando a padaria da esquina abriu e eu tomei um pingado, quente e com pouco açúcar. Vôte! Razão mesmo tem uma amiga que diz: a vida começa depois do café. Não existe bom dia sem um café. Vou comprar uma daquelas maquinetas modernas que fazem café de cápsula para nunca mais passar por esse aperreio. Agora, dormir nu, Deus me defenda! (Dedico esta croniqueta a Lau Siqueira e Lúcia Nunes).
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Xico com X, Bizerra com I terça, 22 de setembro de 2020
Tenho ouvidos moucos para o Streaming. Até já coloquei uns discos meus nos Spotify da vida, por insistência de amigos, mas hoje não mais o faço. Quem quiser ouvir música minha, que compre meus discos. Outro dia percebi que o CD de um cantor querido não existe, no formato físico. Está nas plataformas virtuais, ocupando espaço nas nuvens. Para mim, do tempo do antigamente, nuvem é casa de anjo. Músicas moram nos discos. É lá que as encontro. Irei às nuvens um dia, quando aprender a voar. Por enquanto, fico no chão, com meus CDs, letras, fichas técnicas, fotos … Como acompanhar a letra das cantigas, saber quem tocou, ver as fotos e os textos se não entendo a linguagem dos anjos, se não me acostumo às nuvens? Deixem-me com meus CDs, físicos. Assim quero ouvi-los, senti-los, curti-los à exaustão. E nem me importo se disserem que sou cafona. Sou. Que nem Maciel Melo, que gosta de sanfona, de forró e, tenho certeza, de um CDzinho à moda antiga, arcaico, ultrapassado e caduco. Assim que nem eu.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 15 de setembro de 2020
O baião estava pela metade, quase pronto, ideias jorrando por todos os fios do juízo, quando me aparece a intrusa, a inoportuna, cascuda e antenada. Joguei nela um CD de Bruno e Marrone que a namorada de um sobrinho esqueceu lá em casa. Errei. Peguei o livro de auto ajuda que um amigo tem mania de me presentear, nos meus 4 de novembro. Tiro e queda. Pelo menos para isso serviu aquela sopa de letras inúteis. Não mais havia barata a cercear minha inspiração. Ainda hoje não entendo a eficiência dessas empresas de dedetização que prometem acabar com as baratas e, ao contrário do prometido, só fazem com que elas procriem com maior assiduidade. Quantos baiões não se perderam por conta delas. Não seria de todo errado às baratas atribuir o nível atual em que se encontra a nossa pobre música popular brasileira. Música que alguns ainda acham o maior barato! Nem todos possuem a pontaria que eu possuo.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 08 de setembro de 2020
Dizem que a primeira vez a gente nunca esquece. De qualquer coisa. Parece que é verdade. O meu primeiro carro foi um Fuscão 73, EE 4080, motor 1500, Branquinho. Uma Fera! Tinha sido de um Padre e estava com 7000 kms quando o comprei em 1974. De pronto, coloquei rodas de liga leve, pneus largos, volante esportivo e, enfeitando seu painel, um super roadstar autoreverse comprado na Zona Franca de Manaus. Uma Fera, repito. Perdeu-se na cheia de 75, na Encruzilhada, sob água e lama. Bem feito: quem mandou eu ir namorar com dona Dulce em plena cheia e num local em que a água batia na capota do carro? Dentro dele, e não prestou para mais nada, o último LP da Orquestra Armorial e um livro de Pablo Neruda. O livro, depois eu comprei outro. O disco, não consegui. Hoje, tanto tempo depois, deu saudades do meu branquinho! Fui ler Neruda para esquecer.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 01 de setembro de 2020
De que me vale o relógio no pulso, se ele não me informa se é dia ou noite. São 9 e 15, diz o apetrecho em meu braço, mas da manhã ou da noite? Não sei. Como também não sei se chove ou faz sol, calor ou frio do lado de fora daquele quarto escuro, cortinas fechadas, na solidão de um apartamento hospitalar. Só sei que as 4 horas que meu relógio marca são da tarde quando a enfermeira chega, pontualmente, para aplicar-me uma injeção subcutânea na barriga, para evitar eventual trombose. Às seis, descubro ser quase noite, quando adentra a responsável pela alimentação, trazendo a sopa, os pãezinhos, um bolo, café e leite para servirem de jantar. O iogurte sobrava todo santo dia e ainda hoje não suporto ver o danado na prateleira do supermercado. Nunca tinha experimentado solidão tão brutal, impedido de receber visitas (Covid é terrível até nisso), totalmente ausente do mundo exterior por 30 dias, sem rádio ou ‘notiça das terra civilizada’. Nunca liguei a TV. Sentia-me acuado, condenado, encarcerado em minha própria solidão. Por outro lado, nunca valorizei tanto a vida depois que tive alta e voltei para casa, curado. Resta-me agradecer a Deus por ter esse COVID bem longe de mim e, num futuro próximo, vê-lo como coisa do passado, não mais presente entre nós. Que os anjos me defendam, e aos que quero bem, da solidão do 217.
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
Dentre os inúmeros defeitos que tenho, não relaciono a ingratidão como tal. E seria um proceder ingrato não registrar o atendimento que recebi do corpo técnico – médicos, enfermeiros e técnicos do Hospital Esperança durante minha estada por lá. A todos, pelo interesse, carinho e competência, e ao pessoal do apoio (copa, hotelaria, limpeza), minha eterna gratidão e agradecimento sincero, por estar vivo e curado.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 25 de agosto de 2020
Cine Cassino, Cine Moderno e Cine Educadora. Cinemas de minha cidade, Crato. Tio Amarílio, o meu Alfredo, não era o projecionista: abusado, mas talentoso em seu ofício, era quem desenhava as letras nas tabuletas espalhadas na cidade, anunciando o filme do dia. No Cassino assisti Marcelino Pão e Vinho e quase toda a série de Marisol, uma espanholazinha galega, linda. Infância longínqua. Parecida com a de Totó, um personagem do filme Paradiso, cuja doçura, ingenuidade e amor traduzem como é bom amar com o coração de uma criança. Logo depois passou a não nos interessar, crianças de então, o filme que iria passar. Bastava-nos o escurinho do cinema e a namoradinha ao lado, desencabulada e safadinha, no bom sentido. Aliás, no melhor sentido. Saudades do Cassino, do Moderno e do Educadora. Saudades, também, da namoradinha sapeca.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 11 de agosto de 2020
Assim era ele conhecido em toda a região do Cariri cearense: Anduiá. Esse era o seu nome. 1 metro e 80 de pura classe, artilheiro nato, faro de gol aguçado, terror dos goleiros. Camisa 9 do Esporte do Crato, time treinado pelo meu tio Almir. Ao lado de Chico Curto, este com pouco mais de 1 metro e 50 e melhor que Zico, dizem, deixava os zagueiros do Crato Futebol Clube com insônia na noite anterior ao clássico local, contra o Esporte, no campo do Seminário. Digo que a sorte de Pelé foi o apego do craque cearense a sua terra, ao Cabaré de Glorinha e à cachaça local, fatores que o impediram de ir tentar a sorte num Vasco ou Palmeiras da vida. Se assim tivesse feito, certamente Guadalajara teria aplaudido o cabeça chata na Copa de 70. E Pelé teria sentido na bunda a dureza de um banco mexicano. Verdade. Os Deuses do futebol não me deixam mentir. Sumiu, ataque cardíaco, numa ladeira do Bairro do Gesso, no Crato, depois de mais uma noitada com as ‘meninas’ do cabaré de Glorinha. No domingo seguinte fez-se um minuto de silêncio antes do jogo do Esporte Clube do Crato contra a seleção de Juazeiro do Norte. Resultado: 0x0. Anduiá não fez gol.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 04 de agosto de 2020
CHICO E LUIZ: CORAÇÕES E TALENTOS, TÃO DISTINTOS, TÃO IGUAIS
O universo político de Gonzaga era incolor, totalmente desprovido de matiz ideológico. Seu baião, sua música, seu talento, uma bandeira desfraldada acima de qualquer regime dominante à sua época. Compromissos políticos por ele assumidos durante a ditadura devem ser atribuídos à inconsistência de sua formação política e à vontade de, através de apoios pontuais, trazer ao seu chão progressos por ele desejados. Nunca misturei essas querelas tão pequenas com a grandeza artística do Rei. Nem acho que se deva misturar. São coisas distintas, a meu modesto ver. Transportando para os dias atuais: a imensidão poética de Chico Buarque diminui ou cresce ante seu posicionamento político? Nem uma coisa nem outra. Pouco importa a cor de seu coração partidário. Ele, por sua obra, é imenso. Como imenso seria se outra preferência tivesse seu poético coração. Viva Chico e Luiz!
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Xico com X, Bizerra com I segunda, 03 de agosto de 2020
HOMENAGEM A LUIZ GONZAGA
Minha homenagem ao Rei Luiz Gonzaga.
Uma música composta em 02/Ago/1990, quando fez 1 ano de sua triste partida.
Olhando o mar na madrugada de Candeias, a melodia e a letra saíram, natural e simultaneamente.
Ainda hoje me arrepio quando ouço.
Nesta versão, seu amigo e discípulo Dominguinhos interpreta.
Está no nosso CD LUAR AGRESTE NO CÉU CARIRI, que contempla 12 parcerias minhas com o Mestre Dominguinhos (esta, a única que não é parceria, é só minha).
R. Dominguinhos interpretando “Lua Brasil”, uma composição, letra e música, de Xico Bizerra, em homenagem a Luiz Gonzaga.
Gonzaga, Dominguinhos e Xico: um trio fantástico de cabras talentosos que muito dignificam a Nação Nordestina!
No dia de hoje, 2 de agosto, se completam 31 anos que encantou-se o Rei do Baião, nascido em Exu-PE, em 1912.
Gratíssimo por nos proporcionar este momento mágico, meu caro amigo e colunista fubânico.
É fantástica, comovedora, terna, esta homenagem que você fez ao nosso Rei, interpretada pelo saudoso Dominguinhos.
Por oportuno, informo aos nossos leitores que toda a obra de Xico Bizerra, livros e discos, pode ser adquirida através de seu site Forroboxote.
Xico com X, Bizerra com I terça, 28 de julho de 2020
Inventaram o dia dos Avós. Foi ontem. Penso que todo dia é o dia deles. Ainda que assim não seja, é muito bom ser avô, todo dia. Sobre isso, disse Rachel de Queiróz (e quem sou para dela discordar?) “Netos são como heranças: você os ganha sem merecer. Sem ter feito nada para isso, de repente lhe caem do céu… É como dizem os ingleses, um ato de Deus” … “Completamente grátis – nisso é que está a maravilha. Sem dores, sem choro, aquela criancinha da qual você morria de saudades, símbolo ou penhor da mocidade, longe de ser um estranho, é um filho seu que é devolvido.“ …Disse ainda Rachel: “E quando você vai embalar o menino e ele, tonto de sono abre o olho e diz: “Vô!”, seu coração estala de felicidade, como pão no forno!” Salve Bernardo, faz 7 anos em 07.10, que me dá a alegria de ser avô. Salve Vinícius, faz 2 meses em 01.08, que redobrou esta alegria.
Me gosto quando estou fértil de versos, prenhe de luz, fecundado de amor, grávido de poemas, de estrofes, sonetos, partejando poesias, para ser vida e alegrias parir …
Me gosto ao deixar penetrar no útero da alma o sêmen da letra, a sílaba que germina e dá a luz à palavra para se reproduzir para ser vida, e, gerada, fluir …
Me gosto, enfim, ao permitir-me o prazer do profundo ventre deixar emergir rimas de afeto, outrora feto, agora amor, para ser vida, a luzir ….
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Xico com X, Bizerra com I terça, 21 de julho de 2020
Maior marasmo. No escuro de um dia de sol já ido, saudades infindas preenchem o vazio de um tempo triste. Pior: perceber que o passado passeia solitário pela estrada do pouco tudo e do muito nada. Melhor seria o nada dar as mãos ao tudo e sair por aí barulhando o silêncio do mato próximo, calando a zoada do que não seja grilo, sapo ou, principalmente, passarinho. E assim, deixar a tarde se travestir de noite e mergulhar no escuro, com o auxílio luxuoso de uma ou outra estrela vadia, buscando uma lua para clarear tudo que for diferente de dor. Resta esperar o raiar do dia que está vindo, fiel à crença de que apenas amar e ser amado importa. Tudo o mais não interessa, por secundário que é.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 14 de julho de 2020
Estamos confinados, eu e o único par de sapatos que me restou depois da aposentadoria. Outros pares, a exemplo de gravatas também obsoletas, foram doados. Isolados socialmente de todo e qualquer chão, acho que eles estão morrendo de saudades do meu 42 ‘bico chato’. E é porque eu vivia a pisar-lhes, sem nunca lembrar de lhes oferecer uma engraxada, quando em vez. Sem meias eu os calçava, quase sempre. Mas eles adoravam meu chulé. Educados, não reclamavam quando, distraído, pisava no cocô de cachorro deixado na calçada pela madame do 901. Há quase 100 dias não nos vemos, não trocamos intimidades. Finda a pandemia, vamos ter que fazer terapia. Eu e eles. Talvez eles me perdoem por tê-los traído, quando os troquei por um par de chinelos velhos e confortáveis. E aí, com eles faço as pazes e saio caminhando por estradas luminosas e felizes para bem distante desta Pandemia maluca.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 07 de julho de 2020
Num conto de Edgar Allan Poe (Purloined Letter, A Carta Roubada, em Português) a polícia perde um mês de investigação revirando uma residência à procura de uma carta, que, o tempo todo, estava ‘escondida’ no mais óbvio lugar. Exatamente por isso, por ser tão óbvio o esconderijo, os policiais demoraram tanto tempo para lhe procurarem ali. Na vida real, vida imitando a arte, o acusado estava escondido exatamente na casa do advogado que o protege, local menos indicado para ser procurado pela Polícia. Seu isolamento social teve fim. O medo que faz é sua hipertensão, a pressão subir muito, ter uma crise de labirintite, ficar tonto e cair de um penhasco alto … ‘Saúde’, todos sabem, é algo imprevisível. E em tempos de Pandemia, a queda de um penhasco é tão provável quanto a contaminação pelo Convid-19. E se um enfarte abraçá-lo como abraçou Bebbiano? E se o câncer for mais veloz? A gente nunca sabe o preço do silêncio. Isto é o que nos mostra exemplos recentes: Herzog, Toninho do PT, Celso Daniel, dentre outros.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 30 de junho de 2020
Num conto de Edgar Allan Poe (Purloined Letter, A Carta Roubada, em Português) a polícia perde um mês de investigação revirando uma residência à procura de uma carta, que, o tempo todo, estava ‘escondida’ no mais óbvio lugar. Exatamente por isso, por ser tão óbvio o esconderijo, os policiais demoraram tanto tempo para lhe procurarem ali. Na vida real, vida imitando a arte, o acusado estava escondido exatamente na casa do advogado que o protege, local menos indicado para ser procurado pela Polícia. Seu isolamento social teve fim. O medo que faz é sua hipertensão, a pressão subir muito, ter uma crise de labirintite, ficar tonto e cair de um penhasco alto … ‘Saúde’, todos sabem, é algo imprevisível. E em tempos de Pandemia, a queda de um penhasco é tão provável quanto a contaminação pelo Convid-19. E se um enfarte abraçá-lo como abraçou Bebbiano? E se o câncer for mais veloz? A gente nunca sabe o preço do silêncio. Isto é o que nos mostra exemplos recentes: Herzog, Toninho do PT, Celso Daniel, dentre outros.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 23 de junho de 2020
Não fico calado, nem que a porca torça o rabo. Pelejo para me conter, dizer nada, mas não dá para calar. Aproveitar-se de uma pandemia, alegar urgência ou emergência para malversar o dinheiro público em detrimento de vidas, de pessoas que precisaram e não tiveram respiradores, porque porcos não são, é, no mínimo, um procedimento recriminável. Pérolas aos porcos, atirou-se. Que se apure, que se use a Lei com seus mais rigorosos critérios e, ao final, punam-se os culpados se assim determinar sentença proferida por tribunal justo. Cidadão que não reclama, é, no mínimo, conivente e também merece a PF batendo-lhe à porta. Não calo, nem que eu tenha que enfrentar um exército de porcas de rabos torcidos.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 16 de junho de 2020
Junho chegou. Diferente, mas chegou. A quermesse na rua da vida hasteia o mastro de nosso cuidado com os outros, da solidariedade. Não abraçar é a ordem, é a prova de amor. A dança não é um xote, nem um baião. Mas pode ser da alegria pela proximidade da despedida de quem não nos interessa permanecer, ante a descoberta da vacina que está a caminho. Haverá tempo para o beijo. Tenhamos paciência. Que os Santos João, Pedro e Antônio olhem por nós e nos permita ornamentar a vida com quadrilhas e bandeirolas coloridas e balões com as cores da Paz, da Alegria, da Fraternidade e de todas as virtudes. Enfeitemos nossas casas, nossos corações, acendamos a fogueira de afetos. Junho está aí. Que a vida seja uma festa, um arraial de alegrias e festejos. E, ano que vem, o São João vai ter São João, com sanfona, com forró. E será bem colorido.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 09 de junho de 2020
Nunca gostei de Brasília, desde quando ia muito lá, por obrigação, a trabalho ou em missão de treinamento. Detestava, e continuo a detestar, o fedor insuportável de esgoto que emana das ratoeiras do poder. Não fosse pelos parentes, amigos e colegas queridos moradores da cidade, melhor seria nunca ter ido. Verdade que se encontra na cidade a genialidade da dupla Niemeyer/Lucio Costa. Vê-se, ainda, passarinhos nas ruas largas, além do verde e da floração dos ipês enfeitando os parques. Seus prédios não arranham o céu e quase não se vê sinais de trânsito, por desnecessários que são. Tudo isso atenua minha antipatia pela cidade-avião. Mas falta a decência dos homens de paletó e gravata, a honestidade dos bons de alma, poucos. E isto é fundamental e necessário para um viver bem. Lá acontecem reuniões que, pela falta de decência e postura, causam inveja à mais reles mesa de botequim. Em meio à lama e ao lodo dos lagos costumam nascer flor de lótus. Poucas. Resta a esperança. Tomara que o povo do céu não esqueça de dar uma olhadinha para a ilha solitária de mil sotaques cantada por um Poeta do Ceará.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 02 de junho de 2020
EITA VIRUSINHO FIDUMAÉGUA DE METIDO! SÓ SE FALA NELE!
Da prisão de Ronaldinho Nunca mais que se falou Não se fala do Flamengo Desmatamento, acabou Feminicídio, cadê? Novela o povo não vê Praia não mais se ‘oleou’
Da herança de Gugu Já não se comenta mais Onde o Queiroz se esconde Tanto fez e tanto faz Milícias tiveram fim E a Mariele, enfim Hoje descansa em paz
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Xico com X, Bizerra com I terça, 26 de maio de 2020
No Carnaval, o danado do Corona já pulava atrás do Galo no Recife, subia e descia ladeiras em Olinda. Desde então autoridades sanitárias e infectologistas já alertavam para o risco alto de contaminação com as aglomerações. Ao alerta, ouvidos moucos. Multidões aglomeravam-se. Interesses eleitorais e o receio da impopularidade prevaleceram e não impediram o cancelamento da ‘festa’: dançou o povo. Evitar-se-iam contaminações e alguns óbitos. Vidas valem mais que uma festa. Saúde importa mais que votos. Só não vê quem privilegia a perspectiva política. Na próxima (tomara que não haja) esperamos parabenizar os gestores de plantão por suas ações preventivas. Hoje, apenas lamentamos a falta de providências na época devida.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 19 de maio de 2020
Dona Regina ‘Sem Arte’, sem palco, sem público, sem roteiro, sem chão: Na citação a Stálin e Hitler me assustou; cantar o hino da repressão, tortura e censura me amedrontou; o desrespeito à sua classe, ali representada por Maitê Proença, me aterrorizou; o desrespeito à memória de Aldir Blanc, Moraes Moreira e seu colega Flávio Migliaccio, me apavorou. Espantou-me, isto sim, ver gente tida como inteligente e esclarecida dar guarida e apoio às loucuras e devaneios dessa mulher. Fico triste. Seria o pum do palhaço de que ela falou? Senti o sub nitrato do pó do peido, diria Caetano.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 12 de maio de 2020
Configurei meu coração, mas perdi a senha. Não mais posso acessá-lo tampouco me conectar com o mundo à minha volta. Tentei plugar o meu amor. Em vão. Sem a tal da senha nada é possível. Impossibilitado de navegar na rede, recorri ao Google, tentando reencontrar o mundo, mas, mais uma vez, tentativa frustrada. ‘Sem senha, é impossível’, disse-me abusado e em letras garrafais o Note Book. E o mundo lá fora, explodindo, informando tudo sobre tudo e eu aqui, sem senha, sem saber o que se passa. Eu querendo falar on-line e dizer minhas verdades, contar da minha vontade de viver, mas, apenas porque sou distraído e esqueci a senha, sem poder fazê-lo. Tem nada não: vou me vingar quando lembrar da danada da senha. Vou mandar um ZAP para todos os meus amigos desejando Paz e Bem e, on-line, pelo INSTAGRAN, sorrir para mostrar que ainda é possível ser feliz. E quando um dia conseguir, dançando um xote no site da felicidade, vou conversar pelo FACEBOOK com os que quero bem. E aí me vingo jogando na lixeira todos os arquivos de tristeza e dor. E vou prometer a mim mesmo nunca mais esquecer a danada da senha. A propósito, um amigo meu, meio por poesia, meio por consolo, me fez lembrar que Deus também perdeu a senha do universo e, por isso, não consegue mais acessar o coração dos homens … Tomara que ele encontre logo que a coisa ‘tá feia!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 05 de maio de 2020
Minha mania por números foi reforçada pelos 28 anos que passei no Banco Central, dormindo com números, acordando com índices. Viciado, transferi para a vida pessoal esse péssimo costume. Hoje sei, por exemplo, quantas músicas tenho gravadas, quantas vozes cantaram minhas canções e quantos parceiros me deram o prazer de suas parcerias. Coisa de doido, sei, mas sou assim. Na esteira dessa loucura, vi que rodo, em média, 1283 Km por mês. Como meu carro faz 8,1 Km/litro, gasto 158,4 litros de gasolina no mês, que, ao custo unitário de $4,40 consome $697,00 no meu orçamento mensal. De 10.03 a 10.04, rodei apenas 178 km, gastando 22,0 litros de gasolina, ou seja, $97,00. Resumindo: economizei $600, exatamente o valor de um Coronavaucher. Esse é o tipo da economia que eu preferia não fazer.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 28 de abril de 2020
Há mais de 40 dias que só visto cueca e ando descalço. Não saio, não recebo visitas: calças e sapatos para que? Acho que nem sei mais usá-los. Até desaprendi o caminho da padaria, não sei mais onde fica o posto de gasolina e o Banco. Supermercado e farmácia, também não me vê há muito tempo. Andar no calçadão da praia e correr o risco de ir correr no Aníbal Bruno? Não. Pior que mudaram o sentido de minha rua – o que era INDO agora é VOLTANDO e eu já me preocupo de quando for atravessá-la olhar pro lado errado. Por enquanto, deixem-me de cueca e descalço. Não acho que seja justo deixar preso os que se sentem melhor quando soltos, libertos de amarras inventadas pelos homens. Viva a cueca samba-canção! Igual raciocínio se aplica aos pés, que preferem pisar o chão, sem sapatos, livres, descalços. Pode até parecer que, ao escrever esse texto, tenha eu bebido aquela aguazinha que ‘passarim’ não bebe ou fumado aquele ‘cigarrim’ que tartaruga não fuma. Não! Estava na mais perfeita lucidez quando digitei essas mal tecladas linhas. Viva os pés no chão e tudo o mais solto, do jeito que Deus criou. De prisão basta esta imposta pelo Corona.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 21 de abril de 2020
Tempos sombrios. Nossa esperança se infectou e qualquer espirro ou tosse faz-se acompanhar do temor da contaminação. Beijos, as máscaras protetoras impedem; abraços, só de longe, virtuais, ainda assim esterilizados com álcool em gel e sabão. Esse drama de alegrias confinadas, de ausências indesejadas, de distâncias tão cruéis promove o isolamento de encontros, o distanciamento de amigos e de gente querida. Restará como legado a possibilidade de que uma nova era de igualdade e bem-estar social brote no universo ante a insegurança que acompanhou o vírus e a constatação da fragilidade da vida. Que não demore a volta da alegria, do carinho, do poder beijar e ser beijado, que a gente nasceu foi para ser feliz. Por enquanto, parafraseando Manoel Bandeira, só nos resta ouvir um baião matuto saído de uma sanfoninha do sertão e aguardar o bom tempo que está por vir.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 14 de abril de 2020
Retalhos se espalhavam e coloriam toda a extensão da sala, ao redor de sua cadeira e da velha companheira, uma Singer antiga e barulhenta movida pelo pedal em que Dona Alzira assentava o pé para lhe imprimir movimento. Dali saíam blusas, saias e vestidos para as meninas, calças e camisas para os meninos de quase todas as famílias que moravam ali, no entorno da Vila dos Marítimos. Apenas quando Ivan, seu caçula, lhe exigia o peito a casa silenciava e a máquina de costura tinha sossego. Como era bom ver aquele arco-iris bonito colorindo o chão daquela casa humilde, mas nem por isso menos feliz. Ainda existem costureiras? Será que os retalhos ainda colorem suas casas sob o ruído intenso de velhas Singer? Por onde andará Dona Alzira? Por onde andarão meus sonhos de menino encantado com a cor?
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Xico com X, Bizerra com I terça, 07 de abril de 2020
O grande Poeta Bráulio Tavares, do alto de sua inteligência brilhante, propõe que “sendo para adiar festas, deviam era misturar logo Semana Santa, São João e Halloween, fazer tudo em outubro, assando milho e queimando Judas na mesma fogueira rodeada de bruxas e zumbis.” Modestamente, do baixo de minha indiscutível estultícia, entendo que o carnaval deveria também misturar-se a essa festança múltipla de outubro. Mas os governantes, ávidos pela grana do povo, mesmo já sabedores da existência do vírus à época dos festejos de momo, fizeram de conta que estava tudo em ordem, e fez-se a ‘festa’ … do corona. Temiam perder prestígio se cancelassem o evento. O povo? Ah, o Povo: que se exploda! De minha parte vou enfeitar minha árvore de natal com serpentinas, ovos de páscoa e bandeirinhas de São João.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 24 de março de 2020
Poetas dormem abraçados com as palavras, acariciando-lhes ternamente sob o mesmo manto, embaixo do mesmo lençol. Despertas, essas palavras viram Poemas. Ou Contos. Ou Crônicas, como esta. Às vezes, de tantas, transformam-se em longos Romances. Uns escritos terão a sorte de serem lidos e até admirados. Alguns, pelo azar bafejados, esconder-se-ão nas veredas escuras dos livros nunca abertos. Outros mais, menos sorte que aqueles, sequer terão despertado o interesse de Editores ou Editoras e, anônimas palavras, assim permanecerão, impedidas de provocar emoção em quem as pudesse ler, íntimas, apenas, de quem um dia as juntou com cuidado e carinho. Os que alcançam a ventura de verem suas palavras publicadas terão que se submeter aos ‘donos da verdade literária’ (menos mal que hoje são poucos pela falta de quem os leia). São julgadores que, por ciúme ou inveja, irão hostilizá-los, com críticas infundadas e sem substância cognitiva. E assim vai-se escrevendo até o dia em que a certeza supere a leve impressão de que não vale a pena acordar as palavras. Deixá-las dormindo, penso fazer. Muito em breve.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 17 de março de 2020
Ouvidos foram feitos para escutar coisa boa. Os meus, para isso Deus os fez. Verdade que Orquestras afinadíssimas executando as mais belas sinfonias de Ludwig van Beethoven ou os prelúdios incomparáveis de Johann Sebastian Bach ajudam e contribuem para que a vida seja mais leve e prazerosa. Mas outros sons também alegram o dia-a-dia da gente. Quem já ouviu trovoadas do mês de Junho, anunciando chuva com relâmpagos clareadores, ou a melodia das águas acompanhando a correnteza de um rio, ou, ainda, o cantar harmonioso de galos tecendo as manhãs, sabe a que me refiro. Alguém que já escutou o barulho poético de lagartixas passeando sobre folhas secas caídas ao chão, o coaxar de sapos em perfeita sintonia com a doce zoada do cricrilar dos grilos por certo concordarão com minha teoria sonora. Alguns que não tiveram a ventura de conhecer esses sons, precisam conhecê-los. Assim poderão entender com mais clareza a beleza sublime da música de Piotr Ilyich Tchaikovsky e saborear com mais prazer Le Quattro Stagioni de Antonio Lucio Vivaldi ou se deleitar com a sanfona tocada por José Domingos de Morais, o Mestre Dominguinhos.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 10 de março de 2020
Caminho a ‘pássaros’ largos para bem longe das gaiolas e arapucas, aprendendo com a vida, a melhor das escolas, como fugir das ciladas, como ficar distante dos alçapões tantos que covardemente nos preparam. Minha floresta-aldeia, bem menor que a menor das cidades, é onde repousa minha felicidade, é onde busco desencontrar a hipocrisia de alguns que às vezes insistem em me assaltar. É um lugar coberto de verdades, é minha cantiga, meu descanso, meu de Barros, meu Buarque e meu Domingos. No meu recôndito refúgio percebo que quando os ‘espertos’ se dão conta de que a ‘esperteza’ foi desmascarada pelo poder da Justiça, que a vigarice restou sem máscara, é chegada a hora de os honestos poderem, enfim, exibir seus exemplos para as gerações futuras. Na minha aldeia prevalece a honestidade e o respeito às normas e às pessoas. A farsa não tem vez. Conforta saber que, na perspectiva do hoje, o amanhã sempre será um novo dia e que ninguém, por mais ardiloso que seja, engana toda a gente pela vida toda.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 03 de março de 2020
Lá vem o vendedor, na loja de carros coreana, me apresentando o novo automóvel: motor turbo, ignição eletrônica digital mapeada, injeção Multi Point Fuel Injection, cabeçotes de alumínio, sensores diversos e outras tecnologias desnecessárias, além de um inteligente computador de bordo. Explicou tudo, menos sobre a minha musiquinha: como fazer para ouvi-la, se não existia no interior daquele bólido de última geração um leitor de CD? Em seu lugar, um buraquinho pequenino no qual cabia apenas um pen-drive. Não sabia ele que eu gosto do CD físico, aquele que tem capa, que tem encarte com as letras e fotos, que tem os nomes de quem fez e de quem tocou as músicas. Me deu até saudades do meu velho Fuscão 73 (EE4080) com seu atualíssimo Toca-Fitas Roadstar, último modelo, com auto-reverse, sonho de consumo dos jovens da época, adquirido numa viagem à Zona Franca de Manaus. Saí da loja meio deprimido e fui curar minha amargura na PASSA DISCO comprando o mais novo CD de Francisco César Francisco Cesar Goncalves, também conhecido por Chico César, meu parceiro e xará. Dúvidas não havia, mas ficou mais que consolidada a ideia de que O AMOR É, e sempre será, UM ATO REVOLUCIONÁRIO. O conteúdo é lindo. O encarte, letras e fotos, também. Coisas que o pen drive não me oferece.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 18 de fevereiro de 2020
Apesar do medo, Nunca ter medo de ter medo. Nem do mistério, nem do segredo … Nao ter medo de acertar ainda que para alguns o seu acerto pareça um erro … Nao ter medo de ouvir o não quando se quer ouvir o sim, mas, quando preciso, também saber dizer um não … Não ter medo de Deus … Nem do Adeus, tarde ou cedo. Ah, do Adeus. Desse eu tenho medo!
Nunca ter medo de amar … Nem do mar, do rio ou do riacho … Não vale a pena, acho. Nem de uma poça d’água, ainda que suja: Não fuja, ela pode refletir a lua Que acende a rua … De nada ter medo, nada temer. Medo da sorte, medo da morte, medo sem norte … E, quando nenhum medo restar, Gritar bem alto, em alto e bom som, que não tem medo de nada, nem de Avião … Ah, do Avião. Desse eu tenho medo!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 11 de fevereiro de 2020
Desaprendi o ‘Sinal da Cruz’ e o ‘Em nome do Pai’ que me ensinaram nos catecismos infantis. Salve-Rainhas e o Credo em Deus Pai são coisas do passado. Já os esqueci, ambos, por inúteis que são. Só me restou, de todos essas rezas e aprendizados que de nada servem, o respeito e a crença em Deus. Conversar com Ele, o faço todo dia, a meu modo, e sei que Ele me ouve. Igrejas para mim são todas iguais com seus vendilhões ávidos por lucros e metais. Iguais a todo e qualquer prédio, de quartéis a cabarés, de bares a teatros, aglomerado de tijolos e cimento, que abrigam soldados ou putas, bêbados ou artistas. Minha religião independe de templos: basta fazer o bem, respeitar a crença alheia e ajudar a quem precisa, na medida do possível. Ser bom, ou tentar sê-lo, não é ser rato de sacristia nem provedor material de falsos profetas. Também não é frequentar centros de umbanda ou mesa branca, saber de cor o Alcorão ou raspar a cabeça e virar Rare Krishna. Ser bom não é tampouco decorar o Bhagavad-Gita e saber Sânscrito de trás para frente e da frente para trás. Não! Ser bom é muito mais simples. Começa por não ser mau. O coração, o pâncreas e a alma agradecem. E meus joelhos não se ralam.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 04 de fevereiro de 2020
Também tenho o direito de ser meio louco vez em quando e, assim, já fui acometido de uma vontade grande de conversar com Deus, mesmo sabendo do meu não-merecimento. E marquei audiência confiando na misericórdia dEle. Não pensava que ia enfrentar uma fila enorme de banguelos e desdentados, de sujos e maltrapilhos, de esfarrapados de todo tipo. Me assustei. Ao lado, em outra fila, apenas poucas pessoas. Aí que percebi estar na fila errada. Naquela em que entrei estavam os que iam pedir. Na outra, em que deveria ter entrado e para onde fui, estavam poetas, cantadores e gente que estava ali apenas para agradecer a vida. E foi o que fiz quando me vi, frente a frente, com aquela figura tão luzente e sábia, sempre sorridente e a todos ouvindo. Parecia um Poeta. Agradeci por tudo e, aproveitando, pedi por todos aqueles da outra fila, e mais, pelos que moram vizinho à guerra, pelos que convivem com a fome e pelos deserdados da sorte, tantos. Tentei conversar mais com Deus. As lágrimas não deixaram. Disse apenas muito obrigado e rezei uma oração na minha linguagem pessoal que só eu e Ele entendemos. Desci as escadas do céu mais leve e feliz, mas percebendo o quão difícil é a tarefa dEle.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 28 de janeiro de 2020
A cada dia vou ficando menos novo (adoro desse eufemismo: a gente disfarça a ideia de estar ficando mais velho) e aprendendo o que vale e o que não vale a pena. Antes, brigava por qualquer bobagem, não levava desaforo para casa. Uma ‘fechada’ no trânsito era suficiente para expulsar meu bom humor e jogar ao léu impropérios desnecessários. Hoje, quase todo desaforo eu engulo, faço de conta que não ouço ou vejo, me faço de besta, me benzo, molho o bucho por dentro com uma cerva bem gelada e sigo a vida. Para que complicar se a vida já é tão complicada? Ato consciente que se reforça quando espio no espelho e vejo meus cabelos brancos, devido à brincadeira de mau gosto do senhor Tempo com as tintas dos anos e os pincéis da vida. Até poucos anos eu dizia tudo o que me vinha na boca. De uns tempos para cá, quem se senta ao meu lado jamais ouve um desaforo meu. Ao contrário: calo, faço o sinal da cruz em silêncio, e assim benzido, vou em frente, alegre e sorridente, respeitando o tempo e sua pressa. E para não perder o costume, enxáguo o bucho, já molhado por dentro, com outra cerva, mais gelada que a primeira. Que a vida é curta e só vale a pena o que é bom. Vivo e aprendo com os sábios. Desaprendo tudo que não vale a pena.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 21 de janeiro de 2020
MEU ALFORJE
MEU ALFORJE
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Guardados empoeirados na janela do tempo se aninham no alforje da alma, num cantinho todo especial. Embalados com papel celofone, cor do sol em fim de tarde, os beijos e abraços pululam na varanda da memória enquanto os afetos se aboletam na sala de estar dos sonhos, fazendo a festa para a lua e as estrelas. No quintal em que plantei alegrias hoje colho a ‘bença’ de mãe e a saudade de pai, rezando uma novena pessoal de boas lembranças com uma Salve-Rainha imaginária ao final e um amém sem firmeza, mas em alto e bom som. Dar tantos passos para trás me fez andar outros tantos para frente, cabeça erguida, peito estufado de orgulho pelos caminhos andados, pelos erros corrigidos, pelos amores todos, os já vividos e os por viver (Vinícius ‘tá chegando) … Nas estradas da vida, vou com Deus e não lhe solto a mão, que não sou besta!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 14 de janeiro de 2020
Um Poeta deixou de sê-lo, pensando agredir-me, quando disse que ‘faço música e disco apenas para meia dúzia de amigos’. De estranhar se as fizesse para inimigos. Não as faria. Até porque não os tenho, por mais que alguns se esforcem para assim se tornarem. Sou da Paz, do Amor e a fita que mede o sucesso para alguns é diferente da minha. Se fazer sucesso for ter minha obra cantada pelos Safadões ou Anitas da vida, esse sucesso não me interessa. Reconheço não ter o sucesso que alguns pensam que tem e que seus egos exigem, embora nunca tenham sido gravados por Michel Jackson ou Madona e sejam nacional e internacionalmente desconhecidos além das fronteiras do nosso Estado. Esse ‘sucesso’ jamais terei. Posso até não ter fãs. Amigos, com certeza os tenho. A julgar pelos lançamentos dos meus ‘disquinhos’: só gente da melhor qualidade, saindo pelo ladrão. Esse meu ‘severo juiz’ nunca compareceu a um lançamento, embora tenha cantado músicas minhas em meus discos. Deixem-me com meus seis amigos (acho que uma dezena) que gostam de mim e para quem faço minhas ‘musiquinhas’ que só eles ouvem. Sou feliz assim, sem inveja, sem ter meus colegas como concorrentes (na pior acepção da palavra) e respeitando a todos que trabalham com a arte. Sucesso para mim é isso. O resto é presunção, arrogância, desmedida ambição. Ou seria recalque e complexo? Talvez tudo isso junto. Sou muito mais minha dezena de fãs.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 07 de janeiro de 2020
“- Vai, velho ano, vai-te embora, a passos largos, amparado em raios de escuridão, ancião do tempo que quase já não há. Deixa-me em paz, contigo longe de mim. Vai com as lágrimas que me vistes derramar, com os choros e soluços de que fostes testemunha. Deixa-me só com alguns versos que me alegraram nas noites negras e com os risos, poucos, que iluminaram meu rosto por breves instantes. Mergulhado estás no areal da ampulheta, terra seca, casca de um ovo que nunca se abriu, que nunca virou vida. Que sejas diferente do novo, que está por vir”.
Assim dizia um Poeta triste, sem perceber o quão é bonita a vida, bastando-lhe para tal percebimento apenas abrir os olhos e ver em volta que o cheiro da flor está a nosso alcance, que o amor é próximo e possível e que o bem ainda é o combustível da vida. Assim pensam os Poetas felizes, que enxergam em cada romper de ano um dia novo e um sol nascente cheio de luz e de alegrias.
Sejamos Poetas felizes. Ainda se permite a alegria.
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Xico com X, Bizerra com I quarta, 01 de janeiro de 2020
A cada ano que se finda – e vez por outra eu falo sobre isso – a soma do querer-bem adquirida no decorrer do tempo multiplica a vontade de viver. No percurso são adicionadas coisas boas e a parte que se subtrai, por não prestar, entra no vale do esquecimento e se irriga de perdões. O bom é sentir-se grande, do tamanho de uma criança que sorri ao desembrulhar um brinquedo qualquer na noite de Natal. Ter gente que a gente ama por perto é sempre muito bom. Estando perto de quem se ama estaremos bem junto de Deus. Queres vizinhança melhor? Por isso, começo de ano é tempo de desejar Feliz todos os dias no ano criança que nasce e nos outros todos que estão por vir, com abraços bons para os do bem e com perdões concedidos para aqueles que não merecem um abraço. Mas, ainda assim, se pudermos, até a estes abracemos, lembrando-lhes que na vida há o abraço, o amor e o perdão. Feliz Ano Novo!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 17 de dezembro de 2019
De todos os homens, aquele que semeia versos, ora borboleta, ora pássaro, é o mesmo que também sabe colher luzes e reunir perdidos sons, acolhendo todos os tons em seu tímpano feliz. Sempre com um sorriso a enfeitar seus lábios. Ninguém a ajudá-lo, tantos a lhe atrapalhar. Nas horas vagas, solitariamente, devora brisas e transforma em luz as hostis imagens. E nos trilhos de sua espera, em meio a tintas e aquarelas, a estação é sempre a do chegar, nunca a de partir. Ele desconhece a palavra adeus. A primavera é mais flor quando aquele homem, sorriso estampado no rosto, bondade guardada nas mãos, canta, voa e zune os poemas mais ternos nos outonos e invernos, tecendo sonhos nos verões cheios de sol. Quem é aquele homem que vive a sorrir? E se todos os homens aprendessem a sorrir, como sorri aquele homem, espalhando alegria no meio do mundo?
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Xico com X, Bizerra com I terça, 10 de dezembro de 2019
O projeto estava pronto, com a genialidade do arquiteto que fez o painel desenhado que se debruça ao longo do espaço externo do restaurante, dividindo o ambiente refrigerado daquele outro, ao ar livre. Uma mureta de vidro, encabeçada por pequena jardineira, era tudo o que queríamos. E tivemos. Transparência visual. Tudo feito com o cuidado de possibilitar aos frequentadores o aproveitamento integral das paisagens andantes que por ali trafegavam, indo ou vindo para a praia bem próxima. Tivesse Vinícius passado por ali, teria que pluralizar e alterar o título de sua música Garota de Ipanema, transformando-a em Garotas do Pina, tantas eram as belezas que por ali trafegavam. Mas uma maldita loja de construção pôs em promoção um tal de porcelanato. Pior: a mulher do dono do restaurante encantou-se com as vantagens oferecidas e, ao invés do transparente muro de vidro, afixou ali uma detestável parede, uma mureta de 60 centímetros, de cimento e revestido pelo tal do porcelanato, impedindo a contemplação integral, de nossa parte, daquelas que por ali passavam. Ficamos limitados à parcialidade visual que o ambiente passou a oferecer, permitindo-nos, apenas, o vislumbre da parte acima da cintura daquelas ‘praieiras’. E o ‘andar térreo’? Seria compatível com a beleza apurada na ‘sobre-loja’? Nunca saberemos, submetidos que estamos a esta tortura visual, dúvida atroz. Tanto me revoltei que deixei de frequentar o tal restaurante e, sempre que por lá passo, não resisto e, conjugado com o gesto característico, grito aos quatro cantos: aqui PRA VOCÊS, Ó! Pena que o caldinho de peixe que eles serviam era tão bom!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 03 de dezembro de 2019
Ficou escuro e quase não se via o caminho. Mais parecia uma vereda, uma senda. Da última vez que o céu nublou, demorou mais de 20 anos para desnublar. E a cada dia ficava mais fechado o tempo. Mas um dia o sol raiou. Como sei que qualquer hora outro sol raiará e amanhã será outro dia. Mas quando será o amanhã? Parei, cauteloso, esperando tempo bom, mesmo sabendo que não adianta ficar parado no acostamento no aguardo de bom tempo: tem que botar o carro na estrada, ainda que ela seja estreita e cheia de catabis, encarar o perigo e chegar ao destino final. Redobrar os cuidados, faróis acesos, que o perigo mora perto, mas seguir é preciso, sempre acelerando, cantando e sorrindo, quando possível. Dona Alzira, a costureira, aguarda o corte de chita que eu levo pra fazer um vestido pra minha amada ficar mais bela do que ela já é. Se eu ficar parado no acostamento esse vestido jamais a vestirá. E a chita é muito bonita para se perder em um embrulho só porque o tempo escureceu. Logo eu, que nunca tive medo do escuro e que por tantos escuros já passei … Melhor seguir, cantando e sorrindo, mas sempre atento às negras nuvens e às assombrações. Vai passar. . .
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Xico com X, Bizerra com I segunda, 02 de dezembro de 2019
Estamos na final do Festival Nacional do Frevo concorrendo, na categoria FREVO-CANÇÃO, com o Frevo O ÚLTIMO RAIO DA LUA.
Até a Final, em 07.12, você pode assistir ao vídeo da música e votar nela acessando o site Festival Nacional do Frevo e registrando o seu voto.
Clique em ‘’CLIQUE AQUI PARA ESCOLHER SUA MÚSICA” e vote.
Vou ficar feliz se você fizer isto.
R. Grande Xico Bizerra, meu ilustre amigo, um dos maiores compositores nordestinos da atualidade e colunista do Jornal da Besta Fubana!!!
Já fui lá e já votei no seu frevo, O último raio de lua, composto em parceria com João Neto e interpretado por Edinho Queirós.
COMENTÁIDO DE LUIZ BERTO
Fique certo que toda a comunidade fubânica também entrara lá pra dar o seu voto.
Os nossos solidários leitores irão todos participar desta disputa.
Aliás, vou aproveitar a oportunidade e fechar esta postagem com um dos maiores sucessos de Xico Bizerra, a música “Se tu quiser“, gravada por vários artistas, pra alegrar o nosso sábado com uma bela composição.
Aqui vai a interpretação de Elba Ramalho.
Xico com X, Bizerra com I terça, 26 de novembro de 2019
CENAS DE SEXO EXPLÍCITO, SEM-VERGONHICE E INDECÊNCIA
UMA TRAGICOMÉDIA EM TRÊS obscenos ATOS
(REPUBLICANDO, com pequenas atualizações, pela pertinência temporal):
ATO 1
Na sala de estar, avó e neto em frente à TV, acompanham uma reunião da Câmara Federal, onde seus membros, do ‘Alto’ e ‘Baixo’ clero, reputação abaixo do nível do mar, ambos, se engalfinham numa elegante e respeitosa discussão de amabilidades:
– Conceda-me um aparte. Vossa Excia. é um Ladrão!
– Não lhe concedo o aparte. Exijo a presunção de inocência. Ladrão é Vossa Excia.!
– Com todo o respeito, Vossa Excia. é um Corrupto!
– Data vênia, Corrupto é Vossa Excia.! Fui julgado apenas em duas instâncias colegiadas. Minha corrupção não tem trânsito em julgado.
Propõe a Avó:
– Menino, melhor desligar essa TV. A discussão é inócua. As duas Excelências estão com integral razão. Ambos falam a verdade: são corruptos e ladrões. Num canto da tela, outros engravatados (colarinhos brancos eivados de escuras manchas), sem prestar atenção aos ‘elogios’ entre colegas, celulares nos ouvidos, conversam e riem entre si.
– O homem está falando e ninguém presta atenção, vovó. Riem de quem, dos brigões?
– Não, meu querido. Riem de nós que os colocamos lá. Sorriem do povo.
* * *
ATO 2
Trocam de canal e assistem a uma sessão de um Tribunal que se diz Supremo, cujos integrantes exigem tratamento de Excelência mas agem de forma a não merecê-lo. A população, verdadeira Excelência, vive a ser por eles insultada. Sob negras togas, mudam o entendimento sobre o mesmo assunto diversas vezes num espaço de tempo diminuto, contrariando o bom senso e todas as regras do Direito, expondo o povo à insegurança jurídica que a eles, ‘donos da Lei’, convém.
* * *
ATO 3
Enojados, após irem ao banheiro para uma sessão de vômito em dueto, avó e neto desligam a TV, dão-se as mãos e vão até a banca de jornal mais próxima. Compram uma revistinha imoral, de putaria explícita. Quase tanto quanto. Quase.
* * *
Fecha-se a cortina, apagam-se as luzes. Faz-se breu no País. Escuridão total.
* * *
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Xico com X, Bizerra com I terça, 19 de novembro de 2019
Eu também, a exemplo de Leandro Gomes de Barros e do Poeta Maciel Melo, quis bater um papo com Deus. Fiquei com mais vontade ainda depois que ouvi Gil cantar sua música que trata disso. Eu queria apenas a resposta a alguns porquês: a justificativa para tão poucos com tanto e tantos com tão pouco; a razão de ser de a balança da Justiça nem sempre pender para o lado injusto; a partida de pessoas queridas antes do prazo desejado. Apaguei a luz, calei-me, folguei os nós dos sapatos e joguei a gravata no lixo. Deixei nus corpo e alma, mas de nada adiantou. Ele estava muito ocupado cuidando de quem precisava, apartando brigas, dirimindo conflitos, apaziguando as pessoas que gostam de guerra. Estava lá pras bandas do Oriente em busca de Paz. A exemplo dele, não encontrei essa Paz tão necessária. Talvez por isso, Deus não tenha tido tempo de me ouvir, não quis conversa. Seu Chefe da Casa Celestial explicou-me que Ele estava muito ocupado com coisa séria e eu era um Poeta, disse-me, feliz por natureza, e que, por isso, não precisava daquele encontro. Eu era quase feliz, respondi-lhe. Faltava-me esse bate-papo. Remarquei a audiência. Quem sabe terei melhor sorte e esclarecerei minhas dúvidas todas. Talvez até faça um Poema. Ou uma música. O líder de sua bancada na Câmara do Céu, barbas brancas quase arrastando na terra, garantiu-me o encontro. Dois ‘dedim’ de prosa com Ele não me fará mal. Tomara que não demore muito e eu me encaixe na Agenda de Deus.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 12 de novembro de 2019
Nossos versos nunca serão derradeiros. Outros virão, porque a Poesia jamais será jogada ao léu e sempre precisará ser lida. Diante do infortúnio, nós, passarinhos cantantes, vamos poetar, nos juntar em bando e fazer com que os do mal passem. Torcer para que eles levem na bagagem suas mazelas, preconceitos e maldades e aí, felizes e de asas soltas e canto livre, possamos brindar a liberdade e a alegria. Versar e cantar, toda a vida, toda hora, pois toda hora é hora de cantar. Se o tempo é nublado e o horizonte cinzento, pintemos um sol claro e um céu bem azul, da cor da nossa esperança, com nuvens mais que brancas, da mesma cor de nosso amor e de nossa coragem. Misturemo-nos, pretos e brancos, ricos e pobres, todos. Água e Óleo só não se juntam apenas nas frias leis da Física (ou da Química, nem sei). Se juntam, sim, na lei dos homens de bem, onde é proibido proibir. Mesmo que escrevamos os versos mais tristes esta noite, ainda assim eles cairão na alma como no pasto cai o orvalho e contribuirão para um amanhecer feliz. Discordar de Pablo Neruda? Jamais! Juntemo-nos. Apaguemos a escuridão. Passarinhemos!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 05 de novembro de 2019
Os gatos estão todos metidos a besta. Hoje são amigos dos ratos. Até desconfiam de sua periculosidade e vivem a pedir testes de DNA para confirmar a existência real deles. Ratoeiras já não há e os togados da fauna felina, com a desqualificação das baratas delatoras e se aproveitando das vergonhosas ‘brechas legais’, libertam todos os ratos que roubam, que fazem o que não deve. Reveem e reinterpretam, a toda hora, a constituição animal, de forma a permitir aos ratos que eles continuem roendo e roubando, sobre todas as mesas, de ricos e de pobres. A balança está desprogramada e pende muito mais a favor dos ratos. Roedores já condenados, às vezes por até três tribunais, estão à solta, por ‘presunção de inocência’, pelo trânsito engarrafado e, por isso mesmo, por processos ainda não julgados definitivamente. Haja instâncias. Ao sair as condenações, se é que sairão restarão roedores com seus processos prescritos e eles próprios mortos, por decurso de vida. Assim como os gatos julgadores. Menos mal. Quem sabe no futuro os gatos voltem a ser gatos e cuidem dos ratos, como sempre foi na Constituição da Natureza. E que cumpram as verdadeiras funções atribuídas aos membros do Superior Tribunal Felino – STF. Com todas as vênias que o assunto possa suscitar.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 29 de outubro de 2019
Quando quis entrar no bar o garçom chato estava acabando de baixar a pesada porta. Ainda insisti, sedento que estava, mas ele é mesmo muito chato e disse um NÁO tão NÁO que eu fui parar no bar vizinho. Ainda bem que este estava aberto. Menos mal que todos os bares sejam iguais. Mudam os tira-gostos, a temperatura da cerveja amiga e o humor do garçom. Ainda bem que aquele garçom chato é exceção. Normalmente, os garçons são cúmplices, de tão solidários. E escutam nossas queixas, e enchem nossos copos, e até bebem conosco se a nossa solidão assim exigir. A palavra, antes engasgada na garganta, flui feito espumas ao vento, como dizia o Poeta. Basta haver quem as ouça. E a palavra solta alivia a dor, prepara o peito para mais um verso. Ou para outra saudade. Ou para a mais nova canção que está por brotar. Ou, ainda, na pior das hipóteses, para uma dose saideira, que nunca é a derradeira. Deus abençoe os Garçons. Principalmente os que não tem prazer em baixar a pesada porta do bar e que não aprenderam a dizer não.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 22 de outubro de 2019
Abri lentamente a caixinha de meu guarda-estrelas sem mexer no papel prateado que embrulhava a lua. Deixei-os lá, papel e lua, e retirei, uma a uma, as estrelas de todas as cores que ali dormiam. Percebi que a lua não gostou daquela solidão e a ela devolvi as estrelas roxa e vermelha. As demais, com elas fiquei e levei-as a passear. A estrela branca me indicava o caminho da Paz e segui seu roteiro. No meio do caminho ela sonhou com Dom Helder e desapareceu nas asas de uma pombinha. A estrela verde, levei-a, a seu pedido, para ver o verde mar. Encantou-se com um peixinho cor-de-rosa e sumiu na primeira onda. À azul mostrei o céu e ela se apaixonou por um arco-íris que acabara de se abrir e se embrenhou no meio de tantas cores. Restou-me a amarela, que não resistiu ao primeiro apelo e chamamento do Senhor Sol e a ele foi-se unir. Voltei ao guarda-estrelas, desembrulhei a lua, guardei-a bem junto ao peito e até hoje ela me faz companhia todas as noites, alegrando meus momentos. As estrelas roxa e vermelha, deixei-as guardadas na caixinha para quando a Lua se cansar dos meus afagos e resolver morar em outros céus. Espero que elas não tenham a sorte que as outras tiveram, encontrando complemento às suas belezas e qualidades e por elas me trocando. Aliás, melhor pensando, que elas encontrem rosas e ametistas, vermelhas e roxas, e sejam felizes.
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Xico com X, Bizerra com I quinta, 17 de outubro de 2019
Procura-se roupa decente para vestir a Justiça. Qualquer pano, qualquer trapo ou retalho que não seja uma toga. Sem venda a lhe tapar os olhos, despida de princípios de pesos justos em sua balança e com a espada embainhada contra os costados do humilde povo, a outrora honrada dona Justiça desfila nua pelas ruas, palácios e tribunais, pelas esquinas sinistras do Planalto, escarnecendo a todos e assumindo sua porção prostituída de caráter duvidoso que não resiste ao menor tilintar de moedas à sua frente. A origem do metal vil que corrompe – diretamente ou não, é o que menos importa: de Empresários ou Políticos provenientes, ele perverte da mesma forma e avilta com a mesma força. Pobre de quem nela um dia acreditou. Dona Justiça hoje habita o mais degradado dos cabarés e se entrega, lânguida e voluptuosamente em lascívia permanente com os poderosos e seus interesses inconfessáveis. Dona Justa está nua e sua venda a esconder-lhe a visão nada mais é que uma fraude.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 08 de outubro de 2019
Neto é aquela criaturinha que faz o olho da gente brilhar, quando ele chega por perto com seu sorriso moleque e sotaque de anjo. Ele pede o que quase não pode e a gente dá mesmo sabendo do quase não dever dar. Aquele bombom que maltrata os dentes, aquele chocolate ou até, crime maior, um pouquinho de coca-cola, tudo escondido do pai e da mãe. Tudo dentro daquele Contrato de Cumplicidade que em seu artigo primeiro diz: ‘Não revelar aos Pais nada do errado que seu avô comete’. Até porque quando eles forem avós farão o mesmo com os filhos do meu neto. Parece que estou vendo. A gente ensina a paz mas não resiste a uma luta de espada imaginária entre dois super heróis, ele e eu. Doces encargos do avô. Esse homem de cabelos brancos nunca cansa de ver o mesmo filminho, repetidas vezes, sabendo o final tanto quanto o neto que lhe obriga a isso. Mas, se ele gosta, é bom ver aquele mesmo filminho, repetidas vezes, sabendo o final tanto quanto ele. Contar histórias é outra tarefa própria dos avós. E a gente conta uma, duas, três, dez vezes a mesma história. Não sei qual dos olhos brilha mais, se o nosso ou o dele. Certo mesmo é que quando ele reconta pra nós a história que contamos, é nosso olho que brilha mais. E o avô ri grande que nem menino pequeno. De alegria porque percebe que ele assimilou direitinho os conceitos de união, paz, amizade, amor que a gente tentou passar nas histórias que a gente contou. E aí, inevitável, uma lágrima molha o brilho do olhar de avô. São 6 anos e ele continua a inventar cheiros para o meu jardim. Como não plantar-me num inverno de alegrias para florar risos no meu olhar de avô? Salve Bernardo, que me dá a alegria de ser avô. Feliz 6 anos, meu amiguinho/amigão, meu imenso companheiro. São 2190 dias inventando cheiros no meu pé de alegrias.
* * *
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Xico com X, Bizerra com I terça, 01 de outubro de 2019
Lá vem o seresteiro anônimo pelas brancas areias da praia de Morro Branco, entre altas dunas e falésias das mais variadas cores e tons. Uma mão no ouvido e a outra apontando estrelas. Calem-se todos para que ele continue seu ofício, sua missão de cantar. Isso basta. Não importa se o entendamos, se sua voz é bela, se a afinação é perfeita: basta ouvi-lo. Pouco interessa a canção, pode até ser algo bobo: importa o cantor e sua mensagem, a esperança que nela se contém. Bobagem musical só os desalmados enxergam. Sua alma, por si só acalentada, ajuda a acalentar tantas outras, ternurizando cantigas que ouvimos e que, de tão belas, quase sempre conseguimos fazer coro. Façamos como ele: cantemos. Qualquer coisa. Alguém ficará feliz com nossa voz, por mais desafinada que possa parecer. Outros ouvirão e, quem sabe, nos acompanharão e conosco cantará. E que o seresteiro anônimo continue a alegrar as cores das noites e as areias de um branco morro, arejando as dunas das almas e afagando as falésias coloridas do coração de quem por ali vive e ama.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 24 de setembro de 2019
Como eram bons os meus sábados, longe da escola, do professor durão e do diretor que adorava me suspender. Só porque eu pulava o muro e ia embora antes de a aula terminar. Eu que nunca botei areia no tanque de seu Gordini marrom, que ficava parado lá atrás da Secretaria, longe de seus olhos vigilantes. Sábados de altas conversas com os passarinhos e as borboletas. E, para cada sábado feliz, um domingo avexado e sorrateiro na esquina, aguardando o desamanhecer, sua hora de chegar, anunciando que a segunda-feira estava por vir. No relógio do tempo a semana é cheia de sábados passados e de outros tantos que estão por vir, sem terças ou sextas-feiras, pois o coração da gente sabe nada, nadinha, de calendários: só entende de alegrias e saudades, de flores e de partidas, de encontros e de lágrimas, de amor e desamor. Entende nada das Quintas. Nem das Quartas-Feiras. Não sabe o que é tempo. Mas adora os Sábados.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 17 de setembro de 2019
Ele chegou na estação muito antes da chegada do trem que o levaria. Nem seu barulho nos trilhos se ouvia. Além de sempre apressado, a vontade de chegar era maior que o tempo que lhe sobrava naquele lugar distante e sem flor. Queria chegar logo no País dos Duendes cor do Céu. Um deles o aguarda para levar-lhe à praça central, onde também ela estará a espera-lo, com seu vestido decotado cheirando a guardado de tanto esperar e um sorvete de umbu cajá. Daqueles de casquinha. Nem importa ter ou não açúcar. Irrelevante para ele: às favas a glicose. De mãos dadas e corações alegres, seguirão até o coreto onde anjos entoarão a Valsinha de Chico. Suas mãos desconhecem o verbo se soltar. Seus pés se entrelaçarão num dançar alegre e feliz, bem-dizendo a vida. Marcarão para o dia seguinte. Mesmo local, mesma hora, mesmo tudo. Menos o sorvete: amanhã o sorvete será de felicidade plena com cobertura de alegria e paz. Muito melhor que o de mangaba. Tão bom quanto o de umbu cajá.
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Xico com X, Bizerra com I domingo, 15 de setembro de 2019
PENDERAMA, JÁ NÃO HÁ.
PENDERANA, JÁ NÃO HÁ.
Penderama, já não há. Em seu lugar Nuvens cinzentas de um passado que passou … De um beijo que não dei, De um abraço que se perdeu … Da infância distante, Só restos, lembranças, saudade Dos campos, da casa-grande, das plantas, Do sorriso do meu pai. Do passado, Um dilacerado presente … Adeus, Penderama. Até um dia, meu Pai!
A propósito do texto intitulado OUTROS PENDERAMAS, publicado na coluna de José Paulo Cavalcanti Filho, no último dia 12, no JBF
Xico com X, Bizerra com I terça, 10 de setembro de 2019
A felicidade, de surpresa, avizinhou-se, bateu-me à porta, entrou e sentou à minha frente, pertinho dos livros, entre um Bandeira e um Graciliano. Usou a cadeira de balanço em que eu cochilo como se em casa estivesse. E estava. Foi quando todas as letras deram-se as mãos, arrumaram-se entre si e formaram versos bonitos, belas prosas. Pela janela, os relâmpagos, cor de arco-íris, enfeitavam tudo o que não era terra. Foi quando percebi que todas as estrelas esqueceram de dormir e brincavam naquele céu de pré-chuva, antes que as nuvens virassem neblinas perfumadas. Na calçada, sentados ao chão, os homens conversavam e brincavam que nem as crianças que lhes tinham ensinado a recitar o verbo amar. Ao longe, mas nem tanto, ouviam-se serenatas acompanhadas por violões afinados, tão diferentes dos fuzis que se anunciam, estes usados para fim ignóbil. Estávamos em plena terça-feira de carnaval e todos torcíamos para que aquela festa não se quarta-feirasse. Aos quatro ventos, meninos brancos, pretos e pardos, buchudos e magrelos, ricos e pobres bradavam anúncios de cursos intensivos de abraços e beijos na faculdade de carinho ali próxima, na outra esquina. Todos riam e cantavam e ninguém sonhava com o Paraíso. Precisava? Existia um outro além daquele?
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Xico com X, Bizerra com I terça, 03 de setembro de 2019
Pela janela embaçada, vê-se nuvens de chuva mansa, de neblina preguiçosa, se espalhando nas pétalas azuis do céu, formando carneirinhos para logo em seguida desmancharem-se e virarem dragões ou manchas parecidas com gente que nem a gente. O chão quase enxuto bem reflete a tão pouca intensidade da água que cai. O sol, companheiro inclemente, insiste em travar luta com o nublado que, de certa forma, dá esperança ao homem do sertão. Mas vão-se os dias, e a seca, renitente, permanece. Até que tudo vira breu e o céu fica escuro, pesado, carregado, como se diz. Prenúncio de coisa boa, da felicidade que está por vir. Cai o primeiro pingo, o segundo e aí já não dá mais para contar, tantos os pingos que caem. É a chuva, é o inverno avisando que está chegando. Ajoelhemo-nos, paguemos as alvíssaras e gritemos viva a São José e obrigado a São Pedro. Eu bem que achei que estava bonito para chover.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 27 de agosto de 2019
Lá vem ela, serelepe e fagueira, a moça do cabelo verde que todos os dias fura a fila do metrô e passa à frente de todos, com a maior cabeloverdice. As grávidas, os velhos, as mães com filho no colo, os deficientes, todos ficam para trás. Como ela aparentemente não está grávida, é jovem, não carrega um filho no colo, muito provavelmente ela é deficiente, do ponto de vista ético, sob a ótica mental e a isso se apegue para desrespeitar a todos. Só pode ser. Idade ela tem pra ter juízo. Talvez até tenha: apenas não o usa. Quando consigo entrar no vagão, já lotado, a moça do cabelo verde já está lá muito bem acomodada, sentadinha na janela, sorriso no canto da boca, celular na ponta dos dedos, como que a zombar de todos nós, pobres mortais, imprensados feito sardinha em lata. A falta de civilidade é imensa e me causa indignação. Todos os dias eu me entristeço pela quantidade cada vez maior de mulheres do cabelo verde ao nosso redor, furando fila, estacionando onde não deve, desrespeitando o direito alheio. E antes que me taxem de preconceituoso, vou logo avisando: homens também pintam seus cabelos de verde, de azul e de vermelho. Que bom se não houvesse tintura de cores extravagantes para o cabelo dessa gente.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 20 de agosto de 2019
Ele adestra borboletas, cantando alto a Poesia que ela faz acariciando sonhos e pastorando nuvens. Moram a pequena distância, ele dela, mas não se conhecem. Ela sequer desconfia que o adestrador, no exercício de seu ofício, canta seus poemas. Ele, por sua vez, não imagina que seu canto deriva da poesia que ela escreve. Nunca se viram, nunca se encontraram. Os devaneios comuns aos dois, ao contrário, vivem de mãos agarradas a passear pelo infinito do bem pensar. Estão por se encontrar. Poesia e canto não sabem viver um longe do outro. Um belo dia, tenha certeza, o som invadirá o íntimo da Poetisa que sentirá, no fundo da alma, que suas rimas se transformaram em canção, que seus versos hoje são melodia, que seus corpos foram feitos um para o outro. E aí, sonetos suavizarão seus corações, cantigas bonitas embalarão suas vidas e cantilenas perenes se espalharão pela escola do adestrador, pelos caminhos e veredas das nuvens da Poetisa. Não tenho dúvidas. Amanhã, talvez, antes do primeiro vôo da borboleta azul, logo após as reticências da palavra, assim que o silêncio penetrar a profundeza das cores e a brancura das nuvens, eles se encontrarão para provar o estar vivo da bem-querença. A harmonia prevalecerá e a melodia estará pronta para ser executada. Antes que caia a gota inicial da água em que foi transformada aquela nuvem branquinha, numa chuva de amor e carinho, num borboletar de Paz. Assim é o amor.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 13 de agosto de 2019
Sob o céu do Poeta descansam nuvens branquinhas, preguiçosas, donas da mansidão, mas que ao primeiro assobio de vento se alvoroçam pra virar chuva. É aí que as asas se abrem, batem e alçam vôos nunca dantes voados rumo à quimera de uma vida feliz, possível para os bons, os do bem. E o verbo dever, junto com a obrigação substantiva, desaparece, pois tudo que era devido deixou de sê-lo. Nada por obrigação, tudo por prazer. Nada a lamentar. Restará apenas a saudade do ontem passado e descumprido, da tarefa recomendada e deixada de lado, do canto calado e do poema por escrever. Mas o tempo é presente, embora fugaz, e o futuro é impaciente. E ele já está ali na esquina esperando a gente, silente e indecifrável, doido pra virar passado. E ele é rápido como o vento, ligeiro como a vida.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 06 de agosto de 2019
Não se conhecia maldades na casa de minha infância. Havia, logo à frente, do outro lado da rua, um imenso capinzal onde se criava vacas. A rua era nosso campinho de futebol, bola de meia, raramente de borracha. No quintal, um pé de limão e um outro de doces siriguelas, tudo vigiado por Tupã, amigo fiel de meu pai. Na tentativa de salvá-lo, quando um dia o cão caiu no cacimbão, meu pai perdeu sua Parker 51, de estimação, que escapuliu do seu bolso para fazer companhia a Tupã. Mas o melhor daquela casa é que existia, no quarto, uma cômoda antiga, escura, quatro gavetas, sobre a qual eu folheava, escondido de minha mãe, a Revista do Rádio, detendo-me na coluna em que se via vedetes daquele tempo, como Virginia Lane e Renata Fronzi, com pouquíssima roupa para os padrões da época. Que belas coxas tinha a Lane. Quantos sonhos sonhados com a Fronzi. Belos joelhos. Joelhos e coxas: tudo que nos era permitido ver. Não havia Playboy, nem Ele e Ela: apenas uma tal de Status, precursora das duas, mas recatada em relação a estas. Eram outros os tempos, sem internet, sem WhatZap, sem redes sociais. Nosso telefone, preto, pendurado na parede, se resumia a um 3-20-26. Televisão, só a do vizinho, onde víamos Renato Aragão em preto e branco, às quartas-feiras, antes de ele ir ser famoso no Rio de Janeiro. E era só. Bastava-me a Revista do Rádio, de periodicidade mensal. Um mês de espera pelas fotos das vedetes que enfeitavam meu pensar. No mais, era escola, bola de meia e inocência plena à espera da nova Revista, no final de cada mês, na casa 142 da Francisco Parreão, em frente ao capinzal, onde jogávamos bola sentindo o aroma de bosta das vacas que ali moravam.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 30 de julho de 2019
E a dorzinha no pé da barriga não quer ir embora. Solidária, insiste em me fazer companhia, em não me deixar só. Começando com a letra ‘c’, além de chuva, a única coisa que posso tomar é comprimido. É um depois do café, um depois do almoço e mais um após o jantar. Tome ‘cibalena’. Meu bucho ‘não está valendo um cibazol’, como se dizia lá rua Tianguá de minha infância. O doutorzinho que eu fui, que por ironia do destino se chama Carlos (a letra ‘C’ me persegue) proibiu chocolate, café, Coca-Cola, cerveja, conhaque, charque e cachaça. E ainda me enfiou uma mangueira goela abaixo, com uma câmara na ponta para, segundo ele, bater uns 3×4 das minhas tripas. Que indiscrição. Pior foi quando eu vi os retratos do meu interior: pense numa paisagem feia! Meu consolo é saber que as tripas de Luana Piovani e da morena da ‘Dona do Pedaço’ não devem ser muito diferentes das minhas. Todo interior deve ser feio que nem o meu, acredito. E tem um cantor mineiro, acho que Vander Lee, que cantava que era belo o interior do seu interior. O meu é feio que só a gota serena. Vôte! Acho que Vander Lee nunca bateu uma ‘chapa’ do interior do seu interior. Só sei que depois que eu vi os retratos do bucho por dentro nunca mais eu como dobradinha. Deus me defenda. Também, quando eu ficar bom vou me empanturrar de chocolate, café, Coca-Cola, cerveja, conhaque e cachaça. Cibalenas, nunca mais. Até quando doutor Carlos voltar a recomendá-las.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 23 de julho de 2019
Sou muito sensível a elogios. Adoro quando me chamam de imbecil. Tanto quanto Manoel de Barros. A diferença é que não tenho o talento dele. Mas quando comentam as insignificâncias que escrevo, seja em texto ou canção, fico feliz. Mais ainda e principalmente quando delas discordam. É indicativo de que alguém leu ou escutou e fez despertar o interesse de pelo menos uma pessoa, ainda que pensando diferente de mim. É o poder da palavra ou da música, guardada nos cofres da Poesia. É o nada e o tudo juntos com a magia do encantamento e o poder da sedução. Que seria de nós sem os Buarques de Holanda, Joões Cabrais, os Quintanas, os Vinícius e os Manoéis, os Barros e os Bandeiras? Sem falar nos Pessoas do além-mar. Eles nos bastam para suportar os verdadeiramente imbecis que se julgam superiores, sem o serem, claro. Por isso, me alegram, sobremodo, quando os comentários discordantes são daquelas pessoas reconhecidamente insignificantes e que nos dá prazer tê-las como discrepantes. Opiniões destes, tomo-as como elogio. E gosto de elogios.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 16 de julho de 2019
Ela não foi. Ficou de ir e não foi. Nem mandou alguém em seu lugar: melhor assim. Esse alguém talvez nem goste das cantigas do Chico, tampouco aprecie uma cerva gelada que só. Só sei que a danada não foi. Ou seja: meu amigo estragou água morna e sabão, gastando-os em banho tão demorado. Se seus dentes resistiriam a mais um dia sem escovação, para que escová-los, gastando pasta e escova? Pia e privada bem que poderiam ficar sem lavar: far-se-ia isto depois, com calma. Tudo em vão … Mas tudo bem. Vai ver o UBER ‘farrapou’ ou a babá que ficaria com seu filho adoeceu. Vai ver ela torceu o pé ao descer a escada ou engasgou-se com o cuscus, borrou o batom e deu-lhe preguiça de se ‘rebatonzar’ …Terá tido uma dor de barriga? Ou o calo do mindinho voltou a doer? Talvez tenha ido a um chá de caridade e esqueceu da caridade que iria fazer. Não sei a razão. Sei que ela não foi. Liga não – disse ao meu amigo – aproveita e deixa perdido o desodorante que se perdeu: quem sabe dona Solidão, que ‘tá já chegando ou já chegou, goste do cheiro dele ao cheirar o teu sovaco e se abanque por aí? A gente nunca sabe: a solidão é tão esquisita, tem uns gostos tão estranhos …
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Xico com X, Bizerra com I terça, 09 de julho de 2019
Que bela e poética a casa de um amigo meu, de portas amarelas e jardim florido, onde bate o sol mas não se deixa faltar chuva. A casa que ele sonhou. Tão diferente da casa que certo dia descobri ser a casa que não sonhei, de apenas uma porta para entrar e uma janela permanentemente fechada, por onde não passava uma fresta sequer de luz. Nem passarinhos. Serenatas, não as ouvia. Não existiam músicos nem instrumentos. Apenas poeira sobre um chão silencioso. No jardim, covas não fecundadas, semipreenchidas por areias cujos grãos já se tornavam pretos e nenhum jardineiro ou gota d’água para deles cuidar. Paredes nuas, sem quadros a adornar-lhes, fazendo companhia à janela de que falei, sempre fechada. Respirava-se solidão na casa que não sonhei. Nenhum amor ali podia ter vida. Não havia ar. Não havia amor. Nada fazia questão de existir no tempo daquela casa. Nem relógio havia para marcar a tristeza das horas. Só uma cadeira de balanço que não mais balançava por falta do impulso de alguém. Pelo menos não se ouvia o seu ranger ao balançar. Menos mal que nunca sonhei com esta casa. Melhor sonhar com a casa dos sonhos do meu amigo, próxima dos bons botecos e das boas prosas com amigos, onde não há polícia nem Lei Seca, por desnecessário ser. Uma casa sem cercas, muros ou vigias, com todas as gaiolas de portas abertas, em que se possa esperar o nada-fazer o tempo que necessário for conversando com as borboletas e acariciando as pedras que servem de pouso para passarinhos coloridos e cantantes.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 02 de julho de 2019
Sou de um tempo em que se comemorava o período junino com música, festa e comidas típicas. O mês de Junho era todo de festejos, de homenagens aos Santos Pedro, João e Antônio. Quadrilhas, hoje, só de políticos que roubam a população. Onde estão as fogueiras, os fogos e os balões? Olhei pro céu, que ontem foi lindo, e nada disso pude ver mais. Sequer estrelas tinha. Meu junho parece mais um outubro de tão triste e outonal. Por mais que apure as ‘oiças’ nenhum som de sanfona, nenhuma dança, nenhum baião. Já não se brinca de esconder anéis e as adivinhações são meros aplicativos dos telefones nas mãos de cada ‘matutinho.’ Mas nem com a ajuda tecnológica eles conseguem adivinhar onde estão as canjicas e as pamonhas. Nos palcos, bandas e bundas, sob o cúmplice olhar e escusos interesses dos ‘donos’ do poder público, seus asseclas, sequazes ‘empresários da cultura’. Morreu o São João ou morri eu e esqueceram de me avisar? Não olhem pro céu: pouquíssimas estrelas há. Nem carneirinhos há mais.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 25 de junho de 2019
Chove na cruel cidade das chuvas cruéis. Desabam morros, soterram-se casas, desfazem-se famílias. Mares revoltos de águas muitas, muito além do que deveriam ser. Gente que não mais verá a cidade. Nunca mais. Esperemos o sol brilhar e reflitamos sobre o proclamado Recife, Capital do Nordeste. E seria, não fosse a miséria vista de baixo, a falta de drenagem dos rios, a não-limpeza dos canais, o lixo no que um dia foi calçada. Lá de cima, drones mágicos, imagens enganosas fazem crer que está encravada no nordeste brasileiro uma Estocolmo, uma Copenhague. A verdade é outra. Quando o Capibaribe banhar–se de sol e os sobrados anciãos da rua da Aurora deixarem-se refletir em suas águas correntes, o Beberibe, mãos dadas com as baronesas flutuantes e cansado de longa viagem desde a Serra de Jacarará, a ele se juntará e, em pouco tempo, já transformados em Oceano, se espalharão mundo afora fantasiados de Mar. E aí o Recife voltará a ser belo, ainda que apenas quando visto e fotografado por drones, no andar de cima.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 18 de junho de 2019
O gatinho João amava a gatinha Maria. Aos olhos de João e ao amparo de seus sentimentos, Maria era bela. Belíssima. A mais bonita de todos os telhados. Pouco lhe importava se ela andasse desequilibrada e passeasse suas patas descalças por sobre as telhas sujas do lugar. Não lhe incomodava seus pelos maltratados e em desalinho. Maria era bela. Belíssima. Olhos de um verde que quase não mais existia em outras gatas nas redondezas. Assim avistava João. Seus amigos percebiam muitos defeitos em Maria. E miavam aos quatro cantos suas imperfeições. Apenas o gatinho João não as enxergava. Via e ressaltava sua beleza natural, a que independe de qualquer coisa, a que realmente importa. Maria, apesar dos maus-tratos que a vida lhe impunha, era bela. Belíssima. A mais bela de todas as gatas e seu rosnar era incomparável. Ameaçador, é verdade, mas tão terno quanto. João amava Maria. E Maria amava João. Apenas isso. Além do que, aos olhos de João e ao amparo de seus sentimentos, Maria era bela. Belíssima. A mais bonita de todos os telhados.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 11 de junho de 2019
Joviais senhoras, jovens senhoritas e alguns mancebos, quase sempre malhados, desfilam nas calçadas alheias, com seus cãezinhos, nem sempre cãezinhos. Alguns mais lembram ferozes leões acorrentados ao pescoço e puxados por suas donas e donos, domadores cuidadosos. Meu último cão foi Tupã, quando ainda garoto. Morava e passeava solto no quintal de minha casa. Gosto de cães, mas não mais os tenho e, por isso, com eles não passeio. Prefiro passear com meus sonhos e desejos: melhor companhia não há. Nos ajudam a encarar a vida e os percalços, quando seguram nossas mãos e nos desviam da crua realidade. Outras vezes nos fazem adormecer com a esperança refeita de um dia melhor no dia seguinte. Dobram as esquinas, mudam de calçada, ao pressentir perigo e nos embala, às vezes com carinho, outras, com sofreguidão, antes de nos abandonar até o próximo encontro, até o próximo sonho, até que o desejo se encante. Além do que, não precisam de coleiras, podem conosco subir e descer pelo elevador social. E com a grande vantagem de que não fazem cocô nas ruas.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 04 de junho de 2019
Um tango se ouvia como trilha sonora. No cabaré de um distante sertão, em meio à fumaça e cheiro de cigarros, tudo à meia luz, um tango. No canto do salão, apenas a pequena e quase inexistente claridade de um abajur lilás, bem menos forte que o sol que, dali a pouco, brilharia no céu daquele ambiente triste e profundo. Mas um tango? Melhor seria dançar um baião bem compassado como os que se acostumara a ouvir, pensou ele, antecipando o desejo de ter aquelas coxas fartas e outras curvas dela ao seu dispor, entre suas coxas. Por uma fresta da janela entreaberta, percebia-se um clarão que se achegava, diluindo o sonho, antecipando o final do tango … Ela, com sono, cochilava entre os acordes de um bandoneon tentando tocar La Cumparsita … E ele se pergunta: – ¿Qué has hecho de mi pobre corazón?
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Xico com X, Bizerra com I terça, 28 de maio de 2019
O céu. Olhei hoje cedo, pela manhã, como sempre faço, e ele estava escuro. Carregado, como se diz lá no meu Crato distante. A gente diz que está bonito pra chover. Uma nuvem cinza e preguiçosa passeava, sem pressa, de cá pra lá, de lá pra cá, como que anunciando uma chuva. Além de cinza, preguiçosa e escondedeira do sol, a nuvem era também mentirosa: caiu um pinguinho só, um apenas, um pingo impostor, uma quase neblina fraquinha, insuficiente para amenizar o calor danado que abraçava a todos nós. Era apenas uma nuvem cinza. Flor que precisasse de água pra brotar morreria sem nascer. Isso foi de manhã, sol mal botado a cara de fora. Quem dera, agora à tarde, abram-se as comportas do céu e São Pedro, talvez com remorso, seja generoso deixando cair água muita. Tomara que assim seja, que o Sertão tão precisado também se molhe e que as ribançãs, de asas encharcadas, estejam de volta. A gente merece. Tomara que o mau tempo não demore a passar. A gente não merece.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 21 de maio de 2019
No festim, a sopa de pedras, sem sal. E todos se achegaram: os sem-sorriso e os sem-medo. Depois, até uns sem-fome também vieram pois mais valia a festa que a vontade de comer. Na sopa de pedras puseram sal e o caldeirão fervia … foi quando chegou o povo dos versos abraçando os poetas e fazendo quadras e sextilhas; os sem-ouvidos aplaudiam o pianista e dançavam um blues. Do circo próximo chegaram os malabaristas, o homem do trapézio e o palhaço, que não podia faltar. O domador de leão veio só. A equilibrista, bêbada, não pode vir. Os sem-alegria riam e brincavam e os sem-ninguém encontraram seus pares. E sobrava sopa. Ninguém queria dela saber, muito menos das pedras, que, ao final, apenas serviram para erguer um altar e comemorar a vida, à moda de cada um. De braços dados e saciados de tanto amor escancararam sorrisos e beberam goles de alegria e esperança até o dia clarear. A noite foi breve e as flores se abriram mais bonitas naquela manhã de sol. Do outro lado da rua, o dia permanecia escuro. Todos, com a consciência pesada pois não conheciam a leveza de consciência, comiam as melhores carnes e bebiam os vinhos das safras mais antigas. Eram tristes, não sabiam sorrir nem cantar. Como os ratos que rondavam os felpudos tapetes azuis e vermelhos do salão. Também tristes.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 14 de maio de 2019
Silêncio! Cessem todos os barulhos, zoadas e zumbidos e calem-se os homens. Todos. Mulheres: só para elas tenho ouvidos. Diante de tantas inconsequências provocadas pelos homens repletos de ignorância plena, refaço o caminho e declaro ao mundo o meu silêncio, que assim permanecerá, apenas para ouvir toda a sabedoria que vem da alma feminina, sábia e generosa. Calo, e calarei sempre para escutar a voz da mulher, melhor conselheira. Deixem-me ouvi-la, sempre. Ouvir e depois ouvir mais uma vez, e mais outras ouvirei. Para isso tenho meus dois ouvidos: para escutar as mais verdadeiras verdades. Deixo minha única boca apenas para o beijo. Além da reciprocidade do beijo, haverá de caber em mim, da mulher que amo, o abraço mais terno que farei por merecer. Ela sempre caberá no meu abraço. Quanto mais de perto, melhor poderei ouvir e aprender o que ela me ensina. Silêncio, por favor!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 07 de maio de 2019
Francisquim de Quixadá é seu nome, rabiscar versos no juízo e chamá-los de Poemas, seu ofício. Assim, ajuda a vulgarizar o título, a banalizar a expressão: hoje, todos são Poetas, todos se tratam por Poetas, como se Poetas fossem. Assim como Francisquim, que se diz Poeta, se acha Poeta e adora por esse título ser tratado. Faz uns versinhos, de quando em vez, utiliza rimas paupérrimas e é desobediente nos quesitos métrica e ritmo em seus poemas (se é que assim podemos chamá-los). Não apenas pés, mas versos de pés, mãos, pernas e braços quebrados. Versos ortopédicos, digamos. Tampouco podem seus pretensos versos ser classificados como modernos, tão banais que são. Francisquim, o de Quixadá, é tão Poeta quanto aquele seu xará, o de Baturité, igualmente pouco afeito às rimas e aos versos. Incautos insistem em chamá-los de Poeta e o de Quixadá, de peito cheio e ego lotado, diz, num autoelogio, ser o Poeta mais importante de sua rua. Ele não mente: Na rua em que mora só há uma casa, a sua. E ele mora só. Não tem concorrentes. Mas os dois Francisquins são gente boa. Apebnas n]ão merecem o título de Poeta. Salve Louro do Pajeú, Pinto do Monteiro, Patativa do Assaré, Manoel Bandeira, Manoel de Barros, João Cabral de Melo Neto, Carlos Penna Filho. E apenas para que não restem dúvidas e repetindo o que já disse em crônicas anteriores: me incluo entre os indevidamente chamados de Poeta. Não sou nem tenho a menor pretensão de sê-lo. Apenas escrevo, de quando em vez, letras de música popular. Sou, digamos, o Francisquim do Crato. Poeta é uma coisa muito maior. Coisa para gente da estatura de um Neruda, de um Fernando Pessoa, além daqueles antes citados. Viva quem é Poeta de verdade!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 30 de abril de 2019
No jardim descolorido vagava algo indefinido como que plainando a meio metro do chão. O vulto dessa imagem era o único indicador de que ela ainda estava por lá, sem destino, sem definição de sorte ou de futuro. Entre bromélias e orquídeas, também quase imóveis não fosse o vento, passava despercebida aos transeuntes, todos apressados e absortos com suas tarefas de viventes comuns. A rosa que em sua mão sangrava também era sem cor, como o sangue que não se avermelhou. Até as samambaias e espadas de São Jorge, outrora verdes, estavam empalidecidas. Tudo ali era pálido. Como a vida, como aquele vulto, como aquele jardim. Todos passavam e nada percebiam. Mas ali havia um vulto. Apenas um vulto. Sem vida. Faltava quem lhe desse cor.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 23 de abril de 2019
Da janela do quarto onde durmo avisto o meu pomar de tâmaras. Meus sonhos e devaneios do bem-querer, à sombra das tamareiras, ali também dormem e descansam à espera das alegrias que estão por vir, na terça que virá, ou na quarta, ou na quinta, ou sei lá quando, mas que virão de mãos dadas com o sol, quando a chuva passar, quando a areia do deserto se acalmar, quando não mais houver assustadores trovões estridentes e zoadentos nem relâmpagos de raios e cores diversas. Apenas chuvas finas e generosas. Quando acordarmos, o sol, eu, a esperança e toda a vida vão estar doce como as tâmaras do meu pomar. Será tempo de sorrir, de cantar e de levar aos amigos a alegria de ser feliz … A todos oferecerei o doce das tâmaras. Não sem antes saboreá-las, adoçando a alma na medida justa e certa da felicidade que está por vir.
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Xico com X, Bizerra com I sexta, 19 de abril de 2019
SUPREMA AMIZADE (POEMA DE XICO BIZERRA, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO
SUPREMA AMIZADE (Anta Crusoé)
O amigo do amigo do meu pai É mesmo que ser meu amigo Se mexer com o amigo do amigo de papai Repare, é o mesmo que mexer comigo Porque amigo é amigo, atentai: – Dinheiro não compra, nem passa recibo Por isso, quem não quiser perder a paz Cuidado quando for abrir o bico Que falar mal do amigo do amigo de papai É tal encoxar a morte por trás Ou meter o dedo no cu do perigo!
E quem disse que fui eu que escrevi? Eu nego, renego e desdigo. Eu só compartilhei. Eu juro por Deus, Nossa Senhora e tudo quanto é santo do céu e do inferno que nem conheço dona Anta Crusoé.
Xico com X, Bizerra com I terça, 16 de abril de 2019
Na encruzilhada de uma cidade grande todos os vícios que as grandes cidades têm marcam encontro no mesmo horário: stress, engarrafamento e uma neblina chata e incessante às 6 da tarde, sol já escondido. Na rua estreita, cruzamento com uma outra rua qualquer, destinos embaçados imiscuem-se num sinal vermelho. Entre os dois carros, lado a lado, além dos pingos da chuva miúda sentimentos parecidos, solidões semelhantes. Não fosse o verde do sinal, ali ficariam naquela esquina debulhando sonhos e vontades iguais, um a pastorear o outro e sendo pastoreado numa reciprocidade necessária, repleta de cumplicidade. As buzinas não permitem que o arrepio evolua para um carinho ou um mero aceno, um alô, uma troca de números, quem sabe? Obedientes à lei e sem ter como competir com a impaciência dos outros motoristas que faziam fila na rua estreita, fizeram a curva para lados opostos, os dois carros, as duas vidas, as duas solidões.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 09 de abril de 2019
O não-arrulhar dos mais gentis pombos e o ausente zunir de abelhas aflitas pelo excesso de mel levam para Bernardo o silêncio de um belo sino a não-badalar na mais antiga das igrejas do meu povoado. E o filho da filha de dona Dulce, no sigilo misterioso que se contém no bater de asas de uma nuvem colorida de borboletas, olha para mim, ainda sem saber falar, mas já balbuciando a palavra Amor, deixando escapar na ternura de seus olhos a canção de Paz por que tanto lutei. E depois, no calor de um grão de chuva, neblina pouca em uma manhã de sol, sinto na pele o amanhecer do dia ao preparar os meus melhores colos e abraços para recebê-lo, enquanto começam a surgir as notas da canção que pensei para ele criar e que o desassossego da vida só permitiu os primeiros acordes. Mariana dança. Sua mãe sorri. Bernardo agora dorme o sono do ano um, enternecendo minha tarde de domingo. Era 2014, outubro.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 02 de abril de 2019
Elas já não cuidam de nós e permitem as maiores atrocidades. Suas varinhas mágicas, escondidas sob suas roupas agora pretas, parecendo togas, não produzem mais efeitos. Os sapatinhos de cristal, quebraram-se todos nos degraus das escadas dos palácios suntuosos. Procurou-se, em vão, sapateiros para consertá-los, mas sapateiros já não há nas cercanias do reino encantado e os súditos, desesperançados, andam descalços, pisam pedras. Os guardas sumiram nas carruagens sem placas, bêbados e em alta velocidade: ao que parece, eles não estão interessados em moralizar o trânsito. Os que outrora se intitulavam príncipes mofam nas masmorras mais sombrias. Outros estão por ir fazer-lhes companhia. De nada adiantou procurar as fadas no calabouço, ao lado do pomar das melancias verde-rosa, onde imaginei estivessem escondidas: tinham todas saído para rebolar suas bundas num show de Anita. É triste saber dos desmandos todos, mas mais triste ainda é saber dos ladrões de tatuagens. Já faz pra mais de um ano que sumiram com as da princesa. Descobriram os ladrões. Falta descobrir quem mandou roubá-las. Eles podem quase tudo, mas não poderão roubar a coragem e o amor tatuados no coração dela.
(… Homenagem a MARIELLE, tão reverenciada por tantos, com justiça, e a menina BEATRIZ MOTA, assassinada no colégio de Petrolina, e que poucos lembram sequer o seu nome.)
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Xico com X, Bizerra com I terça, 26 de março de 2019
Janelas, mantenho-as sempre abertas. Escancaradas. Outras, abro-as apenas de quando em vez. Janelas de sóis, de sonhos e de pássatos nunca fazem mal, assim como as das ilusões, das boas ilusões e, principalmente, a janela do amor. Esta, nunca a fecho. Apenas a janela da dor, deixo-a fechada, sempre. Não quero com ela intimidades, tampouco descobrir o que se esconde atrás de suas frestas misteriosas e sombrias. É tudo escuro, sem luz, de uma negritude plena e profunda. Prefiro, então, pintá-la de uma amarelo claro que me agrade a vista e a alma, sempre que a avistar. Fechada, sem brechas.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 19 de março de 2019
A ladeira estava lá. Subiam e desciam, todos. A noite escura e os tantos pés espalhados na rua me impediam de ver serpentinas e confetes fartamente distribuidos pelo chão, cobrindo cada milímetro do paralelepípedo conivente e alcoviteiro. Ao lado dela, Princesa, este eu Plebeu, pouco me importaando com tanta gente ao redor. Era tempo de disseminar intimamente em meu coração fragmentos de amor que se juntariam para formar um painel imenso de felicidade, tudo com uma trilha musical de sopros tocando um frevo bonito de Nelson Ferreira. Ou um frevo canção de Capiba. E o carnaval não terminaria na quarta-feira. Ia prosseguir daí em diante até que o povo começasse a dizer que estava chegando o carnaval novo. No outro ano. Mas como? Ele nunca terminou. Apenas, a fantasia de Princesa deixara de ser apenas uma fantasia aos olhos de tão insignificante Plebeu.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 12 de março de 2019
No carnaval, o José esqueceu a verdade e fez muito bem. Escondeu num lugar bem secreto a chave que nenhuma porta abre e engoliu em seco a palavra doce que nunca pronuncia. Apenas sentou-se na esquina do mundo esperando a utopia. A vida de fantasia, embora fugaz, é bem menos doída, sabia José. Dói menos ver quase nada no bolso se há uma colombina a lhe alegrar o coração; é menos dolorida a barriga vazia se há uma esperança a azular-lhe a alma. Fez muito bem José em não ter ido para Minas em busca de sua lavra de ouro, de seu terno de vidro. Ficou por aqui, ladeiras e pontes a receber seus pés e suor porque a vida tem todo dia e aquela alegria só acontece três ou quatro dias por ano e vale a pena pensar que aquela é a verdade. Embora não seja. Aquilo tudo era festa, era carnaval, era folia. Isto, apenas a vida. A fantasia, para José, sempre foi muito melhor que a realidade. Assim era feliz José, por três ou quatro dias. Evoé!
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Xico com X, Bizerra com I terça, 05 de março de 2019
Minha folia é um confete apenas, de qualquer cor, e um pedacinho pequeno de serpentina, desde que acompanhados de um frevo de Nelson Ferreira. Nem preciso de Felinto, Pedro Salgado, Guilherme ou Fenelon para que minha alma entre no passo e o meu coração bata num compasso binário acelerado, alegria nos pés, sorriso largo. Vim do Crato dos Anicetos para conhecer o som de Capiba, de Carlos Fernando, de Romero Amorim e de tantos outros Mestres, com seus bandolins e metais. Vim, encantei-me, fiquei e nunca mais o Frevo saiu de mim. Tal qual o Capibaribe, atravessando tantas pontes, a festa atravessa todas as fronteiras de minha emoção e estaciona, feliz e brincante, no pátio colorido do meu coração, na varanda de minha alma onde balança alegre uma rede com as cores de Pernambuco. Evoé!
Xico com X, Bizerra com I terça, 26 de fevereiro de 2019
Logo, logo, a tarde já colorida vai se embonitar ainda mais para entregar-se à noite com todo o amor que o arrebol proporciona. Os cantos da Igreja próxima, de repente silenciam e se transformam no encanto dos sinos a badalar para que as janelas se abram e deixem entrar a branda brisa da Ave-Maria. Hora de descanso das sacolas que o homem velho carrega pendurados às costas: suas mãos se postam rezando por um dia de luz diante da escuridão solitária que acompanha aquele alforje de interior repleto de vazios. Árvores tagarelas balbuciam sons incompreensíveis enquanto suas folhas continuam a conversar com o vento, prenunciando o cair d’água que está por vir. As crianças-chuva se protegem no alpendre da casa em que seus pais brincam de se abençoar com a luz do amor. Cai a noite.
Xico com X, Bizerra com I terça, 19 de fevereiro de 2019
TEATRO FEDERAL Apresenta NUMA CIDADE SEM ESQUINAS UMA TRAGICOMÉDIA EM TRÊS obscenos ATOS
* * *
Na sala de estar, avó e neto em frente à TV, acompanham a eleição para Presidente do Senado, de baixíssima reputação: Os Cleros, ‘Alto’ e ‘Baixo’, se engalfinham numa elegante e respeitosa troca de amabilidades:
– Conceda-me um aparte. V Excia é um Ladrão!
– Não lhe concedo o aparte. Ladrão é V Excia!
– Com todo o respeito, V Excia é um Canalha!
– Canalha é V Excia!
Propõe a Avó:
– Menino, melhor desligar essa TV. A discussão é inócua. As duas excelências estão com a razão.
* * *
Num canto da tela, os outros engravatados sem prestar atenção aos impropérios, conversam e riem entre si.
– O homem está falando e ninguém presta atenção, vovó. Riem deles, dos brigões?
– Não, meu querido. Riem de nós.
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Enojados, avó e neto desligam a TV, dão-se as mãos e vão até a banca de jornais mais próxima e compram uma revistinha de putaria explícita. Quase tanto quanto.
* * *
CAI O PANO. RAPIDAMENTE.
Xico com X, Bizerra com I terça, 12 de fevereiro de 2019
Configurei meu coração mas perdi a senha. Não mais posso acessá-lo tampouco me conectar com o mundo à minha volta. Tentei plugar o meu amor, em vão. Sem senha nada é possível. Impossibilitado de navegar na rede, procurei, no Google, reencontrar o mundo, mas, mais uma vez, tentativa inútil. ‘Sem senha, é impossível’, disse-me abusado e em letras garrafais o Note Book. E o mundo lá fora, brilhando, informando tudo sobre tudo e eu aqui, sem senha, sem saber o que se passa. Eu querendo falar on-line e dizer da minha vontade de viver, mas, apenas porque sou esquecido e esqueci a senha, sem poder fazê-lo. Tem nada não, vou me vingar quando lembrar da danada da senha: vou mandar um Zap para meus amigos todos desejando Paz e, on-line, pelo Instagran, sorrir para mostrar que ainda é possível ser feliz. E quando um dia conseguir, dançando um xote no site da felicidade, conversar via Facebook com os que quero bem, vou jogar na lixeira todos os arquivos de tristeza e dor. E aí prometo nunca mais esquecer a danada da senha.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 05 de fevereiro de 2019
No espaço entre o céu e o chão, bem mais próximos do chão que do céu, os fios da ganância e da concorrência entre operadoras de celular dançam a dança da algaravia, sobrepostos entre si, pendurados aos postes, alguns quase tocando o espaço em que o povo tenta andar. Barulhos e zumbidos de ambulantes que não ambulam, aboletados em suas barracas, impedem o fluxo normal de quem por ali passa, tumultuando o que deveria ser uma calçada para pedestres. Restos de comida e esgotos mal acondicionados infestam o ar de uma falta de cheiro digna dos mais infectados mercados das piores cidades do mundo. Carros e ônibus brigam por pedaços pequenos de ruas e avenidas e o ar, de tão poluído, é cinzento, a olho nu. Fumaça e óleo queimado, seus ingredientes O velhinho que pede esmola confunde sua voz de pedido com a estratégia de marketing do camelô querendo vender suas capas para celular. Onde estamos? Para onde vamos? Quando teremos uma Boa Vista passeando por aquela avenida?
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Xico com X, Bizerra com I terça, 29 de janeiro de 2019
No meio do tempo, sol pleno, vento abundante. Ali estavam o menino, sua pipa e o vento alcoviteiro. No mesmo instante em que o menino dá linha a sua ave de papel colorido, ela vai se aproximando dos seus irmãos anjos que perambulam pelo céu e se encantam com o balouçar da pipa brincante. Se desaproximam da terra quente. É a dança alegre de um pedaço de papel, untado com cola de grude e amparado por talas de coqueiro em forma de cruz, que lhe dão sustentação para brigar contra a força do vento que a carrega para o alto. Na extremidade final daquele papel volante e acrobático, a rabiola, provedora do equilíbrio, ‘evitadeira’ das guinadas indesejáveis da pipa. Naquele instante, inexiste qualquer preconceito, todos são iguais. Não importa os pés descalços e o sorriso banguelo de quem tem o domínio sobre o objeto voador: aquele menino tem pleno e profundo conhecimento sobre seu brinquedo e dele faz o que bem quer, tendo o vento como cúmplice e amigo. Ali, se acabam as diferenças e tudo passa a ser igual, como igual é a luminosidade do sol para todos, pretos, brancos, meninos, meninas, ricos e pobres. A pipa é igual para todos que a veem.
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Xico com X, Bizerra com I terça, 22 de janeiro de 2019
Pouco, ou quase nunca, me atrevo a escrever sobre futebol por não dispor de dois atributos essenciais para poder incluir o tema em meus escritos: primeiro, o talento de um Nélson Rodrigues, que tão bem e como ninguém tratou o assunto, inibindo a todos a abordagem do tema. Tudo que se escrever sobre nosso esporte parecerá incompleto se comparado ao que escreveu o dramaturgo Nélson. Segundo, a comparação do futebol de hoje com o de antes, hoje muito diferente do daquela época, em que interesses financeiros não se sobrepunham à beleza do esporte, ao romantismo da bola rolando por entre pés mágicos e mãos defensoras de gols quase feitos. Tempo em que não se beijava descaradamente o escudo do time eventualmente ‘defendido’ pelos atletas atuais. Bem diferente dos craques (a estes podemos chamar de craques) de ontem, que, apesar de não beijarem levianamente os escudos dos seus times, o defendiam de verdade, com amor. Um Garrincha, um Nilton Santos, um Castilho, para não falar de Pelé, defenderam seus times por anos e anos, quando o futebol era apenas um esporte, longe de ser um negócio. Tempos em que uma cantora famosa se apaixonava por um jogador pobre. Tempos em que o golkeeper batia roupa e o centrefor, na banheira, reclamava do juiz da marcação do offside. Pela falta de um drible emocionante de Garrincha, de uma defesa arrojada de Carlos Castilho e levando em conta a inexistência atual de equivalentes jogadores, prefiro estragar minhas letras com o amor, o afeto e a saudade. Por isso que hoje, não obstante eventualmente vista uma camisa vermelha e preta com um leão desenhado no peito, sob o ouro e a prata de algumas estrelas conquistadas, acho mais fácil falar das arquibancadas e refletores da lua, das traves e entraves do amor, das embaixadas e dribles das estrelas, dos lagos e jardins de nuvens preguiçosas e dos golaços dos arco-íris coloridos … Futebol é assunto difícil demais para mim. É coisa para o Nélson.
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