Que bela e poética a casa de um amigo meu, de portas amarelas e jardim florido, onde bate o sol mas não se deixa faltar chuva. A casa que ele sonhou. Tão diferente da casa que certo dia descobri ser a casa que não sonhei, de apenas uma porta para entrar e uma janela permanentemente fechada, por onde não passava uma fresta sequer de luz. Nem passarinhos. Serenatas, não as ouvia. Não existiam músicos nem instrumentos. Apenas poeira sobre um chão silencioso. No jardim, covas não fecundadas, semipreenchidas por areias cujos grãos já se tornavam pretos e nenhum jardineiro ou gota d’água para deles cuidar. Paredes nuas, sem quadros a adornar-lhes, fazendo companhia à janela de que falei, sempre fechada. Respirava-se solidão na casa que não sonhei. Nenhum amor ali podia ter vida. Não havia ar. Não havia amor. Nada fazia questão de existir no tempo daquela casa. Nem relógio havia para marcar a tristeza das horas. Só uma cadeira de balanço que não mais balançava por falta do impulso de alguém. Pelo menos não se ouvia o seu ranger ao balançar. Menos mal que nunca sonhei com esta casa. Melhor sonhar com a casa dos sonhos do meu amigo, próxima dos bons botecos e das boas prosas com amigos, onde não há polícia nem Lei Seca, por desnecessário ser. Uma casa sem cercas, muros ou vigias, com todas as gaiolas de portas abertas, em que se possa esperar o nada-fazer o tempo que necessário for conversando com as borboletas e acariciando as pedras que servem de pouso para passarinhos coloridos e cantantes.
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