Almanaque Raimundo Floriano
Fundado em 24.09.2016
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, dois genros e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Caindo na Gandaia terça, 30 de julho de 2024

MODERNIDADE NA CASA DO TIO TRUTO
MODERNIDADE NA CASA NOVA DO TIO TRUTO

Raimundo Floriano

 

 

 Sentina modernosa

 

                        Aconteceu no ano de 1956. A notícia explodiu em Floriano como bomba atômica, de efeito avassalador:

 

                        – A casa nova que Seu Truto – meu tio – acabou de construir em Teresina tem uma sentina dentro dela!

 

                        Naquele tempo, ainda não existia apartamento no Piauí, e todas as residências tinham no quintal uma casinha ou um cercado de madeira ou de talos de buriti, a dita sentina, na qual os moradores satisfaziam suas necessidades mais urgentes e inadiáveis.

 

 

 

                        Sob a administração da Tia Loura, mulher do Tio Truto, e com financiamento da Caixa Econômica Federal, que exigiu planta assinada por arquiteto ou engenheiro, a casa fora apetrechada de instalações sanitárias condizentes com o progresso que começava a chegar nas terras piauienses.

 

                        Tia Marinaura, irmã de papai e do Tio Truto – solteirona, que não tolerava ser chamada de tia –, alta funcionária dos Correios e Telégrafos em Floriano, esteio dos irmãos, que ajudara quase todos os sobrinhos nos estudos e na formação – inclusive eu –, convocou uma reunião familiar para debater o assunto, motivo de censura para todos os parentes, em particular, e para o povo da cidade, em geral. Ficou deliberado que o Comandante João Bínaco – Tio João Binho –, o caçula, em suas viagens pelo Rio Parnaíba com o Motor João Ferrão, ao dar a passadinha de sempre na casa do Tio Truto, de quem era afilhado, para tomar-lhe a bênção, averiguasse o boato e, na volta, fizesse um relatório circunstanciado, confirmando ou desmentindo tamanho disparate.

 

                        Com o retorno do Tio João Binho, Tia Marinaura convocou nova reunião, sob sua presidência, para ouvir a explanação do Comandante, da qual participaram os seguintes membros: Tia Juliana, Tia Olivinha, Tia Onedina e Pedro Barbalho, seu filho, além do Relator. Este iniciou sua exposição narrando o que testemunhara in loco, ou seja, confirmando tudo e causando verdadeiro espanto em todos os presentes, que externaram suas dúvidas: como ficaria a convivência com o odor natural de qualquer sentina?; qual seria a reação dos demais moradores se um incontido flato de maior sonoridade escapulisse daquela dependência?; como seria feita a limpeza após o uso, vez que nos quintais florianenses a faxina ficava a cargo das galinhas e dos porcos, para isso criados à solta?; usava-se o costumeiro sabugo para a limpeza corporal?

 

                        O Relator nada esclareceu, alegando que apenas averiguara o fato, mas não tivera a coragem de aliviar-se “naquilo”. Um dos presentes indagou se tal dependência também seria usada para as pessoas se banharem. A resposta positiva do Relator só fez mesmo foi aumentar o escândalo e a perplexidade que afligiam todo o clã.

 

                        Diante da cruel realidade, Tia Marinaura, não contendo sua irreprimível indignação, deu por finda a assembleia, dissolvendo-a com esta exclamação:

 

                        – Isso só pode ser invenção da Loura, pois o Truto não seria capaz de fazer tamanha besteira!

 

(Episódio narrado por um dos filhos do Relator, o primo Mairton, que, escondido atrás duma porta, a tudo testemunhou.)

 

 


Caindo na Gandaia sábado, 01 de julho de 2017

OUTROS LIVROS DE RAIMUNDO FLORIANO


Caindo na Gandaia sexta, 30 de junho de 2017

XERIFANDO NO CARDINALATO

 

XERIFANDO NO CARDINALATO

Raimundo Floriano

 

 O Cardeal-Xerife 

                        Esta matéria é a Número 1 em meus arquivos de Consultas. Espero que seja a primeira de uma infinita série, narrando ocorrências aqui resolvidas, à proporção em que os fiéis desta jurisdição de mim se valham, em busca de proteção e aconselhamento. Como só escrevo sobre flagrantes da vida real, não sei quando a Número 2 da série estará no ar à disposição de meus leitores.

 

                        Não vou fazer como o poeta, jornalista e compositor pernambucano Antônio Maria, autor, dentre vários sucessos, do samba-canção Ninguém Me Ama, em parceria com Fernando Lobo e magistral interpretação de Nora Ney, em 1952, e Frevo Número Um do Recife, inesquecível gravação do Trio de Ouro, em 1951. Maria, dentro de sua maravilhosa e inexcedível criatividade, forjava cartas no jornal Última Hora, na página O Jornal de Antônio Maria, que ele mesmo respondia. Um exemplo. LEITOR: Senhor Antônio Maria, descobri hoje que minha noiva só tem três dedos na mão esquerda. Devo casar-me com ela, ou não? RESPOSTA: Meu jovem, se ela tiver sete dedos na mão direita, não há problema. Contanto que a soma dos dedos das duas mãos de sua amada totalize 10, nada impede que se casem e sejam muito felizes!

 

                        Eu admirava esse cara! Me amarrava nele! Pena que tenha morrido em 1964, aos 43 anos, no auge de sua criatividade.

 

                        Mas vamos aos fatos! Eis que me chega mensagem de colega aposentada, solteira, 65 anos, residente em Águas Claras, cidade satélite de Brasília, no seguinte teor:

 

Meu Piedosíssimo Cardeal, Justiceiríssimo Xerife e Abalizadíssimo Guru,

Desejo tudo o de melhor para sua sapientíssima pessoa neste ano de 2011, que ora se inicia. Meu Precioso Amigo, estou necessitando de seu conhecimento profundo da Língua Portuguesa, pelo motivo que passo a explicar. O Síndico do Bloco onde moro, aqui em Águas Claras, é muito omisso com relação às melhorias coletivas. Está no cargo por falta de opção nossa por um melhor. Outro dia, fui grosseiramente humilhada por certa moradora, que tem um cão que late dia e noite, incomodando-me terrivelmente. Esse cão fica sozinho o dia todo, não bebe a água que lhe deixam, porque ela deve estar quente, e comida, sabe-se lá... Enfim, um cão triste e estressado porque vive num cercado pequeno. Certamente por isso, o desabafo através de latidos e uivos insistentes. Reclamei com o tal Síndico que, ao invés de aplicar o que está na Convenção do Bloco sobre esse assunto, insuflou a moradora contra mim. Tive de ouvir, no hall do meu apartamento, grosserias e humilhações da dona do cão, tais como: ‘velha, louca, esclerosada, precisa de tratamento, tem que ir para um hospício’, e outras sugestões do mesmo nível, tudo isso aos berros. Liguei para o Síndico, no meu celular, para que ele ouvisse os desaforos. Mas ele se fez de surdo e me disse que não estava ouvindo nada. Insegura, até com medo da violência física da mulher, que estava muito alterada, e acompanhada por dois filhos adolescentes parrudões, e eu sozinha em casa, precipitei-me, chamei o Síndico de CÍNICO, fazendo um trocadilho, e a coisa ficou foi séria. O Síndico entrou no Juizado de Pequenas Causas contra mim, com uma Ação por ‘danos morais’, e está pedindo uma indenização de R$15.000,00. Desculpe-me incomodá-lo por isso, mas, mentalizando formas de defesa e postura que devo adotar, me lembrei de sua eruditíssima pessoa e dos seus conhecimentos da Língua Portuguesa, e de sua experiência como Cardeal, Xerife e Guru.

Por favor, ajude-me! Como posso me defender? (a) Águas-clarense Agoniada.”

 

Foi o suplicado!

 

 

 

Minha resposta:

 

                        Estimada Atribuladíssima Ovelha de Meu Rebanho,

 

                        Amiga Querida,

 

                        Calma! Como já disse Millôr Fernandes, sempre se pode provar o contrário!

 

                        Você vai eternamente encontrar malquerença em algumas vizinhas onde quer que more. É bonita, morena, boazuda, malhada, popozuda, gostosona, perfumosa, independente, culta, etc. etc. e tal. Mesmo que você não queira, mesmo que esconda, ao máximo, estas são características inerentes a sua pessoa. E, mais ainda: é mulher livre, desimpedida, disponível, dona do seu nariz, e com muito dinheiro pra gastar! Podendo, exatamente por isso, conquistar o homem que quiser! O que só deve mesmo é despertar em suas vizinhas frustradas um forte sentimento: INVEJA! Mendigos de minha terra natal, ao abençoar-nos por uma esmola recebida, costumavam dizer-nos: “Deus te livre do mau vizinho!”.

 

                        No Juizado de Pequenas Causas, você pode começar fazendo o que todo o político fez ontem, faz hoje e fará sempre para, com infalível sucesso, safar-se, e na maior cara-de-pau: NEGAR!

 

                        Caso queira sustentar o termo supostamente ofensivo, apresente-se como mulher culta que é, com curso superior, que fala e escreve bem, conhecedora do Vocabulário Pátrio, no que estará sendo verdadeira.

 

                        Pode alegar que usou o termo CÍNICO filosoficamente, baseada nos filósofos Antístenes de Atenas e Diógenes de Sínope, fundadores da Escola Cínica, que pregavam a volta à vida em estrita conformidade com a natureza (daí o Síndico admitir a convivência com cachorros uivadores), opondo-se aos usos e às regras sociais vigentes (daí o Síndico admitir a vizinha transgredir as normas da Convenção do prédio, com respeito a animais domésticos).

 

                        O Grande Dicionário Melhoramentos define cínico como próprio do cão, canino. Adotando esta linha de defesa, você poderia alegar que usou termo CÍNICO com a conotação de pessoa que dava mais valor aos cachorros que ao ser humano.

 

                        O Aurélio define filocínico como “quem gosta de cães, amigo de cães”. Neste caso, sustente o que disse, mas alegue que o Síndico ouvira mal, pois o que você falara foi FILOCÍNICO, ou seja, amigo dos cachorros!

 

                        Se o Síndico não conseguira ouvir os impropérios da vizinha aos berros, ao celular, como poderia ter ouvido nitidamente a palavra filocínico, desconhecida para a maioria das pessoas, tão esdrúxula, tão proparoxítona? Alegue que o Síndico, ouvindo apenas o final da palavra, compreendeu-a erroneamente, incorrendo, assim, em grave erro.

 

                        E entre também com uma Ação contra o Síndico e o a Vizinha Cachorreira, pelos danos morais que lhe estão causando!

 

Asinus asinum fricat!

 

É o que tinha a lhe aconselhar!

 

Beijo-lhe o rosto em Cardinalíssima Bênção!

 


Caindo na Gandaia quinta, 29 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 20 - UROLOGIA

VERSOS SACÂNICOS

20 - UROLOGIA

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Jovenzinho modernista

Procura o urologista

Querendo se receitar:

– Ajude-me, seu doutor

Eu estou com muita dor

No meu órgão de trans@r!

 

O doutor, com polidez

Não querendo entrar de vez

Não querendo entrar de sola

Pergunta pro rapazinho:

– A dor é no passarinho?

– Não, doutor, é na gaiola!

 


Caindo na Gandaia quarta, 28 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 19 - PATURANDO COM A PILHINHA

VERSOS SACÂNICOS

19 - PATURANDO COM A PILHINHA

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Pagundes enumerava

As benesses que ganhava

De Prancisca, sua pilha;

Pusca zerado, pazenda

No banco, segura renda

Pora casa numa ilha

 

E quando alguém indagava

Onde a pilha trabalhava

Palava: – Não se incomode

Nem me venha com puxico

Se ela me pez picar rico

O segredo é que ela pode!

 


Caindo na Gandaia terça, 27 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 18 - PAQUERA

VERSOS SACÂNICOS

18 - PAQUERA

Raimundo Floriano

 

 

  

Eu, ensinando um artista

Pra ser feliz na conquista

Do amor duma donzela:

– Pegue um espinho linheiro

E enterre no cajueiro

Que tem lá na porta dela!

 

O garoto apaixonado

Declara desanimado:

– Lá não tem pé de caju!

Então eu, com sapiência

Revelo outra ciência:

– Soque espinho no c*!

 


Caindo na Gandaia segunda, 26 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 17 - O VELHO TARADO

VERSOS SACÂNICOS

17 - O VELHO TARADO

Raimundo Floriano

 

  

 

O senil Zeca Morais

Pra fazer seus bacanais

De motéis é usuário

Com garotas malhadinhas,

Safadas, traquejadinhas

Tudo às custas do Erário

 

Ao perguntarem sem medo

Se Viagra era o segredo

Respondeu com frenesi:

– Viagra a peso de ouro?

Eu tomo pra dar no couro

Chá de pic@ de quati!

 


Caindo na Gandaia domingo, 25 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 16 - O SUSTO

VERSOS SACÂNICOS

16 - O SUSTO

Raimundo Floriano

 

 

 

Avião na turbulência

Quicando com violência

O povo todo a gritar

Mas, depois da tempestade

Um mar de tranquilidade

Veio a bordo se instalar

 

Trancoso, cabra inzoneiro

Falou para um passageiro:

– Eu de tanto levar soco

Fiquei todo apavorado

O fiofó tão arrochado

Que ali não passava um coco!

 


Caindo na Gandaia sábado, 24 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 15 - O ESPANTO

VERSOS SACÂNICOS

15 - O ESPANTO

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Pedroca, esperto menino

Astuto, vivo, ladino

Inteligente e sagaz

Vendo um dia a empregada

Fazer xixi descuidada

Pensou assim: – Marrapaz!

 

Assuntando bem direito

Cada qual tem o seu jeito

Na hora da mijação

Eu faço c’um canudinho,

Minha irmã faz c’um cofrinho

E a Xica c’um escovão!

 


Caindo na Gandaia sexta, 23 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 14 - O APELIDO

VERSOS SACÂNICOS

14 - O APELIDO

Raimundo Floriano

 

  

 

No sertão do meu Estado

Nasci e fui registrado

Pelo nome de Manduca

Mas por ter um cabeção

O povo de gozação

Me chamava de Seu Cuca

 

O tempo foi-se passando

O apelido pegando

E veja o que aconteceu

Quando alguém me perguntava

Meu nome, eu nem vacilava

Dizia: – Seu Cuca é eu! 


Caindo na Gandaia quinta, 22 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 13 - HEREDITARIEDADE

VERSOS SACÂNICOS

13 - HEREDITARIEDADE

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Seu Vicente, que foi Cabo

Domador de burro brabo

Falava seus predicados:

– Na vida, trabalhei tanto

Que os filhos, pra meu espanto,

Nasceram todos cansados!

 

Virgilina rebateu:

– Pois diferente fiz eu

Na cama, travei as lutas.

Dia e noite eu d@v@ tanto

Que as filhas, pra desencanto

Já nasceram todas put@s!


Caindo na Gandaia quarta, 21 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 12 - HABILITAÇÃO

VERSOS SACÂNICOS

12 - HABILITAÇÃO

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Mulher casada e gostosa

Porém um tanto nervosa

Depois de muito treinar

Em agendada manhã

Comparece ao Detran

Para a carteira tirar

 

E o marido, coitado

Por demais preocupado

Com os exames de lei

Pergunta-lhe ao retornar:

– Como é, deu pra passar?

E ela responde: – Dei!


Caindo na Gandaia terça, 20 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 11 - GENÉTICA

VERSOS SACÂNICOS

11 - GENÉTICA

Raimundo Floriano 

 

  

Nossa amiga Ana Triskina

Rainha em qualquer piscina

Tem beleza e formosura

Ela e suas quatro irmãs

Conquistam milhões de fãs

Na lindalvez e doçura

 

O pai dessas cinco filhas

Por gerar tais maravilhas

Gente em forma de tesouro

No sertão é conhecido

Pelo nome merecido:

Seu Zé, o Pic@ de Ouro!


Caindo na Gandaia segunda, 19 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 10 - FUMACÊ

VERSOS SACÂNICOS

10 - FUMACÊ

Raimundo Floriano

 

 

 

Não conheço um só fumante

Que mantenha a todo instante

Perto de si um cinzeiro

Tem deles que até em casa

Usa para apagar a brasa

Pires, prato e galheteiro

 

Vendo o tipo que fumando

As cinzas no chão jogando

E o cinzeiro ali de borco

Ninguém mais nem especula

Sobre o óbvio que ulula

Que todo fumante é porco

 


Caindo na Gandaia domingo, 18 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 09 - EDUCAÇÃO DE BERÇO

VERSOS SACÂNICO

09 - EDUCAÇÃO DE BERÇO

Raimundo Floriano

 

 

  

Dizia Seu Zé Neném:

– Minhas filhas criei bem

As seis eu soube educar

Não precisei nem do relho

Sendo a mãe um bom espelho

Tiveram pra quem puxar

 

Embora todas casadas

Com mansões localizadas

Em áreas nobres do Entorno

Com genros não tive sorte

Parece até praga forte

Não escapa um: tudo corno!

 


Caindo na Gandaia sábado, 17 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 08 - CONFISSÃO

VERSOS SACÂNICOS

08 - CONFISSÃO

Raimundo Floriano

 

 

 

Soldados se confessando

Ao Capelão revelando

Terem um pecado só:

– Seu Padre, dê-me a benção

E a sua absolvição

Porque eu comi jiló!

 

Já no último soldado

Pergunta o padre encucado:

– Foi jiló que ocê comeu?

O cabra aí leva a breca:

– Não foi nadica de neca

Porque o Jiló sou eu!

 

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Caindo na Gandaia sexta, 16 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 07 - COINCIDÊNCIA

VERSOS SACÂNICOS

07 - COINCIDÊNCIA

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Gurizinho viu a tia

Quando do banho saía

Pelada e mostrando tudo

Disse ela: – eu tropecei

Num machado e me cortei

Neste ponto cabeludo!

 

O menino olhou pra tia

E com muita ironia

Falou: – Conte outra lorota!

Como foi que esse machado

Tava tão bem apontado

Que pegou bem na xoxot@?

 


Caindo na Gandaia quinta, 15 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 06 - CANTANDO NA CHUVA

VERSOS SACÂNICOS

06 - CANTANDO NA CHUVA

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Bonitão segue ao volante

De seu Tucson possante

Num tremendo vendaval

Eis que jovem gostosona

Lhe acena e pede carona

Pra fugir do temporal

 

Bonitão vai de mansinho

Bolando logo um jeitinho

Pra conquistar seu amor

Usa do velho macete

Fala assim: – Chuva cacete!

E ela: – Chupo, sim senhor!

 


Caindo na Gandaia quarta, 14 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 05 - ASTRONOMIA

VERSOS SACÂNICOS

05 - ASTRONOMIA

Raimundo Floriano

 

 

 

Beraldão disse a um amigo:

– Rapaz, eu nunca consigo

De dia enxergar estrelas!

O outro disse: – Menino,

Fica de quatro e eu te ensino

Um jeito fácil de vê-las!

 

Beraldão quatrificou-se

O amigo aproveitou-se

E arriou as calças dele

Agarrou-o pela cinta

Gritou assim: – Lá vai tinta!

E cravou o ferro nele


Caindo na Gandaia terça, 13 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 04 - ARARIPE NO SAMBA

VERSOS SACÂNICOS

04 - ARARIPE NO SAMBA

Raimundo Floriano

 

  

Em festa do interior

Araripe era um terror

No samba e na batucada

Todo matuto sabia

De sua grande mania:

Dançar com mulher casada.

 

E o pobre do marido

Com medo do enxerido

Do chifre sentindo o faro

Pedia pro sedutor:

– Araripe, por favor

Dance aqui mais no quilaro!

 

(Nota: quilaro = claro, claridade, na linguagem matuta)


Caindo na Gandaia segunda, 12 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 03 - AO PÉ DA LETRA

VERSOS SACÂNICOS

03 - AO PÉ DA LETRA

Raimundo Floriano

 

 

 

 

Recém-casada, Bebel

Chegando à lua de mel

Com Lilico, o maridão

Ficou pasma de surpresa

Quando viu a verg@ tes@

Do amor em plena ereção

 

E olhando pra chib@t@

Suplicou-lhe assim – Me mata

Com essa coisa de mijar!

Ouvindo isso, Lilico

Pegou no chão o penico

E deu nela até matar

 

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Caindo na Gandaia domingo, 11 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 02 - AFRODISÍACO SERTANEJO

VERSOS SACÂNICOS

02 - AFRODISÍACO SERTANEJO

Raimundo Floriano

 

 

 

O Cego João Mandioca

Adentra numa biboca

Com o Fogoió de guia.

No teto, dependurado

Um bacalhau importado

Pra chamar a freguesia

 

O cego ergue o nariz

Cafunga com gosto e diz:

– Por aqui nada me falta

Eita cheiro tesudante

Nesta terra de gigante

Que porr@ de mulher alta!


Caindo na Gandaia sábado, 10 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 01 - A FOME

VERSO SACÂNICOS

 01 - A FOME

Raimundo Floriano

 

 

 

Descobriu a Medicina

Que reduzindo a grelina

Tira a fome e emagrece

Isso é boa novidade

Para o mal da obesidade

De que tanto se padece

 

Meu amigo Zé Cidreira

Diz que sua companheira

Agora virou um gelo

Depois que foi medicada

Co’a nova droga inventada

Perdeu a fome no gr*lo


Caindo na Gandaia terça, 06 de junho de 2017

VERSOS SACÂNICOS - 00 - A INSPIRAÇÃO

VERSOS SACÂNICOS

00 - A INSPIRAÇÃO

Raimundo Floriano

 

 

(Antologia das sextilhas ditadas do além, eletronicamente, pelo falecido menestrel Cego João Mandioca, esmoleiro itinerante, trovador fescenino, cordelista e improvisador, psicografadas pelo Receptor Chico Fogoió, em sua bola de cristal performática, e revisadas pelo Diascevasta Mundico Trazendowski, espécie de paródia aos Versos Satânicos dum poeta inglês)

 

O Cego João Mandioca

Do Encantamento invoca

Um sacana, vejam só

Com a verve fescenina

Transcrita com tinta fina

Pelo Chico Fogoió

 

E o Menestrel do Nordeste

Em meio a cabras da peste

E cordelistas fubânicos

Com inocentes piadas

Provoca muitas risadas

Nestes seus versos sacânicos

 


Caindo na Gandaia terça, 30 de maio de 2017

VELHO SOFRE...

VELHO SOFRE...

Raimundo Floriano

(Escrito no ano de 2016)

 

O símbolo de nós

 

                        Calma no Brasil! Não vou ficar aqui choramingando, queixando-me da vida. Agradeço a Deus por ter-me dado a graça de, entrado na octogenariedade, ora estar neste micro escrevendo livros, narrando episódios, divulgando a MPB, orientando jovens músicos, enfim, não deixando passar em branco o tempo que Ele está me concedendo.

 

                        Apenas quero deixar registradas para vocês algumas situações, por vezes até constrangedoras, das quais tenho sido partícipe nesta minha teimosia de continuar a existir.

 

                        Todo cabra acima dos 75 acha que sou mais velho do que ele. E é um tal de “senhor”, “Seu Raimundo”, “cuidado”, “deixe, que eu carrego”. Tem deles que até me cedem a cadeira onde estão sentados, fazendo-se de mais jovens. Já as mulheres, não! Essas sempre me dão! Me dão a exata idade que eu realmente tenho! Se bem que algumas se fazem de espertinhas, para aplicarem o golpe do joão-sem-braço. E foi o que aconteceu certo dia num supermercado.

 

                        Estava eu na fila especial, sinalizada com a placa acima, quando chega uma garota nova e esbelta, que se postou bem à minha frente. Não me contive e a ela me dirigi:

 

                        – Perguntar ofende?

                        – Depende, por quê?

                        – Por que foi que a senhora furou a fila, me passando pra trás?

                        – Porque eu estou gestante!

                        – Mas gravidez não é doença. Aliás, é até sinal de saúde. Não querendo ofendê-la, a senhora não tem barriga de grávida não.

                        Aí, ela abriu a bolsa, tirou um papel e quase o esfregou em minha cara:

                        – Pois fique o senhor sabendo, que estou grávida mesmo! No duro!  Aqui está o resultado do exame! E agora, posso passar na frente?

               No ato, levantei minha camisa e mostrei-lhe meu tórax cortado, desde a cruz dos peitos até o pé do embigo, todo costurado, esparadrapado e mercurocromado, devido a recentes pontes cardíacas que recebera:

                        – E agora, a senhora poderia passar pra trás?

 

                        Tem umas que se fazem de desentendidas, para nos deixarem muito em apuros ou gozarem com a cara da gente. Como ocorreu na semana passada, quando fui comprar um pacote de fraldas para o chá de bebê do meu professor de malhação. Cheguei à farmácia e dirigi-me a uma jovem balconista:

 

                        – Perguntar ofende?

                        – De jeito algum!

                        – Aqui tem fralda pra vender?

                        – Tem sim, senhor! E muita!

                        – Pois me traga um pacote tamanho M!

 

                        A moça sumiu. Logo depois, apareceu-me com um pacote de quase meio metro de largura. Surpreendi-me com o que vi e perguntei:

 

                        – O que é isso?

 

                        Ela me respondeu falando baixo. Como escuto pouco, pareceu-me ter ouvido “calma, viado”, por isso usei do meu recurso para que as pessoas falem alto comigo: perguntei quase gritando:

 

                        – O QUÊ?

 

                        E ela:

 

                        – FRALDA GERIÁTRICA! PRA VELHO! É PRO SENHOR? O SENHOR NÃO É VELHO?

 

                        – Desculpe-me, expressei-me mal. As fraldas que eu quero são para uma criança que ainda vai nascer!

 

                        Resolvido!

 

                        Parentes e pessoas amigas questionam-me, até com reprimendas, pelo fato de que eu não usava aparelho auditivo. Minha justificativa é uma só: ninguém conversa com velho. Com os jovens, consigo comunicar-me através dessa admirável ferramenta que é a Internet. Tenho quase 1.000 amigos no finado Orkut, substituído pelo Facebook, a maioria na faixa etária entre 15 e 30 anos. E como eles me “ouvem”, me leem, me acatam! Mas, pessoalmente, jovens só se dirigem a velho para perguntarem as horas, algum endereço e até fazerem graça junto aos comparsas. Como agora verão vocês.

 

                     Devido a padecer de severa artrose na região sacroilíaca esquerda, minha perna daquele lado é um centímetro e meio menor que a direita. Isso me faz manquejar um pouco, de forma quase imperceptível, em discreto gingado para equilibrar a marcha.

 

                        Shopping não é o espaço mais indicado para macróbios darem o ar de sua graça, pois é o recanto da meninada bem-nutrida, que gosta de ficar por lá, comprando, passeando, paquerando, enfim, fazendo tudo a que tem direito. Devido a meu vício principal, a leitura, ainda ando por aquelas bandas, vez que lá se encontram grandes livrarias.

 

                      Pois eu ia descuidadamente andando pelo ParkShopping, em busca da Livraria Saraiva, quando tive que atravessar uma Praça de Alimentação. De longe, vislumbrei um bando de adolescentes, meninos e meninas, sentados à mesa, na maior algazarra. Ao me avistarem, começaram eles a cochichar. Ao passar por eles, um, o mais afoito, levantou-se e me interpelou, sob os risinhos dos demais:

 

                        – Ô coroa, você é gay?

                        – Que eu saiba, não! – Respondi.

                        – Então, por que é que você anda rebolando desse jeito?  É pra se mostrar?

 

                        Comecei a contar-lhe sobre o desnível no comprimento de minhas pernas, mas ele interrompeu-me:

 

                        – Você poderia muito bem usar uma bengala, pra disfarçar esse desmunhecamento que a gente acabou de ver! Essas rebanadas não ficam bem prum homem na sua idade! Compre uma bengala!

 

                        Aliás, o avelhentante assunto “bengala” é por demais recorrente. Escreveu não leu, e ele vem à tona.

 

                        Aqui em Brasília, existem vagas exclusivas nos estacionamentos das quadras comerciais e dos shoppings. Para idosos, sinalizadas com a ilustração acima, e, para deficientes, assinaladas com um boneco sentado em cadeira de rodas. Desejando utilizá-las, o motorista deve exibir, bem visível no para-brisa, a devida autorização, fornecida pelo DETRAN.

 

                      Num sábado qualquer, ao chegar à Casa Ortopédica, notei o Galaxie 70 de meu amigo Pachequinho, deficiente físico juramentado, consciente e com documentação em dia, estacionado na vaga de idoso. Raciocinando que o Pachequinho assim agira por engano, resolvi estacionar na vaga de deficiente, ficando, assim, elas por elas.

 

                        Qual não foi minha surpresa ao puxar o freio de mão e surgir, do nada, um policial motocicletado, parar a meu lado e, com toda a urbanidade possível, solicitar:

 

                        – O senhor quer fazer o favor de retirar a viatura da vaga?

 

                        Argumentei, mostrando a autorização do DETRAN no para-brisa e explicando que meu amigo Pachequinho, deficiente, tomara minha vaga e, por isso, eu estava ocupando a dele. O guarda insistiu:

 

                        – Por acaso, o senhor também é deficiente?

 

                        Tentei explicar-lhe o problema do desnível existente em minhas pernas, as cruciais dores produzidas pela severa artrose na região sacroilíaca, mas ele não quis conversa:

 

                        – Se o senhor é também deficiente, cadê sua bengala?

 

                        Retirei a viatura e me mandei, observando, pelo retrovisor, se ele estava fazendo alguma anotação para a respectiva multa. Felizmente, não!

 

                        Doutra vez, foi na fila prioritária do Banco do Brasil, eu caracterizado de Xerife, uniforme de passeio, quepe escuro e óculos ray-ban para combinar, estrela no peito, tal como vocês a seguir verão:

  

                        Repentinamente... Bem, como Aspirante a Cordelista, deixem-me contar-lhes o restante do episódio em sextilhas, por ser o estilo com o qual mais eu gosto de versejar:

 

No Banco, assim de gente

Chega nervosa atendente

E com rispidez me fala:

– Sai daí, seu enganoso

Esta fila é de idoso

Cadê a sua bengala?

 

Setenta e nove a fazer

Esforço-me pra manter

A minha fama de mau

Olhei para a carrancuda

Abaixei minha bermuda

E amostrei-lhe o bilau

 


Caindo na Gandaia terça, 23 de maio de 2017

VAI TOMAR NO C* - A VINGANÇA

VAI TOMAR NO C* – A VINGANÇA!

Raimundo Floriano

 

 O temido vocativo

 

                        Matéria publicada no Jornal da Besta Fubana no dia 14.7.2014.

 

                        Isso que vocês estão vendo aí embaixo, se apreciado voluptuosamente, fesceninamente, afrodisiacamente, assemelha-se a um esfíncter deflorado – eis que sem pregas – e sustentado por centenas de falos em ereção. Ganhou o nome de arena, como todos os campos de futebol recém-construídos para a Copa 2014. Mas esse daí tem história!

 

Estádio Nacional Mané Garrincha - Acervo Google

 

                        Para edificar uma arena obedecendo aos padrões da FIFA, aqui na Capital Federal, tornou-se necessária a demolição da outra que no local se encontrava e vinha atendendo muito bem à demanda brasiliense. E assim o velho Mané Garrincha se foi. Mas opondo tenaz resistência, muito diferente da população, que num tava nem aí. Vou lhes contar.

 

O velho Mané Garrincha, em tarde/noite de Vasco x Gama

- Acervo Google

 

                        Era necessário implodi-lo. Para isso, usaram carradas de dinamite, isolaram a área e tacaram fogo! Tudo filmado! Foi aquela fumaceira, que encobriu o Setor Hoteleiro, mas quando a poeira baixou, lá estava o Mané Garrincha, incólume, soberbo, como que dizendo, para vingar-se:

 

                        – Implosão, vai tomar no c*!

 

                        Aí, os implodidores se danaram! Redobraram a carga! E foi aquele papoco, que se ouviu até nas Satélites. Abaixada a poeira, lá estava o Mané, com a cara mais safado do mundo, novamente a exclamar, em solitária vingança:

 

                        – Implosão, vai tomar no c*!

 

                        Desiludidos, os implodidores resolveram derrubá-lo a golpes de picareta – já disseram que, só no Congresso Nacional, tem 300 –, trincha, enxada, marreta, tudo que era ferramenta manual destrutiva.

 

                        Mas sabem por que o Mané bradava aquele impublicável e sonoro vocativo? É porque o estádio é o templo do palavrão! Não há juiz de futebol que não voltou pra casa com os ouvidos zonzos de tanto ouvi-lo. Igualmente, não há juiz de futebol no qual o vocativo pegou nem que o tenha obedecido. Sabem por quê? Eu mesmo respondo: porque todos não ligaram!

 

                        Aliás, muito antes da implosão, esse terrível vocativo já se fizera ouvir dentro do saudoso Mané. Aconteceu no início de 2007, numa partida entre o Vasco e o Gama, quando o Romário tentava marcar o milésimo gol – faltavam dois –, à qual compareci com minha família.

 

                        Foi uma festa, a partir dar imediações do Mané, com os vendedores ambulantes de camisetas, churrasquinho, refrigerante, cerveja, pinga e tudo que era de guloseima, além da bagunça lá dentro, os torcedores fazendo de tudo que lhes era de direito.

 

                        Em certo momento, correu um zunzum de que o Presidente Vascaíno se encontrava no estádio, e aí aconteceu a unanimidade que jamais eu presenciara entre torcidas adversárias. Todos, em uníssono, passaram a gritar, durante quase dois minutos:

 

                        – Fulano, vai tomar no c*! Fulano, vai tomar no c*! Fulano, vai tomar no c*!...

 

                        No dia seguinte, nenhuma nota em toda a mídia sobre o degradante vocativo. E sabem por quê? Respondo-lhes: porque o Fulano não se importou!

 

                        Quando eu era menino, botaram-me o apelido de “catingudo”, no Grupo Escolar. Fui queixar-me à Diretora, e ela me aconselhou: – Não ligue, que eles param de chamar! Assim fiz, e o apelido não pegou!

 

                        O caso acontecido no Itaquerão, na abertura da Copa do Mundo/2014, foi emblemático. Mandaram Certa Autoridade tomar no c* e, logo depois do jogo, a mídia brasileira e internacional foi só do que se ocupou. E sabem por quê? Respondo: porque a Autoridade ligou, se importou, passou recibo.

 

                        Caso ela tivesse jogo de cintura, chamaria as câmeras e holofotes para si e cantaria, para toda a arena, esse refrão de samba carnavalesco gravado por Zilda do Zé:

 

                        – Vai, vai, amor! Vai, que depois eu vou!

 

                        Mas não, além de ela passar recibo, vestir a carapuça, sua assessoria ficou a investigar quem, dentro da arena, lhe dirigiu tal vocativo, quando seria impossível individualizar, pois me parece ter sido a totalidade, segundo dizem, pois não assisti ao jogo.

 

                        Um Prócer, em gesto inteiramente racista e segregativo, culpou a “elite branca”, o que fez com que a mira de seus correligionários se voltasse para a apresentadora Xuxa, querendo saber se ela igualmente o proferira, vez que também comparecera ao Itaquerão e pertence à tal “elite” criada pelo dito Prócer. Ela? Rainha dos Baixinhos? Claro que não!

 

                        Embora eu não estivesse lá, tenho know-how para livrar a “elite branca” de qualquer culpa e debitá-la inteiramente aos torcedores menores de 40 anos, ali presentes, homens e mulheres, independentemente da etnia, por não saberem, devido à pouca idade, quanto dói tomar no c*. Se assim procederam, na ignorância, só merecem perdão e nada mais!

 

                        E aqui abordo o tema principal deste meu relambório, que é a vingança daqueles machos que acima dos 40 já se encontram e, se quiserem viver mais 40, devem uma anual visita ao urologista. Da primeira vez, já sai de lá diagnosticado e também sabendo o que é tomar no c* e como isso doloroso o é!

 

                        Ano passado, no Dia do Diabético, aqui em Brasília, muitos laboratórios montaram estandes em frete à UNICOM e adjacências, na Rua das Farmácias, para orientar a população sobre as enfermidades que aperreiam, principalmente, as pessoas de idade avançada. Eram médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, acupunturistas e outras especialidades, de ambos os sexos, prestando-nos todos os tipos de informação.

 

                        Num dos boxes, desconhecido aparelho me chamou especial atenção. Devido a sua finalidade, batizei-o logo de TOMADOR NO C*’! Servia para que os homens resistentes ao exame de toque pelos urologistas se cientificassem do que é a próstata e como detectar se ela é portadora ou não de tumor maligno.

 

 

Aparelho Tomador no C*

 

                        Não resisti à tentação!

 

                        E, nessa dedada que vocês me veem executando acima, vai minha vingança contra todos os urologistas brasileiros que, em sua maioria jovens, ainda não passaram pelo toque e, por isso mesmo, não sabem como dói levar futucadas no fiofó!

 


Aparelho Tomador no C*


Caindo na Gandaia terça, 16 de maio de 2017

TRATADO GERAL DA CUECA

TRATADO GERAL DA CUECA

Raimundo Floriano

 

 Cuecas maneiras do Século XXI

 

                        Para quem não conhece as peças de vestuário masculino acima, vou esclarecer: são cuecas modernas, encontráveis facilmente na praça, muito comuns para os homens atualizados e de bom gosto. Eu, por exemplo! Existem até uns modelitos com estampas de vampiras, que é pra chupar (êpa!) o sangue do usuário – tem quem goste, tá na moda! Dito isso, passemos ao empolgante e arrebatador tema a que me propus no cabeçalho desta matéria.

 

 

                        Tal declaração foi publicada na revista Veja, de 4.4.12, na seção Veja Essa. O que me deixou a matutar sobre a precaução da grande atriz e apresentadora. Será esse o destino das jovens quando se casam? Ou será o casamento um pré-requisito para os varões que desejam ter suas cuecas sempre limpinhas? E foi aí que me lembrei da primeira vez em eu usei tal espécie de vestimenta. Foi em fevereiro de 1949.

 

                        Dona Maria Bezerra, minha saudosa mãezinha, ao arrumar meu enxoval, no dia em que eu, aos 12 anos, saía de Balsas para conquistar o Mundo, colocou na maleta seis cuecas sambas-canção, recomendando-me: – Só comece a vestir depois de desembarcar em Floriano. No doloroso momento de despedida e saudade, mamãe não se lembrou de me informar para que serviam aquelas calças curtas, de vez que eu já usava calças compridas.

 

                        Chegando a Floriano, conheci meu primo Nilton, Cadete do Exército, sujeito traquejado pra mais da conta, que me explicou a necessidade do uso das cuecas, ilustrando sua aula com um exemplo bem evidente. Estávamos no período carnavalesco, e a marchinha de maior sucesso era Chiquita Bacana, de João de Barro e Alberto Ribeiro, gravada por Emilinha Borba, que dizia: “Chiquita Bacana/Lá da Martinica/Se veste com uma casca/De banana nanica/Não usa vestido/Não usa calção/Inverno pra ela/É pleno verão/Existencialista/Com toda razão/Só faz o que manda/O seu coração”.

 

                        Calção – como chamávamos, até uns 30 anos atrás, a calcinha de hoje – era um símbolo feminino, peça que mulheres direitas usavam por debaixo de todas as roupas, e a que não o fizesse, poderia ser chamada de rapariga. Assim também a cueca, segundo o Nilton, era sinal de que o homem se encontrava em plena maturidade moral, cônscio de suas responsabilidades sociais.

 

                        Convenientemente instruído, passei a usar minhas cuecas, sem que fosse necessário contrair matrimônio para que elas se conservassem dentro da limpeza requerida.

 

                        E os anos se passaram. Agora, com essa declaração da atriz, resolvi, auxiliado pelo Google, por meus cadernos de lembretes e pelas observações pessoais, ir a fundo (êpa!) no tema, procurando, não esgotá-lo, mas pelo menos dar um pouco de claridade sobre esse imprescindível componente do vestuário masculino.

 

                        Já no tempo de antigamente, o homem, desde que era parido, precisava usar algo que o impedisse de lambuzar de matérias fecais tudo em seu derredor. Daí, a invenção do cueiro.

 

Cueca samba-canção, cueiro e ceroula

 

                        A etimologia da palavra está lá no Aurélio: Cueiro (De cu + eiro), sendo “cu” o orifício na extremidade terminal do intestino, pela qual se expelem os excrementos, e “eiro” o que exerce certo ofício, profissão ou atividade. Vejam bem, os acadêmicos e lexicógrafos podiam, com certa razão, denominar essa peça de “cuzeiro”, mas isso resultaria em chulo, agressão aos ouvidos e aos bons costumes.

 

                        Chegando o bebê à idade adulta, cuidou-se logo de bolar outra vestimenta que o impedisse de fazer sujeira, não só a sua volta, mas nas próprias roupas. E a humanidade criou a ceroula.

 

                        Higiênica, isso é o que a ceroula não era! Acostumado a ter quem lhe trocasse os cueiros a toda hora que os sujasse, o homem, por muitos anos, despreocupou-se com as medidas de higiene que a ceroula requeria, fazendo dela o uso até que se rasgasse, sem jamais lavá-la, até porque, devido a motivo de economia, só comprava uma única peça. Parecidamente como hoje a maioria dos mancebos age com relação à calça jeans.

 

                        A Queda da Bastilha, em 1789, não só representou o nascimento do desejo de liberdade em todos os povos, como trouxe em seu bojo a industrialização e incremento da produção de artigos manufaturados de uso comum, inclusive peças de vestuário. Isso não afetou, no entanto, a Corte Portuguesa, cujos mancebos, ao chegaram ao Brasil, em 1808, continuavam no hereditário costume do uso da única ceroula sem lavá-la, até seu desgaste total pela ação do tempo.

 

                        Deram-se eles muito mal. Ocorre que com as brasileiras o buraco (êpa!) era mais embaixo. Para achegar-se-lhe ao leito, o varão teria que se aprecatar de todos os cuidados higiênicos, banhar-se, acheirosar-se, caso contrário, não haveria jogo. Com a fartura de panos para as mangas, o comércio cuidou de inventar um tipo de ceroula mais apropriado ao clima tropical, de pernas curtas, o que hoje é conhecido como samba-canção, mas que, naquela época, manteve o nome de ceroula, ou ceroulas, pois os homens passaram a comprar mais de uma para uso individual. O nome permaneceu ceroula, até que um dia!

 

                        Até que um dia, certa esposa conheceu o triste fadário temido pela atriz Sabrina. Ao levar a ceroula branca de seu marido ao tanque, constatou ser ela portadora, nos fundilhos, de amarelada mancha, também conhecida como “a freada da bicicleta”, com origem na boca do cano de descarga de seu cônjuge.

 

A freada da bicicleta - Acervo Google

 

                        Com o pensamento no orifício escabroso e manifestando incontido asco relativo à mancha, a pobre senhora exclamou: – Eca!!! Estava criado o neologismo para a ceroula, que o Aurélio consagra: Cueca (de cu, acima já definido, + eca, porcaria, sujeira).

 

                        Falando-se na higiene pessoal, existe um produto de primordial relevância no desempenho desse mister: o papel higiênico. Para muitos que ainda não o conhecem, que ainda vivem na era do sabugo e da folha de bananeira, aqui vão duas imagens, do liso e do estampado.

 

Papéis higiênicos: o liso e o estampado - Acervo Google

 

                        Há pouco tempo, num desses programas televisivos matinais que tratam de assuntos diversos, a apresentadora foi muito didática ao ensinar o emprego correto do papel higiênico, valendo-se de linda modelo vestida apenas de maiô, que fazia todos os movimentos ilustrativos do método.

 

                        A apresentadora instruía desta maneira: pega-se um pedaço de papel medindo cerca de um metro e dá-se-lhe uma dobra, fazendo-o ficar duplicado, com cerca de meio metro; em seguida, dá-se-lhe nova dobra numa das extremidades, mais ou menos de 10 centímetros, e executa-se a primeira limpada no fiofó; isso feito, olha-se para a dobrinha ali passada, verificando se o papel veio limpo ou sujo; se limpo, está pronta a operação; se sujo, dá-se-lhe nova dobrinha, na mesma conformidade da primeira, e nova limpada, até que o papel se apresente completamente limpo. Tudo isso da frente para a retaguarda, evitando emporcalhar a genitália. Pronto! Fácil, não é?

 

                        Voltando à cueca, lembro-me duma jogada de mestre da indústria há cerca de 50 anos: o lançamento da cueca assemelhada à calcinha feminina, mais aderente ao corpo, que ficou popularmente conhecida pelo nome da marca que a consagrou: Zorba.

 

Cueca revolucionária - Acervo Google

 

                        De início, os homens não quiseram aceitá-la. Eu, por exemplo! Mas a indústria, com seus bons marqueteiros, soube impor essa nova moda, tachando o modelo antigo com o nome de samba-canção, relacionando-o ao brega e ao cafona. Foi o santo remédio. Até eu caí nessa!

 

                        Chico Fogoió, o Assessor Piauiense deste Cardinalato, contou-me um caso deveras interessante ocorrido em Vão da Urucu, nas barrancas do Rio Parnaíba. A filha dum fazendeiro saiu de lá para estudar, ficou muito tempo em Minas e no Rio de Janeiro e, quando regressou, já formada em Veterinária, começou a namorar o capataz da fazenda, o qual, por atávicos motivos, jamais usara cueca na vida. Carinho vai, carinho vem, resolveram noivar. Aí, a doutora deu-lhe uma zorba, para que ele a vestisse no dia do pedido oficial. Ele ainda quis reagir, argumentando que ninguém saberia se ele trajava ou não a cueca, pois ficava ela escondida pela calça, mas a moça explicou que, mesmo debaixo da calça, aparecia a marquinha, como se vê nas mulheres. Aí, ele capitulou.

 

                        No dia do noivado, chegou ele à casa-grande já vestido na zorba. Em dado momento, assaltado pela urgência de satisfazer uma necessidade fisiológica, dirigiu-se ao matinho, no quintal da fazenda, munido de cinco sabugos, e, em lá chegando, derrubou o barro. Sucedeu que ele se esquecera da zorba, e só abaixara a calça. Já aliviado, passou o primeiro sabugo no fiofó, e ele voltou limpinho. Olhou pro chão, procurando o tolete, mas nada viu. Espantou-se, mas raciocinou que as galinhas do terreiro já o haviam comido, assungou a calça, abotoou-a, afivelou o cinturão e seguiu para o almoço que se iria iniciar. Ao sentar-se à mesa, com toda a família da namorada já em seus lugares, sentiu uma substância fria a pesar-lhe na bunda. Intrigado, enfiou e mão atrás por dentro da calça, encheu-a com a massa desaparecida e, exibindo-a a todos, gritou:

 

                        – Tá aqui!

 

                        Foi uma luta para que a namorada e sua família aceitassem o pedido de noivado, mas tudo acabou em muita festa, com bebida, tira-gosto, sanfona, zabumba, triângulo e ganzá.

 

                        No mundo político, a cueca teve sua utilidade direcionada para um outro mister, muito diferente daquele que seus inventores idealizaram: esconder dinheiro sujo, proveniente de propinas e outras maracutaias.

 

Usos cuecais diversos - Acervo Google

 

                        E assim caminha a humanidade!

 

                        Não poderia faltar neste tratado uma pegadinha do tempo em trabalhei como Ajudante de Palhaço no Circo Cometa do Norte em Teresina. Pergunta: – Qual é a diferença da cuíca pra a cueca? Resposta: – A cuíca ronca, e a cueca escuta o ronco!

 

                        E não se esqueçam, meus queridos leitores: de nada vale uma cueca de seda ou de veludo, se a calça não estiver rasgada no bumbum! Ninguém vai notar sua sofisticação!

 

                        Uma cueca bem lavada é meio caminho andado nos assuntos do amor. Por isso, e para terminar, não me furto de mencionar o fato de uma cueca limpinha ter sido o objeto de suposto homicídio, pois não se sabe se o intento foi concretizado, eis que o malfeitor jamais foi encontrado. É o que diz a Marcha da Cueca, de Mendes, Prestes e Sardinha, gravada por Celso Teixeira para o Carnaval de 1970:

 

“Minha cueca tava lavada

Foi um presente

Que eu ganhei da namorada

 

Eu mato, eu mato

Quem roubou minha cueca

Pra fazer pano de prato”

 

"


Caindo na Gandaia terça, 09 de maio de 2017

SAUDADES DO CEARÁ

SAUDADES DO CEARÁ

Raimundo Floriano

 

 Fortaleza: Praça do Ferreira em 1957 - Acervo Google

 

Oh, que saudades que eu tenho

Do Ceará no passado

Da alencarina bonita

Do balancê cadenciado

Da ABA, do Luís Filipe

Da Esquina do Pecado

Bem na Praça do Ferreira

Aquele vento encanado

Soprando de lá da praia

Arribava toda saia

Do mulherio descuidado

 

Em Fortaleza eu vi

Pela vez primeira o mar

E garotas de biquíni

Na praia a se bronzear

Bebi uns goles da água

Nas moças passei o olhão

Mas senti umas pontadas

No centro do coração

Pois mulher e água salgada

Mesmo na dose acertada

Detonam qualquer pressão

 

Na Esquina do Pecado

Eu ia com meu benzim

A gente trocando juras

De sincero amor sem fim

Eu pedia: – Dá um xêro?

E ela: – Toma, Mundim!

O vento soprou com força

No rumo dela e de mim

Quando olhei, vi minha amada

Com a saia esvoaçada

Parecendo a Marilyn

 

 


Caindo na Gandaia terça, 02 de maio de 2017

SARAMAGO NAVEGOU NA MAIONESE

 

 

SARAMAGO NAVEGOU NA MAIONESE

Raimundo Floriano

 

 La fuga di Lot da Sodoma (Gustave Doré - 1832 – 1883)

 

                        Matéria publicada no Jornal da Besta Fubana no dia 21.6.2010.

 

(Esta crônica, que se encontrava na fila para publicação, foi escrita a 10.5.2010, mais ou menos na época em que um deputado cearense declarou que o Presidente da República navegara na maionese. Mais de mês antes, portanto, do falecimento do grande escritor português José Saramago, ocorrido a 18.6.2010)

 

                        Pra início de conversa, declaro-lhes, com muito fervor, que professo a Religião Católica Apostólica Romana e sigo fielmente sua doutrina. Ao tomar as primeiras lições de Catecismo, na igreja de São Sebastião, em Balsas (MA), me foram ministrados estes dois basilares Mandamentos: amar a Deus sobre todas as coisas; não tomar Seu Santo Nome em vão!

 

                        Navegar está na moda! Navegar é preciso! – já dizia o poeta. Navegar na maionese, porém, nem pensar!

  

                        A ilustração acima apresenta-nos um casal homogâmico masculino. A palavra homogamia ainda não foi catalogada, pelo inusitado da nova realidade, como o enlace matrimonial entre duas pessoas do mesmo sexo, nem nos Tratados de Direito, nem nos mais modernos dicionários. Mas não demora muito. Em Portugal, a 17.5.10, o Presidente Cavaco Silva sancionou essa união.

 

                        O termo casal homogâmico, em minha pobre opinião, é muito mais deferente do que o corriqueiro casal gay. E, se ele ainda não existe, acabei de inventá-lo! Crédito para mim, pois!

 

                        Diante dessa nova situação jurídica, muitas perguntas se fazem recorrentes na boca do povo. Quem dos dois engravidará? Quem dos dois parirá? Qual a contribuição desse casal para continuidade da espécie humana? E a resposta será sempre a negativa. Porque, biologicamente, nada disso é possível. Quer dizer, ainda não, pois os cientistas estão aí aferrados nas pesquisas para resolver esse pequeno problema.

 

                        O escritor Luiz Berto, o Papa Berto I, é um criador de personagens fantásticas. Em o Romance da Besta Fubana, a Besta, que dá nome ao livro, é uma entidade mítica, bissexual, extraída da Literatura de Cordel, que vem do espaço sideral até o sertão pernambucano, para tomar parte ativa na República Rebelada de Palmares. O ponto alto de sua atuação, a meu ver, é o momento da punição dos infratores, em solenidades públicas que ganharam a denominação de enrabamento! Nas quais nenhum filho foi gerado, evidentemente!

 

                        Esse livro ficou tão famoso e ganhou tantos prêmios, que ofuscou os demais trabalhos literários de Luiz Berto. Por isso, Memorial do Mundo Novo, de igual valor, lançado em 2001, excelente reconstituição da História de Pernambuco, passou batido em todos os órgãos da mídia e até mesmo no Jornal da Besta Fubana, blog onde este que lhes escreve e um monte de desocupados publicam as besteiras que inventam.

 

                        No Memorial, Luiz Berto apresenta-nos o navegante bombardeiro Diogo de Paiva, componente da flotilha espanhola do Capitão Vicente Iañez Pinzon, chegada à Costa Brasileira em fevereiro de 1500, antes, portanto, do português Pedro Álvares de Cabral.

 

                        Diogo de Paiva é detentor da imortalidade, e sua pessoa atravessa os tempos, tem parte ativa e preponderante em todos os acontecimentos históricos, desde sua chegada a Pernambuco até o limiar do ano 2000, quando é abatido por um tiro mortal.

 

                        No Capítulo II do livro, Diogo de Paiva abandona a flotilha e, com matolão às costas, a cara e a coragem, segue em direção à mata, até encontrar-se com duas belas e jovens indígenas, que lhe simulam um sorriso. Transcrevo, por achar magnífica, a descrição que o autor faz daquele primeiro contato do europeu com as nativas brasileiras:

 

                        “Entre o balançar das ondas do mar às suas costas, e o balançar das palhas dos coqueiros à sua frente, os passos do bombardeiro são seguros, e como que dizem da naturalidade deste encontro que se irá estabelecer.

 

                        Está criado Pernambuco, e nele instalado o iniciador de sua população cristã.”

 

                        Perceberam? Para criar uma população, aqui ou alhures, era imprescindível, nos tempos de antanho, a participação de sexos opostos.

 

                        Os holandeses, quando invadiram Pernambuco, e os franceses, quando se apossaram de São Luís, no Maranhão, trouxeram, em suas caravelas, além de soldados e equipamentos, milhares representantes do sexo feminino, sem as quais seria impossível a continuidade de suas etnias por aqui.

 

                        Vejamos agora o caso Caim, o navegante maionésico.

 

                        É aquele Caim mesmo, o do Livro de Gênesis, filho de Adão e Eva, que matou seu irmão Abel e, como penitência, foi condenado pelo Senhor a vagar de modo errante pelo mundo, após tão monstruoso crime.

 

                        O Livro de Gênesis também relata a destruição das duas Cidades Sodoma e Gomorra. A palavra Sodoma deu como derivado o substantivo sodomia, que é a conjunção sexual anal entre homossexuais masculinos, ou entre homem e mulher.

 

                        Pois bem, os varões de Sodoma e Gomorra vinham, há muito tempo, praticando apenas esse ato sexual, desconhecendo o heterossexualismo, fazendo com que o Senhor, para castigá-los, mandasse que dois anjos descessem à Terra com o objetivo de destruir as duas cidades.  Sabendo disso, Abraão resolve interceder por Sodoma, dirigindo-se ao Senhor:

 

                        – Destruirás também o justo com o ímpio? Se, porventura, houver 50 justos na cidade, destruí-los-ás também e não pouparás o lugar por causa dos 50 justos que estão dentro dela? Longe de ti que faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo seja como o ímpio, longe de ti seja. Não faria justiça o Juiz de toda a Terra?

 

                        Respondeu-lhe o Senhor:

 

                        – Se eu em Sodoma achar 50 justos dentro da cidade, pouparei todo o lugar por amor deles.

 

                        Abraão insiste:

 

                        – Se porventura faltarem de 50 justos 5, destruirás por aqueles 5?

 

                        – Não a destruirei se eu ali achar 45 justos – respondeu-lhe o Senhor.

 

                        Abraão abaixou o número de justos para 30, depois para 20 e, finalmente para 10, obtendo do Senhor a resposta:

 

                        – Não a destruirei por amor dos 10!

 

                        Mas em Sodoma havia menos de 10 justos, apenas quatro, que foram salvos pelos anjos: Lot, sua mulher e suas duas filhas, cujos maridos não os quiseram seguir, por julgar que o sogro gracejava quando lhes comunicou que os anjos o aconselharam a deixar a cidade.

 

                        E a destruição do Senhor foi implacável!

 

                        Baseado na Bíblia e, talvez inspirado – quem sabe? – no Memorial do Mundo Novo, José Saramago, festejado romancista português, escreveu Caim, em 2009, livro no qual o personagem-título, com a mesma imortalidade de Diogo de Paiva, viaja pelo tempo, participando de várias passagens do Velho Testamento, com um único objetivo: atacar Deus!

 

                        Intrometendo-se em acontecimentos nos quais foram protagonistas Moisés, Jó, Noé e outros, Caim se concentra na destruição de Sodoma e Gomorra para questionar Deus, com impropérios vários, chamando-o de covarde, para dizer o mínimo, e outros esculachos e aleivosias, sempre apoiado no bordão que pontua a maior parte do livro:

 

                        – Por que o Senhor não poupou as inocentes crianças que habitavam a cidade? Seriam elas também pecadoras? Pagaram elas, justas, pelos ímpios?

 

                        E aqui eu respondo ao personagem Caim e ao escritor Saramago:

 

                        – Não havia crianças por lá! Lembram-se da sodomia? Pois é! Há muito tempo, nas duas cidades, praticando os homens o ato sexual com pessoas do mesmo sexo, ou por via anal com o sexo oposto, jamais seriam seus habitantes capazes de gerar ser humano algum para a perpetuação da espécie!

 

                        São bem conhecidos casos de malfeitores, corruptos e atrizes pornôs que, ao atingirem a idade provecta, acercaram-se de Deus para redimir-se. Saramago fez o contrário: na senectude, procurou Deus para depreciá-lo.

 

                        Assim, perdeu ótima oportunidade de manter-se calado!

 

                        E, igualmente a seu personagem Caim, Saramago navegou na maionese!

 


Caindo na Gandaia terça, 25 de abril de 2017

RECEITA PARA EMAGRECER

RECEITA PARA EMAGRECER

Raimundo Floriano

 

O Gordo e o Magro: sucesso no cinema

 

                        Atividade! Atividade Sempre! Este foi o lema que me foi transmitido pelo saudoso amigo cearense Deputado Januário Feitosa: – Meu caro, não deixo passar em branco o tempo que Deus está me concedendo!

 

                        Seguindo sua trilha, desde 26.02.1991, quando fui aposentado, ingressei em nova etapa de minha vida, para a qual há muito tempo eu viera me preparando, qual seja, organizar meu acervo fonográfico e escrever sobre toda a experiência alcançada até ali. Dez anos depois, atendendo a imposição médica, passei a malhar em academia, três vezes por semana, nas tardes das segundas, quartas e sextas-feiras. Mesmo assim, ainda me sobrava tempo ocioso, o que passei a preencher com pescarias, nas tardes das terças, quintas e sábados.

 

                        Diferentemente da maioria dos pescadores aposentados, que fazem expedições homéricas para locais extremamente piscosos como a Serra da Mesa e o Araguaia, mas retornam com peixes todos carimbados com códigos de barras, minhas pescarias eram aqui mesmo pertinho de casa, na ASBAC - Associação dos Servidores do Banco Central, a cujo quadro social pertenço, mercê de afinidade com um funcionário daquela estatal.

 

                        Localizada às margens do Lago Paranoá, cuja população de peixes cada vez aumenta mais, sua ribanceira é apropriada para a diversão pesqueira. Os peixes mais comuns pegados ali são a tilápia, a carpa e o tucunaré, este exigindo técnica especial para capturá-los. Com isca, usam-se carne, minhocas, angu de farinha, miolo de pão, piabas e, a mais apreciada, o boró, tipo de larva encontrada nas casas especializadas, vendidas como ração para aves.

 

                        O equipamento mais usado é simples: vara de mão e molinete. Em meu caso particular, empregava, na vara de mão, linha de cinco metros, com três anzóis encastoados, o que possibilitava pegar até três tilápias de cada vez, em dia de fartura. E também alguns molinetes com linha de cerca de 30 metros, que deixava fincados na espera.

 

                        A história que lhes vou contar, por ser conversa de pescador, poderia merecer até 90% de desconto. Eu digo poderia, porque é verídica, passada diante de testemunhas oculares, amigos que a presenciaram quando aconteceu: Hipérides Leandro Farias, Henry Cooper da Rocha e Luciana, sua mulher, falecido Hernandes Grillo, o Azulinho, e outros.

 

ASBAC - Vistas aéreas

 

                        Praticamente dentro da selva de pedra, como se pode ver nas fotos acima, e pegando peixe adoidado, era muito difícil para nós apreciarmos as maravilhas que a Natureza realizava em nosso derredor, principalmente com diversos pescadores zoológicos que lá se esforçavam na luta pela sobrevivência, ao contrário de nos outros, que o fazíamos apenas por farra, por diversão, para matar o tempo. Tanto que, em meu caso, os pescados eram distribuídos com as costureiras, cabeleireiras e manicures de minha Quadra, jamais os levando para casa. Até que um dia!

 

                        É meu costume, desde os tempos de menino, ao recolher qualquer linha para trocar a isca, dar uma ferra – puxão firme –, na esperança de surpreender algum peixe comendo de furto ou dando sopa no trajeto do anzol. Certo dia, ao recolher um molinete e executar a ferra, senti a barra pesar no fundo do lago. Cada vez eu girava a roldana, mais a presa se debatia. Os colegas ali por perto deixaram suas varas de lado para apreciar o tamanho peixe. Mas, oh! decepção!: tratava-se apenas de um pato! Depois de libertado, ele bateu asas e voltou para sua vidinha.

 

                        E foi quando passamos a dar atenção aos fenômenos naturais desencadeando-se a olhos vistos, sem que os percebêssemos. Os companheiros alados que exerciam os meios de prover sua subsistência, sem que até então os notássemos, eram de várias espécies: martins-pescadores, socós, garças, marrecos, gansos, patos pescadores, estes objeto de nossa observação mais acurada a partir de então.

 

Pato pescador abicanhando a presa  

                        O pato pescador, em bandos, passa o dia inteirinho na faina de conseguir alimento, afastados uns 20 metros ou mais da margem do lago. Cada mergulho dura, no máximo 25 segundos. Quando consegue abicanhar a presa, na horizontal, leva-a para a superfície, a fim de degluti-la, conforme já explanei aqui, dia 19.08.13, no episódio O Socó e o Muçum - Lenda Balsense, como visto na figura acima.  Em seguida, o pato maneja para abicanhá-la pela cabeça.   Isso feito, joga -a para cima de forma que ela lhe caia de ponta-cabeça diretamente na goela. Tudo muito rápido pois, do contrário, vem uma garça e lhe arrebata o pitéu. Caso isso não ocorra, e com a presa no bucho, ele volta a mergulhar, caçando como se morto de fome estivesse.

 

                        O aguapé é uma planta aquática flutuante cultivada no Lago Paranoá para combater a poluição. Como emigra de um lado para o outro, formando imensas ilhas vegetais, ao sabor do vento, às vezes chega determinar que se suspendam as atividades, quando aportam na área de um pesqueiro.

 

Aguapés: a saúde do Lago Paranoá

 

                       Pois foi uma dessas ilhas que, em bela tarde ensolarada, vimos aproximar-se de nós. Alguém gritou: – Tem um pato se afogando naqueles aguapés!

 

                        Na verdade, dava para se ver o coitado do pato semimergulhado, com cabeça enganchada numa touceira, e o bumbum a agitar-se ao vento.

 

                        Outro costume que trago desde menino é o de mergulhar para desenganchar meus anzóis, quando preciso, com peixe ou não. Por isso, sempre estou vestido de sunga, e naquele dia não foi diferente. Sem pestanejar, caí n’água, nadei até os aguapés, resgatei o pato e arremessei-o na ribanceira, julgando morto, eis que, àquela altura, completamente inerte.

 

                        Imediatamente o Rocha – Henry Cooper – falou: – Vou levar ele para casa e fazer um bom guisado!

 

                        Eu até quis argumentar dizendo: – Porra, cara, esse pato só tem pena e osso, você já pegou duas carpas enormes hoje, será que vale que compensa perder tempo em cozinhá-lo?

 

                        Mas o Rocha fincou pé, e aí eu resolvi pesar o bicho com nossa balança de mola: um quilo e trezentos gramas! Só! Isso com as penas molhadas!

 

                        Irredutível, o Rocha arranjou uma cordinha e amarrou o cadáver do pato num pé de pau, temendo que alguém o carregasse, e se retirou para bem longe, no rumo do Píer 21, onde sempre pega grandes peixes, não sei com qual feitiço.

 

                        E nós, os colegas de pescaria, continuamos em nossa rotina de sempre. Passada uma boa hora, escutamos, repentinamente, um qüém-qüém!

 

                        Olhamos para onde vinha a zoada, e vimos o pato amarrado ciscando de um lado para outro, agitando as asas, debatendo-se para se libertar. Gritamos o Rocha, que veio na carreira. Aí, diante da surpresa de todos, baixou em mim o espírito de um de meus alter egos, o Doutor Mundico Trazendowski, quando usei da palavra:

 

                        – Amigo Rocha, a coisa agora mudou de figura. Eu salvei o pato do afogamento, julgava-o falecido, mas agora, diante de sua ressurreição, avoco para mim o direito de libertá-lo.

 

                        A nobreza de minha proposição foi aceita pelo Rocha, por Luciana, sua Mulher, pelo Hipérides, pelo Azulinho e outros ali presentes. Cumprindo o deliberado, o Rocha desamarrou o prisioneiro que, gritando qüém-qüem, saiu voando, dirigindo-se para a mesma área de onde fora resgatado, agora sem aguapés, e continuou na mesma vidinha, mergulhando e caçando, completamente esquecido da arriscosa aventura que acabara de protagonizar.

 

                        O tempo passa, o tempo voa, mas nossa requintada gastronomia está sempre numa boa! Um dia, aqui em casa, resolvemos convidar parentes e amigos para comer um pato no tucupi. Ficou a meu cargo a tarefa de comprar a ave.

 

                        Lá no Carrefour, deveras foi meu espanto ao conferir o tamanho dos patos à venda. O menor que encontrei, já depenado, pesava 2 quilos e quinhentos gramas.

 

                        Lembrei-me, então, do pato pescador de outrora, de como ele, alimentando-se somente de peixe, era magro, lépido e faceiro, voando como qualquer passarinho, diferentemente do pato de granja, criado com ração balanceada e, por isso mesmo, pesadão preguiçoso, incapaz de conseguir, por si, o próprio alimento, pregado ao chão, aguardando apenas a hora de servir de repasto em banquetes, tipo o que estávamos planejando.

 

Pato pescador e pato de granja: trabalho versus doce vida

 

                        Concluindo, aí vai meu conselho, justificativo do título desta matéria:

 

                        – Comam peixe! Peixe não engorda! Aliás, quem engorda é você!

 

 

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Caindo na Gandaia terça, 11 de abril de 2017

PARTENOMANCIA – ADIVINHAÇÃO DE VIRGINDADE – SERTANEJA

PARTENOMANCIA SERTANEJA

Raimundo Floriano

 

 Famosa donzela do Cordel

 

                        Partenomancia, segundo o Aurélio, é vocábulo originário do Grego – parteno, virgem + mancia, adivinhação – e significava a arte de adivinhar se era ou não virgem uma mulher, administrando-lhe certa bebida que ela não devia vomitar, ou cingindo-lhe ao pescoço uma fita que não podia passar facilmente por cima da cabeça, caso a mulher estivesse pura.

 

                        Tô inventando nada. Disso eu sabia desde os tempos de estudante, quando comecei a consultar dicionários e, casualmente, topei com essa palavra. Esqueci-me logo do assunto, pois creditava essa adivinhação aos contos da carochinha, do arco-da-velha, como se dizia em meu sertão sul-maranhense.

 

                        Numa de minhas férias em Balsas, já adulto, resolvi dar uma pescada no Porto do Martim. Chegando lá, encontrei Jerônimo, preto velho africano, que a gente chamava de Pai Jerome, tratando porcos cevados para vender a retalho no dia seguinte no Mercado. Os rejeitos jogados no rio faziam com que se juntasse uma quantidade enorme de peixes, como piau, pacu, sardinha, piranha, pirambeba e pataca, espécie de piaba assim chamada por seu formato achatado, assemelhando-se à antiga moeda de 320 réis, do mesmo nome.

 

                        Tava pra mim, cada linhada era uma fisgada. Minha fieira já estava quase lotada, quando chegou uma porção de garotas para tomar banho na Fonte de Laje, uns 100 metros à nossa direita. Pai Jerome, largou um pouco seu trabalho e me perguntou:

 

                        – Mundinho, tu quer mexer nos possuídos daquelas pequenas?

 

                        Surpreso com o inusitado da pergunta, questionei-o, achando que isso seria impossível. Até que eu queria, mas de que jeito? Aí, ele me ensinou como é que se fazia. Mandou que eu pegasse uma pataca viva, passasse-a em meu pingolim e depois a jogasse no rio, proferindo esta quadrinha mandingueira:

 

Vai, pataquinha encantada,

Por estas águas sem fim

E diz praquelas mocinhas

Que não se esqueçam de mim

 

                        Foi o que fiz. Rapaz, contando não dá pra acreditar! Não demorou um minuto, e as garotas começaram a pular, dando gritinhos nervosos, e procurando proteger as entrepernas com as mãos!

 

                        Chega eu fiquei todo arrupiado! Larguei a pescaria e me acerquei de Pai Jerome, que nesse momento abria a barriga dum leitão. Quando ele puxou e retirou o fato, separou uma bexiguinha cheia dum líquido verde – a bílis, ou fel. Nova artimanha ele me propôs:

 

                        – Tu quer aprender como é que se faz pra saber se uma pequena ainda é donzela? – É claro que fiquei todo interessado!

 

                        Eram os dois métodos, iguaisinhos aos sobre os quais eu já lera no dicionário, o da beberagem e o da fita, mostrando que essa Arte provinha da África, dos tempos dos faraós. O método da fita é muito simples, descomplicado, e sobre ele adiante me alongarei. O da beberagem requeria alguns ingredientes difíceis de serem encontrados longe do sertão, além de imprescindível rogativa cabalística em Iorubá.

 

                        Para preparar a garrafada da beberagem, eram necessários fel de barrão – porco não castrado –, mijo de quati, chocalho de cascavel, pilado, raspa de chifre de pai-de-chiqueiro – bode não capado – e casco de jumento, moído, tudo isso em infusão num litro de cachaça durante uma semana. Se a menina ingerisse um gole da garrafada e vomitasse, era sinal de que estava no mato sem cachorro, que já lhe haviam comido os tampos.

 

                        Perguntei-lhe se eu não poderia substituir algum dos ingredientes por outros mais fáceis de encontrar, mas Pai Jerome disse-me que não senhor. Ainda questionei sobre a dificuldade para se conseguir o mijo de quati, porém ele explicou que a mandinga tinha tudo a ver com o amor, com atos da procriação, da perpetuidade da espécie, como esclareceu: o barrão, quando está cobrindo a fêmea, leva meia hora só no gozo; o quati tem a pic@ de osso, por isso rompe qualquer obstáculo à sua frente; a cascavel, com a cabeça do formato de membro viril, produz um veneno que, desde a antiguidade, é usado em perfumes afrodisíacos, mezinhas e adivinhações; um-pai-de chiqueiro, arrastando o saco pelo terreiro, cobre todo o rebanho de cabras duma fazenda; o jumento, por ter o maior mangalho de todos os quadrúpedes, é o símbolo do desc@b@ç@dor.

 

                        Muitos anos se passaram depois daquilo. Eu nunca tivera a ocasião de testar aqueles conhecimentos ginecológicos. Até que um dia!

 

                        Aqui em Brasília, nos Anos 1960, servindo na Polícia do Exército como Sargento Furriel, era raro eu não estar com um livro na mão e, como usava óculos, os colegas de caserna, por sacanagem e gozação, começaram a chamar-me de doutor. Em decorrência disso, aproveitavam-se para dar trotes nos Sargentos recém-chegados, submetendo-os a meu exame médico, no qual eu sempre declarava o novato incapaz definitivamente para o Serviço Público, podendo prover os meios de subsistência. Isso equivalia a demissão sem direito algum. Depois que o cabra ficava apavoradíssimo – alguns, pais de família, até choravam –, o embuste era revelado, e todos caíam na gargalhada.

 

                        Esse tratamento de doutor me é dirigido até hoje por muitos dos velhos camaradas daquele tempo. Não só pelas molecagens no quartel, mas pelo fato que adiante lhes relatarei.

 

                        Naquele tempo, o concurso de Miss Universo era algo equivalente à Copa do Mundo de Futebol. No dia da eleição, todos os países ficavam ligados no evento, por meio do Rádio e da TV, onde ela pegava. Para concorrer, havia um pré-requisito sem o qual a candidata não era aceita: a virgindade, atestada por Junta Médica do certame. Muitos pais, com receio de suas filhas não serem aprovadas pela Junta, procuravam se garantir, consultando, de antemão, alguém que lhes tirasse qualquer sombra de dúvida quanto às filhas.

 

                        Nessa época, eu morava no Cruzeiro Velho, na antiga Quadra 39, Casa 10. Certo dia, talvez sugestionado pelo tratamento de doutor que me era deferido pelos colegas, bateu-me à porta um casal, trazendo a filha de 18 anos para que eu a examinasse. Na hora, lembrei-me dos sortilégios que Pai Jerome me ensinara e pedi-lhes que retornassem dali a dez dias, pois me encontrava assoberbado de compromissos. Mas não tava não! Eu queria era um tempo para providenciar os ingredientes. Recomendei-lhes que, ao voltar, a garota já viesse com a região pubiana depilada.

 

                        Para dar credibilidade a meu exame e angariar a confiança daqueles pais, eis que os notei um tanto ressabiados pelo fato de eu ser ainda rapaz solteiro, procurei o aval de um colega casado e acatado no bairro, convidando o Paulo Augusto Soares Bandeira, Sargento da PE e maranhense como eu, cuja esposa, Dona Terezinha, ludovicense, depois de ficar sabedora de meu propósito, consentiu que ele funcionasse como meu assistente, mas com uma observação:

 

                        – Olhe, Seu Floriano, só deixo porque é com o senhor, pessoa de muito respeito. Se fosse com outro, era fora de cogitação!

 

                        Assim garantido, peguei um ônibus – eu ainda nem sonhava em possuir carro –, fui à Cidade Livre – hoje, Núcleo Bandeirante – e escarafunchei nas bancas de tudo que é raizeiro e macumbeiro existente no Mercado. Pouca coisa! Fel de barrão, só encomendado! Mijo de quati, nem pensar!

 

                        Dez dias depois, o casal retornou com a menina para conhecer o diagnóstico. Como eu não encontrara os ingredientes para a beberagem, resolvi partir para o método da fita.

 

                        Acompanhado do Bandeira, levei a garota para o quarto, mandei que se despisse, invoquei, mental e respeitosamente, a cabala iorubana – da qual já não me recordo – e dei início ao exame. Peguei uma fita e circundei-lhe a cabeça, tomando, dessa forma, a medida de seu perímetro, como à esquerda desta figura:

 

                         Dado um nó na parte superior da fita, retirei a laçada e mandei que ela a mordesse, após o que tentei passá-la por cima de sua cabeça, como à direita da figura.

 

                        Não passou! Se passasse, adeus, viola!

 

                        No caso em epígrafe, a menina podia concorrer ao Miss Brasília sem perigo de susto algum. Foi esse o diagnóstico que os pais receberam, prenhes de felicidade.

 

                        Após as despedidas, o Bandeira chamou o casal para uma conversa reservada e o alertou:

 

                        – Podem inscrevê-la, mas cuidado! Furada, furada mesmo, ela não é! Mas, na região de seu fiafá, é grande o aceiro. As coxas dela se encontram bastante inflamadas, assadas pra todo lado, de tanto rastro de pic@!

 

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Caindo na Gandaia terça, 04 de abril de 2017

OS GATOS-PINGADOS DO JET SET INTERNACIONAL

OS GATOS-PINGADOS DO JET SET INTERNACIONAL

Raimundo Floriano

 

 

Bagagem prática do homem viajado - Acervo Google

 

                        Que sou um homem cosmopolita, traquejado, todo mundo sabe disso. Em qualquer país onde desembarco, sou logo identificado como cidadão internacional, de seu tempo, e isso apenas por visível detalhe: a bagagem que carrego, constituída de mala com rodízios e pequena valise de mão, para objetos de uso pessoal.

 

                        Ultimamente, devido à diversificação desses objetos miúdos, tais como faca amolada, calçadeira, lixa de unha, tesoura, para serviços diversos, apito, para a xerifança, todos metálicos, até minha bagagem de mão é despachada, e eu embarco e desembarco em qualquer aeroporto tendo à mão a penas um item, este de caráter inseparável: livro, para leitura no trajeto.

 

                        A leitura, vício que carrego desde a infância, faz-me lembrar, a cada check-in, do livro Oliver Twist, do inglês Charles Dickens, escrito em 1838, no qual é narrada a triste sina dum menino nascido para sofrer e que é, a certa altura, vendido aos donos duma funerária para exercer o ofício de gato-pingado, ou seja, menino que ia à frente dos cortejos fúnebres de falecidos sem eira nem beira, desvalidos, fingindo chorar. Como eram escassos os carpideiros, surgiu esta expressão: uns poucos gatos-pingados. E o que isso tem a ver com minha elegante bagagem? Calma! Mais adiante, vocês hão de saber.

 

                        Prestem atenção nos filmes atuais. Vocês já viram o Tom Cruise, o Richard Gere, o Brad Pitt, o Anthony Hopkins, o Johnny Depp ou o John Travolta carregando bagagem além da acima descrita? Não! E sabem por quê? O segredo é que todos eles vêm, de há muito, me imitando.

 

                        Meu comportamento racional impôs-se desde os tempos em que, fazendo a primeira viagem em minha vida, quase nada tinha pra carregar, o que era característica dos sertanejos de meu tempo, que bem podiam falar como Bias, um dos Sete Sábios da Grécia: omnia mea mecum porto – levo comigo tudo que tenho.

 

                        Naquele tempo, a bagagem invariável de todo nordestino desapercebido, ao embarcar na carroceria dum caminhão, ou em balsa, lancha, vapor e motor, era a maleta, o saco de rede e um cofo ou uma cesta para carregar comida, o chamado frito da viagem. Ao desembarcar, o cofo ou a cesta já não faziam parte de sua tralha.

 

 

Cofo e cesta: munição de boca, para economizar no passadio - Acervo Google

 

                        O sertanejo tem uma virtude que o diferencia de todos os outros patrícios brasileiros: a solidariedade. Eu constato isso todas as vezes em que, no período natalino, vou embarcar algum parente ou amigo na Rodoviária de Brasília. Qualquer deles – homem ou mulher – passa o ano inteirinho trabalhando, dando duro, mas economizando cada centavo ganho, visando apenas a levar um pouco de alegria e felicidade a seus familiares que o aguardam em seu rincão. E é verdadeira mágica a acomodação de tudo o que levam nos bagageiros dos ônibus interestaduais. Nada fica sobrando. Tudo comprado no Brasil, para consumo interno, incrementando o pibinho nacional.

 

Bagagem de nordestinos: moto e bicicleta também vão - Acervo Google

 

                        Agora, vejamos, em contrapartida, o que ocorre com os personagens do jet set internacional. Normalmente, é esta a pequena bagagem de quem desembarca nos aeroportos internacionais brasileiros, deixando, no exterior, o suado dinheirinho para a riqueza dos gringos: 

 

                        Há bem pouco tempo, eu presenciei, no Aeroporto de Miami, esta cena, com uma socialite brasileira fazendo seu check-in:

 

Elegância e descontração -Acervo Google 

                        O mais curioso é o fato de que, quando embarcam para o exterior, os colunáveis e outros nem tanto, mal levam a roupa do corpo, numa prática do omnia mea mecum porto. Mas, ao voltar, tchan, tchan, tchan! Tem certas malas internacionais que, perdoem-me a comparação, de tão grandes, se parecem mais com o caixão de defunto de alguém como o Shrek.

 

                        E tem mais uma. Aproveitando-se da franquia que as empresas aéreas concedem aos portadores de bagagem de mão, tem certos vivaldinos que carregam verdadeiros jacás, atopetando os compartimentozinhos que ficam sobre a cabeça da gente, com o risco de tudo aquilo despencar de lá de riba, como já soeu amiúde ocorrer.

 

                        Certo sábado, eu estava no Aeroporto Internacional de Brasília aguardando uma passageira VIP, que vinha de Miami para conhecer a Capital Federal, comigo atuando como cicerone.

 

                        Depois de mais de hora e meia de atraso, eis que o painel anunciou a aeronave no pátio! O alívio foi momentâneo. Passada mais de meia hora, ninguém aparecia no portão de desembarque. Alguém deu um certeiro palpite: – Tá todo mundo sofrendo na revista da Alfândega!

 

                        E o tempo marchou. Enfim, apareceu uma passageira, verdadeira locomotiva social, sumida atrás do carrinho que empurrava com sua imensa bagagem:

 

Acervo Google 

                        Vinte minutos depois, foi a vez da segunda socialite, esta não menos exagerada em seus ricos teréns:

 

Acervo Google 

                        Sobre o conteúdo de tantas malas, a revista Veja até esclarecera um pouco, em sua Edição nº 2304, de 16.01.13:

  

                        A espera começou a provocar certo desconforto nos circunstantes, alguns com placas indicativas de pessoas desconhecidas que aguardavam. O fato não chegou a incomodar-me, pois quando fora anunciado o primeiro atraso, eu correra até a Livraria e comprei o livro Big Jato, do Xico Sá, dando início imediato a sua leitura. Com um livro, o tempo flui que a gente nem vê!

 

                        Uma de minhas filhas, estranhando a demora para eu chegar em casa, foi ao Aeroporto saber o que acontecia, isso porque eu não carrego celular comigo. Ao me ver ali sentado, tranquilão, absorto na leitura, perguntou-me:

 

                        – Pai, sua convidada ainda não desembarcou?

 

                        Respondi-lhe, feito papagaio e repetindo o que ouvira, que ela deveria estar desvencilhando-se de problemas com a Alfândega. Minha filha, admirada com tamanha demora, insistiu:

 

                        – Pai, e quantos passageiros já saíram pelo Portão de Desembarque?

 

                        Foi a única resposta que me veio na hora:

 

                        – Meia dúzia de gatos-pingados!

 


Caindo na Gandaia terça, 28 de março de 2017

O SOCÓ E O MUÇUM - LENDA BALSENSE

 

O SOCÓ E O MUÇUM – LENDA BALSENSE

 

                        Matéria publicada no Jornal da Besta Fubana no dia 19.8.2013.

 

                        O Correio Braziliense, maior jornal da Capital da República, estampou, no domingo passado, dia 11.08.13, esta matéria:

 

“O Presidente do STF e Relator do Mensalão, Ministro Joaquim Barbosa, negou individualmente os embargos infringentes. Considera absurda a tentativa de discutir o assunto. Segundo ele, a Corte já analisou todos os argumentos trazidos pela defesa, e os advogados tentam apenas ‘eternizar’ o processo. Inconformados, os réus entraram com novo recurso, para que a palavra final seja dada pelo Plenário do Supremo.”

 

                        Diante desse combate renhido que o Ministro Joaquim Barbosa, nosso herói, vem travando contra a corrupção, e das chicanas que se antepõem à vitória da Justiça, veio-me à lembrança a época de minha venturosa infância em Balsas, sertão sul-maranhense.

 

                        Era no tempo do Rei, da Rainha, da Feiticeira, do Príncipe, da Princesa, da Fada-madrinha, do Lobisomem, do Cabeça de Cuia, do Vaqueiro, do Cantador, da Bruxa, da História de Trancoso e da Carochinha, do Mundo Encantado que povoava nossa imaginação infantil, no qual éramos introduzidos pela tradição oral do Velho Sinésio.

 

                        Em Balsas, onde não havia cinema e só duas ou três casas possuíam aparelhos de rádio, o Velho Sinésio exercia a mais bela profissão que conheci desde que me entendo por gente, a de Contador de História, praticada de porta em porta, a chamado dos respectivos pais de família, ocasião em que toda a meninada da vizinhança ali se ajuntava para ouvi-lo. A televisão ainda não fora inventada.

 

                        Eu e meus irmãos mais velhos tivemos a sorte de participar dessa maravilhada plateia. Na esquina de nossa casa, no meio da rua, havia frondoso pé de manga, embaixo do qual, à boca da noite, acendíamos uma fogueira, sentávamo-nos e éramos transportados para o mundo fantástico do Velho Sinésio, sempre que papai, Seu Rosa Ribeiro, o contratava.

 

                        O repertório abrangia não só as tradicionais histórias infantis, como também as lendas simples do sertão, quando ele abusava de sua capacidade criativa para contar-nos algumas com personagens por todos nós conhecidas, muitas delas inventadas, como esta do Socó e do Muçum. Para auxiliar a compreensão dos leitores, vou definir cada um dos personagens.

 

                        Socó - Design. comum a várias aves ciconiiformes, ger. paludícolas, da fam. dos ardeídeos, esp. dos gên. Tigrisoma, Butorides e Botaurus, de ampla distribuição, hábitos diurnos, crepusculares ou noturnos, sendo encontradas isoladas ou aos pares. Entenderam? Não? Nem eu! Por isso, aí vai a imagem:

 

Socó abicanhando a presa - Acervo Google

 

                        O socó, o martim-pescador e outros pássaros piscívoros têm um especial manejo para engolir a presa, verdadeiro malabarismo. Pescam-na como visto na figura acima. Em seguida, jogam-na para o alto, fazendo com que ela lhe caia de ponta-cabeça diretamente na goela. Jamais a engolem pelo rabo, pois até os bichos sabem que quem engole pelo rabo, enrabado será.

 

                        Muçum - Peixe teleósteo simbranquiforme, da fam. dos simbranquídeos (Synbranchus marmoratus), encontrado em rios, lagos e açudes da América do Sul; é desprovido de escamas, nadadeiras pares e bexiga natatória; a pele, amarelada nos adultos, secreta grande quantidade de muco. Em períodos de seca, vive durante meses enterrado em túneis; possui capacidade de sofrer reversão sexual. Não entenderam? De novo? Empataram comigo! Eis a figura:

 

Muçum presepeiro - Acervo Google

 

                        O muçum é o maior bagunçador de um pesqueiro. Além de não ser comestível, o fisgado enrola-se na linha, embaraçando-a toda. Isso dentro d’água. Fora, dana-se a pular e enrodilhar-se, dando o maior trabalho para tirar-lhe o anzol da boca, visto que é mais liso do que quiabo ensaboado e não morre com porrada. Para matá-lo, só mesmo com fogo. É o peixe mais resistente de todos o que já pesquei.

 

                        Isto dito, passemos à lenda contada pelo Velho Sinésio.

 

                        Na Lagoa do Maravilha, distante uma légua de Balsas, um socó tentava capturar seu almoço, mas os peixes andavam vasqueiros, não aparecia unzinho para matar-lhe a fome, até que ele viu um muçum dando sopa ali perto. Já quase morto de fome, pensou: – Vai esse mesmo! E engoliu o muça. Pela cabeça, é claro, que ele não era besta de correr o risco acima referido.

 

                        Acontece que o muçum, esperto pra caramba, não se deu por vencido: entrou pelo bico e saiu pelo fiofó. O socó, ao vê-lo dando sopa, e pensando que se tratasse de outro indivíduo muçunático, engoliu-o novamente. E outra vez o muçum saiu-lhe pelo furico. A operação ficou a repetir-se indefinidamente, isso porque o socó, por nunca encher a barriga, continuava com mesma fome lascada que o trouxera à lagoa.

 

O socó deglutindo – e expelindo – a presa

 

                        Depois de umas horas, vendo tanta fartura, o socó deteve-se um pouquinho em sua comilança e exclamou?

 

                        – Eita lagoa da peste para ter muçum que não acaba mais! Tô feito!

 

                        Resumo da ópera: adaptando-se a lenda para os tempos atuais, a socó seria a Justiça, e o muçum, os embargos infringentes, declaratórios, procrastinatórios, chicanatórios, eternizatórios, etc. e coisa e tal.

 

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Caindo na Gandaia terça, 28 de março de 2017

O SOCÓ E O MUÇUM – LENDA BALSENSE

O SOCÓ E O MUÇUM – LENDA BALSENSE

 

                        Matéria publicada no Jornal da Besta Fubana no dia 19.8.2013.

 

                        O Correio Braziliense, maior jornal da Capital da República, estampou, no domingo passado, dia 11.08.13, esta matéria:

 

“O Presidente do STF e Relator do Mensalão, Ministro Joaquim Barbosa, negou individualmente os embargos infringentes. Considera absurda a tentativa de discutir o assunto. Segundo ele, a Corte já analisou todos os argumentos trazidos pela defesa, e os advogados tentam apenas ‘eternizar’ o processo. Inconformados, os réus entraram com novo recurso, para que a palavra final seja dada pelo Plenário do Supremo.”

 

                        Diante desse combate renhido que o Ministro Joaquim Barbosa, nosso herói, vem travando contra a corrupção, e das chicanas que se antepõem à vitória da Justiça, veio-me à lembrança a época de minha venturosa infância em Balsas, sertão sul-maranhense.

 

                        Era no tempo do Rei, da Rainha, da Feiticeira, do Príncipe, da Princesa, da Fada-madrinha, do Lobisomem, do Cabeça de Cuia, do Vaqueiro, do Cantador, da Bruxa, da História de Trancoso e da Carochinha, do Mundo Encantado que povoava nossa imaginação infantil, no qual éramos introduzidos pela tradição oral do Velho Sinésio.

 

                        Em Balsas, onde não havia cinema e só duas ou três casas possuíam aparelhos de rádio, o Velho Sinésio exercia a mais bela profissão que conheci desde que me entendo por gente, a de Contador de História, praticada de porta em porta, a chamado dos respectivos pais de família, ocasião em que toda a meninada da vizinhança ali se ajuntava para ouvi-lo. A televisão ainda não fora inventada.

 

                        Eu e meus irmãos mais velhos tivemos a sorte de participar dessa maravilhada plateia. Na esquina de nossa casa, no meio da rua, havia frondoso pé de manga, embaixo do qual, à boca da noite, acendíamos uma fogueira, sentávamo-nos e éramos transportados para o mundo fantástico do Velho Sinésio, sempre que papai, Seu Rosa Ribeiro, o contratava.

 

                        O repertório abrangia não só as tradicionais histórias infantis, como também as lendas simples do sertão, quando ele abusava de sua capacidade criativa para contar-nos algumas com personagens por todos nós conhecidas, muitas delas inventadas, como esta do Socó e do Muçum. Para auxiliar a compreensão dos leitores, vou definir cada um dos personagens.

 

                        Socó - Design. comum a várias aves ciconiiformes, ger. paludícolas, da fam. dos ardeídeos, esp. dos gên. Tigrisoma, Butorides e Botaurus, de ampla distribuição, hábitos diurnos, crepusculares ou noturnos, sendo encontradas isoladas ou aos pares. Entenderam? Não? Nem eu! Por isso, aí vai a imagem:

 

Socó abicanhando a presa - Acervo Google 

                        O socó, o martim-pescador e outros pássaros piscívoros têm um especial manejo para engolir a presa, verdadeiro malabarismo. Pescam-na como visto na figura acima. Em seguida, jogam-na para o alto, fazendo com que ela lhe caia de ponta-cabeça diretamente na goela. Jamais a engolem pelo rabo, pois até os bichos sabem que quem engole pelo rabo, enrabado será.

 

                        Muçum - Peixe teleósteo simbranquiforme, da fam. dos simbranquídeos (Synbranchus marmoratus), encontrado em rios, lagos e açudes da América do Sul; é desprovido de escamas, nadadeiras pares e bexiga natatória; a pele, amarelada nos adultos, secreta grande quantidade de muco. Em períodos de seca, vive durante meses enterrado em túneis; possui capacidade de sofrer reversão sexual. Não entenderam? De novo? Empataram comigo! Eis a figura:

 

Muçum presepeiro - Acervo Google 

                        O muçum é o maior bagunçador de um pesqueiro. Além de não ser comestível, o fisgado enrola-se na linha, embaraçando-a toda. Isso dentro d’água. Fora, dana-se a pular e enrodilhar-se, dando o maior trabalho para tirar-lhe o anzol da boca, visto que é mais liso do que quiabo ensaboado e não morre com porrada. Para matá-lo, só mesmo com fogo. É o peixe mais resistente de todos o que já pesquei.

 

                        Isto dito, passemos à lenda contada pelo Velho Sinésio.

 

                        Na Lagoa do Maravilha, distante uma légua de Balsas, um socó tentava capturar seu almoço, mas os peixes andavam vasqueiros, não aparecia unzinho para matar-lhe a fome, até que ele viu um muçum dando sopa ali perto. Já quase morto de fome, pensou: – Vai esse mesmo! E engoliu o muça. Pela cabeça, é claro, que ele não era besta de correr o risco acima referido.

 

                        Acontece que o muçum, esperto pra caramba, não se deu por vencido: entrou pelo bico e saiu pelo fiofó. O socó, ao vê-lo dando sopa, e pensando que se tratasse de outro indivíduo muçunático, engoliu-o novamente. E outra vez o muçum saiu-lhe pelo furico. A operação ficou a repetir-se indefinidamente, isso porque o socó, por nunca encher a barriga, continuava com mesma fome lascada que o trouxera à lagoa.

 

O socó deglutindo – e expelindo – a presa 

                        Depois de umas horas, vendo tanta fartura, o socó deteve-se um pouquinho em sua comilança e exclamou?

 

                        – Eita lagoa da peste para ter muçum que não acaba mais! Tô feito!

 

                        Resumo da ópera: adaptando-se a lenda para os tempos atuais, a socó seria a Justiça, e o muçum, os embargos infringentes, declaratórios, procrastinatórios, chicanatórios, eternizatórios, etc. e coisa e tal.

 

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Caindo na Gandaia terça, 21 de março de 2017

O ORGASMO DOS GATOS

O ORGASMO DOS GATOS

Raimundo Floriano

 

 

 

                   Duma revista científica, dessas de sala de espera de clínica, extraí este pequeno trecho:

 

“Ferver de Ardor

A sensação intensa e aguda acompanhada de uma contração rítmica dos músculos dos órgãos sexuais é o chamado orgasmo. O nome vem do grego orgasmos, que significa ‘ferver de ardor’”.

 

                   Ferver de ardor! só se for no caso dos humanos e de outros animais – dizem que o orgasmo do porco dura 30 minutos!!! Mas, no universo gatesco, pelo menos no caso da gata, é ferver de dor!

 

                   Sexóloga felinoorgasmóloga – estudiosa do orgasmo dos gatos –, publicou resultado de suas pesquisas nas quais constatou que o gato macho, na cópula, ao alcançar o orgasmo, tem seu pênis transformado em algo espinhento, à feição de um talo de mandacaru. E que esse pênis, ao expandir-se em agulhadas, é que provoca o orgasmo da gata.

 

                   E conclui ser por isso que os felinos, quando estão orgasmizando no telhado, fazem aquela barulheira monumental, principalmente a gata que, além de espetada na penetração, leva mais aquelas outras alfinetadas lá dentro, como acima explicado.

 

 

 

                   Há algum tempo, essa cientista compareceu ao Programa do Jô, na Rede Globo. Ao expor sua esdrúxula teoria para o apresentador, este não se conteve e a interrogou com incredulidade e espanto:

 

                   – A senhora já perguntou isso à gata?


Caindo na Gandaia terça, 14 de março de 2017

O ENTERRO DO TARMENTO

O ENTERRO DO TARMENTO

Raimundo Floriano

 

 

Circo com o mastro empinado - Acervo Google

 

                        Dia desses, Chico Fogoió me ligou lá de Teresina só pra conversar miolo de pote e também relembrar algumas passagens engraçadas que presenciamos ou delas tomamos conhecimento. Dentre tantas, esta foi digna de nota.

 

                        – Mundinho, toda vez em que eu vejo um circo armado, me alembro daquela tragédia que o falecido Tira-Teima, nosso amigo, poeta e improvisador contava, e dum jeito que não tinha quem não risse!

 

                        – E qual era, Chico?

 

                        E o Chico me avivou a memória:

 

                   Um cara, que tinha o apelido de Tarmento – mistura de Tarzan com jumento –, morreu devido a tremenda crise e priapismo.

 

(Você sabe o que é priapismo? Não sabe, então consulte o Aurélio antes de continuar, até porque eu e o Chico não gostamos de falar nem de escrever palavras chegadas para o obsceno.)

 

                        No velório, embora todos tivessem o cuidado de camuflar a causa-mortis, cobrindo o defunto com um lençol, o corpo do dito cujo parecia a lona dum circo, com aquele imenso mastro no meio do corpo apontando para o alto.

 

                        Na hora de fecharem o caixão, cadê da tampa se encaixar? Ficou lá enriba do priapo, balançando, feito uma gangorra.

 

 

 

                        Aí, um dos presentes, já meio alto da cana que tomara em homenagem ao amigo morto, saiu-se com esta ideia:

 

                        – O jeito é serrar-lhe o que esta sobrando!

 

                        – E jogar fora? Mas como? Faz parte do corpo do extinto! – alguém ponderou.

 

                        E o bêbado achou logo achou a solução:

 

                        – É só serrarem-lhe o possuído e enfiar-lhe fiofó adentro!

 

                        Assim procederam.

 

                        Quando fizeram a introdução, sem vaselina nem cuspe, correram duas lágrimas dos olhos do falecido.

 

                        Aí, a viúva que, calada, a tudo assistia, não se conteve e falou:

 

                        – Eu não te dizia, Tarmento, que doía pra c@r@lho!

 


Caindo na Gandaia terça, 07 de março de 2017

O ADIVINHADOR

 

O ADIVINHADOR

Raimund Floriano

 

 

Acervo Google

 

                        O expediente matinal ainda não começara. Estávamos assinando o Ponto, quando resolvi contar um caso verídico acontecido com meu amigo Chico Fogoió – atual Assessor deste Cardinalato para Assuntos Piauizeiros. Ao terminar meu relato, todos os circunstantes, uns vinte colegas, caíram em estrondosas gargalhadas. Dona Itajacy, que estava um pouco distante, mas com as oiças ligadonas, viu-se acometida de convulsivas risadas, culminando em quase se mijar de tanto riso, segundo depois me revelou Dona Marilu, sua confidente. Foi no início dos Anos 1970.

 

                        Eu jamais esperara tal reação, principalmente por se tratar de fato real. Goiano Braga Horta foi o que mais apreciou o desfecho e aproveitou para me aconselhar:

 

                        – Raimundo, manda essa piada para o Pasquim, que ela, com certeza, será publicada na Antologia Mundial de Anedotas de Salão! Vai ser o maior sucesso!

 

                        Argumentei com o Goiano que aquilo não era piada, era apenas um flagrante da vida do Chico, mas ele continuou insistindo para que eu tentasse a publicação. Nunca o fiz, principalmente porque, naquele tempo, eu tinha o maior acanhamento de pôr minha cara – ou a bunda – na janela. Medo de que o pessoal do Pasquim me desse, como era seu costume, uma cruel espinafrada na Seção de Cartas.

 

                        Essa timidez, quase 40 anos depois, se encontra superada, graças ao Jornal da Besta Fubana, que publica tudo que se lhe remete, bom ou ruim. O julgamento fica a cargo do leitor. Em sendo assim, dispo-me agora de todo o acanhamento que me caracteriza, ofertando para vocês a oportunidade de conhecerem a saia-justa em que se viu envolvido meu fraterno piauiense.

 

                        Aconteceu em 1956. Chico Fogoió resolveu mandar-se de Teresina e cavar a melhora da vida em São Paulo. Para isso, pediu as contas no emprego, onde ganhava salário mínimo, vendeu a rede, a bicicleta velha caindo aos pedaços, um canário cantador, juntou o apurado e embarcou no pau de arara rumo à conquista do Mundo.

 

                        Na Pauliceia, a coisa não estava fácil. Hospedou-se ele numa pensão cabeça-de-porco em longínquo subúrbio e, todos os dias, dirigia-se para as portas de fábricas e de casas comerciais, na tentativa de arrumar emprego. Qualquer tipo de ocupação. E nada! O dinheirinho que levara encurtava, minguava, estava chegando a seu final.

 

                        Certa manhã, nas imediações da Praça da Sé, restando-lhe apenas uns cem cruzeiros no bolso, deu de cara com grande tabuleta pendente duma janela, com a seguinte inscrição: 

 

                        Chico Fogoió exultou! Pensou: “Pronto, estou salvo. Pago 50 cruzeiros do curso, depois jogo 50 cruzeiros no Bicho, com o dinheiro ganho invisto mais no jogo e, em pouco tempo, poderei voltar ao Piauí com a mala cheia da grana e conta milionária no Banco do Brasil!”

 

Acervo Google 

                        Subiu a escada que dava acesso ao Curso. Havia imensa fila. Chico entrou nela. Ao chegar sua vez, uma Secretária recebeu o pagamento adiantado, como previsto, e o encaminhou para a Sala de Aula.

 

                        O Professor de Adivinhação o aguardava. Mandou que ele tirasse a roupa e ficasse de quatro. Chico Fogoió estranhou aquele tipo de aula e quis insurgir-se contra a ficar nu e, mais ainda, na incômoda posição de quatro. Mas o Mestre foi incisivo:

 

                        – O senhor quer aprender a adivinhar? Então é assim! Caso não concorde, pode pegar seu dinheiro e desaparecer daqui, pois tenho outros alunos para diplomar.

 

                        Chico Fogoió resignou-se. Tirou a roupa, ficou pelado e pôs-se na posição recomendada.

  

                        O Mestre, então, destampou uma lata de vaselina sólida, tirou generosa dedada e besuntou o fiofó do Chico. Depois disso, manuseou seu enorme pingolão até ficar bem rijo, untou-o também com vaselina, após o que o aproximou em riste no rumo do bumbum do Chico, em vista do que este se virou pro Mestre e gritou:

 

                        – Peraí! Peraí! Desse jeito, tá parecendo que o senhor vai mesmo é me enrabar!!!

 

                         Ao que o Mestre respondeu:

 

                        – Pronto! Já está adivinhando! Acabou-se a aula! O próximo!!!

 


Caindo na Gandaia terça, 28 de fevereiro de 2017

NA FLÓRIDA, BOTEI GRINGO PRA CORRER

NA FLÓRIDA, BOTEI GRINGO PRA CORRER

Raimundo Floriano

 

Boeings DC 10 e 747-300, meus competentes arrochadores esfincterianos - Acervo Google

 

                        É batata! Não falha! Não sei se o fenômeno é biológico ou psicológico! Toda vez em que eu entro num avião, meus intestinos – delgado e grosso – param de funcionar! No momento da decolagem, baixa em mim o espírito do Caboco Tranca-bunda!

 

                        Essa aflição perdura por vários dias. Em vista disso, procuro fazer viagens curtas, retornando o mais rápido possível, com o objetivo de desarrochar o fiofó em casa. Nas mais recentes que fiz, ao Recife, a Balsas e a São Luís, demorei, no máximo, três dias. Para estadias mais longas, procuro acautelar-me, levando na bagagem vários vidros de laxante.

 

                        Assim aconteceu na última viagem que fiz aos Estados Unidos, mais precisamente para Orlando, aos Parques da Disney, em 2001, presente para minha filha mais nova, que completava 15 anos.

 

                        Quando entrei o DC-10 da Varig, de Brasília para São Paulo, senti o tranco no bucho. Não foi novidade. De São Paulo para Miami, num 747-100 também da Varig, eu só conseguia expelir alguma coisa por vias urinárias. Durante o voo, quase todo sobre o Oceano Atlântico, e até desembarcar em Miami, fui logo me preparando para o suplício estomacal, tomando umas três lapadas de Agarol, o mais eficiente laxante que conheço.

 

                        Em Miami, deram-nos a notícia de que seguiríamos em aviões diversos até Orlando. Minha família embarcou num jatinho, e eu fui encaminhado para uma velha aeronave, de hélice, Modelo ATR-14, como aí vocês veem:

 

O ATR-14 americano - Acervo Google 

 

                        Já gostei da mudança. Avião de hélice, em especial o bimotor, dificilmente cai. Para minha tranquilidade, antes do embarque, vi as tampas dos motores abertas e dois sujeitos com chaves de fenda e almotolias apertando parafusos e lubrificando engrenagens, o que me tirou, por completo, o medo da viagem.

 

                        ATR-14 era antigo mesmo, com a pintura meio descascada, bancos puídos, mas o ronco era de respeito. Que saudades de meus tempos de DC-3 da Cruzeiro do Sul! A aeromoça era uma creole americana, bem-nutrida, de seus 60 anos.

 

                        Tentei pegar no sono, mas não consegui. Apanhei uma revista, mas, quando comecei a folheá-la, dei uma olhada lá pra baixo, querendo apreciar a paisagem, e espantei-me ao ver que voávamos sobre o mar. Se assim fosse, o piloto errara o caminho, estávamos era voltando para o Brasil. Resolvi interpelar a colored. Quando ela passou por mim, com um litrão de Coca-Cola e copos de plástico, apontei para o aguaceiro abaixo e, no melhor do meu Inglês, interroguei-a:

 

                        – The book is on the table? – Ela me encarou, com jeito de aborrecida e apenas falou:

                        – What? – Voltei a apontar para o mar abaixo e repetir a pergunta:

                        – The book is on the table? – Aí, a stewardess respondeu-me, com ar de desprezo:

                        – Ocaxôubi! – Só mais tarde, vim a saber que o tal oceano que sobrevoáramos se tratava do Lago Okeechobee!

 

                        Lá em Orlando, reunida a família, começamos a visitar os Parques programados no pacote turístico, meu povo se divertindo a valer, e eu, desesperadamente, a mandar pra dentro quatro doses diárias de Agarol. 

                        Com uma semana lá, a atração era o Parque Wet’n Wild, que fica numa avenida muito maior que o Eixão de Brasília, denominada International Drive.

 

 

                       Parque Wet’n Wild - Acervo Google 

                        Passaríamos o dia inteirinho lá. Enquanto meu pessoal se deleitava nos diversos brinquedos e atrações, aproveitei para fazer as compras da extensa lista de encomendas de parentes e amigos. E no propósito de conseguir, para minha caçula, uma versão gigante do boneco Piu-Piu, que lá eles chamam de Tweety.

 

                        Ao sairmos do hotel, para precaver-me contra a ausência de alimentos para diabéticos em todo lugar do mundo, eu pegara duas maçãs e uma salsicha de frango e enfiara na pochete fornecida pela companhia turística.

 

 

Piu Piu, ou Tweety - Acervo Google 

                        Fui às compras a pé. No calorão da Florida, todas as lojas permanecem com suas portas fechadas, mas, lá dentro o ar condicionado funciona, no mais alto grau, tornando o ambiente completamente gelado. De fora, você vê aquele avenidão deserto, numa segunda-feira, parecendo com qualquer casa comercial brasileira em dia de domingo, porém, quando entra nas lojas, elas estão apinhadas de gente.

 

                        Eu já tinha comprado um aparelho de Fax, cordas pra violão, bocal de saxofone e outras miudezas e ia caminhando cabisbaixo no calçadão, sopesando aquelas quinquilharias, quando quase abalroei uma jovem família de americanos, o pai carregando no ombro um boneco gigante do Piu-Piu. Do tamanho que eu procurava. Não contive meu júbilo. Olhei para o gringo, apontei para o boneco e perguntei:

 

                        – The book is on the table? – Esse cara me pareceu mais inteligente que a aeromoça, pois me entendeu sem pestanejar. Botou o indicador em direção duma loja amarelona e me informou:

 

                        – Over There!

 

                        Nem agradeci! Rumei apressadamente para a loja, porém, ao entrar, grande decepção: a fila era extensa, e o estoque de bonecos estava se acabando na prateleira. Além do mais, com americano é assim, se você estiver numa fila, na boca do caixa, e chegar um deles, o cara passa pra sua frente numa boa. Contei as pessoas na fila, os bonecos, calculei que, com imensa sorte, ainda conseguiria o meu, e resolvi encarar a empreitada. Prestes a ser atendido, entrou porta adentro uma turminha de americanos, meninada barulhenta, que foi logo se postando na dianteira de todo brasileiro que via. Pensei: dei com os burros n’água! Para consolar-me, e como estava com fome, resolvi almoçar ali mesmo na fila. Peguei a salsicha de frango que trouxera na pochete, começando a comê-la. E foi aí que se deu a desgraceira!

 

                        No que o primeiro naco bateu lá dentro, meu estômago, que não funcionava há uma semana, resolveu agir, atender aos apelos do poderoso laxante! Formou-se dentro de mim um bolo de gases que subia, descia, ia prum lado, ia pro outro, até que tomou o rumo certo e se transformou numa prolongada, mas silenciosa bufa. Fedorenta, podre, quase mortal, durando cerca de um minuto, impregnando, no ambiente gelado, tudo e todos os que se encontravam no interior da loja.

 

                        Foi uma parada pra desmantelo! Espirrou gringo pelas portas da loja, como o diabo fugindo da cruz, todos eles tapando as ventas e gritando oh me, oh my! Só ficaram lá dentro os empregados e alguns brasileiros que também queriam o boneco e não estavam nem aí para a bufa. Fiquei sendo o primeirão da fila. 

 

                        Quando a vendedora falou next! – Apontei-lhe o boneco e perguntei: 

                        – The book is on the table? – A americana entendeu logo o que eu queria, pois me respondeu na lata, sem respirar:

                        – Fifty dollars! But if you go away now, immediately, it’ll be free of charge to you! Do you go? Please?

 

                        Minha cara avermelhou! Como que a gringuinha descobrira ter sido eu o bufador? Naquela circunstância, restava-me, apenas, assentir, o que fiz com esta bem elaborada frase:

 

                        – Oh, yes, I do! 

                        Saí de lá com o Piu-Piu sem gastar um puto e pensando assim: 

                        – Eita povo bom da mulesta!

 

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Caindo na Gandaia terça, 21 de fevereiro de 2017

NA COPA DE 1974, QUASE ME BORREI DE MEDO

NA COPA DE 1974, QUASE ME BORREI DE MEDO!

 

Acervo Google 

                        Aconteceu no dia 3 de julho de 1974, data em que eu completava 38 anos! Naquele dia, o Brasil jogaria contra a Holanda, então conhecida como Laranja Mecânica!

 

                        A Seleção Brasileira já entrou na Copa/74 derrotada. Sem contar com os craques Carlos Alberto, Brito, Clodoaldo, Gerson, Tostão e Pelé, que nos maravilharam na conquista do Tri, em 1970, surgia uma geração de perdedores, que só levantaria a cabeça 24 anos depois, em 1994, com a genialidade de Romário e Bebeto, ao sagrarmo-nos Tetra. Em 1974, ficamos em 4º lugar.

 

                        Mesmo com o Brasil praticamente entrando em campo para cumprir tabela, a Banda da Capital Federal fez a festa do povão nos três primeiros jogos, porque nosso objetivo era a alegria das ruas, a presepada, a aprontação, a paquera, com nossas marchinhas, sambas e frevos, coisas das quais os brasileiros tanto gostam, não importando o resultado em campo.

 

                        Empatamos o primeiro jogo em 0x0 com a Iugoslávia; o segundo, também sem abrir o placar, com a Escócia; ganhamos do Zaire por 3x0, passando para a 2ª Fase. Nesta, ganhamos da Alemanha Oriental por 1x0 e da Argentina por 2x1. Aí, tivemos de encarar a Holanda, que vinha comendo todo mundo pelas beiradas.

 

                        Aquele 3 de julho caiu numa quarta-feira.  Como a partida terminaria já na boca da noite de um dia útil, combinamos que, na hipótese de sairmos vitoriosos, o desfile seria no Guará I, com a Banda se reunindo na QI 12, Conjunto U, daquela satélite, onde eu residia.

 

                        Desfilariam como Porta-Estandartes, naquela noite, Graça Souza, minha colega na UDF, e Edna Neves, filha do Sebastião, trombonista da Banda, de quem passarei a falar.

 

                        Sebastião Francisco Neves tocava escaleta, sanfona e qualquer instrumento de bocal. Mineiro de Belo Horizonte, pertenceu, na graduação de 3º Sargento, às Bandas de Música da Polícia Militar de Minas Gerais, do 12º Regimento de Infantaria e do BGP – Batalhão da Guarda Presidencial. Conhecemo-nos na caserna, ainda nos tempos pioneiros de Brasília.

 

                        Intelectual de vasta cultura, foi aprovado em todos os concursos que fez. Assim, no início dos Anos 1960, deixou o Exército, indo pertencer aos quadros da NOVACAP – Companhia Urbanizadora da Nova Capital, e, depois, do Itamaraty, como Oficial de Chancelaria. Bacharelando-se em Ciências Contábeis, passou no concurso para Fiscal de Tributos do Estado de Goiás, cargo no qual se aposentou.

 

                        Sebastião pertenceu ao efetivo permanente da Banda da Capital Federal desde sua fundação, em 1972, e, para todos os desfiles ou funções, levava suas três filhas, Edna, Vera e Vilma.

 

                        Foi um grande amigo, e seu falecimento, a 23.8.2001, aos 70 anos de idade, vítima de câncer de pele – era quase albino e viveu muito exposto ao sol –, entristeceu não só a mim, mas a todos aqui em casa, porque pertencia a nosso círculo familiar. Meu abalo foi tamanho que, em seus funerais, no momento em que baixavam seu caixão ao túmulo, não me contive e pronunciei breve despedida, emocionando a todos, não conseguindo também eu conter as lágrimas.

 

                        Sebastião era pessoa com quem eu contava na certa para todos os movimentos musicais que bolava e, por isso mesmo, era acolhido por nós com muito calor humano. E era em nossa casa que ele se sentia bem. No Natal, por exemplo, após a ceia com sua família, era certa sua vinda para cá – morávamos em Quadras vizinhas –, com o trombone ou a escaleta, para continuarmos a festa até o raiar do dia. Assim era nos aniversários e nas demais datas festivas.

 

                        Nunca vi o Sebastião pronunciar uma palavra negativa a alguém! Sempre que começava qualquer frase, era com esta expressão: – Pois é!

 

                        Em certa noite, depois do Natal de 1980, quando eu ainda era solteiro, Sebastião e eu estávamos em minha garçoniere, na 416 Sul, combinando o que faríamos nas festividades vindouras, quando chegou meu sobrinho Pedro Ivo, que vinha se despedir, pois estava saindo de viagem, em seu fusca, para o Maranhão, onde ia se casar, e lamentando o fato de ter que enfrentar a estrada sozinho, sem companhia para conversar ou ajudá-lo durante o percurso. Perguntei ao Sebastião se ele topava acompanhá-lo, e ele aceitou no ato.

 

                        Combinamos, então, que ele iria e ficaria me esperando em Balsas, aonde eu chegaria no dia 30, para tocarmos no Réveillon.

 

                        Imediatamente, Sebastião foi a sua casa, apanhou o trombone e a escaleta, e os dois pegaram a estrada. Mas tão desligado era ele, que seguiu com a roupa do corpo, nem se lembrando de calçar os sapatos, de forma que, no casamento do Pedro Ivo, lá estava ele de chinelos.

 

                        Em Balsas, tocamos no Réveillon do CRB – Clube Recreativo Balsense, e, no dia seguinte, numa farra com amigos na Churrascaria Batatais.

 

                        Sebastião partiu desta vida em 2001, mas meu contato e minha amizade com sua família permanecem inalterados. No mês de julho de 2006, em meu Forrozão/70, dancei com 25 damas, dentre elas a Vera – companheira inseparável do pai aonde quer que ele fosse – e a Alice, filha desta e sua neta.

 

                        Falemos, agora, no grande susto que levei na Copa de 1974, chegando às raias de perder a dignidade. Mas, primeiro, quero esclarecer-lhes um pormenor. Das duas coisas que eu mais tenho medo no mundo, a segunda é cachorro. De tal modo que, quando chego à casa de qualquer pessoa que tem a fera, vou logo cantando este refrão da axé-music: – Segure o cão! Amarre o cão! Segure o cão, cão, cão, cão, cão! A primeira é de alma do outro mundo. Nunca vi qualquer delas, mas tenho tal pavor que me pelo, pois que las hay, las hay!

 

                        Voltemos ao 3 de julho de 1974, dia do jogo do Brasil com a Holanda!

 

                        Era no tempo do calor humano na Câmara dos Deputados, quando havia congraçamento entre os funcionários. No Departamento de Administração, onde eu era lotado, comemoravam-se todos os aniversários. Naquela quarta-feira, levei para minha festa um panelão de vatapá, outro de marizabel, preparados por minha Comadre Maria Júlia, cinco frangos assados, comprados num galeto, e refrigerantes.

 

                        Mal começara o ágape, um dos colegas apareceu com uma garrafinha cheia de líquido que, segundo declarou, os passarinhos de sua casa não quiseram beber. Experimentei-o, era de meu agrado, e foi só o que tomei durante a congratulação.

 

                        A seu término, rumei para minha garçoniere, no Guará I, sentindo-me já um pouco baleado pela água que os passarinhos rejeitaram. Ao chegar, liguei a TV e, sozinho, assisti ao jogo, tomando lapadas de água ardente a cada gol que levávamos. Terminado o jogo, deitei-me, bem mareado, ali mesmo no sofá da sala, e peguei no sono. Sono profundo!

 

                        Mais ou menos às 9 da noite, bateram insistentemente em minha porta. Levantei-me um tanto estremunhado e, ao abri-la, dei de cara com o Sebastião e a Vera, que deveria ter em volta de 10 anos na época.

 

                        Recebi-os, como era de boa educação, mas pê da vida por terem me acordado. E a conversa fluía sem graça, cada qual sem assunto, eu querendo que eles se mandassem dali. De repente, outras pancadas na porta. Fui abrir e quase morro de susto: dei de cara com o Sebastião! Olhei para ele, que ria, olhei para o sofá, e lá estava ele, também rindo! Naquele momento, me arrupiei todo e pensei:

 

                        – É abantesma! É alma!

 

 

                        E fui amarelando, desfalecendo, quase me estatelava no chão, não fosse a rápida ação do Sebastião que me segurou e gritou, para acalmar-me:

 

                        – Aquele ali é o Geraldo, meu irmão gêmeo!

 

                        Durante quase 15 anos em que nos conhecíamos, ele jamais me falara que tinha esse irmão. Geraldo era Sargento na Banda de Música da PM Mineira e outro presepeiro de marca maior. Para se ter ideia, possuía um coreto em frente a sua casa no bairro belo-horizontino onde morava.

 

Os dois irmãos engemados 

                        Passado o susto, resolvemos esticar a noite, festejando o resto de meu aniversário. Saímos do Guará I e rumamos para o Plano Piloto, onde só deparamos com ruas desertas, o que nos fez dirigirmo-nos para o Centro Comercial Gilberto Salomão, point dos boêmios e da juventude naquela época.

 

                        Chegando àquele shopping, ocupamos mesa na calçada dum barzinho quase lotado, fizemos nossos pedidos e, sem solicitar permissão, iniciamos o show, com o Sebastião na escaleta, o Geraldo no violão e eu no cavaquinho, os dois últimos no vocal, auxiliados pela Vera e trovadores eventuais, entoando repertório totalmente voltado para canções seresteiras da Velha Guarda. Foi sucesso retumbante! Dali pra frente, os aplausos e pedidos de bis eram consagradores, sendo o hit mais reprisado – para o público novidade – a valsinha Seresta, de Alvarenga, Ranchinho e Newton Teixeira, composta em 1940.

 

                        Geraldo veio a falecer no ano retrasado, em Belo Horizonte, aos 82 anos de idade. Em homenagem a esses dois amigos e também para relembrar aquela belíssima noite em que, há 40 anos, conseguimos, com nossa música, levar alegria para grande número de brasilienses entristecidos pela derrota na Copa, conto aqui esse episodio, para perenizá-lo na memória de quem o leia.

 


Caindo na Gandaia terça, 14 de fevereiro de 2017

MODERNIDADE NA CASA DO TIO TRUTO

MODERNIDADE NA CASA NOVA DO TIO TRUTO

Raimundo Floriano

 

 Sentina modernosa

 

                        Aconteceu no ano de 1956. A notícia explodiu em Floriano como bomba atômica, de efeito avassalador:

 

                        – A casa nova que Seu Truto – meu tio – acabou de construir em Teresina tem uma sentina dentro dela!

 

                        Naquele tempo, ainda não existia apartamento no Piauí, e todas as residências tinham no quintal uma casinha ou um cercado de madeira ou de talos de buriti, a dita sentina, na qual os moradores satisfaziam suas necessidades mais urgentes e inadiáveis.

 

 

 

                        Sob a administração da Tia Loura, mulher do Tio Truto, e com financiamento da Caixa Econômica Federal, que exigiu planta assinada por arquiteto ou engenheiro, a casa fora apetrechada de instalações sanitárias condizentes com o progresso que começava a chegar nas terras piauienses.

 

                        Tia Marinaura, irmã de papai e do Tio Truto – solteirona, que não tolerava ser chamada de tia –, alta funcionária dos Correios e Telégrafos em Floriano, esteio dos irmãos, que ajudara quase todos os sobrinhos nos estudos e na formação – inclusive eu –, convocou uma reunião familiar para debater o assunto, motivo de censura para todos os parentes, em particular, e para o povo da cidade, em geral. Ficou deliberado que o Comandante João Bínaco – Tio João Binho –, o caçula, em suas viagens pelo Rio Parnaíba com o Motor João Ferrão, ao dar a passadinha de sempre na casa do Tio Truto, de quem era afilhado, para tomar-lhe a bênção, averiguasse o boato e, na volta, fizesse um relatório circunstanciado, confirmando ou desmentindo tamanho disparate.

 

                        Com o retorno do Tio João Binho, Tia Marinaura convocou nova reunião, sob sua presidência, para ouvir a explanação do Comandante, da qual participaram os seguintes membros: Tia Juliana, Tia Olivinha, Tia Onedina e Pedro Barbalho, seu filho, além do Relator. Este iniciou sua exposição narrando o que testemunhara in loco, ou seja, confirmando tudo e causando verdadeiro espanto em todos os presentes, que externaram suas dúvidas: como ficaria a convivência com o odor natural de qualquer sentina?; qual seria a reação dos demais moradores se um incontido flato de maior sonoridade escapulisse daquela dependência?; como seria feita a limpeza após o uso, vez que nos quintais florianenses a faxina ficava a cargo das galinhas e dos porcos, para isso criados à solta?; usava-se o costumeiro sabugo para a limpeza corporal?

 

                        O Relator nada esclareceu, alegando que apenas averiguara o fato, mas não tivera a coragem de aliviar-se “naquilo”. Um dos presentes indagou se tal dependência também seria usada para as pessoas se banharem. A resposta positiva do Relator só fez mesmo foi aumentar o escândalo e a perplexidade que afligiam todo o clã.

 

                        Diante da cruel realidade, Tia Marinaura, não contendo sua irreprimível indignação, deu por finda a assembleia, dissolvendo-a com esta exclamação:

 

                        – Isso só pode ser invenção da Loura, pois o Truto não seria capar de fazer tamanha besteira!

 

(Episódio narrado por um dos filhos do Relator, o primo Mairton, que, escondido atrás duma porta, a tudo testemunhou.)

 

 


Caindo na Gandaia terça, 07 de fevereiro de 2017

ESCATOLOGIA COPROLÓGICA

ESCATOLOGIA COPROLÓGICA

 

(Esta nauseabunda (epa!) matéria, escrita em 1991, foi, por motivos óbvios, recusada pelo Correio Braziliense, Jornal da ASCADE, Voz Ativa, Jornal do Brasil, O Globo e muitos outros. Persistindo, no entanto, as razões que a provocaram (epa!), foi reescrita e assim publicada, em 12.9.1993, pelo Diário de Alagoas. Hoje, 14.6.2010, decorridos 17 longos anos, e supondo que tal situação não mais exista, transcrevo-a aqui no Jornal da Besta Fubana, com a devida revisão.)

 

 

Anexo IV: o Edifício Kodak - Acervo Google

 

                        Escatologia e coprologia são termos que se equivalem. Compreendem ambos o ramo do conhecimento humano que trata do estudo dos excrementos, das fezes. Por conseguinte, o tema aqui ventilado nada tem de perfumoso. A não ser para quem gosta! Epa! Rimou?

 

                        Se Pero Vaz de Caminha retornasse ao Brasil, neste ano de 1993, e resolvesse conhecer Brasília, mais precisamente o Congresso Nacional, e, percorrendo o Anexo IV da Câmara dos Deputados – aquele prédio cuja cor, dizem, Oscar Niemeyer denominou amarelo-kodak, frequentado por eleitores de todos os rincões do País, em busca de audiência com seu parlamentar –, necessitasse (epa!) fazer uso de umas das instalações sanitárias de qualquer dos seus andares, excetuados o subsolo e o térreo, cuja população é composta só por funcionários da Casa, na certa, após aliviar-se (epa!) da sua bagagem gástrica, escreveria, atônito, ao Rei de Portugal, Dom Manuel, o Venturoso:

 

                        – Os visitantes-do-prédio-kodak não sabem acionar o autoclismo ao saírem da retrete! (Tradução: não sabem dar descarga depois de usarem a latrina!).

 

                        Com efeito (epa!), é um espanto!

 

                        Na parte da manhã, o ambiente é tolerável, pois ali remanescem os benéficos resultados da faxina executada na véspera, à noite, pelo dedicado pessoal da Limpeza. Mas vá lá às três da tarde, se quiser se empanturrar de sufoco, nojo e entojo. São vasos e mais vasos cheios, às vezes até os beiços, de material fecal e urina, tudo se esparramando pelas louças e pelo chão, dedadas marrons nas portas e paredes, uma fedentina insuportável, papel espalhado por todos os quadrantes. Descarga? O que que é isso?

 

                        Um Presidente da República da época – depois disso, e não por isso, defenestrado do Palácio do Planalto –, em vibrante pronunciamento no estado de Goiás, bradou aos microfones que o povo brasileiro estava de saco cheio. Ah! Bom! Então é por isso que os visitantes-do-prédio-kodak esvaziam o seu em qualquer espaço daquele aliviador (epa!) recanto.

 

                        Pero Vaz acharia que tais requintes de imundície são privativos (epa!) apenas dos visitantes. E com razão, porque aos parlamentares e funcionários são destinados compartimentos exclusivos em cada gabinete.

 

                        Acrescente-se que a Segurança, em que pese todo o rigor, não pode – dentro da liberalidade que reina naquela Casa do Povo, e exigida pelos próprios deputados –, impedir que pessoas estranhas fiquem por lá a perambular, quer portando sacolas, esmolando, vendendo obras (epa!) literárias, ou, simplesmente, apertadas (epa!) procurando um cantinho para poderem se acocar.

 

                        O Escrivão da Armada acrescentaria:

 

                        – E tanto faz, Rei Meu Senhor, se é na sentina dos homens ou das mulheres, dos mancebos ou das donzelas, dos raparigos ou das raparigas! Isso porque, nos reservados dos visitantes-do-prédio-kodak, a sujidade é unissex.

 

 

                        Bocage, o mais irreverente poeta da Literatura Lusitana, tem a si atribuídos, pelos cordelistas nordestinos, estes versos, ao deparar com uma latrina em condições análogas:

 

                        Quem exerce na privada

                        Porém nunca acerta dentro

                        Ou tem a bunda quebrada

                        Ou o bumbum fora de centro

 

                        Pensando bem, é mesmo uma questão de prumo.

 

                        Há uns que têm aquilo soft. Um Presidente da República, no discurso acima aludido, declarou que tem aquilo roxo.

 

                        Pois bem, os visitantes-do-prédio-kodak têm aquilo torto!

 

Visitante-do-prédio-kodak: alívio!

 

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Caindo na Gandaia terça, 31 de janeiro de 2017

DIA DO BOM VIZINHO

DIA DO BOM VIZINHO

 

Acervo Google

 

                        Esta matéria deveria ter ido ao ar no dia 23 de dezembro de 2013, data consagrada na Folhinha como o Dia do Vizinho. Atropelada por outros assuntos mais prementes, como o Réveillon e o Dia de Reis, só hoje, 14.2.2014, é publicada, mas com a necessária explicação: na convivência social, todo dia do ano é também Dia do Bom Vizinho.

 

                        Isso posto, passemos aos fatos!

 

                        Em certa madrugada do mês de agosto de 2013, o morador do Ap. WWW, parede-e-meia com o nosso, o XXX, andou arrumando suas malas para uma viagem que aconteceria logo mais, e a movimentação, obviamente, provocou um pouco de barulho, mas nada que nos incomodasse do lado de cá.

 

                        No dia seguinte, fomos surpreendidos com esta Ocorrência registrada no Livro do Condomínio por inquilino, morador do Ap. YYY, embaixo do nosso:

 

“Senhora Síndica. Solicito sua intervenção junto aos moradores do Ap. XXX, no sentido de reduzirem seus barulhos intensos como derrubada muito ruidosa de objetos e arrastar de móveis. Isto ocorre principalmente nos fins de semana, a partir das 6h da manhã. Impossibilita descanso.”

 

                        Não satisfeita com isso a reclamante passou a interpelar-nos pessoalmente, dedo em riste, sem ao menos averiguar quem lhe causara tanto desconforto, o que me levou a registrar, no mesmo Livro, esta defesa:

 

                        “Brasília, DF, 17 de agosto de 2013.

 

                        Senhora Síndica,

 

                        – Deus te livre da praga do mau vizinho!

 

                        Esta era uma das rogativas do Cego Adriano, lá no sertão sul-maranhense, em meu tempo de menino, cada vez que recebia qualquer dádiva.

 

                        Já se vão mais de setenta anos. Na época, a criançada, que morava em casas não geminadas, cujos pais conviviam na mais perfeita harmonia com os moradores das redondezas, socorrendo-se, ajudando-se e, às vezes, sofrendo mutuamente, não compreendia bem o sentido das palavras do cego. Mas ele, cantador e cordelista, homem estudado e viajado, explicava-nos:

 

                        – Quando Deus andou no mundo, estando um dia à sombra duma figueira, onde a caravana havia feito alto para o descanso dos apóstolos, e vendo Cefas Simão sentado numa grande pedra, teria exclamado: “Levanta-te daí, Cefas Simão, porque, há duzentos mil anos, sentou-se nessa mesma pedra um mau vizinho!”

 

                        A narração me impressionou por demais. E, quando entrei para o Catecismo, ao aprender quais eram os Dez Mandamentos da Lei de Deus, acrescentei o 11º: Ser bom vizinho! Sob pena de, ao deixar a existência, ir padecer no fogo do inferno!

 

                        E venho cumprindo à risca esse preceito. Nos dois blocos de apartamento em que morei, na 416 Sul e neste, fui aprovado em meu comportamento gregário, o que comprovam os convites recebidos para ser síndico, tanto lá, quanto aqui.

 

                        Resido neste Bloco, com minha família, há 18 anos. Aqui, criamos nossas filhas, demos-lhes educação para conviver com a sociedade, em geral, e com os vizinhos, em particular. Hoje, temos duas moças formadas, bem orientadas na vida, exemplo para todos os pais de família de nossa Comunidade.

 

                        Este prédio não possui isolamento acústico, fazendo com que uma festinha de aniversário no Ap. AAA seja ouvida até no Ap. ZZZ. Aproximando-se um pouco mais, ouvem-se o bater duma porta, o fechar duma gaveta, a descarga dum vaso. A pequena distância, podem-se ouvir tapas e beijos e até gemidos e sussurros na hora do amor.

 

                        Os bons vizinhos – tais como nossa família – a tudo relevam, mesmo por empatia, pois o receptor de ruído de hoje pode ser o barulhento de amanhã. Isso é o que os americanos chamam de política da boa vizinhança.

 

                        A Moradora do Ap. YYY, em sua reclamação, motivo desta correspondência, poderia ter melhor averiguado a origem do barulho que a incomodou sem, açodadamente, identificar nosso apartamento como seu causador. Na verdade, o ruído foi originado em outra unidade, vez que seu morador estava arrumando as malas para viajar. E isso não durou por toda a noite. Daqui, ouvimos toda a operação, mas, adotando a empatia e a compassividade, ignoramos o fato, levando em conta, também, que tal morador é um dos mais silenciosos do prédio.

 

                        O desassossego da Moradora do Ap. YYY persiste, embora tenhamos adotado todas as providências para não a incomodar. Agora, suas recriminações já não mais se limitam às páginas deste livro. São-nos dirigidas pessoalmente.

 

                        E isso faz com que nos transformemos todos em vítimas de cruel paranoia. De um lado, nós, do XXX, tomando todas as precauções no sentido de preservar o bem-estar da Reclamante, patrulhando-nos 24 horas por dia, pisando em ovos, como se diz. Enquanto isso, do outro lado, a Reclamante parece – repare bem, eu disse parece – estar a policiar-nos, atenta a qualquer som que provenha de nosso lar até mesmo o de um flato mais forte descuidadamente escapulido. 

 

                        Isso pode levar qualquer um à instabilidade emocional! Deus, no entanto, é maior, é Pai, e nos ajudará!

 

                        No intuito de solucionar o problema, sugiro a criação de uma Comissão de Moradores que passe, sem avisar-nos, uma noite no Ap. YYY, observando nosso comportamento, para depois emitir um laudo com sugestões que acataremos, contanto que não seja mudarmo-nos para outro local.

 

                        Não há erro sem solução, não há solução sem defeito e não há defeito que não possa a qualquer tempo ser corrigido.

 

                        O Correio Braziliense de hoje traz, em seu caderno Cidades, página inteira intitulada Meu Vizinho, Meu Irmão, enfatizando que “a convivência com quem mora na casa ou no apartamento ao lado, por vezes, transforma-se em um laço duradouro”. E conta três histórias de pessoas que descobriram, bem pertinho, amigos para a vida inteira.

 

                        Está em nós a possibilidade de sermos assim também!

 

                        Em nome da Boa Vizinhança, subscrevo-me,

 

                        Atenciosamente,

                       

                        Proprietário e Morador do Apartamento XXX.”

 


Caindo na Gandaia terça, 24 de janeiro de 2017

DESTRANCAI O FIOFÓ

DESTRANCAI O FIOFÓ! 

 

Sofisticada sentina sertaneja

 

                        A sentina – casinha, latrina, privada – é a dependência mais importante de qualquer tipo de habitação. Pelo aspecto da sentina de uma residência, tenho a noção exata da boa ou má educação de seus moradores. Pela apresentação da sentina de um hotel, concluo de quantas estrelas ele é, realmente, merecedor.

 

                        O fato que agora lhes narro aconteceu quando eu tinha 10 anos, verdade verdadeira, eu juro, sem cruzar os dedos!

 

                        Chilim – assim o chamávamos –, um de meus nove irmãos, 6 anos mais velho do que eu, estudante e Carteiro em Floriano (PI), encontrava-se de férias em Balsas, nossa terra natal, sertão sul-maranhense. Para dar continuidade a este meu emocionante relato, tenho que discorrer um pouco sobre a personalidade desse querido irmão.

 

                        Bom filho, bom amigo, bom irmão, Chilim era nosso exemplo, nosso espelho. Bonito, alto, jogador de futebol, namorador, forte, jamais apanhou ou deixou que apanhássemos na rua. Fazia-nos brinquedos de buriti – caminhão, jipe, lancha, vapor, barca, avião – e dava-nos presente quando vinha de férias. Por isso, todos nós – seus irmãos menores e a molecada de nossa rua – queríamos ser um Chilim quando crescêssemos.

 

                        Eu mesmo, até quando me foi possível, segui seus passos por muito tempo. Ele estudou em Floriano, eu também; saiu do Piauí para cursar a EsSA – Escola de Sargentos das Armas, eu também; foi promovido a 3º Sargento, do Exército, eu também; aproveitou as escassíssimas horas de folga da caserna para estudar, eu também; deixou a vida militar para assumir cargo mais alto na vida civil, eu também; teve umas 30 namoradas quando solteiro, eu também; ao dar baixa do Exército, foi promovido a 2º Tenente da Reserva, eu também; sempre se vangloriou pelos longos anos de bons serviços prestados à Pátria, eu também.

 

                        Talvez por ter saído pela primeira vez de Balsas a bordo do vapor Chile, e nele retornado nas primeiras férias, ou por Dona Maria Bezerra, nossa santa e saudosa mãezinha, tratá-lo, carinhosamente, de Chilim, nós, seus irmãos mais novos, acabamos por adotar esse epônimo.

 

                        Como eu ia dizendo, Chilim encontrava-se de férias em Balsas. Dormíamos todos os seis irmãos homens num quarto grande, com cinco redes armadas – uma em cada canto e uma no centro – e uma cama Patente.

 

                        Certa manhã, ao levantar-se, ele olhou em direção à minha rede, viu que eu estava acordado, e falou:

 

                        – Raimundo, este ano, eu não caguei nem uma vez! – E saiu do quarto.

 

                        Aquilo me deixou com a cabeça fervendo, perturbada, atrapalhada. Como seria possível? Será que lá em Floriano, cidade adiantada, não existia sentina? Se não havia sentina, então era bem capaz de que o povo de lá não fizesse cocô. Sendo ele para mim um espelho, resolvi imitá-lo. Raciocinei: se ele aguentou, eu também aguentaria! Bastava não ir à nossa sentina, e pronto! Aos 10 anos, eu desconhecia completamente as funções biológicas do corpo humano, caso contrário, nem pensaria em tamanho despautério.

 

                        Acontece que, ao tomar aquela resolução, eu já estava um pouco com a bala na agulha, soltando umas bufas e uns peidinhos que, no dizer do conterrâneo Guarda-fios Zé Catarina, são telegramas anunciando que o tolete vem atrás.

 

                        Meu quebra-jejum naquele dia foi o típico do sertão balsense: café torrado e pilado em casa, leite mungido, beiju ensopado de azeite de coco e bolo frito, fritado na banha de porco. Saí da mesa começando a sofrer as ânsias do descarrego, mas pensei: – À tarde, eu já me acostumei!

 

                        Às 11 horas, fomos todos banhar no Porto do Martim. Havia ali, do lado direito, um matinho, cheio de goiabeiras e pés de ata, onde muitos aliviavam seus intestinos, deixando as sementes e os estrumes para adubo. Daí, as fruteiras. Outros usavam como privada o próprio Rio Balsas. Não utilizei qualquer dos dois, mas a cólica começava a apertar; do umbigo pra baixo, a dor era quase insuportável.

 

                        Retornamos para o almoço: baião de dois, picadinho de carne seca e macaxeira, galinha ao molho pardo e frito de linguiça. Na sobremesa, doce de buriti com requeijão. Banquete irresistível, mas quase não trisquei na comida, e, ao deixar a mesa, já estava mesmo era vendo assombração. No bucho, uma trovoada apavorante!

 

                        Às 4 horas da tarde, completamente dominado pela revolução que se operava dentro de mim, com pipocos, roncados e rangidos, procurei o dito irmão que, até aquele momento, desconhecia minha desvairada resolução. Fui logo perguntando:

 

                        – Chilim, como foi que você conseguiu passar o ano todinho sem cagar?

 

                        E ele: – Quem foi que falou isso?

 

                        Gritei: – Você!

 

                        – Falei isso não! – Respondeu-me.

 

                        – Falou sim. De manhã, quando se levantou da rede, você falou que este ano não cagou nem uma vez!

 

                        Ele aí, rindo-se da esparrela em que eu caíra, esclareceu: – Eu falei este ano! Hoje é 1º de janeiro de 1947!

 

                        Nesse momento, eu não consegui mais segurar o barro, minha decisão foi pro beleléu, afrouxou. Despejei tudo o que tinha dentro das tripas, borrei-me todo, ali, na frente dele, sendo necessário disparar na carreira em direção ao rio para lavar-me. Coitadinha da desafortunada calça curta de brim que eu vestia!

 

                        Por isso, caros leitores, aconselho-vos a não seguirdes meu malfadado exemplo. Tão logo sentirdes a vontade de obrar, não segureis o produto fecalístico!

 

                        Preliminarmente, concito-vos a peidardes bastante. O sujeito que não peida, tem dois motivos principais: ou está sustando o flato, para não ofender seus circunstantes, ou o está segurando, para que a massa não venha junto. Em ambos os casos, a pessoa vive estressada, trabalha sem ânimo, briga com o cônjuge, discute com os filhos, intriga-se com o bom vizinho, não ajunta dinheiro, bate o carro constantemente, empregada não para em sua casa. Bocage, tido pelos cordelistas como grande poeta escatológico, já dizia, segundo se propala no sertão nordestino:

 

                        O peido é um soluço vão

                        Um soluço comprimido

                        Que brota dos intestinos

                        E morre sem ter nascido

                       

                        A sensação que ele traz

                        A gente sente depois

                        É nada, nada e mais nada

                        Que se divide por dois

 

                        É pólvora refinada

                        Pisada no almofariz

                        Faz mira no calcanhar

                        Mas acerta é no nariz

 

                        Manjastes? Então, compartilhai-o com vossos semelhantes!

 

                        Ao aconselhar-vos a não vos borrardes, como eu me borrei, relembro propaganda de uma casa de comércio que li, na primeira metade do século XX, em A Careta, O Malho ou Almanaque da Parnahyba, não posso precisar em qual das publicações:

 

                        Tomai purgante

                        Cagai bastante,

                        Mas cagai elegante

                        Comprando penico

                        Na Casa Elefante

 

                        Portanto, antes de dar minha corridinha ao banheiro, deixo-vos aqui esta edificante mensagem:

 

                        – Em qualquer situação ou época do ano, sentindo-se apertado, não vacileis, destrancai o fiofó!

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Caindo na Gandaia terça, 17 de janeiro de 2017

CUSPIDORES, CUIDADO COM A BRUZACÃ

CUSPIDORES, CUIDADO COM A BRUZACÃ!

 

A Bruzacã: metamorfose ambulante  - Acervo Google

 

                        Peraí! Mas o nome da bola não é Brazuca? – Dirão vocês. E eu respondo: – Calma no Brasil! Até eu me enrolei, caçando um jeito de redigir esta matéria sem muita dispersão, eis que meu intuito é especular sobre a mania que têm os jogadores de futebol de cuspir a toda a hora.

 

                        Esse nome Brazuca, sempre me deixava muito perturbado, por não atinar eu com seu motivo ou significado. Alguns explicam que, assim como carinhosamente chamamos os portugueses de portugas, eles, em contrapartida, nos chamam de brasucas. Bom, neste caso, a grafia seria sem o “z” da Brazuca, como batizaram nossa bola. Eis que a derivação vem de Brasil.

 

                        E estava eu, raspsodo, cordelista, logogrifeiro, diascevasta, cruciverbista, parafrasta, calemburista, decifrador, enigmático, filósofo, profeta, criptógrafo, Cavaleiro da Távola Sertaneja, Imperador da Bandeira do Divino, paladino das almocrevadas do sertão nordestino, enrolado com semelhante dilema, quando me deu uma estralada no coco cabeludo: todos esses títulos me foram conferidos – ou melhor, por mim usurpados – após a leitura do livro Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, de Ariano Suassuna, no ano de 1971.

 

                        A ficha caiu! Está naquela obra-prima a solução desse grande mistério! A Pedra do Reino apresenta-nos um ser mitológico que habita o universo das crendices de todos os sertanejos que se prezam: a Besta Bruzacã.

 

                        Inconscientemente, mas inspirados pelos eflúvios astrosos de Ariano, penso eu, salvo melhor juízo, os próceres da CBF e da Fifa nomearam nossa bola com o anagrama da entidade mitológica sertaneja: Brazuca. Isso porque a danada aparece com vários nomes, maneiras e figuras diferentes, conforme a exigência da ocasião requerente de sua presença.

 

                         A Bruzacã, com a denominação de Hipupriapa, ou Hipupiara, é uma diaba-fêmea do mar e do litoral, uma bicha horrorosa, mas que desempenhou papel importantíssimo na epopeia empreendida por Dom Pedro Dinis Quaderna, o herói do livro. Adiante, duas de suas ilustrações, uma de autoria do gravador xilógrafo Taparica, baseada em desenho de Frei Vicente do Salvador, e outra saída da imaginação do próprio artista sertanejo: 

 

  

                        No cenário futebolístico pós-Penta, a Bruzacã apareceu duas vezes, com nomes modificados: na Alemanha, em 2006, como Teamgeist, que significa “espírito de equipe”, e, na África do Sul, em 2010, como Jabulani, “trazendo alegria para todos”. Nelas, o Brasil se ferrou:

 

A Bruzacã, travestida de Teamgeist e Jabulani Acervo Google 

                        Agora, a Bruzacã surge-nos anagramada aqui no Brasil, levando-nos a fazer estas advertências aos jogadores, aprecatai-vos! Cuspidores futebolísticos, cuidado com Bruzacã!

 

                        Passemos, doravante e, por conseguinte, ao item principal desta matéria, publicada no Jornal da Besta Fubana, no dia 2 de junho de 2014, que é o cuspe no Futebol Mundial.

 

                        É deveras impressionante esse fenômeno, que se observa em todos os cantos da Terra, mostrado, às escâncaras, pelas câmeras da TV. Há muito tempo, a colunista Danuza Leão já se mostrava estarrecida com as escarradas que os jogadores de futebol executam em campo.

 

                        Uma das explicações que encontrei na Internet é a de que a cusparada dos jogadores se constitui, num mecanismo de defesa do organismo para evitar irritação das mucosas associado a mudanças nas características normais da constituição da saliva. Se fosse assim, os jogadores de basquetebol, que se movimentam muito mais, estariam constantemente cuspindo, o que nunca acontece. O jogador de futebol é o único atleta que cospe no campo onde exerce sua profissão.

 

                        Só para ilustrar, aí vai esta arte do caricaturista Juarez, apresentando dois atletas de times não identificados:

 

 

                        E não é só no terreno gramado não! Às vezes, o atleta utiliza-se da escarrada para atingir a cara do adversário. Houve um que foi mais além. Um, de cujo nome não me recordo, que ficou milionário no futebol, em determinado jogo, ao ser expulso de campo, para vingar-se do árbitro, cuspiu na bola, que tanta fama lhe trouxera no cenário internacional.

 

                        Acho, salvo melhor juízo, que o problema é falta de civilidade mesmo.

 

                        Quando eu estudava no Colégio Diocesano, em Teresina (PI), numa aula de boas maneiras, o preceptor expendeu seu juízo de que tudo que sai de nosso corpo é excremento. Assim, as pessoas jamais deviam cuspir em público, preservando-se do mesmo modo que procedem no ato de defecar ou no momento da micção.

 

                        Questionado sobre como devia proceder alguém que se visse possuído de insopitável desejo de cuspir, o preceptor respondeu que, nesse caso, a pessoa devia cuspir no lenço. Lembro bem da reação do Almir, um parnaibano, que o interpelou, achando que era nojento por demais guardar no bolso um lenço cuspido, ao que o preceptor matou a pau:

 

                        – E o que é que você faz com o lenço depois de assoar o nariz?

 

                        E terminou a aula dizendo que o correto mesmo seria a pessoa engolir o cuspe, mesmo nas ânsias de mulher parida.

 

                        Eu até que reconheço a impossibilidade de cada jogador ter um lenço à mão, sempre que lhe vem o irrefreável desejo. Mas eles devem se convencer de que estão num palco, diante de uma plateia que pagou caro para assistir ao espetáculo esportivo e não para vê-los expelir seus dejetos orgânicos. Ainda mais diante das câmeras, que transmite o ato, ao vivo e em cores, para os quatro cantos do Mundo.

 

                        Tem um jogador de fama internacional em nosso escrete, esperança da torcida brasileira, que, de tanto desabar no gramado, ganhou o apelido de cai-cai. Lembram-se dele?

 

                        Acho que é de tanto escorregar no cuspe!

 

                        No próximo dia 12, a bola começa a rolar neste Mundial, com o jogo Brasil x Croácia. Embora o resultado seja perfeitamente previsível, com goleada a nosso favor, não custa nada o alerta:

 

                        – Olho vivo! Cuspidores, cuidado com a Bruzacã!

 

 


Caindo na Gandaia terça, 10 de janeiro de 2017

CRIPTOGRAMAS

CRIPTOGRAMAS

 

 

 

                        O termo criptograma é o resultado da fusão das palavras gregas cripto – oculto, obscuro – e grama – escrita, figura –, significando, portanto, o texto incompreensível de uma mensagem ou imagem. Nos serviços internacionais de espionagem, a pessoa que decifra tais enigmas é denominada parafrasta, expressão esta que especifica uma de minhas habilidades.

 

                        Em meus tempos de infância e adolescência, os grandes laboratórios distribuíam, todo mês de dezembro, almanaques com o calendário para o ano seguinte, contendo ainda matéria informativa, científica, literária, recreativa e humorística. Eram a miniatura do nosso Jornal da Besta Fubana, verdadeiro almanaque nos dias atuais. O mais famoso deles, Almanaque Capivarol, trazia, na última página, uma Carta Enigmática, a cujos decifradores prometia brindes especiais.

 

                         No final do ano de 1948, quando eu tinha 12 anos de idade, o prêmio oferecido pelo Almanaque Capivarol de 1949 seria “um útil e interessante brinde” sem, no entanto, especificar sua natureza. Decifrei a Carta e enviei a resposta para o endereço indicado e, logo em seguida, viajei para Floriano, onde me submeteria ao Exame de Admissão ao Ginásio. Aqui vai a solução:

 

“Sirvo-me da presente para levar ao vosso conhecimento que há mais de dois anos vinha sofrendo de muita fraqueza, desânimo e falta de coragem. Aconselhado a usar o maravilhoso Capivarol, dele fiz uso e só com 3 vidros obtive a minha saúde de outrora. Ofereço-vos minha fotografia autorizando-vos a fazerdes dela e desta o uso que vos convier. (a) Antônio Estrela Leite.”

 

                        Em Floriano, até me esqueci desse assunto. Lá, recebi uma carta de Seu Rosa Ribeiro, meu saudoso pai, comunicando-me que chegara em casa uma encomenda do Laboratório Capivarol endereçada para mim. Era o prêmio! Fiquei ansioso para conhecê-lo, o que se deu em julho, quando retornei de férias.

 

                        Ao abrir o pacote, a surpresa: uma dúzia de ondulótis, como dizia o rótulo da caixa, ou seja, 12 bobes! Isso mesmo, aqueles rolinhos de plástico que Dona Florinda usa nos cabelos para conquistar o Professor Girafales!

 

                        Minha intenção aqui é relembrar um pouco desse feliz passado e também exigir um bocado da imaginação e perspicácia dos nossos queridos leitores.

 

                        Não é tarefa simples, já vou avisando. Puxa muito pela cabeça. A cultura de almanaque requer um bocado de vivência, malícia, acuidade. Por exemplo, quantos buracos temos no corpo? Você, apressadinho, respondeu: – Nove! Contou os sete da cabeça mais os dois dos países-baixos. Mas são onze! – Onze? Sim, você deixou de contar os dois buracos dos peitos!

 

                        Os criptogramas abaixo, em sua maioria, estão relacionados à comunidade fubânica, aos colunistas, palpiteiros e comentaristas que, diariamente, assinam ponto no Jornal da Besta Fubana. Vamos a eles, com algumas imagens colhidas no Google :

 

CRIPTOGRAMA 01 (Fácil, para da uma ideia do raciocínio)

  

CRIPTOGRAMA 02

  

CRIPTOGRAMA 03

  

CRIPTOGRAMA 04

  

CRIPTOGRAMA 05

  

CRIPTOGRAMA 06

 

 CRIPTOGRAMA 07

  

CRIPTOGRAMA 08

  

CRIPTOGRAMA 09

  

CRIPTOGRAMA 10

   

CRIPTOGRAMA 11

  

CRIPTOGRAMA 12

 

 CRIPTOGRAMA 13

  

CRIPTOGRAMA 14

  

CRIPTOGRAMA 15

 

 CRIPTOGRAMA 16

 

 CRIPTOGRAMA 17

 

 CRIPTOGRAMA 18

  

CRIPTOGRAMA 19

  

CRIPTOGRAMA 20 (O mais difícil de todos)

 

 

RESPOSTAS: 

01 - A GALINHA BOTA OVO

02 - RAIMUNDO FLORIANO

03 - BRASÍLIA CAPITAL DA ESPERANÇA

04 - JORNAL DA BESTA FUBANA

05 - LUIZ BERTO

06 - PAULO CARVALHO

07 - CARLITO LIMA

08 - JORGE FILÓ

09 - FÁBIO CABRAL

10 - CARLOS AIRES

11 - LEONARDO LEÃO

12 - ANA RIOS

13 - DO JUMENTO AO PARLAMENTO

14 - NEIDE SANTOS

15 - MACIEL MELO

16 - XICO BIZERRA

17 - ZELITO NUNES

18 - VALTER AZEVEDO

19 - RAIMUNDO FLORIANO

20 - MARIA JURACI (Lembram-se dos buracos?)

 

 


Caindo na Gandaia terça, 03 de janeiro de 2017

BIÓPSIA DESMORALIZANTE

BIÓPSIA DESMORALIZANTE

  

                        Sempre fui amarrado num tempero apimentado, atolado até o miolo, feito talo de jaca. Credito essa adoração ao fato de que, quando criança, passaram muita pimenta em meu polegar esquerdo para que eu deixasse de chupá-lo, o que resultou em efeito contrário: quanto mais ardido, mais saboroso!

 

                        Por isso, sempre que me era dada a oportunidade, eu repetia essa máxima ouvida de Seu Teodorico Fernandes, fazendeiro morador na Rua do Frito:

 

                        – Comer sem pimenta, é o mesmo que dançar com irmã! Tem gosto de nada!

 

                        Até bem pouco tempo, eu possuía cerca de 50 garrafas de molho de pimenta-de-cheiro e malagueta, meu preferido dentre os demais. Cada garrafa durava, no máximo, uma semana, ao cabo da qual eu a enchia novamente com vinagre, datava-a e colocava-a na espera, aguardando sua vez de, aproximadamente em um ano, voltar à mesa para consumo.

 

                        Mas foi bom enquanto durou!

 

                        Há coisa de uns cinco anos, comecei a sentir uns pigarros, uma irritação na garganta e, a cada vez que eu engolia comida apimentada, me danava a tossir. Depois de tomar tudo quanto é tipo de mezinha caseira, de fazer gargarejos em vão, resolvi procurar um médico. Este, depois de examinar-me, receitou-me alguns medicamentos e recomendou que eu voltasse dentro de um mês, para que os resultados fossem avaliados.

 

                        Ao retornar, eu não melhorara um tiquinho sequer, por isso o doutor requisitou uma gastroscopia. Sem outra alternativa, submeti-me a esse angustiante exame, que se deu no Hospital Santa Lúcia. Vou tentar descrevê-lo.

 

                        A gente senta numa cadeira toda cheia de cabos ligando-nos a um monitor. O médico enfia-nos um pequeno tudo na boca, que servirá de conduto por onde será introduzido um cateter – pronuncia-se catetér, aprendam! – contendo uma pequena câmera, que bisbilhotará tudo na barriga da gente. Até que iria tudo bem, se não fosse certo local crítico na goela, muito apertado, por onde só é possível o cateter entrar se a gente lhe facilitar a passagem dando uma pequena tossida, uma tossidela.  É uma sensação por demais incômoda, quase insuportável. Nesse momento, acontece a valiosa performance da enfermeira que participa dos procedimentos. A que me atendeu foi essa que vocês vêem a seguir, que me falou, para tranquilizar-me:

 

                        – Sou a doutora Haidajam, enfermeira pê-agá-dê árabe e assistente juramentada. Vou ajudá-lo durante o exame, para que obtenhamos um resultado satisfatório, sem que seja necessário repetir o procedimento.

 

 

Doutora Haidajam, enfermeira da gastroscopia 

                        São três ações sincronizadas, harmônicas, que não duram nem um segundo, mas a sensação angustiosa é tremenda, horrível, arrasadora. O médico posiciona a cabeça do cateter no buraquinho apertado da goela da gente e fala: – Tosse! Ao mesmo tempo, para nos desviar a atenção, a enfermeira, num abraço, debruça-se sobre a gente e segura-nos os braços. Pronto, já passou! Depois disso, a gente vê na tela o cateter remexendo por tudo quanto é paragem dentro do bucho. Com uma semana, sai o laudo daquilo tudo.

 

                        De posse dele, o médico me explicou que o exame detectara uma úlcera no estômago, e marcou meu retorno para submeter-me uma biópsia, que determinaria se a úlcera era de caráter maligno.

 

                        Preparei-me, criei coragem, e voltei para o sacrifício. Detalhe: a gente tem que ir em jejum de 12 horas, de alimento e de água. Quando cheguei lá, fui assaltado por um mau pressentimento, gelei! Pensei: – Tô frito! A enfermeira era outra! Esta daí:

 

 Doutora Rohalym, enfermeira da biópsia 

                        E a conversa de me-engana-que-eu-gosto foi a mesmíssima da anterior:

 

                        – Sou a doutora Rohalym, enfermeira pê-agá-dê chinesa e assistente juramentada. Vou ajudá-lo durante o exame, para que obtenhamos um resultado satisfatório, sem que seja necessário repetir o procedimento.

 

                        A diferença, agora, também, era que o cateter, penetrando pelo buraquinho, levava na cabeça, além da câmera, um alicate, para beliscar um pedaço da úlcera já diagnosticada. Se houvesse um meio de eu falar aqui em três vozes, repetir os três movimentos numa única voz, como seria fácil para vocês entenderem. Sendo isso impossível, vamos sintetizar essas três ações – tosse, enfia, abraça – na palavra JÁ!

                       

                        Tudo pronto, tudo preparado, o médico posicionado, eu atento, a enfermeira alerta, aconteceu:

 

  – JÁ!

 

POW!

 

                        Soltei um peido daqueles de quebrar vidraça, de derrubar parede, tipo arrasa-quarteirão, de esquentar o anel do fiofó. Ainda bem que eu estava em jejum, com as tripas vazias, caso contrário, sei não!

 

                        O médico disse:

 

                        – Calma, não foi nada!

 

                        A enfermeira, tadinha, ficou mais vermelha do que pimenta-malagueta. E eu, cabisbaixo e também vermelho de acanhamento, ao ser liberado, retirei-me sem olhar para a cara de seu ninguém.

 

                        Uns quinze dias depois, saiu o resultado da biópsia. Negativo! Era só pigarro mesmo. Ao recebê-lo, o laboratorista me orientou para que levasse o laudo ao médico, que daria seu parecer final.

 

                        O diabo é quem volta mais lá!

 

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Caindo na Gandaia terça, 27 de dezembro de 2016

ANTI-INFLAMATÓRIO

ANTI-INFLAMATÓRIO

Raimundo Floriano

 

Acervo Google 

                        Esta historinha não é uma piada, não dá pra rir, mas é engraçadinha e, pelo fato de ser verídica, de ter acontecido mesmo, não posso deixar de relatá-la. Alguém mais inteligente e sagaz do que eu saberá transformá-la numa boa anedota.

 

                        Uma de minhas cuidadoras, a quem eu chamo de Tiazinha, é excelente fisioterapeuta, competentíssima, mas muito despreparadinha em assuntos de sacanagem. Com 28 anos, parece-me, segundo andei apurando, que ainda não passou pelas armas. Por isso, seus pacientes – todos – gostam de dizer palavras apimentadas perto dela, só para verem seu boquiabertismo. Bárbaro, não é?

 

                        Certo dia, lá na Clínica, ela apareceu com as orelhas sangrando e explicou que aquilo era devido ao fato de ter usado brincos de bijuteria. Um dos colegas fisioterapatas aconselhou-a a passar a pomada anti-inflamatória Nebacetin na ferida e também nos brincos, quando os fosse usar.

 

                        Mas ela, avoadinha, a todo o momento esquecia o nome da pomada e perguntava de novo. Barbaridade, né não? Numa dessas esquecidas, resolvi ensinar-lhe um processo mnemônico, para que não se atrapalhasse quando fosse comprar o remédio. Falei-lhe assim:

 

                        – Tiazinha, você se lembra do seriado da TV chamado Família Dinossauro?

                        – Lembro, sim! – Respondeu-me.

                        – Tinha um dinossaurozinho, o Baby, que, por não saber falar “papai”, toda vez que o via, abria os bracinhos para ele e gritava “não é a mamãe!”.

                        – Isso mesmo! – Disse a garota.

  

                        – Pois então? Quando você chegar à farmácia, dirija-se ao rapaz do balcão e diga assim:

                        – Moço, eu quero comprar uma pomada anti-inflamatória, mas me esqueci do nome. Um paciente meu me ensinou que eu dizendo uma palavra parecida, você saberá o nome correto do medicamento.

 

                        Daí, o moço do balcão perguntará:

 

                        – E qual é essa palavra?

 

                        Então, você pensará em uma específica parte de seu corpo e, tal qual no seriado, exclamará:

 

                        – Não é nabucetinha!

 


Caindo na Gandaia terça, 20 de dezembro de 2016

AMOR DE RAPARIGA

AMOR DE RAPARIGA

Raimundo Floriano

 

Rapariga na viração

 

                        Conheci Benedito Honório por acaso. Por tabela.

 

                        No ano de 2003, doei 100 exemplares do meu livro Do Jumento ao Parlamento ao Batalhão de Polícia do Exército de Brasília – BPEB, cujo Comandante me convidou para uma happy hour no quartel daquela Unidade, onde eu concederia autógrafos aos militares aquinhoados.

 

                        Foi uma bonita festa, emocionante para mim, pois vi ali na fila, esperando receber seu exemplar, do Comandante ao Corneteiro. Dentre eles, o Major Blum, já na reserva, da Turma de 1959 da Escola de Sargentos das Armas – EsSA, hoje dileto amigo, que me pediu mais um para remeter a Benedito Honório, o seu colega de turma, também já reservista, residente em João Pessoa (PB), na Praia de Manaíra.

 

                        Uns meses depois, o próprio Benedito Honório veio visitar-me aqui em Brasília, ocasião em que lhe mostrei todo o meu acervo literomusical. Meses mais tarde, em passeio pela Paraíba, fui à casa dele, onde conheci toda sua família, inclusive a recém-nascida Cecília – homenagem à Santa Padroeira da Música –, consolidando uma grande amizade, que a cada dia mais se fortalece.

 

                        Vou dizer um pouco de Benedito Honório.

 

                        Depois que saiu da EsSA, formou-se em Direito e, mais tarde, deixou o Exército para ingressar no Serviço Público, sendo, hoje, Consultor Jurídico.

 

                        É músico, clarinetista, compositor, poeta, escritor e cordelista. Com seus conhecimentos junto à classe artística paraibana, elegeu-se Presidente da Ordem dos Músicos da Paraíba.

 

                        Tem composições suas, ou com parceiros, gravadas pelos grandes intérpretes nordestinos, sendo o principal deles o saudoso forrozeiro Manoel Serafim, a quem conseguia trabalho nos tempos das vacas magras e a quem ajudou e protegeu durante a enfermidade que, infelizmente, levou o cantor à morte.

 

                        O último CD de Benedito Honório, lançado em 2004, Coletânea de Ritmos Diversos, com intérpretes como Jairo Aguiar, Paulo Germano, Fátima Lima, Ailton Vieira, Manoel Serafim, Claudionor Germano, Gino Liver, Jadir Camargo e Meves Gama, e arranjos de Maestro Chiquinho, Maestro João Lira, Maestro Ramalho, Joca do Acordeom, Duda da Passira e Maestro Duda, é uma excelente amostra de seu talento e de sua versatilidade.

 

                        Naquela viagem à Paraíba, pra todo lugar aonde eu ia, a música mais tocada era Amor de Rapariga, constante do CD Sacudindo o Forró, cujo refrão “amor de rapariga é que é amor/amor de rapariga é bom demais” não me saía mais da cabeça.

                       

                        Ao retornar a Brasília, telefonei logo para o Honório, pedindo-lhe que adquirisse o disco e o mandasse para mim.

 

                        Meu amigo não só me remeteu o CD, que hoje enriquece a minha coleção de Forrós, como fez um cordel relativo ao tema, enfatizando que era “exclusivo para Raimundo Floriano”. Guardo os versos com carinho, mas acho tremendo egoísmo conservá-los só para meu gasto. Por isso, e suplicando perdão ao fraterno Benedito Honório pela inconfidência, disponibilizo este inspirado e engraçadíssimo cordel, para o deleite de toda a comunidade fubânica.

 

AMOR DE RAPARIGA É BOM DEMAIS?

(Benedito Honório)

 

Embora com muito atraso

(Espero, sem desengano)

Estou cumprindo o acerto

Antes que complete um ano

Implorando mil desculpas

Caro amigo Floriano.

 

Conforme já lhe falei

Adquiri, sem intriga

O “Sacudindo o Forró

Com o AMOR DE RAPARIGA

Música que tem gerado

Muito bafafá e briga.

 

Um rapaz conhecido meu

Muito sério e bem casado

Passou na loja e comprou

O CD tão festejado

Chegou em casa dizendo:

“EITA DISCO ARRETADO!”

 

Sua esposa, espantada

Com aquela afirmação

Exigiu do maridinho

Uma clara explicação:

Por que o dito CD

Levava à tal conclusão?

 

Como resposta, o marido,

De imediato, pôs

O CD no mini-system

Não deixando pra depois

Apertou a tecla certa

Ou seja, na Faixa Dois.

 

Após a introdução

Ouviu-se a voz de um rapaz

Cantando a letra que diz

De forma clara e loquaz

Que AMOR DE RAPARIGA

Certamente É BOM DEMAIS!

 

Aí, o tempo esquentou

Naquele lar sempre unido.

Entendendo a mulher

Que o seu homem querido

Com algumas raparigas

Estava sendo envolvido.

 

Depois de um bate-boca

Foram às vias de fato

Ele deu-lhe uns safanões

Ela jogou-lhe o sapato

Era um cenário digno

De um cabaré barato.

 

 Em seguida, se agrediram

De coice, murro, empurrão

Por cima de cama e mesa

Pote, panela e fogão

Quebraram, até, uma gaiola,

Onde tinha um azulão.

 

Nesse vai-e-vem rasgaram

Quatro sacos de farinha

Tinha uma galinha choca

Deitada lá na cozinha

Caíram por cima dela

Esbagaçaram a bichinha.

 

Um amigo do rapaz

Chegou e foi pressentindo

Que aquela lenga-lenga

Não tinha caráter lindo

Tomou partido e ficou

A FAIXA DOIS repetindo.

 

Com isso, aquela esposa

Ficou mais indignada

Pulava que nem cabrita

Quando se vê desmamada

Quanto mais ouvia a música

Mais ficava aperreada.

 

Por volta de meia-noite

Sem nenhum raio de luz

A mulher muito esgotada

Gritou: “Valha-me Jesus!”

Com dois pedaços de pau

Improvisou uma cruz.

 

Nesse momento ouviu-se

Um grandioso pipoco

Era o SOM que espatifava

Deixando o marido mouco

Por coincidência o CD

Caiu em cima de um toco.

 

Num prego existente ali

Foi-se o disco encaixar

Surgiu uma ventania

Sem ter como explicar

O certo é que o CD

Começou logo a rodar.

 

Um trovão bastante forte

Trouxe um raio bem fugaz

Caindo na Faixa Dois

Dizendo uma vez mais

Que o AMOR DE RAPARIGA

Com certeza É BOM DEMAIS.

 

O vento soprou mais forte

De um jeito esquisito

Açoitando o tal CD

No rumo do infinito

Entrou em órbita e sumiu

É verdade, tenho dito.

 

Uma fumaça vermelha

Surgiu com a ventania

No meio tinha uma luz

Transformando a noite em dia

Via-se um JUMENTO ALADO

Relinchando em latomia.

 

O amigo do marido

Partícipe da confusão

Foi, então, abduzido

Sem qualquer reclamação

Montado no asinino

Sumiu na imensidão.

 

O casal voltou “às boas”

Formam, hoje, um par romântico

Vivem de casa pra igreja

Ensaiando um novo cântico

Estão em lua-de-mel

Atravessando o Atlântico.

  

E como prova do fato

Remeto do tal CD

A capa (ou caixa?) que vai

Como brinde pra você

O CD que estou mandando

SÓ ALEGRA, pode crer!

 

                        Para que todos conheçam a melodia, aí vai o Amor de Rapariga, com o Forró Sacode:

 

 


Caindo na Gandaia terça, 13 de dezembro de 2016

A ESPORA

DO LIVRO CAINDO NA GANDAIA

A ESPORA

Raimundo Floriano

  

            A edição do mês de junho de 2006 da Voz Ativa, órgão informativo da ASA-CD – Associação dos Servidores Aposentados da Câmara dos Deputados –, nos brinda com saborosa crônica do colega Goiano Braga Horta, na qual cita todos os companheiros dos velhos tempos em que trabalhou na Seção de Mecanografia. A última pagina do jornal, porém, nos dá conhecimento de triste notícia: a Partida para a Eternidade de Dona Marilu, dia 2.6.2006, aos 92 anos de idade.

 

            Após sua leitura, fiquei a rememorar aqueles bons tempos, e não pude conter a vontade de narrar certas passagens hilariantes vividas por nós da Diretoria do Patrimônio, no 9º andar do Anexo I, em decorrência de uma brincadeira que a todos divertia.

 

            Estávamos em 1969, o Congresso Nacional fechado, em virtude do AI-5, editado pelo Regime Militar, e pouco tínhamos para fazer. Como sempre acontece no Serviço Público, quer civil, quer milico, quando não há muita tarefa a executar, surge logo a implacável figura de um saco. E, com ele, uma porção de funcionários desocupados para coçá-lo. Já falei isso em outro livro, mas é assim mesmo que a coisa se dá, não custa repetir, para quem desconhece. E, coçando aquele saco, com a mente ocupada em coisa alguma, começavam a surgir ideias e armações.

 

            Assim, nasceu a Era da Espora!

 

            Ferreirinha, de saudosa memória, baiano arretado, sobre o qual muito se poderia escrever, chegou um dia perto de mim e falou:

 

            – Raimundo, lá no Ministério do Trabalho, de onde eu vim, a turma tinha uma brincadeira muito engraçada, que era botar esporas nos colegas. Recortavam umas esporas de papel e, com fita durex dupla face, pregavam nos saltos dos sapatos de alguém, sem a pessoa ver, de forma que o cara ficava o expediente todo andando com elas, e a gente mangando dele.

 

            Não dei muita importância ao assunto. Na manhã seguinte, chegou ele com esmerado par de esporas de papel, já munidas da fita, e me deu para que eu a colocasse nalgum desatento. Guardei-as em minha gaveta, e ele se afastou.

  

            Daí a mais ou menos uma hora ele voltou e me perguntou bem baixinho, sussurrando:

 

            – Já botou?

            E eu, murmurando:

            – Já!

            – Em quem?

            Cochichei:

            – Em você!

 

            Ele olhou para os calcanhares e viu as duas esporas. Aí, meu amigo, o sujeito engrossou, ficou vermelho de raiva e esbravejou:

 

            – Você me respeite, que eu sou pai de família e não sou homem pra brincadeira. Se eu estivesse aqui com a minha peixeira, ninguém se meteria a fazer uma coisa dessas comigo, porque eu sou é baiano, e isso não vai ficar assim não!   

 

            Mas, com o passar do tempo, ele se acalmou e até chegou a andar pregando esporas nos outros. Como o caso ficou muito conhecido, fiquei com a fama de botador de esporas lá no Patrimônio.

 

            Essa foi a única espora que pus em alguém, durante todo aquele período. Por seu turno, o funcionário Felisberto tomou para si a tarefa de agraciar quem quer que se postasse descuidado a seu redor. Aí, seguiram-se os subprodutos, como o rabo, as estrelas de Oficial, as divisas de Sargento e as espadas. Esse Felisberto, hoje premiado escritor e baluarte da Cultura Popular Nordestina, é daqueles que podem perder o amigo, mas não perdem a piada.

 

            Trabalhava conosco Dona Marilu, 55, senhora simpática, alegre, que promovia nossas festinhas e se encarregava da lista de presentes para os aniversariantes. Exímia taquígrafa, exercia a função de Secretária da Diretora, Dona Iatir Emília. Felisberto era a menina-dos-olhos das duas. Não sei se por ser ele um dos melhores datilógrafos da Câmara, se pelo fato de ser professor de Matemática, se por sua privilegiada inteligência, se por sua tenra idade – 22 anos –, o fato é que ambas dispensavam a ele afeição quase maternal.

 

            Embora Dona Marilu desempenhasse aquela função, sua mesa ficava fora da sala de Dona Iatir, mais ou menos na linha imaginária que separava a Seção de Compras da Seção de Material. E foi ali que, sem qualquer remorso, Felisberto pôs-lhe duas esporas nos sapatos salto doze. Dona Itajacy, Batichote, Jota Ribeiro, Arlyson, Gouveia, Tabajara e outros, quando viram a presepada, foram acometidos de incontido acesso de riso, sendo que o Tabajara teve que correr para o banheiro, pois se mijara de tanto rir. Nesse crucial momento, Dona Iatir chamou a Secretária a seu gabinete. Dona Marilu foi, despachou, mas quando deu a volta para se retirar, exibiu as duas esporas para a Diretora, que perguntou, já explodindo na gargalhada:

 

            – Marilu, que negócio é esse?

  

            Dona Marilu olhou para os sapatos e, ao ver aqueles adereços, deu o maior berro:

 

            – Quem foi o filho duma galinha que pôs isso em mim?

 

            Esse “filho duma galinha” tinha endereço certo: eu, Raimundo Floriano.

 

            E tenho certeza de que nossa amiga fez a Grande Viagem sem me perdoar, mas hoje, lá do Além, está vendo esta página e reconhecendo que, durante muitos anos, me recriminou e condenou por um pecado que jamais cometi com relação a sua boníssima pessoa.

 

            Logo eu, que sempre fui um colega tão deferente!

 


Caindo na Gandaia terça, 06 de dezembro de 2016

LIVRO CAINDO NA GANDAIA - APRESENTAÇÃO

CAINDO NA GANDAIA

Raimundo Floriano 

APRESENTAÇÃO

  

                        2016! 80 anos! Com a Graça de Deus, aqui cheguei, procurando nunca deixar passar em branco o tempo de vida que Ele continua me concedendo!

 

                        Iniciei-me na leitura lúdica, extracurricular, muito cedo, para um menino do sertão, onde não havia livrarias. Aos 10 anos de idade, em 1946, ganhei o primeiro romance, A Volta de Tarzan, de Edgar Rice Burroughs; no ano seguinte, Memórias da Emília, de Monteiro Lobato, ambos presentes de meu irmão Bergonsil.

 

                        Daí pra frente, mergulhei de ponta-cabeça na Literatura, contabilizando, hoje, cerca de 1.500 obras lidas, além da produção de quase 400 crônicas, um monte de revisões, prefácios, orelhas, críticas para amigos e o lançamento de seis livros: Regras de Pontuação e Sinais de Revisão, em 1977; O Acordo PDS/PTB, em 1981; Do Jumento ao Parlamento, em 2003; De Balsas para o Mundo, em 2010; Pétalas do Rosa, em 2013; e Memorial Balsense, em 2015.

 

                        Seis livros! Realização hercúlea! Falar nisso, seis rebentos que valem muito mais que os Doze Trabalhos de Hércules, estes resultantes apenas da força muscular, ao passo que os livros advieram do esforço intelectual, da queimação da massa cinzenta, do muito pensar.

 

                        Na marcha do tempo, seis dias de intenso labor. Chegando ao sétimo, está na hora de descansar, como recomenda o Criador do Universo.

 

                        E nada melhor que repousar na alegria, no riso, no bom humor de uma história picante, engraçada, que nos faz esquecer as agruras do dia a dia. Já disseram há muito tempo: rir é o melhor remédio!

 

                        Neste livro, realizo um desejo há muito sonhado: retornar os tempos de outrora, relembrando os circos que conheci na infância e na adolescência, chegando até a trabalhar num deles, resgatando piadas, versinhos de inesquecíveis Palhaços, e também homenagear os Velhos dos Pastoris, atores que até os dias de hoje batem ponto nos tablados nordestinos, com suas cançonetas, charadas e muito mais.

 

                        Sou do tempo em que os Palhaços tinham nome. E eram os ídolos da criançada. Por isso mesmo, ao se apresentarem, aplaudidos, não só pela meninada, como pelos pais e mães que acompanhavam a filharada para cada espetáculo, pegavam leve em seus esquetes, sem jamais chocar as famílias ali presentes.

 

                        Quando muito, faziam gestos ao dançarem com as rumbeiras, segurando suas cadeiras e, depois, lambendo os dedos, o que ouriçava a imaginação da molecada. Nas paródias e emboladas, deixavam que a rima produzisse na cabeça de cada um a malícia subentendida.

 

                        Os Palhaços de meu tempo sempre entravam no picadeiro entoando umas quadrinhas apimentadas, que ficaram em nossas memórias para sempre:

 

O cachorro quando late

No buraco do tatu

Bota escuma pela boca

E chocolate pelos zói

 

Um velho mais uma velha

Foram tomar bãe na bica

A velha escorregou

E o velho passou-lhe a toalha

 

Menina namoradeira

Gosta de beijo e abraço

Depois fica aí chorando

Porque perdeu o caderno

 

Mulher bonita e faceira

É pior do que boi brabo

Se o boi tem força no chifre

Ela tem força no olhar

 

Faca de ponta

Espingarda, baioneta

Nunca vi coisa tão dura

Como couro de butina

 

Minha mãe, quando eu morrê

Me enterre lá no quintá

Debaixo da goiabeira

Aonde as moças vão me vê

 

                        No ano de 1945, logo depois do final da Guerra, passou lá por Balsas uma trupe mambembe, cujas principais atrações eram a famosa e estonteante rumbeira Marquise Negra e os Palhaços Zé Gaiola e Picolé.

 

                        Zé Gaiola era um bamba na paródia. Feijoada, calcada num popular foxtrote americano, em que ele se fazia acompanhar por Picolé ao violão, passou a integrar o repertório musical de todo menino sertanejo daquele tempo:

 

FEIJOADA

 

Aqui está

O Zé Gaiola lá do Ceará

Que viu as coisas lá da capitá

Só inda lhe falta vê o má

Vê o má, vê o má

 

A Joana

Ficou doente lá em Messejana

Por via duma penca de banana

Que ela engoliu nesta semana

 

Açude de Orós

Açude de Orós

Ficou nisso sós

Ficou nisso sós

 

As ruas e praia

São fogo de paia

 

Por isso mesmo é que não estou

De conversa não

Tô na cidade e não vou pro sertão

Lá ta morrendo de fome os cristão

Sem um caroço de feijão

 

Eu inté

Me hospedei enriba dum oité

Que fica lá bem pertinho do céu

E vi São Pedro de bonéu

De bonéu, de bonéu

 

Lá de riba

Vi Teresina, Oropa e Paraíba

Vi uma véia lá em Macaíba

Tomando chá de copaíba

 

Mas esse povo

Tem ũa mania danada

Qualquer coisinha que sente

Vai tomar limonada

 

Ainda ontonte eu tava empanzinado

Aí tomei o tal de apreparado

Quando afrouxei foi mesmo que tesoura

Inté canhão-metraiadora

 

E feijoada

É uma comida lascada

Comida de madrugada

Deixa a barriga inchada

 

Inda isturdia a Fredegunda

Sentiu um repuxo

Ũa roncadeira no paiol do bucho

Ũa estraladeira, pareceu cartucho

Foi caso sério e não foi luxo

 

                        A malícia, a interpretação, bem como a rima fescenina, ficavam a cargo do espectador, da plateia, eis que os Palhaços insinuam, mas nunca chegam aos finalmentes.

 

                        Já com os Velhos dos Pastoris, a coisa muda de figura. Apresentando-se nos bairros das periferias, noite adentro, tendo como público adultos fissurados na sacanagem, botam pra quebrar mesmo. Chamam as Pastoras no centro, e o desbocamento é sua marca registrada.

 

                        No início dos Anos 1990, ensaiei com minhas duas filhas, uma de 7 anos de idade e a outra de 5, um teatrinho em que mesclava o pregão dos Palhaços nas ruas, anunciando o espetáculo, com a irreverência do Velho do Pastoril, que foi filmado por meu sobrinho Maurício e, hoje, transformado em youtube, se encontra na Internet à disposição de todos:

 

                       

 

                        Neste sétimo trabalho, o do descanso, o da gandaia, incorporo as personalidades do Ajudante de Palhaço Seu Mundinho, que fui, no Circo Cometa do Norte, em 1956, e do Velho Fulô, que venho sendo desde há muito e para sempre, como os leitores poderão comprovar nos temperados Versos Sacânicos. Botando a cara na janela, realizo sonho que, da infância, se prolongou, fortalecendo-se cada vez mais, até a octogenariedade. Como no circo, aqui vocês não encontrarão novidade alguma. A magia circense é resumida nisto: tudo é repetição, o que se renova é a plateia.

 

                        Os assuntos, por serem estanques e de igual importância, aparecerão em ordem alfabética.

                       

                        Espero que gostem!

 

Seu Mundinho e Velho Fulô

 


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