VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Rachel Adjuto
Não era para ser assim.
Quando se volta ao convívio não é para maltratar.
Não é para ainda mais amar?
A razão passa longe da compreensão do que realmente acontece na mente de quem maltrata quem diz amar.
Maltratar por quê?
Tentar entender é como buscar o inexplicável.
Talvez a complexidade estudada por Freud e seus discípulos elucide algo.
Talvez.
Seria psicose, neurose, paranóia, perversão, distúrbio disso, distúrbio daquilo, sigla tal ou sigla qual ou sei lá o quê?
Seria insegurança?
Seria arrogância, que nada mais é do que a outra face da insegurança?
Seria medo?
Mas qual a lógica em pensar que pela força é possível impedir que se vá aquele a quem se ama?
E se ama a tal ponto que se teme perder, qual a lógica em se usar a força para ferir esse ser?
Maltratar por quê?
Tentar entender é como buscar o inexplicável.
Quem pode perscrutar a alma humana e explicar o que parece inexplicável?
Seria tão difícil compreender que a flor só perfuma quando regada?
Seria tão difícil compreender que a mão que despedaça a rosa é a mesma que sangra com os espinhos?
A RESPOSTA DO MENOR INFRATOR
Rachel Adjuto
Um dia me falaram que eu seria alguém.
Quem?
Quis ser bombeiro, quis ser professor, quis ser doutor.
Um dia me falaram que eu seria amado.
Amado por quem?
Não conheci meu pai e minha mãe...
Minha mãe precisou me deixar com a vizinha.
A vida a levou por estreitos caminhos e meus irmãos seguiram seu
exemplo.
Não sei quem sou e nem para onde vou.
Estou por aí.
O que vier, é lucro.
A perder, não tenho nada.
Perdeu você, playboy, perdeu você, que me roubou a educação, me
roubou os sonhos, me roubou a família.
Perdeu você, playboy, que não me deu escola, ao invés,
disse que eu não sirvo pra nada.
Perdeu, você, playboy, que me levou meu pai, que não me deu o
direito de ser filho, nem de ser criança.
Nunca brinquei. Sempre pelejei.
Perdeu você, playboy, que endureceu a minha mãe e retirou dela a
capacidade de me amar.
Perdeu você, playboy, que acha que me tirando tudo vai ficar impune.
Eu sei revidar e sei te mostrar que sua ação recai em seu próprio colo.
Nota do editor: Poema premiado no 1º Prêmio Nacional de Literatura para Magistrados, promovido pela AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros. Sua autora, Rachel Adjuto, é Juíza de Direito no Distrito Federal e colunista deste Almanaque.