Almanaque Raimundo Floriano
Fundado em 24.09.2016
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)
Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, dois genros e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.
Literatura de Cordel quarta, 23 de janeiro de 2019
JOÃO DOIDO, CACETE E ROLA (CORDEL DO POETA PERNAMBUCANO JOSÉ HONÓRIO)
Mote:
João Doido, cacete e rola Tudo é nome do caralho
Glosa:
Peia, cipó, mandioca Carabina, prego e talo Estaca, pica, badalo Sarrafo, pomba, biloca Pinto, manjuba, piroca Vergalhão, também mangalho Linguiça, cajado, malho Nervo, trabuco, bilola João Doido, cacete e rola Tudo é nome do caralho.
Glosa do poeta pernambucano José Honório, publicada no álbum Indecências, editado em julho de 1990.
Literatura de Cordel domingo, 20 de janeiro de 2019
O dedo eu acho difícil Encontrá-lo, meu parceiro Ninguém sabe há muito tempo O seu real paradeiro Há quem diga, no entanto Que o dedo desse santo Tá no cu do brasileiro.
Cordel de Jesus de Rita de Miúdo
Literatura de Cordel quinta, 17 de janeiro de 2019
A PERSEGUIDA E SEUS NOMES NO CORDEL: MOTE E GLOSA DE JOSÉ HONÓRIO
Vagina, papuda, greta Xanha, lasca, racha e fruta Tabaco, chibiu e gruta Fenda, bainha e buceta Desejada, cara-preta E bacurinha também É vizinha do sedém Talho, pipiu e xiranha Xiri, perereca, aranha Quanto nome a brecha tem
Literatura de Cordel quarta, 09 de janeiro de 2019
O CASAMENTO DO BODE COM A RAPOSA (FOLHETO DE FIRMINO TEIXEIRA DO AMARAL)
* * *
O CASAMENTO DO BODE COM A RAPOSA – Firmino Teixeira do Amaral
Eu ouço os velhos dizerem Que os bichos da antiguidade Falavam como falamos E tinham civilidade Naquele tempo até bichos Casavam por amizade
Naquele tempo mestre burro Lia escrevia e contava O cavalo era escrivão O cachorro advogava O carneiro era copeiro E o jaboti desenhava
Leão era o rei dos bichos Onça era professora Elefante era juiz A raposa agricultora Camelo era correio A aranha tecedora
Gavião criava pinto Guaxinim plantava cana O macaco em sua tenda Vendia queijo e banana Aos outros a prestação Pra receber por semana
Urso era presidente A traça era costureira Girafa fazia renda Cutia era engomadeira Peru era viajante Cobra vendia na feira
O lobo era capitão Urubu era marchante O jacaré era bacharel Canguru comerciante O peba era coletor Camaleão despachante
Coruja era feiticeira O papagaio pregador Periquito era fiscal O sapo era caiador A preguiça era parteira Mestre bode era doutor
O gato era tenente Pavão era sapateiro Mucura vendia ovos Tiú era cozinheiro Tamanduá era padre O preá era barbeiro
A cigarra era cantora O mocó era dentista Socó era pescador A garça era modista Morcego guarda noturno A lagarta desenhista
Afinal todos os bichos Daquele tempo passado Era como os homens hoje Viviam tudo empregado Não se via bandalheira Nem se vivia enganado
O bode sendo doutor De alta capacidade Enamorou-se da raposa Consagrou grande amizade Prometendo-lhe mais tarde Fazer-lhe a felicidade
A raposa muito alegre Chegou em casa e contou Pra sua mãe que sabendo De muito gosto aceitou A raposa tão contente Nesse dia não jantou
Disseram doutor bode É um jovem bem decente Pertence a alta escala É filho de boa gente Porém queremos saber Se o pai dele consente
Quando o bode velho soube Também não propôs questão Deu consentimento ao filho De ter da raposa a mão A velha cabra então disse Não acho boa união
Meu filho sendo doutor De alta capacidade Querer casar com uma moça De tão baixa qualidade Respondeu o velho sorrindo Isto é só formalidade
A raposa também vem Duma raça boa e pura É uma jovem elegante Vive da agricultura Respondeu a cabra zangada Mas não me agrada a figura
Eu não sei que diabo tem Que a tal não posso me unir Me arrepia os cabelos Só em ver ela sorrir Porém como todos querem É o jeito eu consentir
Doutor bode quando soube Que sua mãe consentia Deu três pulos no terreiro Tomou rapé de alegria Correu pra casa da noiva Pra contar o que havia
A raposa muito contente Foi dizendo agora vai Aproveite a ocasião Me peça logo ao meu pai Se não levar a decisão Tu hoje daqui não sai
O bode fez uma carta Muito bem feita e mandou Pela resposta na sala Silencioso esperou O velho recebeu a carta Veio em pessoa e falou
Foi dizendo doutor bode Para que tanta vergonha Eu me acho ao seu dispor E precisando disponha Dona raposa de lado Se conservava risonha
O bode como doutor Falou em cima da bucha É muito certo o ditado Filho de pobre não luxa O pobre de vez se atrapalha E o rico desembucha
Dona raposa lhe peço Como seu maior amigo A sua filha estimada Para se casar comigo Doutor bode só ela dizer Se quer se casar consigo
Sendo que ela queira O seu pedido aqui feito Cá de meu lado garanto De muito gosto aceito Chamaram então a raposa Contaram tudo direito
Ajustaram o casamento Marcaram o mês e o dia Mandaram logo avisar O padre da freguesia O velho tamanduá Com toda família ia
Fizeram logo convites Por cartas especiais Desde o soldado raso Aos mais altos generais Afinal todos os bichos Da classe dos animais
O leão como era o rei Mandou dizer que não ia Porém estava ao dispor Se quisesse a garantia Mandava a força armada De linha ou cavalaria
O bode lhe agradeceu Dizendo não precisar Pois não tinha inimigo Que quisesse lhe atacar Porém se fosse preciso Telefonava pra mandar
Afinal chegou o dia Do casamento feliz Primeiramente iriam A presença do juiz Depois foram se casar Na igreja da matriz
As testemunhas do bode Foram cachorro e elefante Da raposa a professora Onça pintada galante E a filha do capitão lobo Uma jovem muito elegante
Sapo tocava guitarra O macaco bandolino Periquito na rabeca Canguru no violino Caititu no contra baixo E o peru no cavaquinho
Guaxinim tocava flauta O papagaio violão O socó na clarineta Morcego no rabecão Mestre coelho no tambor E o mocó no bombardão
Veado lavava prato Carneiro botava mesa A garça junto ao pavão Iam fazendo a limpeza O porco de sentinela Para servir de defesa
Estavam todos na mesa Começou uma discussão Dizia o lobo que era Superior ao leão Saltou o cachorro dizendo Amigo agora isto não
Diga-me por qual motivo És melhor que o leão Ele sendo o nosso rei Tem o direito na mão Temos de reconhecê-lo Como chefe da nação
Porém o lobo zangou-se Queria porque queria Ver terminar em desgosto A festa daquele dia O cachorro deitou-lhe o braço Errou pegou na cotia
O dom raposo na luta A favor do capitão O cachorro pegou de jeito E lhe deu um bofetão E uma grande dentada Deixando morto no chão
Nisso chegou doutor bode Vendo seu sogro morrer A professora também Foi a causa defender Mas o boi tomou a frente Fez a onça esmorecer
Capitão lobo nesse dia Arrenegou-se do diabo O corneteiro entrou na luta Poucos minutos deu cabo Camelo quebrou espinhaço A anta perdeu o rabo
Saltou o burro dizendo Com o leão ninguém bole Pode vir duzentos lobos Dum bocado não me engole Deu um pontapé no urso Que ainda hoje anda mole
Peru correu para um lado Quase morre de tremer Veado a zoada vendo Tratou logo de correr O jacaré caiu na água Não quis a vida perder
Tenente gato na luta Com os dentes agarrou o preá Macaco pulou num pau E gritou guardem de lá Façam o angu de vocês Que eu fico olhando de cá
A raposa a muito tempo Já tinha se escapulido Vendo o cachorro na luta Não quis saber de marido Caçote deixou a barba Cobra deixou o vestido
O peba apanhou de pau Traça ficou em farrapo Urubu quebrou a perna Jaboti desceu em trapo A mucura quase morre Pisaram em cima do sapo
Morcego por ser sabido Agarrou-se no cavalo O grilo ia fugindo O gavião pode pegá-lo A barata se desviando Passou no bico do galo
Dum murro o coelho quebrou O pescoço do socó Deixou a preguiça sem junta Ficou sem rabo o mocó A girafa disse vôte Quem quiser que brigue só
Onça fez uma carranca Deu um bofete no bode Ele espirrando dizia Com a onça ninguém pode Dum bofete que me deu Quase me arranca o bigode
Porco sacou de um facão E gritou guarda debaixo Com meia hora de luta Sangue corria em riacho Pavão apanhou de pau Mas não sujou o penacho
Camaleão foi saindo Guaxinim meteu a faca O cachorro pegou o padre E foi com ele a estaca Disse a garça vocês briguem Mas não me sujem a casaca
O papagaio nem sabia Que rumo tinha tomado Cigarra saiu voando Caboré estava trepado A rã detrás duma porta O tiu todo arranhado
O elefante e o boi Lutavam na força bruta O cachorro com o lobo E a onça na disputa A anta mais o mocó Perderam o rabo na luta
Com duas horas de luta O campo estava deserto Não tinha quem visse mais Um deles ali por perto Desde esse dia que os bichos Se intrigaram por certo
Vamos saber dos noivos Que tinham se escapulido A raposa muito nervosa Por já ter tudo perdido Se não fosse o casamento Seu pai não tinha morrido
Camisa de sete varas Só veste ela quem pode Diabo leve o casamento Chorando dizia o bode Por causa do tal casório Ia perdendo o bigode
O bode fez uma jura Por tudo quanto é sagrado Se pudesse se divorciar Não seria mais casado Na minha mente o camelo Saiu mais prejudicado
Ao cabo de muito tempo A raposa apareceu Magra nojenta e pelada Nem o bode conheceu Chorando amargamente Pelo seu pai que perdeu
Dizia perdi meu pai Disse o bode se não corro A onça me deu um tapa Um murro que quase morro Culpados de tudo isso Foi o lobo e o cachorro
A raposa chamou o bode Para se divorciar E fez juramento a Deus De nunca mais se casar Ficou de mal com o cachorro Pra nunca mais se falar.
Literatura de Cordel quarta, 02 de janeiro de 2019
O CAVALO QUE DEFECAVA DINHEIRO (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
O Cavalo que Defecava Dinheiro
Leandro Gomes de Barros
Na cidade de Macaé Antigamente existia Um duque velho invejoso Que nada o satisfazia Desejava possuir Todo objeto que via
Esse duque era compadre De um pobre muito atrasado Que morava em sua terra Num rancho todo estragado Sustentava seus filhinhos Na vida de alugado.
Se vendo o compadre pobre Naquela vida privada Foi trabalhar nos engenhos Longe da sua morada Na volta trouxe um cavalo Que não servia pra nada
Disse o pobre à mulher: _ Como havemos de passar? O cavalo é magro e velho Não pode mais trabalhar Vamos inventar um “quengo” Pra ver se o querem comprar.
Foi na venda e de lá trouxe Três moedas de cruzado Sem dizer nada a ninguém Para não ser censurado No fiofó do cavalo Foi o dinheiro guardado
Do fiofó do cavalo Ele fez um mealheiro Saiu dizendo: _ Sou rico! Inda mais que um fazendeiro, Porque possuo o cavalo Que só defeca dinheiro.
Quando o duque velho soube Que ele tinha esse cavalo Disse pra velha duquesa: _Amanhã vou visitá-lo Se o animal for assim Faço o jeito de comprá-lo!
Saiu o duque vexado Fazendo que não sabia, Saiu percorrendo as terras Como quem não conhecia Foi visitar a choupana, Onde o pobre residia.
Chegou salvando o compadre Muito desinteressado: _Compadre, Como lhe vai? Onde tanto tem andado? Há dias que lhe vejo Parece está melhorado…
_É muito certo compadre Ainda não melhorei Porque andava por fora Faz três dias que cheguei Mas breve farei fortuna Com um cavalo que comprei.
_Se for assim, meu compadre Você está muito bem! É bom guardar o segredo, Não conte nada a ninguém. Me conte qual a vantagem Que este seu cavalo tem?
Disse o pobre: _Ele está magro Só o osso e o couro, Porém tratando-se dele Meu cavalo é um tesouro Basta dizer que defeca Níquel, prata, cobre e ouro!
Aí chamou o compadre E saiu muito vexado, Para o lugar onde tinha O cavalo defecado O duque ainda encontrou Três moedas de cruzado.
Então exclamou o velho: _Só pude achar essas três! Disse o pobre: _Ontem à tarde Ele botou dezesseis! Ele já tem defecado, Dez mil réis mais de uma vez.
_Enquanto ele está magro Me serve de mealheiro. Eu tenho tratado dele Com bagaço do terreiro, Porém depois dele gordo Não quem vença o dinheiro…
Disse o velho: _meu compadre Você não pode tratá-lo, Se for trabalhar com ele É com certeza matá-lo O melhor que você faz É vender-me este cavalo!
_Meu compadre, este cavalo Eu posso negociar, Só se for por uma soma Que dê para eu passar Com toda minha família, E não precise trabalhar.
O velho disse ao compadre: _Assim não é que se faz Nossa amizade é antiga Desde os tempo de seus pais Dou-lhe seis contos de réis Acha pouco, inda quer mais?
_Compadre, o cavalo é seu! Eu nada mais lhe direi, Ele, por este dinheiro Que agora me sujeitei Para mim não foi vendido, Faça de conta que te dei!
O velho pela ambição Que era descomunal, Deu-lhe seis contos de réis Todo em moeda legal Depois pegou no cabresto E foi puxando o animal.
Quando ele chegou em casa Foi gritando no terreiro: _Eu sou o homem mais rico Que habita o mundo inteiro! Porque possuo um cavalo Que só defeca dinheiro!
Pegou o dito cavalo Botou na estrebaria, Milho, farelo e alface Era o que ele comia O velho duque ia lá, Dez, doze vezes por dia…
Aí o velho zangou-se Começou loga a falar: _Como é que meu compadre Se atreve a me enganar? Eu quero ver amanhã O que ele vai me contar.
Porém o compadre pobre, (Bicho do quengo lixado) Fez depressa outro plano Inda mais bem arranjado Esperando o velho duque Quando viesse zangado…
O pobre foi na farmácia Comprou uma borrachinha Depois mandou encher ela Com sangue de uma galinha E sempre olhando a estrada Pré ver se o velho vinha.
Disse o pobre à mulher: _Faça o trabalho direito Pegue esta borrachinha Amarre em cima do peito Para o velho não saber, Como o trabalho foi feito!
Quando o velho aparecer Na volta daquela estrada, Você começa a falar Eu grito: _Oh mulher danada! Quando ele estiver bem perto, Eu lhe dou uma facada.
Porém eu dou-lhe a facada Em cima da borrachinha E você fica lavada Com o sangue da galinha Eu grito: _Arre danada! Nunca mais comes farinha!
Quando ele ver você morta Parte para me prender, Então eu digo para ele: _Eu dou jeito ela viver, O remédio tenho aqui, Faço para o senhor ver!
_Eu vou buscar a rabeca Começo logo a tocar Você então se remaxa Como quem vai melhorar Com pouco diz: _Estou boa Já posso me levantar.
Quando findou-se a conversa Na mesma ocasião O velho ia chegando Aí travou-se a questão O pobre passou-lhe a faca, Botou a mulher no chão.
O velho gritou a ele Quando viu a mulher morta: _Esteja preso, bandido! E tomou conta da porta Disse o pobre: _Vou curá-la! Pra que o senhor se importa?
_O senhor é um bandido Infame de cara dura Todo mundo apreciava Esta infeliz criatura Depois dela assassinada, O senhor diz que tem cura?
Compadre, não admito O senhor dizer mais nada, Não é crime se matar Sendo a mulher malcriada E mesmo com dez minutos, Eu dou a mulher curada!
Correu foi ver a rabeca Começou logo a tocar De repente o velho viu A mulher se endireitar E depois disse: _Estou boa, Já posso me levantar…
O velho ficou suspenso De ver a mulher curada, Porém como estava vendo Ela muito ensanguentada Correu ela, mas não viu, Nem o sinal da facada.
O pobre entusiasmado Disse-lhe: _Já conheceu Quando esta rabeca estava Na mão de quem me vendeu, Tinha feito muitas curas De gente que já morreu!
No lugar onde eu estiver Não deixo ninguém morrer, Como eu adquiri ela Muita gente quer saber Mas ela me está tão cara Que não me convém dizer.
O velho que tinha vindo Somente propor questão, Por que o cavalo velho Nunca botou um tostão Quando viu a tal rabeca Quase morre de ambição.
_Compadre, você desculpe De eu ter tratado assim Porque agora estou certo Eu mesmo fui o ruim Porém a sua rabeca Só serve bem para mim.
_Mas como eu sou um homem De muito grande poder O senhor é um homem pobre Ninguém quer o conhecer Perca o amor da rabeca… Responda se quer vender?
_Porque a minha mulher Também é muito estouvada Se eu comprar esta rabeca Dela não suporto nada Se quiser teimar comigo, Eu dou-lhe uma facada.
_Ela se vê quase morta Já conhece o castigo, Mas eu com esta rabeca Salvo ela do perigo Ela daí por diante, Não quer mais teimar comigo!
Disse-lhe o compadre pobre: _O senhor faz muito bem, Quer me comprar a rabeca Não venderei a ninguém Custa seis contos de réis, Por menos nem um vintém.
O velho muito contente Tornou então repetir: _A rabeca já é minha Eu preciso a possuir Ela para mim foi dada, Você não soube pedir.
Pagou a rabeca e disse: _Vou já mostrar a mulher! A velha zangou-se e disse: _Vá mostrar a quem quiser! Eu não quero ser culpada Do prejuízo que houver.
_O senhor é mesmo um velho Avarento e interesseiro, Que já fez do seu cavalo Que defecava dinheiro? _Meu velho, dê-se a respeito, Não seja tão embusteiro.
O velho que confiava Na rabeca que comprou Disse a ela: _Cale a boca! O mundo agora virou Dou-lhe quatro punhaladas, Já você sabe quem sou.
Ele findou as palavras A velha ficou teimando, Disse ele: _Velha dos diabos Você ainda está falando? Deu-lhe quatro punhaladas Ela caiu arquejando…
O velho muito ligeiro Foi buscar a rabequinha, Ele tocava e dizia: _Acorde, minha velhinha! Porém a pobre da velha, Nunca mais comeu farinha.
O duque estava pensando Que sua mulher tornava Ela acabou de morrer Porém ele duvidava Depois então conheceu Que a rabeca não prestava.
Quando ele ficou certo Que a velha tinha morrido Boto os joelhos no chão E deu tão grande gemido Que o povo daquela casa Ficou todo comovido.
Ele dizia chorando: _Esse crime hei de vingá-lo Seis contos desta rabeca Com outros seis do cavalo Eu lá não mando ninguém, Porque pretendo matá-lo.
Mandou chamar dois capangas: _Me façam um surrão bem feito Façam isto com cuidado Quero ele um pouco estreito Com uma argola bem forte, Pra levar este sujeito!
Quando acabar de fazer Mande este bandido entrar, Para dentro do surrão E acabem de costurar O levem para o rochedo, Para sacudi-lo no mar.
Os homens eram dispostos Findaram no mesmo dia, O pobre entrou no surrão Pois era o jeito que havia Botaram o surrão nas costas E saíram numa folia.
Adiante disse um capanga: _Está muito alto o rojão, Eu estou muito cansado, Botemos isto no chão! Vamos tomar uma pinga, Deixe ficar o surrão.
_Está muito bem, companheiro Vamos tomar a bicada! (Assim falou o capanga Dizendo pro camarada) Seguiram ambos pra venda Ficando além da estrada…
Quando os capangas seguiram Ele cá ficou dizendo: _Não caso porque não quero, Me acho aqui padecendo… A moça é milionária O resto eu bem compreendo!
Foi passando um boiadeiro Quando ele dizia assim, O boiadeiro pediu-lhe: _Arranje isto pra mim Não importa que a moça Seja boa ou ruim!
O boiadeiro lhe disse: _Eu dou-lhe de mão beijada, Todos os meus possuídos Vão aqui nessa boiada… Fica o senhor como dono, Pode seguir a jornada!
Ele condenado à morte Não fez questão, aceitou, Descoseu o tal surrão O boiadeiro entrou O pobre morto de medo Num minuto costurou.
O pobre quando se viu Livre daquela enrascada, Montou-se num bom cavalo E tomou conta da boiada, Saiu por ali dizendo: _A mim não falta mais nada.
Os capangas nada viram Porque fizeram ligeiro, Pegaram o dito surrão Com o pobre do boiadeiro Voaram de serra abaixo Não ficou um osso inteiro.
Fazia dois ou três meses Que o pobre negociava A boiada que lhe deram Cada vez mais aumentava Foi ele um dia passar, Onde o compadre morava…
Quando o compadre viu ele De susto empalideceu; _Compadre, por onde andava Que agora me apareceu?! Segundo o que me parece, Está mais rico do que eu…
_Aqueles seus dois capangas Voaram-me num lugar Eu caí de serra abaixo Até na beira do mar Aí vi tanto dinheiro, Quanto pudesse apanhar!..
_Quando me faltar dinheiro Eu prontamente vou ver. O que eu trouxe não é pouco, Vai dando pra eu viver Junto com a minha família, Passar bem até morrer.
_Compadre, a sua riqueza Diga que fui eu quem dei! Pra você recompensar-me Tudo quanto lhe arranjei, É preciso que me bote No lugar que lhe botei!..
Disse-lhe o pobre: _Pois não, Estou pronto pra lhe mostrar! Eu junto com os capangas Nós mesmo vamos levar E o surrão de serra abaixo Sou eu quem quero empurrar!..
O velho no mesmo dia Mandou fazer um surrão. Depressa meteu-se nele, Cego pela ambição E disse: _Compadre eu estou À tua disposição.
O pobre foi procurar Dois cabras de confiança Se fingindo satisfeito Fazendo a coisa bem mansa Só assim ele podia, Tomar a sua vingança.
Saíram com este velho Na carreira, sem parar Subiram de serra acima Até o último lugar Daí voaram o surrão Deixaram o velho embolar…
O velho ia pensando De encontrar muito dinheiro, Porém secedeu com ele Do jeito do boiadeiro, Que quando chegou embaixo Não tinha um só osso inteiro.
Este livrinho nos mostra Que a ambição nada convém Todo homem ambicioso Nunca pode viver bem, Arriscando o que possui Em cima do que já tem.
Cada um faça por si, Eu também farei por mim! É este um dos motivos Que o mundo está ruim, Porque estamos cercados Dos homens que pensam assim.
Literatura de Cordel quarta, 19 de dezembro de 2018
O CASAMENTO D UM CALANGRO (FOLHETO DE GERMANO DA LAGÔA)
Respeitada a ortografia da época
O CASAMENTO DE UM CALANGRO – Germano da Lagôa
Foi um calangro na casa De seu tio papavento. Tomou-lhe a benção e disse. Antes de tomar assento: Venho lhe pedir a mão De sua filha em casamento.
Papavento respondeu-lhe : Tua linhagem descobre Que inda és meu parente. Descendes de sangue nobre. Mas não te dou minha filha Porque tú és muito pobre.
Bem conheço que sou pobre, Não é preciso que diga, Mais não se fala em pobresa Quando um forte amor se liga, Vai mais que o senhor me a dê Do que haver uma intriga.
Papavento respondeu-lhe : Em vista do teu assumpto Eu como pae de familia Uma coiisa te pergunto: Se fóra do dia de hoje, Com ella já andaste junto ?
Calangro lhe respondeu : Meu tio deixe de asneira, Que fóra do dia de hoje Temos feito é muita cêra E temos andado juntos Uma semana inteira.
Papavento disse: Isto Que me diz é uma affronta, Você é um atrevido E minha filha uma tonta ; -Póde ir botar os banhos Que a dispensa eu dou prompta.
Calangro sahiu aos saltos De tanto contentamento, Não parava mais em casa Não trabalhava um momento, Passava dias e noites Em casa do papavento.
Papavento, quengo velho, Mestre na velhacaria, Disse a mulher: – Que vem ver Calangro aqui todo dia. Tome cautella com elle, Viva com a noiva de espia.
No outro dia Calangro Foi de novo ver a prima, Achou-a longe de casa Trepada em um pé de lima Calangro fallou em baixo Ella respondeu-lhe em cima.
Disse ella então ao Calangro; Não sabes, meu namorado ? Que esta noite, eu vi papai Paliando bem agastado, Calangro disse me conte O que por lá foi passado.
Papai disse a minha mãe Que queria lhe pedir Para que você deixasse De tantas vezes lá ir, E se elle isto fizer Só tem de ver eu fugir.
Calangro olhou para a prima Achou-a muito amarella, Foi ao papavento e disse: Fique com sua donzella Que eu não sirvo p’ra remendo, Caçe outro e case ella.
Papavento disse: – Isso Não é cousa que se faça Se seu pai não der um geito Você não gosta da graça; Ou casa com minha filha Ou se acaba a nossa raça.
Foi a noiva se queixar Ao pai de seu namorado Disse ao velho: – Meu tio Tenha dó de meu estado Pois eu não sou cão sem dono; Calangro está enganado.
Se o senhor não der um geito Eu me queixo ao delegado, Meu pai tem dinheiro e gasta E é feio o resultado; Seu filho está bem moço Poderá ser recrutado.
O pai de calangro disse : Não tenho geito a lhe dar ; E a noiva, d’ali mesmo Saiu para se queixar Ao capitão cururú Delegado do lugar.
Cururú ouviu a queixa E saltou fóra do poço, Dizendo enthusiasmado, Vamos ter barulho grosso ; A Excellentissima volte Que eu mando prender o moço.
Tocou logo uma bozina Que ficou tudo assombrado, N’uma hora o alagadiço Estava cheio de soldado, Tudo gritando a um tempo Às ordens ! seu delegado !
— Vão em casa do juiz Para passar o mandado Ao official de justiça Quero o Calangro intimado E se elle resistir Venha morto ou amarrado.
O cabo disse ao sargento ; – Bote os soldados na frente, Eu não vou que sou casado, Calangro é homem valente. Se elle pegar nas armas Mata hoje muita gente.
Ahí disse o official, Vão indo de vagarinho, Primeiro, cerca-se a casa, Empiqueta-se o caminho, Vocês segurem o cerco Que eu pego o homem sosinho.
O official era o gato Que conduzia o mandado, Calangro quando ouviu Dizer que estava cercado Disse de dentro p’ra fóra: —Não deixo vivo um soldado.
O gato ahi respondeu-lhe: —Quem vai dar leva seu sacco ; Saia fóra, vamos ver Quem de nós dois é mais fraco. Nessas palavras calangro Veio a bocca do buraco.
O gato pulou de cá E pegou-o pelo rabo, E foi dizendo se renda Se não eu já o acabo. Calangro grita estou preso; Vá acabar com o diabo.
Nesta lucta que tiveram Deixaram o calangro nú E assim mesmo o levaram À vista do cururú Que o interrogou dizendo : —0 que é que fizeste tú?
Disse o calangro o que fiz, É cousa que não offende, Eu quiz casar com a prima E … o senhor bem me entende Julgo até que não tem crime Quem com tempo se arrepende.
Cururú disse:—0 senhor Cahiu num feio artigo ; E para punir a honra Sou rigoroso comsigo ; Ou se casa, ou senta praça, Ou a forca é seu castigo !
Eu não queria casar Porque me vejo em atrazo E não quero assentar praça Para ser soldado raso ; Em vista do que me diz Se hei de morrer, antes caso.
Disse o cururú: – Vão ver, P’ra casa do papavento 0 padre tamanduá, E dêm á festa andamento. Por que de hoje a trez dias Se fará o casamento.
Convidem dona Raposa P’ra da noiva ser madrinha, Ella veja se arranja Por lá alguma gallinha Para ajudar na festa, Que a outra despeza é minha.
Foram ver o tejú-assú P’ra do noivo ser padrinho ; Esse, disse ao portador Quando vinha no caminho : Se houver óvos, eu vou. Por que não bebo vinho.
E outra cousa, também, P’ra eu não ir enganado: Sabe se o major cachorro P’ra festa foi convidado ? Se foi, eu volto d’aqui. Que elle é meu intrigado …
Finalmente se juntaram A raposa, o tejú-assú, O papavento e a mulher, A seriema, o urubú, Padre, noivos, convidados. Só faltou o cururú.
Urubú foi cosinheiro ; Fez um comer muito ruim, Adquiriu para o padre Uns pedaços de copim, E elle comia dizendo É pouco, só dá pra mim.
Quando estava posta a mesa Um guarda, a porta espiava ; E foi então avisar Que o cachorro chegava Tejú-assú levantou-se E disse que não ficava.
Disse a raposa: – Eu não saio Deixando o meu prato cheio, Tejú-assú disse: – Eu corro Que o barulho aqui é feio. Nisto o cachorro pegou-o E cortou-lhe o rabo ao meio!
Sahiu o tejú-assú Damnado pela floresta Levando pedras e páos Tudo de eito na testa ; Encontrou cameleão Que inda vinha p’ra festa.
Cameleão quando ouviu De seu parente a zuada, Assombrado perguntou-lhe : – O que há meu camarada? Temos barulho na festa, Ou me vem com caçuada ?
Caçuada, o que seu mano, Foi um barulho do diabo; Major cachorro chegou Peor do que um leão brabo, Botou-se primeiro a mim Olhe o que me fez no rabo !
Numa luta sanguinaria Se empenharam os convidados Os que escaparam com vida Fugiram ensanguentados; Desde esse dia ficaram Os animaes intrigados.
Literatura de Cordel quarta, 12 de dezembro de 2018
A MORTE DE ÍCARO (FOLHETO DE MAÉRCIO LOPES SIQUEIRA)
A MORTE DE ÍCARO
Maércio Lopes Siqueira
Dédalo e Ícaro: da mitologia grega para a literatura popular nordestina
A mitologia grega
é rica de ensinamento
para toda nossa vida
pois nos dá conhecimento
da natureza humana,
mostrando como se engana
nosso pobre pensamento.
Uma lenda dessas diz
que Dédalo trabalhava
para Minos, um rei grego
e a ele agradava
com as suas invenções,
pois suas fabricações
o rei muito apreciava.
Mas a glória durou pouco
sumiu a sua alegria.
Dédalo desagradou
ao rei o por isso ia
para sempre ser levado
e ficar aprisionado
numa torre muito fria.
Nesse lugar de prisão
numa ilha situado
Dédalo ficou cativo
do seu filho acompanhado.
Tanto o pai como o menino
cumpriam o seu destino
pela vida já traçado.
Porém Dédalo pensava
num modo de escapar.
Queria fugir dali
pra ninguém mais o pegar.
Levaria o seu filho
vencendo todo empecilho
para assim se libertar.
Depois de muito pensar,
encontrou uma saída
e disse para si mesmo
numa voz bem comovida:
“Vigiam terra e mar,
é por tanto pelo ar
que salvarei nossa vida.”
Porque Minos, o rei grego,
mandava que a vigilância
fosse dura e rigorosa
sempre em toda circunstância
pela terra e pelo mar
sem deixar de revistar
tudo com toda constância
Por isso Dédalo pai
por ser bom visionário
enxergou a solução
no seu grande imaginário,
pensando em fabricar
boas asas e voar
de modo extraordinário.
O inteligente homem
ansioso por fazer
dois pares de asas boas,
começou a percorrer
o espaço que podia
e as penas que ele via
tratava de recolher.
Depois de ter recolhido
boas e diversas penas,
ele amarra com uns fios,
usando os dedos apenas
juntando bem as maiores
para depois as menores
com cera colar centenas.
Enquanto o pai trabalhava
com a mente e com os dedos
o filho se divertia
as penas sendo brinquedos
quando o vento as levava,
ele corria e pegava
eram esses seus folguedos.
Dédalo faz que as asas
tenham boa curvatura,
cuidando para que elas
se encaixem na estrutura,
quer fazer de modo tal
que chegando ao final
a obra tique segura.
Quando aprontou as asas
quis fazer um experimento
segurou nelas com jeito
e fazendo movimento
seu corpo ficou suspenso,
sentiu um prazer imenso
por causa de seu invento.
As asas funcionaram
de modo sensacional
Assim eles fugiriam
numa forma sem igual.
Pai e filho como aves
quebrando todas as traves
da nossa lei natural.
Pois o homem não é ave,
o seu lugar é o chão,
homem ter um par de asas
é um caso de aberração,
ou fruto da inteligência
de trabalho e paciência
de grandiosa invenção.
Pondo no filho as asas,
Dédalo muito feliz
ajeitando seu pequeno,
com forte voz ele diz:
Ícaro, filho querido
vou deixá-lo esclarecido
pois tu és um aprendiz.
Não vá voar muito baixo
aproximado do mar,
os vapores dessas águas
podem te atrapalhar.
Também não subas demais,
a cena não é capaz
do calor agüentar.
É preciso o equilíbrio
e voar numa altura
que não comporte perigo
e que seja mais segura.
Por isso fica ao meu lado
pois eu tenho mais cuidado
e melhor desenvoltura.
Dito isso, os dois partiram
cruzando o imenso céu,
da prisão dura saindo
deixando a ilha cruel.
Voavam com liberdade,
sentindo a felicidade
mais doce que o doce mel.
Os camponeses na roça
viram os dois seres voantes,
pensaram que eram deuses
voando por une instantes.
Ficaram admirados
todos eles encantados
com os dois seres distantes.
Ícaro, entusiasmado,
com o vôo se embelezou
quis atingir mais altura
e por isso ele deixou
do seu pai a companhia.
O sol alto o seduzia
alcançá-lo ele buscou.
O forte calor do sol
foi, porém seu inimigo,
as asas se desfaziam
era fatal o perigo
pois s cera derreteu-se
toda pena desprendeu-se
esse foi o seu castigo.
O menina agita os braços
procurando flutuar
como se ainda tivesse
as asas para voar.
Gritando aflito pro pai
porém sem jeito ele cai
nas profundezas do mar.
E Dédalo não conseguiu
do seu filho o salvamento.
Viu quando ele caía
mas o distanciamento
não permitiu sua ação
que trouxesse a salvação
para o filho no momento.
Viu o filho despencar-se
em busca do mar profundo,
tristeza maior que essa
não existe nesse mundo!
O sue Ícaro morreu
quando nas águas bateu
numa fração de segundo.
O pai muito amargurado
Das águas tira o menor,
Levou-o pra muito longe
Para dar-lhe a melhor
E bonita sepultura,
Que acolhesse com ternura
O seu tesouro maior.
Então Dédalo enterrou
o filho muito querido.
De ter feito aquelas asas
já estava arrependido
Alcançou a liberdade
mas lhe ficou a saudade
do menino assim perdido.
Em memória do seu filho
toda aquela região
ele chamou de Icária
pra sua recordação.
Chegou em paz na Sicília
deixando pra sempre a ilha
lugar da triste prisão.
Essa lenda tão fantástica
nos mostra com eficiência
a importância do invento,
do saber e da ciência,
mas nos dá uma lição
pra termos moderação
no uso da inteligência.
Ela também nos ensina
o amor pela virtude,
a busca do equilíbrio
seja em nós uma atitude.
O sucesso e a grandeza,
o prazer e a riqueza,
tudo isso nos ilude.
Dédalo foi muito sábio,
pois conhecia o segredo
das coisas da natureza,
no entanto tinha medo
e por isso advertiu
mas o filho não ouviu
morrendo, por isso, cedo.
Portanto toda ciência
quando é mal direcionada
passando dos seus limites
de uma forma exagerada
deixa de ser benfazeja
por importante que seja
torna amaldiçoada.
Literatura de Cordel quarta, 05 de dezembro de 2018
O TESTAMENTO DA CIGANA ESMERALDA (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS) ÁUDIO
Literatura de Cordel quarta, 28 de novembro de 2018
UMA VIAGEM AO CÉU (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
Uma vez, eu era pobre,
Vivia sempre atrasado,
Botei um negócio bom
Porém vendi-o fiado
Um dia até emprestei
O livro do apurado.
Dei a balança de esmola
E fiz lenha do balcão
Desmanchei as prateleiras
Fiz delas um marquezão
Porém roubaram-me a cama
Fique dormindo no chão.
Estava pensando na vida
Como havia de passar,
Não tinha mais um vintém
Nem jeito pra trabalhar
O marinheiro da venda
Não queria mais fiar.
Pus a mão sobre a cabeça
Fiquei pensando na vida
Quando do lado do Céu
Chegou uma alma perdida,
Perguntou: - Era o senhor,
Que aí vendia bebida?
Eu disse que era eu mesmo
E a venda estava quebrada,
Mas se queria um pouquinho
Ainda tinha guardada
Obra de uns dois garrafões
De aguardente imaculada.
Me disse a alma: - Eu aceito
E lhe agradeço eternamente
Porque moro Céu, mas lá
Inda não entra aguardente
São Pedro inda plantou cana
Porém perdeu a semente.
Bebeu obra de 3 contos,
Ficou muito satisfeita
Disse: - Aguardente correta,
Imaculada direita,
Isso é que eu chamo bebida
Essa aqui, ninguém enjeita!
Perguntei-lhe: - Alma, quem és?
Disse ela: - Tua amiga,
Vim te dizer que te mude
Aqui não dá nem intriga
Quer ir para o Céu comigo?
Lá é que se bota barriga!
Eu lá subi com a alma
Num automóvel de vento
Então a alma me mostrava
Todo aquele movimento,
As maravilhas mais lindas
Que existem no firmamento.
Passamos no Purgatório,
Tinha um pedreiro caiando,
Mas adiante era o Inferno
Tinha um diabo cantando
E a alma de um ateu
Presa num tronco, apanhando.
Afinal, cheguei no Céu
A alma bateu na porta,
Como pouco chegou São Pedro
Que estava pela horta,
Perguntou-lhe: - Esta pessoa
Ainda é viva, ou é morta?
Então a alma respondeu:
- É viva, estava no mundo
Não tinha de que viver
Está feito um vagabundo,
Lá quem não for bem sabido
Passa fome, vive imundo!
São Pedro aí perguntou:
- O mundo lá, como vai?
Eu aí disse: - Meu Santo,
Lá filho rouba do pai,
Está se vendo que o mundo
Por cima do povo cai...
Eu ainda levava um pouco
Da gostosa imaculada,
Dei a ele e ele disse:
- Aguardente raciada!
E aí me disse: - Entre,
Aqui não lhe falta nada!
Arrastou uma cadeira
E mandou eu me sentar
Chamou um criado dele
Disse: - Cuide em se arrumar
Vá lá dentro e diga a ama
Que bote um grande jantar.
Quando acabei de jantar,
O Santo me convidou,
Disse: - Vamos lá na horta
Fui, ele então me mostrou
Coisas que me admiraram
E tudo me embelezou.
Vi na horta de São Pedro
Arvoredos bem criados
Tinha pés de plantações
Que estavam carregados
Pés de libras esterlinas
Que já estavam deitados.
Vi cerca de queijo e prata,
E lagoa de coalhada
Atoleiro de manteiga
Mata de carne guisada
Riacho de vinho do porto,
Só não tinha imaculada!
Prata de quinhentos réis
Eles lá chamam caipora,
Botavam trabalhadores
Para jogar tudo fora,
Esses níqueis de cruzado
Lá nascem de hora em hora.
Então São Pedro me disse:
- Quero fazer-lhe um presente,
Quando você for embora
Vou lhe dar uma semente,
Você mesmo vai escolher
Aquela mais excelente!
Deu-me dez pés de dinheiro,
Alguns querendo botar,
Filhos de queijo do reino
Já querendo safrejar,
Uns caroços de brilhante
Para eu na terra plantar.
Galhos de libra esterlina
Deu-me cento e vinte pés
Deu-me um saco de semente
De cédulas de cem mil réis
Deu-me maniva de prata
De diamante, umas dez.
Aí chamou Santa Bárbara,
Esta veio com atenção
São Pedro aí disse a ela:
Eu quero uma arrumação
Este moço quer voltar
Arranje-lhe uma condução.
- Bote cangalha num raio,
E a sela num trovão
Veja se arranja um corisco
Para ele levar na mão,
Porque daqui para Terra
Existe muito ladrão!
Eu desci do Céu alegre
Comigo não foi ninguém
Passei pelo Purgatório
Ouvi um barulho além –
Era a velha minha sogra
Que dizia: - Eu vou também!
Eu lhe disse: - Minha sogra,
Eu não posso a conduzir
Ela me disse: - Eu lhe mostro
Porque razão hei de ir
E se não for apago o raio
Quero ver você seguir!
Nisso o raio se apagou,
Desmantelou-se o trovão,
O corisco que eu trazia
Escapuliu-se da mão
E tudo quanto eu trazia
Caiu desta vez no chão.
Aí a velha voltou
Rogando praga e uivando,
Quando entrou no Purgatório
Foi se mordendo e babando
Dizendo tudo de mim
Lançando fogo e falando.
Bem dizia o meu avô:
- Sogra, nem depois de morta
Fede a carniça de corpo
A língua da alma corta
Não diz assim quem não viu
Uma sogra em sua porta.
Eu vinha com isso tudo
Que o santo tinha me dado
Mas minha sogra apanhou
O diabo descuidado
Fiquei pior do que estava
Perdi o que tinha achado.
E quando cheguei em casa
A mulher quase me come,
Ainda pegou um cacete
E me chamou tanto nome,
Disse que eu casei com ela
Para matá-la de fome...
Se não fosse minha sogra
Eu hoje estava arrumado,
Mas ela no Purgatório
Achou tudo descuidado,
Abriu a porta e danou-se
Veio deixar-me encaiporado.
Nunca mais voltei ao Céu
Para falar com São Pedro,
E ainda mesmo que possa
Não vou porque tenho medo
Posso encontrar minha sogra
E vai de novo outro enredo.
FIM
Literatura de Cordel quarta, 21 de novembro de 2018
O CACHORRO DOS MORTOS (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
Os nossos antepassados
Eram muito prevenidos
Diziam: matos têm olhos
E paredes tem ouvidos
Os crimes são descobertos
Por mais que sejam escondidos
Em oitocentos e seis
Na província da Bahia
Distante da capital
três léguas ou menos seria
Sebastião de Oliveira
ali num canto vivia
Ele, a mulher e duas filhas
E um filho já homem feito
O rapaz era empregado
E estudava direito
O velho não era rico
Mas vivia satisfeito
As duas filhas eram moças
Bonitas e encantadoras
Logravam na capital
O nome de sedutoras
Chamavam atenção de todos
As grandes tranças tão louras
Esse velho era ferreiro
E ferreiro habilitado
Vivia ali do ofício
Plantando e criando gado
Por três vezes enjeitou
O cargo de delegado
Havia um vizinho dele
Eliaziário Amorim
Esse tinha um filho único
Da espécie de Caim
Enquanto o espanhol velho
Até não era ruim
O filho deste espanhol
Era uma fera carniceira
Veio provocar namoro
Com as filhas de Oliveira
Uma delas disse a ele:
De nós não há quem o queira
Ele disse: Tu não sabes
Que meu pai possui dinheiro
Em terras e criações
É o maior fazendeiro?
Ela disse: O meu pai é pobre
Planta, cria e é ferreiro
Minha mãe tece de ganho
Nós vivemos de costura
Meu pai vive de sua arte
E de sua agricultura
Meu irmão é empregado
Para que maior ventura?
O sedutor conheceu
Seus planos serem debalde
E só podia vencê-la
Por meio de falsidade
Que é a arma mais própria
Aonde existe a maldade
Saiu dali Valdivino
Fedendo a chifre queimado
E Angelita ficou
Com o coração descansado
Nem disse aos outros de casa
O que tinha passado
Ele pensou em forçá-la
Mas pensou no resultado
Devido o pai de Angelita
Ser muito considerado
O filho pelo governo
Era tão conceituado
Exclamou ele consigo:
oO! Angelita és tão bela
Eu não sossegarei mais
E nem me esquecerei dela
Farei tudo para vencê-la
Porém não caso com ela
Mas Valdivino temia
O pai dela e o irmão
Que o governo da província
Tinha-lhe muito atenção
O rapaz era empregado
E tinha consideração
Valdivino inda pensou
Que matando Floriano
Podia calçar com ouro
Todo governo bahiano
Ainda que entrasse em júri
Não passava nem um ano
Ou poderia matá-lo
Oculto numa emboscada
Porque ninguém vendo o crime
Ele não sofria nada
Defunto não conta história
Estava a questão acabada
Havia ali um engano
Entre Vitória e Bahia
A divisão das províncias
Ali ninguém conhecia
Sebastião de Oliveira
Era o único que sabia
O governo da província
Tendo aquela precisão
Disse um dia a Floriano
Você vá em comissão
Chamar seu pai para vir
Mostrar a demarcação
Valdivino de Amorim
Viu Floriano passar
Escolheu o lugar próprio
Onde pudesse emboscar
Dizendo dentro de si:
Ele não pode escapar
A fera foi emboscá-lo
Onde havia uma capoeira
Carregou um bacamarte
Fez duma árvore trincheira
Distante um quarto de légua
Da fazenda de Oliveira
O rapaz chegou em casa
O velho tinha saído
Foi ver se achava um jumento
Que havia se sumido
Um amigo lhe escreveu
Que lá tinha aparecido
O Floriano chegou
Depois que o velho saiu
Nessa tarde não voltou
Com a família dormiu
Deu o recado à mãe dele
De madrugada seguiu
Calar um cachorro velho
Que Sebastião criou
Quando Floriano saiu
Calar o acompanhou
Floriano quis voltar
Porém Calar não voltou
Passava ali Floriano
A fera então enfrentou-o
Disparou o bacamarte
Sem vida em terra lançou-o
Calar partiu ao sicário
O assassino amarrou-o
As moças lá da fazenda
Ouviram o grande estampido
Angelita se assustou
Dizendo: O que terá sido?
O tiro foi para o lado
Que seu irmão tinha ido
Angelita convidou
A sua irmã Esmeralda
Dizendo: Vamos aqui
A passeio pela estrada
Aquele tiro que deram
Deixou-me sobressaltada
No sertão naquele tempo
Podia uma moça andar
Passava dois ou três meses
Sem nem um homem passar
Por isso foram elas duas
Não tinha o que recear
Iam ali conversando
Sobre a aragem matutina
Disse Esmeralda à irmã:
Olha para o céu, menina
Estás vendo aquelas estrelas
Como têm a luz tão fina?
Chegaram aonde o irmão
Estava morto na estrada
O criminoso no mato
Atirou em Esmeralda
E enfrentou Angelita
Dizendo: Não diga nada
Angelita muito pálida
Sem estar esmorecida
Vendo os dois irmãos já mortos
Por uma mão homicida
Lhe disse: Monstro tirano
Eu morro e não sou vencida
Ele disse: Angelita
Com tudo isso sou teu
Foi dar-lhe um beijo nos lábios
E Angelita mordeu
Ele cravou-lhe o punhal
Ela ali esmoreceu
Pondo a mão na punhalada
Disse: Monstro desgraçado
Aquele velho cachorro
Que está ali amarrado
Descobrirá este crime
E tu serás enforcado
Olhou para o gameleiro
Que tinha junto a estrada
Dizendo: Tu gameleiro
Viste esta cena passada?
És uma das testemunhas
Quando a hora for chegada
Na última agonia
Exclamou: Monstro assassino
Tirastes agora três vidas
E não sacias o destino?
Isso hei de te lembrar
Perante o juiz divino!
Não julgue que fique impune
Este sangue no deserto
Tu não vês três testemunhas
Que estão aqui muito perto
Estás perante ao público
Irão depor muito certo
Disse Valdivino: És louca
Quem viu o que foi passado?
Disse Angelita: Este cão
Que está ali amarrado
A gameleira e as flores
Dirão no dia chegado
Olhou para o cão e disse:
Olha, meu velho Calar
Tu dirá tudo ao juiz
Se ele te perguntar
Essa velha gameleira
Fica para te ajudar
Essa flor que por ela
Há festa aqui todo ano
Há de tirar a justiça
De uma suspeita ou engano
Dirá ao juiz: Venha ver
Quem matou o Floriano!
As três vidas que roubaste
Pagarás com sua vida
Tu hás de te arrepender
Depois da causa perdida
Uma lágrima vertida
Será por teu pai vertida
Contudo monstro, perdôo-te
Porque fui e sou cristã
A morte do meu irmão
A minha e de minha irmã
Tu hoje matas a mim
Outro te mata amanhã
E pondo a mão sobre uma
Das punhaladas que tinha
Disse a Calar: Se fugires
Consola a minha mãezinha
E diga-lhe que abençoe
Os pobres filhos que tinha
Embora que tu não fales
Pois não te foi concedido
Mas um olhar bem lançado
Dá idéia dum sentido
Um uivo e um olhar
Pode ser compreendido
E ali cerrando os olhos
Quase sorrindo expirou
O assassino olhando
Chorando se retirou
Depois pensou: Isto é nada!...
Com toda calma voltou
Já estava frio o cadáver
Porém nas faces mimosas
Via-se perfeitamente
Desenho de duas rosas
Como se fossem pintadas
Por mãos das mais curiosas
Em Esmeralda se via
O sangue ainda saindo
Vestígio de zombaria
Como quem morre sorrindo
Como criança que brinca
Finge que está dormindo
O rapaz banhado em sangue
Bem no meio da estrada
À esquerda de Angelita
À direita de Esmeralda
Com uma mão na ferida
E a outra mão estirada
Valdivino tinha à noite
Escrito numa carteira:
"Eu hoje hei de matar
Floriano de Oliveira
Se não matá-lo me mato
Será a minha derradeira"
Datou-a e assinou o nome
Pegou a arma e saiu
Se encostou num gameleiro
A carteira escapuliu
Havia um oco da árvore
Nele a carteira caiu
A fera não se lembrou
Da testemunha ocular
Perdendo aquela carteira
Alguém a podia achar
Ela na mão da justiça
Quem poderia o soltar?
Porém uma força oculta
Permitiu que ele perdesse
E a mesma força impôs
Que dela se esquecesse
Para dizer a seu tempo:
O assassino foi esse!
Calar, o velho cachorro
Que aquele espetáculo via
Soltando uivos enormes
Que muito longe se ouvia
Rosnava, fitava os olhos
Debalde a corda mordia
Valdivino ali puxando
Um facão muito afiado
Descarregou no cachorro
Um golpe encolerizado
Errou e cortou a corda
Com que estava amarrado
Valdivino ficou triste
Vendo o cachorro correr
Lembrou-se o que Angelita
Disse antes de morrer
Porém disse: Ele não fala
Como poderá dizer?
Calar chegou na fazenda
Uivando desesperado
Dona Maria da Glória
Já tinha levantado
Quando viu o cão uivando
Aí cresceu-lhe o cuidado
E foi procurar os filhos
Onde ouviu os estampidos
Calar foi adiante uivando
Com enormes alaridos
Dona Maria da Glória
Ia aguçando os ouvidos
Como não foi seu espanto
Quando chegou no lugar
Onde achou os filhos mortos
Sem nada ali atinar
Calar sabia de tudo
Mas não podia falar
Voltou Maria da Glória
Num triste e penoso estado
Já Sebastião em casa
A esperava sentado
Não sabia da desgraça
Que a pouco tinha se dado
Perguntou pela família
Ela não pôde contar
Disse apenas: Morreu tudo
E apontou o lugar
Estendeu-se para um lado
Sem mais nada atinar
Sebastião de Oliveira
Foi por onde a mulher veio
Achou a poça de sangue
Os filhos mortos no meio
Olhou para o céu e disse:
Oh! Meu Deus que quadro feio
Foi perguntar à mulher
Como aquilo foi se dado
Ela apenas lhe contou
O que tinha passado
Deixando o ancião
Aflito e impressionado
Montou num burro e saiu
Dali para a capital
Quando chegou na cidade
Foi ao quartel general
Lá falou mais duma hora
E nada disse afinal
Depois de muita insistência
O presidente entendeu
Perguntou por Floriano
Ele lhe disse: Morreu..
Ele e a família toda!...
E contou o que se deu
A justiça foi atrás
Ver o que tinha se dado
Encontrou os três cadáveres
No chão em sangue banhado
Calar inda estava uivando
Junto dos mortos deitado
Foram à casa de Oliveira
Ver se Maria da Glória
Dava um roteiro que ao menos
Se calculasse uma história
Ela contou essa mesma
Que eles guardam na memória
Dona Maria da Glória
Dois dias depois morreu
Sebastião de Oliveira
Com três dias enlouqueceu
Dentro de duas semanas
Tudo desapareceu
A justiça da Bahia
Não cessou de procurar
Espalhou por toda parte
Secretos a indagar
Não havia uma pessoa
Que dissesse: Eu vi matar
Dava dez contos de réis
Na moeda que quisesse
À pessoa que chegasse
E seriamente dissesse
Teria mais um terreno
A pessoa que soubesse
Porém o crime se deu
Quando ali ninguém passava
Calar sabia tudo
Porque no crime ele estava
Se falasse descobria
Desejo não lhe faltava
Impressionava a todos
Habitantes da cidade
Como deu-se aquele crime
Naquela localidade
Floriano de Oliveira
Todo lhe tinha amizade
Atribuiu-se a um roubo
Por algum aventureiro
Mas o rapaz costumava
A não andar com dinheiro
Questão de moça não era
Ele era justiceiro
Os moradores de perto
Eram todos conhecidos
Compadres dele e do pai
E por eles protegidos
Tanto que se dando o crime
Todos ficaram sentidos
Eliziário era um desses
Abortos que tem havido
Desses que o pão que come
Considera estruído
Fazer-lhe o mal é pecado
Fazer-lhe o bem é perdido
Esse era fazendeiro
Porém dali não saía
Nem era bem conhecido
No comércio da Bahia
Só onde vendia lã
Alguém lá o conhecia
E o dono do açougue
Onde ele vendia gado
O banco onde ele tinha
Dinheiro depositado
Tanto que deu-se esse crime
E dele não foi lembrado
Sentiu e chorou bastante
A morte do camarada
E não foi à missa dele
Por não ser de madrugada
Pois só tinha uma camisa
E essa estava rasgada
Também procurou saber
Qual seria o assassino
Não sei se pelo dinheiro
Ou pelo próprio destino
Mas nunca lhe veio na mente
Ser seu filho Valdivino
Onde deu-se o crime havia
Duas estradas em cruz
Diziam que ali se achavam
Umas flores muito azuis
Formando uma lapa igual
À do menino Jesus
Os baianos costumavam
Desde da antigüidade
Fazerem uma grande festa
Naquela localidade
Véspera e dia de ano
Ali era novidade
Na capital da Bahia
Não havia outro festim
Havia missa campal
Orquestra e botequim
Bailes naquelas latadas
Bem cobertas de capim
Em oitocentos e nove
Estava a festa a terminar
Um velho que ali passava
Passou naquele lugar
Atrás desse caçador
Vinha o cachorro Calar
Abrigou-se numa sombra
Vinha muito esbaforido
Foi cheirar o pé da cruz
Que o senhor tinha morrido
Cheirou a das duas moças
E depois soltou um gemido
Estava ali um general
O bispo e o presidente
Com o chefe da polícia
Homem muito experiente
Todos ficaram daquilo
Impressionadamente
O general perguntou
De quem era aquele cão
Respondeu o velho Pedro:
Este cachorro patrão
É do defunto Oliveira
Que Deus dê-lhe a salvação
Este cachorro é o rei
Dos cachorros caçadores
Ainda adora o lugar
Que mataram seus senhores
Se fosse de madrugada
Seus uivos faziam horrores
Disse o chefe de policia:
Inda não se descobriu
A morte de um patrício
Que tanto à pátria serviu
Foi logo nesse deserto
Em horas que ninguém viu
Disse ali o presidente:
Se ainda se descobrir
O autor dessas três mortes
Eu juro por Deus o punir
Serei o carrasco dele
Quando ele à forca subir
Sebastião de Oliveira
Era um pobre acreditado
A família deu exemplo
O filho um rapaz honrado
Era um rapaz distinto
Por todo mundo estimado
Então disse o general:
Isso ainda é descoberto
O crime foi muito oculto
Feito aqui neste deserto
Mas quando chegar o dia
Há de saber-se por certo
Se eu vivo for nesse tempo
Serei o algoz mais forte
Serei um dos que conduz
Para o teatro da morte
Com a minha própria mão
Amolo o ferro que o corte
O cachorro ouvindo aquilo
Ergueu-se muito contente
Foi aos pés do general
Festejou o presidente
Como quem dizia: O crime
É punido corretamente
Disse o bispo: Esse cachorro
É testemunha ocular
Ele viu quem fez as mortes
Só faltava é ele apontar
Se ele visse o criminoso
Podia lhe denunciar
Disse o velho: Esse cachorro
Fez uma coisa esquisita
Tinha uma cobra enroscada
Onde mataram Angelita
Ele despedaçou-a a dentes
Quase que se precipita
Disse o velho: Esse cachorro
Aos pés da cruz se lança
Solta um uivo muito triste
Como quem pede vingança
Como quem pede debalde
Sem ter daquilo esperança
Nisso chegou um cavalheiro
Valdivino de Amorim
Andava fora inda vinha
Ver se alcançava o festim
Vinha num burro possante
Alvo da cor de jasmim
Assim que o cachorro viu
Valdivino se apear
Rosnou e partiu a ele
Querendo lhe estraçalhar
Só não rasgou-lhe a garganta
Devido o velho pegar
Tremia o queixo e babava
Fitando ali Valdivino
Uivava como quem já
Tivesse perdido o tino
Só faltava era dizer
— Eis aí o assassino!
E foi para o pé da cruz
E ali pegou a uivar
Fitando os olhos no céu
Como quem quer suplicar
Como quem dizia: Oh! Deus
Vens que não posso falar!
O bispo disse: Valdivino
Você está descoberto
O senhor foi autor
Das mortes neste deserto
Aquele cachorro deu
Um depoimento certo
O monstro viu o perigo
Fez tudo para negar
O bispo disse: Meu filho
Não há mentira em olhar
Os olhos são verdadeiros
Não podem nada ocultar
Os olhos também se queixam
Um olhar diz o que sente
Ameaça ou traição
Punição severamente
Declara mágoa ou dor
Porém o olhar não mente
O olhar daquele cão
Está demonstrando a dor
O sentimento profundo
Da morte do seu senhor
Ele só falta falar
E apontar o matador
Naquilo duas crianças
Que estavam em brincadeira
Uma delas se trepou
Num galho de gameleira
Tirando um ninho de rato
Achou nele uma carteira
O leitor deve lembrar-se
De um verso que aqui já leu
Veja na véspera do crime
O que Valdivino escreveu
E que no oco da gameleira
A carteira se perdeu
Ali trouxeram a carteira
Entregaram ao general
O bispo disse: Senhor
O que lhe disse afinal
Eu não lhe disse que os olhos
Só diz o que é legal?
Valdivino descobriu tudo
Em sua interrogação
Calar ali demonstrava
Ter grande satisfação
Pulava um metro de altura
E rolava pelo chão
Corria escaramuçando
Como quem estava em folia
Festejou o general
Com demarcada alegria
Como quem dizia: Nesses
Encontrei o que queria
O povo todo da festa
Quis a Valdivino linchar
O bispo e o presidente
Tratou de acomodar
Garantindo que a justiça
Havia de o castigar
Saiu preso Valdivino
Calar o acompanhou
O velho Pedro chamava
Mas ele não escutou
Voltou quando Valdivino
Preso nos ferros deixou
O general ao sair
Ordenou ao cozinheiro
Que desse ao velho Calar
Um bom lombo de carneiro
Porque merecia muito
Aquele bom companheiro
O criado deu o lombo
Calar nem para ele olhou
Saiu o povo da festa
E o lombo lá ficou
O cachorro veio comer
À noite quando voltou
A mulher de Eliziário
Sabendo o que aconteceu
Deu-lhe um ataque tão forte
Que ela no chão se estendeu
Passou a noite sem fala
No outro dia morreu
Juvenal um espanhol
Parente de Eliziário
Chegando lá disse ao velho:
— você é milionário
Compre três ou quatro médicos
Que provem ele está vario
Porque ele estando vário
Não poderá ser julgado
O processo fica inválido
Não pode ser condenado
Aí o senhor procura
O melhor advogado
Eliziário pensou
Aquilo ser acertado
Do contrário Valdivino
Ia ser executado
E tinha toda certeza
Ele morrer enforcado
Dirigiu-se à capital
Procurou advogado
Este arrumou cinco médicos
Sendo o réu examinado
Provaram que há quatro anos
Ele era tresloucado
O bispo e o presidente
Consultaram ao general
Mandaram vir quatro médicos
No reino de Portugal
E fizeram na Bahia
Uma junta especial
Vieram de Portugal
Quatro médicos escolhidos
Que por dinheiro sem conta
Não seria iludidos
Esses homens de caráter
Jamais seriam vendidos
E examinaram o réu
Cada médico de per si
Todos disseram que nunca
Houve tal loucura ali
Nem sequer nervoso havia
Todos juraram aí
Fizeram novo processo
Depois dele examinado
E estando pronto o processo
Valdivino foi julgado
A sentença que pegou
Foi para ser enforcado
Não havia mais recurso
Estava tudo consumado
O réu dali a três dias
Ia ser executado
Não tinha mais o que apelar
Já tinha sido julgado
O velho quase sem jeito
Sem nada mais conseguir
Tentou o último meio
A fim do filho fugir
Mas só dos degraus da forca
Podia se escapulir
Então soube que o carrasco
Era um tal de Zeferino
Um calibre mais ou menos
Igual o de Valdivino
Tinha os três dons da desgraça
Covarde, vil, assassino
Era um mulato laranjo
De aspecto aborrecido
O couro da testa dele
Sempre se via franzido
Os cabelos bem vermelhos
Rosto largo e não comprido
Foi o velho Eliziário
A esse tal Zeferino
Ver se ele podia dar
Evasão a Valdivino
Dizendo: Ele pula da forca
E depois toma destino
Pegue dez contos de réis
Que lhe dou adiantado
E se tiver a fortuna
Dele não ser enforcado
Dar-lhe-ei mais vinte contos
O dinheiro está guardado
Então disse Zeferino
— Isso é difícil arranjar
Porém quando ele subir
Eu finjo me desculpar
Ele que vai prevenido
Trata logo de saltar
Disse Zeferino ao velho:
O senhor deve aprontar
Um cavalo bem ligeiro
Para quando ele saltar
Montar-se logo e correr
Antes do povo chegar
Eu hoje direi a ele
Tudo que está planejado
Que cor será o cavalo
Que há de está selado?
— Diga que é o poldro branco
Em que ele andava montado
Valdivino quando soube
Esta consulta que havia
Ficou como uma criança
Chorava ali de alegria
Jurando no mesmo instante
Que Calar lhe pagaria
Então quando chegou o dia
Estava o povo aglomerado
Valdivino de Amorim
Ia ser executado
Tudo ali estava esperando
Vê-lo morrer enforcado
Presente ao estado maior
Que vinha presenciar
Subiu Valdivino à forca
Zeferino foi laçar
Porém ele se encolhendo
Conseguiu dali saltar
E saiu como uma flecha
Entre o povo se meteu
Se montando no cavalo
Dali desapareceu
Internando-se no mato
Num instante se escondeu
O povo indignou-se
Com a fuga de Valdivino
Um deles que ali estava
Estrangulou Zeferino
Porque este tinha dado
Evasão ao assassino
Porém chegou o cachorro
Quase na ocasião
Soltou dois ou três latidos
Saiu de venta no chão
Sessenta e três praças foram
Também em perseguição
Porém Valdivino ia
Em bom cavalo montando
Tinha grande desvantagem
De não ter saído armado
E Calar no rastro dele
Gania muito vexado
Foi preso Eliziário
Como autor da evasão
O povo não o matou
Porém foi para a prisão
E o bispo que saiu
Pedindo à população
Era meia-noite em ponto
Valdivino ainda corria
O cavalo já cansado
Que nada mais resistia
E o cachorro Calar
De vez enquanto latia
Valdivino conhecendo
Que nada a ele valia
E o cachorro Calar
Seu rastro não deixaria
Pensou em suicidar-se
Só assim descansaria
Dentro do mato apoiou-se
E amarrou o cavalo
Encostou-se numa pedra
Sentiu alguém acordá-lo
Nisto o cavalo espantou-se
Ele não soube pegá-lo
Seguiu por uma vereda
Descalço e todo rompido
Ouvindo de vez enquanto
Calar soltar um ganido
Foi sair bem no lugar
Que o crime tinha havido
Ele viu a gameleira
Que sombreava a estrada
Floriano de Oliveira
Angelita e Esmeralda
Sebastião de Oliveira
E dona Maria prostrada
Viu vir uma carruagem
Nela vinha um magistrado
Que saudou os três vultos
Depois de ter se apeado
Exclamou: Sangue inocente
Breve hás de ser vingado!
Tornou a tomar o carro
Se montando foi embora
Nesse momento Calar
Vem com a língua de fora
Festejou todos os vultos
E voltou na mesma hora
Um dos vultos chamou ele
O cachorro estacou
Valdivino não ouviu
O que o fantasma falou
Só ouviu foi dizer: Volte
E o cachorro voltou
O criminoso pensou
Que ali não escaparia
Lembrou-se duma pessoa
Que morava na Bahia
Pois tinha onde ocultá-lo
Que nem o cachorro via
Era um compadre e amigo
A quem ele protegeu
Que com dinheiro do pai
Esse tal enriqueceu
E ia sempre visitá-lo
Quando a justiça o prendeu
Valdivino calculou:
Eu o que devo fazer
É ir para o quintal
Por ali me esconder
Ou ele ou a mulher dele
Um há de me aparecer
E saiu o assassino
Chegando lá se escondeu
Não houve ali quem o visse
Quando o dia amanheceu
O compadre veio fora
E ele lhe apareceu
Valdivino lhe pediu
Que não o deixasse morrer
Disse o velho Roberto:
Eu tenho onde te esconder
Porém ninguém mais daqui
Disso não pode saber
Quatros dias decorriam
E o assassino escondido
Debaixo dumas madeiras
Estava ele metido
O pai dele na cadeia
Já ia ser concluído
Num dia de quarta-feira
O velho Calar chegou
A força ainda estava armada
Calar ali a olhou
Cravando a vista no céu
Um uivo triste soltou
Veio ali o presidente
Que trouxe um pão e lhe deu
Calar olhou para ele
Cheirou-lhe os pés e gemeu
Botando o pão entre as mãos
Deitou-se e ali comeu
Chegou a força do mato
Não trazendo o criminoso
O general com aquilo
Ficou muito desgostoso
Até o governador
Ficou doente e nervoso
O povo ao redor da forca
Só fazia lamentar
Que o pai do assassino
Deverá se executar
Tudo pedia ao governo
Que o mandasse enforcar
O cachorro levantou-se
Como quem está chamando
Foi à casa de Roberto
Na porta ficou uivando
Olhava para Roberto
Partia a ele rosnando
O general com aquilo
Ficou bastante nervoso
E disse ao governador:
Estou muito receoso
Que ali naquela casa
Está oculto o criminoso
Então a força cercou
Toda casa de Roberto
O cachorro só faltava
Era dizer: Está perto
O general disse a ele:
O senhor está descoberto
Roberto ali descobriu
Onde o assassino estava
Debaixo das madeiras
O monstro se conservava
Foi levado ao pé da forca
Onde o povo lhe esperava
Contou tudo que se deu
Antes de ser enforcado
Os vultos que viu nas cruzes
A quem tinha assassinado
O segredo do cachorro
E o carro do magistrado
Às cinco horas da tarde
A justiça o enforcou
O pai dele estava preso
Assim que o sino dobrou
Ali soltando um suspiro
Na mesma hora expirou
Estando morto o assassino
O deitaram sobre o chão
O cachorro olhou-o bem
Chamando tudo atenção
Soltou dois ou três latidos
Que espantou a multidão
Quando a justiça ordenou
Pra ser o corpo inhumado
Sobre os pés do general
Calar caiu mui cansado
Talvez querendo dizer
General, muito obrigado
O general foi ver água
Ao cachorro ofereceu
Ali o velho Calar
Dois litros d'água bebeu
Trouxeram-lhe uma fritada
Porém ele não comeu
Festejando o general
As pernas dele abraçou
Dirigiu-se ao presidente
A mesma ação obrou
Depois desapareceu
Novo destino tomou
Foi direitinho ao lugar
Que o horrendo crime se deu
No pé da cruz de Angelita
Ele cavou e gemeu
O velho Pedro chamou-o
Mas ele não atendeu
Deitou-se entre as três cruzes
Sua vida liquidou
Nas condições dum guerreiro
Que da batalha voltou
Trazendo os louros de guerra
À sepultura baixou
O general quando soube
Que Calar era sumido
E que fazia três dias
Que não era aparecido
Mandou gente procurá-lo
Ficando muito sentido
Saíram cinco ou seis praças
Em procura de Calar
O general tinha dito
Não voltem sem o achar
Tragam ele direitinho
Não o façam maltratar
Os praças foram ao lugar
Onde o crime tinha havido
Onde a família Oliveira
Tinha toda sucumbido
Bem no pé duma das cruzes
Tinha o velho cão morrido
Tinha posto termo a vida
O maior dos lutadores
O que em sua existência
Viu o horror dos horrores
Que sem falar descobriu
Quem matou os seus senhores
O general quando soube
Da forma que o tinham achado
Mandou fazer uma cova
E nela foi enterrado
Um dos amigos mais firmes
Que no mundo foi criado
E nas mortes dos senhores
Ele afirmou ter ação
Provou que tinha amizade
Ao velho Sebastião
A morte só foi vingada
Por sua perseguição
Só não fez foi dizer nada
Mas provou por sua vez
Apontou só com a vista
O monstro que os crimes fez
Seus olhos diziam ao público
Esse matou todos três
Deitou-se encostado às cruzes
Que tinham edificado
Tinha morrido há três dias
E nem sequer estava inchado
Como quem dizia: Agora
Posso morrer estou vingado
Mais de duzentas pessoas
Assistiram enterrar ele
Devido à grande firmeza
Que tinha se visto nele
Muitas flores naturais
Deitaram na cova dele
Agora vejam leitores
Quem era o velho Calar
E como Sebastião
Um dia pôde o achar
Ele tinha cinco dias
O dono ia o matar
Então o velho Oliveira
Achou ser ingratidão
Matar aquele inocente
Embora fosse ele um cão
Porém disse: A caridade
Não se faz só a cristão
E levou-o para casa
Disse à mulher que criasse
Dizendo: Pode ser bom
Algum dia inda caçasse
Quando nada da fazenda
Talvez os bichos espantasse
De fato, Calar criou-se
E era um cão caçador
Maracajá e raposa
Tinha dele tal pavor
Que passava muito longe
Da fazenda do senhor
Era o vigia da noite
Um minuto não dormia
Numa coisa que guardava
O velho cão não bulia
Só quando os donos lhe davam
Era que ele se servia
A família do Oliveira
Às vezes a conversar
A velha dizia aos filhos:
Esse cachorro Calar
Tem expressões de pessoa
Que conhece seu lugar
Em casa do dono ele
De noite nada chegava
Um bacurau que voasse
Ele se erguia e ladrava
Do poleiro das galinhas
Até coruja espantava
Como era muito bom
O dono sempre caçava
Porém a vizinho algum
A noite acompanhava
E só ia para o mato
Quando o senhor lhe chamava
Depois de terem morrido
Os senhores de Calar
O pobre cão toda noite
Ia para aquele lugar
Olhava para as três cruzes
Levava a noite a uivar
Latia e fitava o céu
Que causava pena e dó
Via sangue no capim
Ele cobria com pó
Não queria ir para casa
Passava a noite ali só
O velho Pedro dos Anjos
Vizinho de Sebastião
Achou que aquele animal
Merecia compaixão
Chamou-o para não vê-lo
Morrer sem ter remissão
O velho Pedro caçava
Toda noite com Calar
Mas ele só ia à caça
Depois que ia ao lugar
Aos pés daquelas três cruzes
Não deixava de uivar
Assim morreu o Calar
Ficou também descansado
Era um cão porém deixou
O nome imortalizado
Morreu depois de livrar
Quem já o tinha livrado
Leitor não levantei falso
Escrevi o que se deu
Acreditem que este fato
Na Bahia aconteceu
Depois de lutar então
Rolou Calar sobre o chão
Onde seu senhor morreu
Literatura de Cordel quarta, 14 de novembro de 2018
AS PROEZAS DE UM NAMORADO MOFINO (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
AS PROEZAS DE UM NAMORADO MOFINO
Leandro Gomes de Barros
Sempre adotei a doutrina Ditada pelo refrão, De ver-se a cara do homem Mas não ver-se o coração, Entre a palavra e a obra Há enorme distinção.
Zé-pitada era um rapaz Que em tempos idos havia Amava muito uma moça O pai dela não queria... O desastre é um diabo Que persegue a simpatia.
Vivia o rapaz sofrendo Grande contrariedade Chorava ao romper da aurora Gemia ao cair da tarde A moça era como um pássaro Privado da liberdade.
Porque João-mole, o pai dela era um velho perigoso, Embora que Zé-pitada Dizia ser revoltoso, Adiante o leitor verá Qual era o mais valoroso.
Marocas vivia triste Pitada vivia em ânsia, Ele como rapaz moço No vigor de sua infância, Falar depende de fôlego Porém obrar é sustância.
Disse pitada a Marocas, Eu preciso lhe falar Já tenho toda certeza, Que é necessário a raptar, À noite espere por mim Que havemos de contratar.
Disse Marocas a Zezinho: Papai não é brincadeira, Diz Zé-pitada, ora esta! Deixe de falar besteira, Você pode ver-me as tripas, Porém não verá carreira.
Diga a que hora hei de ir, Eu dou conta do recado Inda seu pai sendo fogo, Por mim será apagado, Eu juro contra minh’alma Que seu pai corre assombrado.
Disse Marocas, meu pai Tem tanta disposição Que uma vez tomou um preso Do poder de um batalhão, Balas choviam nos ares, O sangue ensopava o chão.
Disse ele, eu uma vez Fui de encontro a mil guerreiros, Entrei pela retaguarda, Matei logo os artilheiros, Em menos de dez minutos O sangue encheu os barreiros.
Disse Marocas, pois bem Eu espero e pode ir, Porém encare a desgraça, Se acaso meu pai nos vir, Meu pai é de ferro e fogo, É duro de resistir.
Marocas não confiando Querendo experimentar, Olhou para Zé-pitada Fingindo querer chorar, Disse meu pai acordou, E nos ouviu conversar.
Valha-me Nossa Senhora! Respondeu ele gemendo, Que diabo eu faço agora?!... E caiu no chão tremendo, Oh! Minha Nossa Senhora! A vós eu me recomendo
Nisso um gato derrubou Uma lata na dispensa, Ele pensou que era o velho, Gritou, oh!, que dor imensa!. Parece qu’stou ouvindo Jesus lavrar-me a sentença.
A febre já me atacou, Sinto frio horrivelmente. Com muita dor de cabeça, Uma enorme dor de dente, Esta me dando a erisipela, Já sinto o corpo dormente.
Antes eu hoje estivesse Encerrado na cadeia, De que morrer na desgraça, E d’uma morte tão feia, Veja se pode arrastar-me, Que minha calça está cheia.
Por alma de sua mãe, Pela sagrada paixão, Me arraste por uma perna E me bote no portão, A moça quis arrastá-lo, Não teve onde pôr a mão.
Ela tirou-lhe a botina, Para ver se o arrastava, Mas era uma fedentina, Que a moça não suportava, Aquela matéria fina Já todo o chão alagava.
Disse a moça: quer um beijo? Para ver se tem melhora? Ele com cara de choro, Respondeu-lhe, não, senhora, Beijo não me salva a vida, Eu só desejo ir-me embora.
Então lhe disse Marocas, Desgraçado!... eu bem sabia, Que um ente de teu calibre, Não pode ter serventia. Creio que fostes nascido Em fundo de padaria.
Meu pai ainda não veio Eu hoje estou sozinha, Zé-pitada aí se ergueu, E disse, oh minha santinha! A moça meteu-lhe o pé, Dizendo: vai-te murrinha!
E deu-lhe ali uma lata, Dizendo: está aí o poço, Você ou lava o quintal Ou come um cachorro ensosso, Se não eu meto-lhe os pés Não lhe deixo inteiro um osso.
Disse ele, oh! meu amor! O corpo todo me treme, Minha cabecinha está, Que só um barco sem leme, Parece faltar-me o pulso, O Anjo da Guarda geme.
Então a moça lhe disse: O senhor lava o quintal Olhe uma taboca aqui!... Lava por bem ou por mal, Covardia para mim, É crime descomunal.
E lá foi nosso rapaz Se arrastando com a lata, A moça ali ao pé dele, Lhe ameaçando a chibata, Ele exclamava chorando Por amor de Deus não bata.
Vai miserável de porta Quero já limpo isso tudo, Um homem de sua marca Pequeno, feio e pançudo, Só tendo sido criado Onde se vende miudo.
Disse o Zé quando saiu: Eu juro por Deus agora, Ainda uma moça sendo Filha de Nossa Senhora, E olhar pra mim, eu digo: Desgraçada, vá embora.
Literatura de Cordel quarta, 07 de novembro de 2018
A SECA DO CEARÁ (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Seca as terras as folhas caem, Morre o gado sai o povo, O vento varre a campina, Rebenta a seca de novo; Cinco, seis mil emigrantes Flagelados retirantes Vagam mendigando o pão, Acabam-se os animais Ficando limpo os currais Onde houve a criação.
Não se vê uma folha verde Em todo aquele sertão Não há um ente d’aqueles Que mostre satisfação Os touros que nas fazendas Entravam em lutas tremendas, Hoje nem vão mais o campo É um sítio de amarguras Nem mais nas noites escuras Lampeja um só pirilampo.
Aqueles bandos de rolas Que arrulavam saudosas Gemem hoje coitadinhas Mal satisfeitas, queixosas, Aqueles lindos tetéus Com penas da cor dos céus. Onde algum hoje estiver, Está triste mudo e sombrio Não passeia mais no rio, Não solta um canto sequer.
Tudo ali surdo aos gemidos Visa o aspectro da morte Como a nauta em mar estranho Sem direção e sem Norte Procura a vida e não vê, Apenas ouve gemer O filho ultimando a vida Vai com seu pranto o banhar Vendo esposa soluçar Uma adeus por despedida.
Foi a fome negra e crua Nódoa preta da história Que trouxe-lhe o ultimatum De uma vida provisória Foi o decreto terrível Que a grande pena invisível Com energia e ciência Autorizou que a fome Mandasse riscar meu nome Do livro da existência.
E a fome obedecendo A sentença foi cumprida Descarregando lhe o gládio Tirou-lhe de um golpe a vida Não olhou o seu estado Deixando desemparado Ao pé de si um filinho, Dizendo já existisses Porque da terra saísses Volta ao mesmo caminho.
Vê-se uma mãe cadavérica Que já não pode falar, Estreitando o filho ao peito Sem o poder consolar Lança-lhe um olhar materno Soluça implora ao Eterno Invoca da Virgem o nome Ela débil triste e louca Apenas beija-lhe a boca E ambos morrem de fome.
Vê-se moças elegantes Atravessarem as ruas Umas com roupas em tira Outras até quase nuas, Passam tristes, envergonhadas Da cruel fome, obrigadas Em procura de socorros Nas portas dos potentados, Pedem chorando os criados O que sobrou dos cachorros.
Aqueles campos que eram Por flores alcatifados, Hoje parecem sepulcros Pelos dias de finados, Os vales daqueles rios Aqueles vastos sombrios De frondosas trepadeiras, Conserva a recordação Da cratera de um vulcão Ou onde havia fogueiras.
O gado urra com fome, Berra o bezerro enjeitado Tomba o carneiro por terra Pela fome fulminado, O bode procura em vão Só acha pedras no chão Põe-se depois a berra, A cabra em lástima completa O cabrito inda penetra Procurando o que mamar.
Grandes cavalos de selas De muito grande valor Quando passam na fazenda Provocam pena ao senhor Como é diferente agora Aquele animal de que outr’ora Causava admiração, Era russo hoje está preto Parecendo um esqueleto Carcomido pelo chão.
Hoje nem os pássaros cantam Nas horas do arrebol O juriti não suspira Depois que se põe o sol Tudo ali hoje é tristeza A própria cobra se pesa De tantos que ali padecem Os camaradas antigos Passaem pelos seus amigos Fingem que não os conhecem.
Santo Deus! Quantas misérias Contaminam nossa terra! No Brasil ataca a seca Na Europa assola a guerra A Europa ainda diz O governo do país Trabalha para o nosso bem O nosso em vez de nos dar Manda logo nos tomar O pouco que ainda se tem.
Vê-se nove, dez, num grupo Fazendo súplicas ao Eterno Crianças pedindo a Deus Senhor! Mandai-nos inverno, Vem, oh! grande natureza Examinar a fraqueza Da frágil humanidade A natureza a sorrir Vê-la sem vida a cair Responde: o tempo é debalde.
Mas tudo ali é debalde O inverno é soberano O tempo passa sorrindo Por sobre o cadáver humano Nem uma nuvem aparece Alteia o dia o sol cresce Deixando a terra abrasada E tudo a fome morrendo Amargos prantos descendo Como uma grande enxurrada.
Os habitantes procuram O governo federal Implorando que os socrra Naquele terrível mal A criança estira a mão Diz senhor tem compaixão E ele nem dar-lhe ouvido É tanto a sua fraqueza Que morrendo de surpresa Não pode dar um gemido.
Alguém no Rio de Janeiro Deu dinheiro e remeteu Porém não sei o que houve Que cá não apareceu O dinheiro é tão sabido Que quis ficar escondido Nos cofres dos potentados Ignora-se esse meio Eu penso que ele achou feio Os bolsos dos flagelados.
O governo federal Querendo remia o Norte Porém cresceu o imposto Foi mesmo que dar-lhe a morte Um mete o facão e rola-o O Estado aqui esfola-o Vai tudo dessa maneira O município acha os troços Ajunta o resto dos ossos Manda vendê-los na feira.
Literatura de Cordel segunda, 05 de novembro de 2018
PAVOR EM BRASÍLIA, CORDEL DE MIGUEZIM DE PRINCESA
PAVOR EM BRASÍLIA
Miguel Lucena Filho (Miguezim de Princesa)
Na hora em que Sérgio Moro Aceitou ser o ministro, Teve uma senadora Que gritou: – Ai, Jisus Cristo, Venha socorrer meu marido, Tudo está muito sinistro!
Se ele, como juiz, Botou grandes na prisão, Agora, no Ministério Da Justiça da Nação, A vida ficou mais dura Pra tudo quanto é ladrão.
Pesadelo de corrupto, Começou a tremedeira! Soube que um senador Pulou e deu uma carreira Direto para o banheiro, Sofrendo de caganeira.
Ligaram para a Bahia Pra saber como fazer, O chefe baiano disse: – Já começou a feder, Derrubaram o tabuleiro E estragaram o dendê.
CGU e AGU, A Polícia Federal, O Coaf e a Receita, Limpando o Brasil do mal, Com Sérgio Moro no leme, Pondo fim ao bacanal.
Obras que nunca terminam, Como a tal transposição, Trilhões que desapareceram Nos tubos do Petrolão, Gente vendendo e comprando Na mais vil corrupção.
Gente que não tinha nada, Filava até macarrão, Aparece desfilando Em luxuoso carrão E ainda diz: – Sou reitor Da minha instituição!
Dinheiro sendo lavado Da forma mais descarada: Lojas caras que se abrem, Mas quase não vendem nada, Atacadão, restaurante, Tudo coisa de fachada.
Bolsonaro anunciou, Logo ao raiar do dia, Que o juiz Sérgio Moro Ia mandar na freguesia: Teve gente desmaiando, Outros sentindo agonia, Uma hemorroida inflamada Se aliviou numa bacia; Eu grito: Viva o Brasil! (O estoque de Rivotril Acabou na drogaria)
Literatura de Cordel quarta, 31 de outubro de 2018
HISTÓRIA DE JUVENAL E O DRAGÃO (FOLHETO DE JOÃO MARTINS DE ATHAYDE) - VÍDEO
Literatura de Cordel quarta, 24 de outubro de 2018
HISTÓRIA DA DONZELA TEODORA (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
HISTÓRIA DA DONZELA TEODORA
Leandro Gomes de Barros
Eis a real descrição
Da história da donzela
Dos sábios que ela venceu
E a aposta ganha por ela
Tirado tudo direito
Da história grande dela
Houve no reino de Túnis
Um grande negociante
Era natural da Hungria
E negociava ambulante
Uma alma pura e constante
Andando um dia na praça
Numa porta pôde ver
Uma donzela cristã
Para ali se vender
O mercador vendo aquilo
Não pôde mais se conter
Tinha feição de fidalga
Era uma espanhola bela
Ele perguntou ao mouro
Quanto queria por ela
Entraram então em negócio
Negociaram a donzela
O húngaro conheceu nela
Formato de fidalguia
Mandou educá-la bem
Na melhor casa que havia
Em pouco tempo ela soube
O que ninguém mais sabia
Mandou ensinar primeiro
Música e filosofia
Ela sem mestre aprendeu
Metafísica e astrologia
Descrever com distinção
História e anatomia
Ela que já era um ente
Nascida por excelência
Como quem tivesse vindo
Das entranhas da ciência
Tinha por pai o saber
E por mãe a inteligência
Em pouco tempo ela tinha
Tão grande adiantamento
Que só Salomão teria
Um igual conhecimento
Cantava música e tocava
A qualquer um instrumento
Estudou e conhecia
As sete artes liberais
Conhecia a natureza
De todos os vegetais
Descrevia muito bem
A castra dos animais
Descrevia os doze signos
De que é composto o ano
Da cabeça até os pés
Conhecia o corpo humano
E dava definição
De tudo do oceano
Admirou todo mundo
O saber desta donzela
Tudo que era ciência
Podia se encontrar nela
O professor que ensinou-a
Depois aprendeu com ela
Mas como tudo no mundo
É mutável e inconstante
Esse rico mercador
Negociava ambulante
E toda sua fortuna
Perdeu no mar num instante
Atrás do bem vem o mal
Atrás da honra a torpeza
Quando ele saiu de casa
Levava grande riqueza
Voltou trazendo somente
Uma extrema pobreza
Só via em torno de si
O vil manto da marzela
Em casa só lhe restava
A mulher e a donzela
Então chamou Teodora
E pediu o parecer dela
Disse ele: minha filha
Bem vês minha natureza
E sabes que o oceano
Espoliou minha riqueza
Espero que teus conselhos
Me tirem desta pobreza
Ela quando ouviu aquilo
Sentiu no peito uma dor
E lhe disse, tenha fé
Em Deus nosso salvador
Vou estudar um remédio
Que salvará o senhor
E disse: meu senhor saia
Procure um amigo seu
É bom ir logo na casa
Do mouro que me vendeu
Chegue lá converse com ele
E conte o que lhe sucedeu
O que ele oferecer-lhe
De muito bom grado aceite
E veja se ele lhe vende
Vestidos que me endireite
Compre a ele todas as jóias
Que uma donzela se enfeite
Se o mouro vender-lhe tudo
Com que possa me compor
Vossa mercê vai daqui
Vender-me ao rei Almançor
É esse o único meio
Que salvará o senhor
El-rei lhe perguntará
Por quanto vai me vender
Por dez mil dobras de ouro
Meu senhor há de dizer
Quando ele admirar-se
Veja o que vai responder
Dizendo alto senhor
Não fique admirado
Eu vendo-a com precisão
Não peço preço alterado
Dobrada esta quantia
Tenho com ela gastado
É esse o único meio
Para a sua salvação
Se o mouro vende-lhe tudo
Descanse seu coração
Daqui para o fim da vida
Não terá mais precisão
O mercador seguiu tudo
Quando a donzela ditava
Chegou ao mouro e contou-lhe
O desespero em que estava
Então o mouro vendeu-lhe
Tudo quanto precisava
Roupa, objetos e jóias
Para enfeitar a donzela
As roupas vinha que só
Sendo cortada pra ela
Ela quando vestiu tudo
Parecia ficar mais bela
O mercador aprontou-se
E seguiu com brevidade
Falou ao guarda da corte
Com muita amabilidade
Para deixá-lo falar
Com a real majestade
Então subiu um vassalo
Deu parte ao rei Almoçor
O rei chegou a escada
Perguntou ao mercador:
— Amigo qual o negócio
Que tem comigo o senhor?
Então disse o mercador
Sem grande humildade:
— Senhor venho a vossa alteza
Com grande necessidade
Ver se vendo esta donzela
A vossa real majestade
O rei olhou a donzela
E disse dentro de si:
Foi a mulher mais formosa
Que neste mundo já vi
Trinta ou quarenta minutos
O rei presenciou ela ali
Perguntou ao mercador:
Por quanto vendes a donzela?
Por 10 mil dobras de outro
É o que peço por ela
E não estou pedindo caro
Visto a habilidade dela.
Disse o rei ao mercador:
— Senhor, estou surpreendido
Dez mil dobras de ouro
É preço desconhecido
Ou tu não queres vendê-la
Ou estás fora do sentido
Disse o mercador: El rei
Não é caro esta donzela
Dobrado a esta quantia
Gastei para educar ela
Excede a todos os sábios
A sabedoria dela
O rei mandou logo chamar
Um grande sábio que havia
O instrutor da cidade
Em física e astronomia
Em matemática e retórica
História e filosofia
Esse veio e perguntou-lhe
— Donzela estás preparada
Para responder-me tudo
Sem titubiar em nada?
Se não estiver seja franca
Se não sai envergonhada
Então ela respondeu-lhe
— Mestre pode perguntar
Eu lhe responderei tudo
Sem cousa alguma faltar
Farei debaixo da lei
Tudo que o senhor mandar
O sábio ali preparou-se
Para entrar em discussão
Ela com muita vergonha
Ela não teve alteração
Pediu licença a El-rei
E ficou de prontidão
— Diz-me donzela o que Deus
Sob o céu primeiro fez
Respondeu o sol e a lua
E a lua por sua vez
É por uma obrigação
Cheia e nova todo mês
— Além do sol e a lua
Doze signos foram feitos
Formando a constelação
Sendo ao sol todos sujeitos
Desiguais na natureza
Com diversos preconceitos
Como se chama esses signos?
Perguntou o emissário
A donzela respondeu:
— Capricórnio e Aquário
Tauro, Câncer, Libra, Virgo
Pisces, Escórpio e Sagitário
— Existem outros três signos
Áries, Léo e Geminis
No signo Léo quem nascer
Será um homem feliz
Inclinado a viajar
Por fora de seu país
O sábio disse: Donzela
É necessário dizer
Que condições tem o homem
Que em cada signo nascer
Por influência o signo
De que forma pode ser?
Disse ela o signo Aquário
Reina o mês de janeiro
O homem que nascer nele
Tem o crescimento varqueiro
Será amante das mulheres
Ventaroso e lisonjeiro
Pisces reina em fevereiro
Quem nesse signo nascer
É muito gentil de corpo
Muito guloso em comer
Risonho, gosta de viagem
Não faz o que prometer
Em março governa Áries
Neste signo nascerão
Homens nem ricos nem pobres
Por nada se zangarão
Neles se notam um defeito
Falando sós andarão
Em abril governa Tauro
Um signo bem conhecido
O homem que nascer nele
Será muito presumido
Altivo de coração
Será rico e atrevido
Geminis governa em maio
Sua qualidade é quente
O homem que nascer nele
Será fraco e diligente
Para os palácios e cortes
Se inclina constantemente
Em julho governa Câncer
Sua qualidade é fria
O homem que nascer nele
É forte e tem energia
É gentil e tem muita força
E sempre tem alegria
Em julho governa Léo
Por um leão figurado
O homem que nascer nele
É lutador e honrado
Altivo de coração
Inteligente e letrado
Em agosto reina Virgo
Vem da terra a natureza
O homem que nascer nele
Tem princípio tem riqueza
Depois se descuidará
Por isso cai em pobreza
Em setembro reina Libra
A Vênus assinalado
O homem que nascer nele
Será um pouco inclinado
A viajar pelo mar
É lutador e honrado
O que nascer em outubro
Será homem falador
Inclinado aos maus costumes
Teimoso e namorador
Pouco jeito nos negócios
Falso grave e enganador
Então o mês de novembro
Sagitário é o reinante
O homem que nascer nele
Será cínico e inconstante
Desobediente aos pais
Intratável assim por diante
Em dezembro é Capricórnio
Tem a natureza de terra
O homem que nascer nele
Será inclinado a guerra
Gosta de falar sozinho
E por qualquer coisa espera
O sábio ali levantou-se
Disse ao rei esta donzela
Não há sábio aqui no mundo
Que tenha a ciência dela
E com isso vossa alteza
Que estou vencido por ela
O rei ali ordenou
Que fosse o sábio segundo
Foi um matemático e clínico
Um gênio grande e fecundo
E conhecido por um
Dos sábios maior do mundo
Chegou o segundo sábio
Que inda estava orelhudo
E disse: Donzela eu tenho
Dezoito anos de estudo
Não sou o que tu venceste
Conheço um pouco de tudo
A donzela respondeu
Com licença de el-rei
Tudo que me perguntares
Aqui te responderei
Com brevidade e acerto
Tudo vos explicarei
Perguntou o sábio a ela:
Em nosso corpo domina
Qualquer um dos doze signos
Que a donzela descrimina
Terá alguma influência
Os signos com a medicina?
Então a donzela disse:
Descrito mestre direi
Sabe que os signos são doze
Como eu já expliquei
Compactam com a química
Quer saber? Explicarei
Áries domina a cabeça
Uma parte melindrosa
Para quem nascer em março
A sangria é perigosa
A pessoa que sangrar-se
Deve ficar receosa
Libra domina as espáduas
Câncer domina os peitos
Para os que são deste signo
Purgantes tem maus efeitos
E as sangrias também
Não serão de bons proveitos
Tauro domina o pescoço
Léo domina o coração
Capricórnio influi nos olhos
Escórpio a organização
Geminis domina os braços
e influi na musculação
Virgo domina o ventre
E Aquário nas canelas
Para os que são desses signos
Purgas e sangrias são belas
Então Sagitário e Pisces
Ambos têm igual tabelas
O sábio dentro de si
Disse meio admirado
Onde esta discutir
Ninguém pode ser letrado
Esta só vindo a propósito
De planeta adiantado
O sábio disse: Donzela
Eu quero se tu puderes
Isto é, eu creio que podes
Não dirás se não quiseres
O peso, idade e conduta
Que têm todas as mulheres
Disse a donzela: A mulher
É sempre a arca do bem
Porém só quem a criou
Sabe o peso que ela tem
Isso é uma coisa ignota
Disso não sabe ninguém
Que me dizes das donzelas
De vinte anos de idade?
Respondeu: Sendo formosa
Parece uma divindade
Principalmente ao homem
Que lhe tiver amizade
As de trinta e quarenta
Que dizes tu que elas são?
Disse ela: Uma dessas
É de muita consideração
— Das de 50 o que dizer?
— Só prestam para oração
— Que dizes das de 70?
— Deviam estar num castelo
Rezando por quem morreu
Lamentando o tempo belo
O que dizes das de 80?
— Só prestam para o cutelo
Então classificas as velhas
Tudo de mal a pior?
E nos defeitos de tantas
Não se encontra um menor
Disse ela: Deus me livre
De ser vizinho da melhor
Donzela o sábio lhe disse
Sei que és caprichosa
Entre todas as pessoas
És a mais estudiosa
Diga que sinais precisam
Para a mulher ser formosa
Então a donzela disse:
Para a mulher ser formosa
Terá dezoito sinais
Não tendo é defeituosa
A obra por seu defeito
Deixa de ser melindrosa
Há de ter três partes negras
De cores bem reluzentes
Sobrancelhas, olhos, cabelos
De cores negras e ardentes
Branco o lacrimal dos olhos
Ter branca a face e os dentes
Será comprida em três partes
A que tiver formosura
Compridos os dedos das mãos
O pescoço e a cintura
Rosada cútis e gengivas
Lábios cor de rosa pura
Terá três partes pequenas
O nariz, boca e pé
Larga a cadeira e ombro
Ninguém dirá que não é
Cujos sinais teve-se todos
Uma virgem em Nazaré
O sábio quando ouviu isto
Ficou tão surpreendido
E disse: El-rei Almançor
Confesso que estou vencido
E quem argumenta com ela
Se considera vencido
El-rei mandou que outro sábio
Entrasse em discussão
Então escolheram um
Dos de maior instrução
A quem chamavam na Grécia
Professor da criação
Abraão de Trabador
Veio argumentar com ela
E disse logo ao entrar:
Previne-te bem, donzela
Dizendo dentro si
Eu hoje hei de zombar dela
Então a donzela disse:
Senhor mestre estarei disposta
De todas suas perguntas
O senhor terá resposta
Se tem confiança em si
Vamos fazer uma aposta?
Minha aposta é a seguinte
De nós o que for vencido
Ficará aqui na corte
Publicamente despido
Ficando completamente
Como quando foi nascido
O sábio disse que sim
Mandaram o termo lavrar
E a donzela pediu
Ao rei para assinar
Para a parte que perdesse
Depois não se recusar
Lavraram o termo e foi
Às mãos do rei Almoçor
Pra fazer válido o trato
E ficar por fiador
Obrigando quem perdesse
Dar as roupas ao vencedor
O sábio aí perguntou:
Qual é a coisa mais aguda?
Disse ela: é a língua
Duma mulher linguaruda
Que corta todos os nomes
E o corte nunca muda
Donzela qual é a coisa
Mais doce do que mel?
— O amor do pai a um filho
Ou dama esposa fiel
A ingratidão de um desses
Amarga mais do que fel
O sábio disse: Donzela
Conheces os animais?
Quero agora que descrevas
Alguns irracionais
Me diga qual é o bicho
Que possui oito sinais
Mestre, isto é gafanhoto
Vive embaixo dos outeiros
Tem pescoço como vaca
Esporas de cavaleiros
Tem olhos como marel
Um pássaro dos estrangeiros
Focinho como de vaca
Tem pés como de cegonha
Tem cauda como de víbora
Uma serpente medonha
E é infeliz o vivente
Que a boca dela se oponha
Tem peito como cavalos
E não ofende a ninguém
Tem asas como de águia
A que voa muito além
São antes oito sinais
Que o gafanhoto tem
Perguntou o sábio a ela:
— Que homem foi que viveu
Porém nunca foi menino
Existiu mas não nasceu
A mãe dele ficou virgem
Até que o neto morreu
— Este homem foi Adão
Que da terra se gerou
Foi feito já homem grande
Não nasceu, Deus o formou
A terra foi a mãe dele
E nela se sepultou
Foi feita mas não nascida
Essa nobre criatura
A terra foi a mãe dele
Serviu-lhe de sepultura
Para Abel o neto dele
Fez-se a primeira abertura
— Donzela qual é a coisa
Que pode ser mais ligeira?
Respondeu: O pensamento
Que voa de tal maneira
Que vai ao cabo do mundo
Num segundo que se queira
O sábio fitou-a e disse:
— Donzela diga-me agora
Qual o prazer de um dia
Qual prazer duma hora?
— Dum negócio que se ganha
Dum passeio que se queira
A donzela respondeu
Com a maior rapidez
Disse: um homem viajando
E se bom negócio fez
É um dos grande prazeres
Que verá por sua vez
Donzela o que é vida?
Disse ela: Um mar de torpeza
O que pode assemelhar-se
À vela que está acesa
Às vezes está tão formosa
E se apaga de surpresa
Donzela por quantas formas
Mente a pessoa afinal?
Respondeu: Mente por três
Tendo como essencial
Exaltar a quem quer bem
E pôr taxa em quem quer mal
Donzela que é velhice?
Respondeu com brevidade:
É vestidura de dores
É a mãe da mocidade
E o que mais aborrecemos?
Respondeu: É a idade
Donzela qual é a coisa
Que quem tem muito ainda quer?
Disse ela: É o dinheiro
Que o homem e a mulher
Não se farta de ganhar
Tenha a soma que tiver
Qual é a coisa que o homem
Possui e não pode ver?
Disse ela: O coração
Que aberto tem que nascer
Ver a raiz dos seus olhos
Não há quem possa obter
Donzela qual foi o homem
Que por dois ventres passou?
Disse a donzela: Foi Jonas
Que uma baleia o tragou
Conservou-o dentro três dias
E depois o vomitou
O sábio disse: Donzela
Qual o homem mais de bem?
Disse ela: É aquele
Que menos defeitos tem
Quem terá menos defeitos?
— Isso não sabe ninguém
— Donzela qual é a coisa
Que não se pode saber?
O pensamento do homem
Se ele não quer dizer
Por mais que a mulher procure
Não poderá obter
— Donzela o que é a noite
Cheia de tantos horrores?
Disse ela: É descanso
Dos homens trabalhadores
É capa dos assassinos
Que encobre os malfeitores
— Onde a primeira cidade
Do mundo foi construída?
— A cidade de Ninive
A primeira conhecida
Que depois de certo tempo
Foi pela Grécia abatida
Perguntou: Qual o guerreiro
Que teve a antigüidade?
Respondeu: Foi Alexandre
Assombro da humanidade
Guerreou vinte e dois anos
E morreu na flor da idade
Donzela falaste bem
Do maior conquistador
Diga dos homens qual foi
O maior sentenciador?
— Pilatos que deu sentença
a Cristo Nosso Senhor
De todos os patriarcas
qual seria o mais valente?
— O patriarca Jacó
Que lutou heroicamente
Com os anjos mensageiros
Do monarca onipotente
— Qual foi a primeira nau
Que foi para o estaleiro
— Foi a Arca de Noé
A que no mar foi primeiro
Onde escapou um casal
De tudo no mundo inteiro
— O que corta mais
Que a navalha afiada?
É a língua da pessoa
Depois de estar irada
Corta com mais rapidez
Que qualquer lâmina amolada
— Qual é o maior prazer
Com que se ocupa a história?
Respondeu: Quando um guerreiro
No campo ganha vitória
Sabei que não pode haver
Tanto prazer tanta glória
O sábio disse: Donzela
Tens falado muito bem
Me diga que condições
O homem no mundo tem?
Disse a donzela: tem todas
Para o mal e para o bem
É manso como a ovelha
E feroz como o leão
Seboso como o suíno
É limpo como o pavão
É falso como a serpente
É tão leal como o cão
É fraco como o coelho
Arrogante como o gelo
Airoso como o furão
Forçoso como o cavalo
E mais te digo que o homem
Ninguém pode decifrá-lo
É calado como peixe
Fala como papagaio
É lerdo como preguiça
É veloz igual ao raio
É sábio quando ouviu isto
Quase que dar-lhe um desmaio
Então inventou um meio
Para ver se a pegaria
Perguntou: O sol da noite
Terá luz quente ou fria?
A donzela respondeu
Que à noite sol não havia
Com a presença do sol
É que se conhece o dia
Se de noite houvesse sol
A noite não existia
E sem o sereno dela
Todo vivente morreria
Sem água, sem ar, sem luz
A terra não tinha nada
Não tinha os seres que tem
Seria desabitada
A própria vegetação
Não podia ser criada
Os reinos da natureza
Cada um possui um gênio
É necessário o azoto
Precisa o oxigênio
Para a infusão disso tudo
O carbono e o hidrogênio
O dia Deus fez bem claro
A noite fez bem escura
Se de noite houvesse sol
Estava o homem à altura
De notar esse defeito
E censurar a natura
O sábio baixou a vista
E ouviu tudo calado
Nada teve a dizer
Pois já estava esgotado
E tinha plena certeza
Que ficava injuriado
Disse ao público: Senhores
A donzela me venceu
Não sei com qual professor
Esta mulher aprendeu
Aí a donzela disse:
Então o mestre perdeu?
Ele vendo que estava
Esgotado e sem recursos
Ficou trêmulo e muito pálido
Fugiu-lho até os pulsos
Prostou-se aos pés de El-rei
Se sufocando em soluços
E disse: Senhor, confesso
A vossa real majestade
Que vejo nesta donzela
A maior capacidade
Ela merece ter prêmio
Pois tem grande habilidade
A donzela levantou-se
Foi ao soberano rei
Então beijando-lhe a mão
Disse: Vos suplicarei
Mande o sábio entregar-me
Tudo que dele ganhei
O rei ali ordenou
Que o sábio se despojasse
De todas as vestes que tinha
E à donzela as entregasse
O jeito que tinha ali
Era ele envergonhar-se
O sábio pôs-se a despir-se
Como quem estava doente
Fraque, colete e camisa
Ficando ali indecente
E pediu para ficar
Com a ceroula somente
Depois sufocado em pranto
Prostrado disse à donzela:
Resta-me apenas a ceroula
Não posso me despir dela
A donzela perguntou-lhe:
O senhor nasceu com ela?
O trato foi o seguinte
De nós quem fosse vencido
Perante a todos da corte
Havia de ficar despido
Como quando veio ao mundo
Na hora que foi nascido
El-rei foi o fiador
Nosso ajuste foi exato
O senhor tem que despir-se
E dar-lhe fato por fato
Ficando com a ceroula
Não teve efeito o contrato
E não quis dar a ceroula
O rei mandou que ele desse
Ou pagaria à donzela
O tanto que ela quisesse
Tanto que indenizasse-a
Embora que não pudesse
Donzela quanto queres
Perguntou o sábio enfim
A donzela ali fitou-o
E lhe respondeu assim:
A metade do dinheiro
Que meu senhor quer por mim
O rei ali conhecendo
O direito da donzela
Vendo que toda razão
Só podia caber nela
Disse ao sábio: Mande ver
O dinheiro e pague a ela
Cinco mil dobras de ouro
A donzela recebeu
O sábio também ali
Nem mais satisfação deu
Aquele foi um exemplo
Que a donzela lhe vendeu
O rei então disse à ela:
Donzela podes pedir
Dou-te a palavra de honra
Farei-te o que exigir
De tudo que pertencer-me
Poderás tu te servir
Ela beijou-lhe a mão
Lhe disse peço que dê-me
A quantia do dinheiro
Que meu senhor quer vender-me
Deixando eu voltar com ela
Para assim satisfazer-me
O rei julgou que a donzela
Pedisse para ficar
Tanto que se arrependeu
De tudo lhe franquear
Mas a palavra de rei
Não pode se revogar
Mandou dar-lhe o dinheiro
Discutiu também com ela
Mas ciente de tudo
Quanto podia haver nela
E disse vinte mil dobras
Não pagam esta donzela
Voltou ela e o senhor
À sua antiga morada
Por uma guarda de honra
Voltou ela acompanhada
O senhor dela trazendo
Uma fortuna avaliada
Ficaram todos os sábios
Daquilo impressionados
Pois uma donzela escrava
Vencer três homens letrados
Professores de ciências
Doutores habilitados
Abraão de Trabador
Com todos não discutia
Já tinha vencido muitos
Em música e filosofia
Em história natural
Matemática e astronomia
Ele descrevia a fundo
Os reinos da natureza
Era engenheiro perito
De tudo tinha a certeza
Descrevia o oceano
Da flor d'água a profundeza.
Tanto quando ele entrou
Que fitou bem a donzela
Calculou dentro de si
A força que havia nela
Confiando em sua força
Por isso apostou com ela
Caro leitor escrevi
Tudo que no livro sabei
Só fiz rimar a história
Nada aqui acrescentei
Na história grande dela
Muitas coisas consultei
Literatura de Cordel quarta, 17 de outubro de 2018
AS 4 ÓRFÃS DE PORTUGAL, OU O VALOR DA HONESTIDADE (FOLHETO DE JOÃO MELQUÍADES FERREIRA DA SILVA)
Na capital de Lisboa, havia uma união de quatro donzelas órfãs, sem pai sem mãe irmão, servindo a moça mais velha como mãe de criação.
Vitalina era a mais velha e muito religiosa, viviam de costuras numa vida trabalhosa: Isabel Francisca e Maria, cada qual mais virtuosa.
Vitalina adoeceu; vendo que não escapava, chamou logo as três mocinhas que em seu poder criava, para lhes dar um conselho que tanto necessitava.
Disse ela: minhas filhas vocês vivam sem questão satisfeitas com a sorte trabalhando pelo pão; nada tendo peçam esmola, mais não deixe esta união.
No outro dia Vitalina estava no necrotério, mas levou palma e capela para o chão do cemitério, no símbolo da virgindade de moça de critério.
As moças ficaram sós por casa do acabamento, ninguém lhes dava costuras para ganharem o sustento; começaram a passar fome com pena e sofrimento.
Quando as moças não tinham mais nada para vender, eram três moças donzelas que não tinham o que comer, sem lamentarem a sorte, jejuavam sem querer.
Lutando assim pela vida com tanta dificuldade, perseguida pelos homens mas guardando a virgindade, quem sofre com paciência Deus manda felicidade.
A fome já era tanta que as moças padeciam, que botavam sal na água por alimento bebiam, e os homens sem caridade a elas não protegiam.
Maria, uma das moças, disse ainda não é assim, se hei de morrer de fome, aqui mesmo levar fim, vou procurar pelo mundo, quem tome conta de mim.
As outras duas pediram: maninha, não vá embora, vamos esperar mais tempo, ninguém sai daqui agora, ate chegar o socorro de Deus ou nossa Senhora.
Maria disse: Manas, eu já estou resolvida, vou ver se encontro um homem que me dê roupa e comida; hoje à noite eu vou embora, que não sou esmorecida.
Maria arrumou a roupa e deixou anoitecer, o pedido das irmãs em nada quis atender; se despediu com a noite dizendo: vou me vender.
A noite está muita escura, porém, a moça seguia no oitão de uma igreja, um vulto lhe aparecia; o vulto era um padre, pegou na mão de Maria
O padre disse: filhinha esta hora, aonde vais? O que é que tu procuras, que daqui não passas mais, volta que tuas irmãs ficaram chorando atrás.
Padre, porque sou pobre, uma orfã desvalida, abandonei minhas irmãs para salvar minha vida; eu vou procurar um homem que me dê roupa e comida.
Porquanto a minha pobreza, faz vergonha eu lhe contar, todo dia em nossa casa não tem que se almoçar; há tempo que eu não janto, eu vou dormir sem cear.
O padre disse: filhinha, tu precisas de caridade, então me diz se conheces na alta sociedade, qual e o homem solteiro mais rico desta cidade.
Tem o coronel Paulino que é um moço solteiro, negociante na praça, capitalista e banqueiro; o governo deve a ele grande soma de dinheiro.
O Padre tirou um lápis, num papel pôs-se a escrever, dirigindo um bilhetinho de acordo o seu saber, para o coronel Paulino esta questão resolver.
O padre disse: filhinha, volta e vai descansar, por hoje lhe passa a fome, não precisa mais cear, porque a sua pobreza agora vai se acabar.
Quando o dia amanhecer, vá o bilhete entregar ao coronel Paulino, a quem eu mando levar; espera pela resposta que ele tem que te dar.
Maria voltou a casa, conforme o padre dizia; as Irmãs abriram a porta, disseram entra Maria; se abraçaram todas três chorando de alegria.
Quando o dia amanheceu, Maria, no mesmo tino, foi levar o bilhetinho ao coronel Paulino, para saber da resposta, qual será o seu destino.
No armazém do Paulino, estavam negociando uma secção dos mais ricos sobre negócio tratado, e viram aquela mocinha que vinha se aproximando.
Os homens se combinavam, cada qual o mais ladino; Maria interrogou-os, com seu termo feminino, quem é aqui dos senhores o grande coronel Paulino?
O coronel levantou-se, chegou se para Maria disse: sou eu seu criado, enquanto a moça dizia: trago este bilhetinho para vossa senhoria.
O bilhete lhe explicava, honradíssimo coronel, dê a esta mocinha o valor deste papel, porém, pese-o na balança, até chegar no fiel.
O coronel inda riu-se, dizendo ora muito bem, isto não é precisão que se ocupa ninguém, o peso deste papel só pesa igual um vintém.
O coronel pegou o bilhete, pôs na balança um tostão, mas foi botando dinheiro como quem pega algodão, a concha do bilhetinho só pesava para o chão.
O coronel botou todo o ouro que possuía, botou o dinheiro de papel que a balança não cabia, a concha do bilhetinho mais pesada não subia.
Ele arredou o dinheiro, e passou-se com o papel, a concha do bilhetinho subiu e mostrou o fiel, era a honra da donzela que valia o coronel.
O coronel disse: moça, você é misteriosa, qual é a sua oração na vida religiosa? Este bilhete foi feito por uma mão poderosa.
Coronel, a minha mãe de criação me ensinava S. Antonio é meu padrinho, e a ele me entregava, eu tomava bênção ao santo, a noite quando rezava.
Então a senhora diga-me quem fez este bilhetinho, se foi feito em casa pela mão de algum vizinho, ou então se é milagre que nasceu de seu padrinho.
Coronel, eu esta noite de casa não havia saído no oitão de uma igreja, um padre desconhecido mandou-lhe este bilhetinho, conforme vem dirigido
O coronel baixou vista, e disse quando pensou: então, o bilhete foi Santo Antonio quem mandou pra senhora casar comigo como o santo me contou.
A senhora, uma mocinha que vive em pobreza, mas sua honra pesou mais que a minha riqueza, no dia que nós casarmos somos iguais por natureza.
Desde aí o coronel tomou conta de Maria, convidou os seus amigos, casou-se no outro dia, mandou ver as duas órfãs para sua companhia.
Literatura de Cordel quarta, 10 de outubro de 2018
PELEJA DO CEGO ADERALDO E ZÉ PRETINHO DO TUCUM, FOLHETO DE FIRMINO TEIXEIRA AMARAL, EM VÍDEO
Literatura de Cordel quarta, 03 de outubro de 2018
A TERRÍVEL HISTÓRIA DA PERNA CABELUDA (FOLHETO DE GUAIPUAN VIEIRA) YOUTUBE
A TERRÍVEL HISTORIA DA PERNA CABELUDA
GUAIPUAN VIEIRA
(PRENÚNCIO DA BESTA-FERA)
Literatura de Cordel quarta, 26 de setembro de 2018
BRASIL CABOCLO (POEMA-CORDEL DE ZÉ DA LUZ)
Literatura de Cordel quarta, 19 de setembro de 2018
HISTÓRIA DA PRINCESA DA PEDRA FINA (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
HISTÓRIA DA PRINCESA DA PEDRA FINA
Leandro Gomes de Barros
No Reino da Pedra Fina
Havia uma princesa
Misteriosa, encantada
Uma obra da natureza
Com ela duas irmãs
Que eram a flor da beleza.
Naquela linda princesa
Só era em que se falava
Nesse lugar também tinha
Um pobre que trabalhava
Com três filhos no roçado
Com isso se sustentava
Chamavam-se os três meninos
João, Antonio e José
José que era o caçula
Do tamanho dum bebé
A sua mãe lhe estimava
Nunca deu-lhe um cafuné
Disse o marido à mulher:
- vou trabalhar no roçado
os meninos também vão
pra ajudar-me doutro lado
você cá mate um franguinho
apronte-o, leve-o guisado.
Estando o velho cansado
Com os filhos a trabalhar
Às duas horas da tarde
Diz ele: - Vou descansar
Meus filhos tenham paciência
Não tarda mamãe chegar.
Pegou Antonio a brincar
Fazendo riscos no chão
Dizendo: - Estou com vontade
De comer muito feijão
Misturadinho com bredo
Acho melhor do que pão
Aí respondeu João:
- Eu desejava comer
muita banana com casca
até a barriga encher
ambos mandaram José
dar também seu parecer.
De modo misterioso
Respondeu o Cazuzinha:
- O que tenho no pensamento
nenhum dos dois adivinha
então será um segredo
ou do rei ou da rainha.
Disse José: - Eu descubro
Creio que não me incrimina
Não é pra mim bem vocês
É pra quem Deus determina
Eu queria ver as pernas
Das moças da Pedra Fina
- Oh! Atrevido menino!
(respondeu o pai deitado)
e levantou-se dizendo:
- Cachorro, bruto, safado
não respeita as princesas
querer morrer enforcado?
Levantou-se o velho irado
Dizendo por este jeito:
- Você ainda acha pouco
os males que me tem feito?
Assim nós todos iremos
Sofrer pelo seu respeito!
Aí deu umas lapadas
No seu caçula Zezinho
Nisto foi chegando a velha
Que já vinha no caminho
- Meu velho, pra que fez isto?
Pra que deu no bichinho?
- Porque foi muito atrevido
minha velha Umbelina
ele buliu com as pessoas
tão altas que nos domina
desejando ver as pernas
das moças da Pedro Fina.
- Se eles souberem disso
nos mandariam chamar
nos metiam na prisão
mandavam a ele matar
eu só dei essas lapadas
para o exemplo ficar.
Ai a velha zangou-se
Começou logo a chorar:
- Vamos pra casa meu filho
para seu pai não lhe dar
inda a princesa sabendo
não lhe manda degolar.
José sempre se lembrava
Do pai o que tinha feito
Dizendo que a família
Sofria por seu respeito
Saiu vagando no mundo
O qual por Deus foi aceito.
Esse inocente menino
Saiu, só levou um pão
Não tinha um vintém no bolso
Só quis do pai o perdão
Da sua cara mãezinha
A sua santa benção.
A mãe partida de pena
Abençoou o menino
Vendo o filho tão pequeno
Sair como um peregrino;
- Rogo a Deus como bom pai
que zele por teu destino.
O Cazuzinha era novo
Porem era destemido
Já fazia mais de um mês
Que ele tinha saído
Chegou na beira de um rio
Medonho e desconhecido
Ficou com bastante medo
No atravessar do rio
Só ouvia urros de fera
No pé dum monte sombrio
Porem tinha pouca água
Por ser tempo de estio
Ele atravessou o rio
Quando em terra pisou
Sentiu que estava com sede
Água no chapéu tirou
No chapéu veio uma pedra
Que muito lhe admirou.
Era um brilhante encantado
Mas ele não conhecia
Julgando não ter valor
Pouca importância fazia
Depois guardo-o no bolso
E pensou no que fazia.
Saiu por ali afora
Quando foi no outro dia
Entrou num grande reinado
Que ele não conhecia
Sem ter um vintém no bolso
Tomou uma hospedaria
O rapaz aperreado
Já vendo a hora sofrer
Tirou a pedra do bolso
Começou a oferecer
Dizendo: - Quem quer comprar?
Eu tenho é pra vender.
José muito aperreado
Sem jeito com que passar
Deu a pedra a um lojista
Perguntando: - Quando dá?
Respondeu: - É um brilhante
Eu não a posso comprar.
- Em todo este reinado
(lhe respondeu o caixeiro)
o senhor vá procurando
até pelo estrangeiro
para comprar esta pedra
bem poucos terão dinheiro.
Disse também o lojista?
- Esta jóia é um primor
só quem a pode comprar
é o nosso imperador
só ele terá dinheiro
com que pague o seu valor.
O rapaz saiu pra rua
Com a tal pedra na mão
Assim que o rei a viu
Ficou com tanta ambição
Mandou chamar o rapaz
Comprou-a por um milhão.
Deu-lhe mais um palácio
E um posto de capitão
Pelo seu merecimento
Todos lhe davam atenção
Era um estrangeiro nobre
Filho de outra nação.
Na corte tinha um barbeiro
Que no reinado vivia
Também era conselheiro
Em tudo se intrometia
Disse logo a todo mundo
Que a pedra o rei a possuía.
O rei mandou colocar
A pedra em sua coroa
Como era um brilhante
De uma espécie muito boa
Servia de ornamento
Pra sua nobre pessoa.
O barbeiro quando viu
Disse muito admirado
- Isso só ficava bem
tendo outra em cada lado
tendo mais uma na frente
fica um rei mais respeitado.
Lhe disse o imperador:
- Aonde vou encontrar
outra pedra como esta?
É asneira procurar....
- O moço que lhe vendeu
é quem pode lhe arranjar.
- Rei senhor, mande chamar
ele não dirá que tem
lhe mostre pena de morte
veja se a pedra não vem
pois ela não há de tê-la
só rei senhor, mais ninguém.
- Sim senhor, está muito bem!
Mandou logo procurar
Dali saiu o barbeiro
Ver se podia encontrar
Quando encontrou foi dizendo:
- Rei senhor manda chamar.
Veio o moço e o barbeiro
Para a presença do rei
Lhe disse o imperador:
- sabes pra que te chamei:
porque preciso outra pedra
igual a que te comprei.
Disse o rapaz ao rei:
- Outra eu não posso arranjar
ainda eu tenho dinheiro
não tenho aonde comprar
eu achei esta no rio
porém sem nunca esperar.
- O senhor vá ver a pedra
me chegue aqui qualquer dia
peça por ela o que quiser
não resgatei a quantia
porém chegando sem ela
morrerá no mesmo dia.
Saiu José muito triste
Pensando de qual maneira
Poderia se livrar
Dessa cena traiçoeira
Foi sair no mesmo rio
Aonde achou a primeira.
Foi pelo mesmo lugar
Aonde tinha passado
Seguiu pelo rio adentro
Procurando com cuidado
Uma pedra que igualasse
A que ficou no reinado.
Ele já estava cansado
De por ali procurar
Bebeu água sem ter sede
Nada de poder encontrar
Desenganado da vida
Pegou sozinho a falar.
Dizia ele consigo:
- Eu sei que vou morrer
essa pedra que procuro
é impossível obter
me acabo aqui afogado
não dói gosto ao rei me ver.
José pegou a ouvir
Uma coisa que estrondava
Chegando ao pé da serra
Ainda mais intimidava
De repente viu o fogo
Que perto dele brilhava.
De repente aquele fogo
Transformou-se num leão
Brigando com uma serpente
Troando que só trovão
Saia fogo dos dentes
De faiscar pelo chão.
José nem pode falar
Vendo aquela tempestade
O leão falou com ele
Pedindo por caridade:
- Mata-me esta serpente
que dou-te a felicidade.
Respondeu sem ter maldade
A serpente: - Criatura
Mata o leão que dou-te
O que tu andas à procura
Depois te farei feliz
Que sou uma virgem pura.
Ele atirou no leão
Aquela fera valente
Com um tiro muito certeiro
Morrei instantaneamente
Morto que fosse o leão
Desencantava a serpente.
Era uma moça encantada
Uma excelente menina
A origem do encanto
Foi para cumprir a sina
Era essa a tal princesa
Do reino da Pedra Fina.
Ele com ela abismou-se
Somente pela beleza
Perguntou-se: - Quem sois vós?
Disse ela: - A princesa do
Reino da Pedra Fina
Que venho em tua defesa.
Dali saiu a princesa
Com José acompanhando
Desceram de rio abaixo
Ambos juntos conversando
No lugar que procurava
Ela parou lhe falando:
- Se teu ferro está cortando
anda cá, vem me ferir
corta este dedo ao meio;
mas ele não quis ouvir
disse ela: - Corta logo
que o sangue vem te servir.
José sem querer cortar
Julgando ser uma asneira
Mas quando cortou-lhe o dedo
Corria sangue em biqueira
Do sangue saíram duas pedras
Do formato da primeira.
Disse ela: - Está ao
O que você procurava
Esteve aqui há pouco
Procurando e não achava
Porque estava brigando
E o leão me arranhava.
Daí foram para casa
Que o rei tinha lhe dado
Ia em companhia dela
Porem muito embelezado
Pela sua formosura
Esqueceu-se do mandado.
Passando mais alguns dias
A princesa lhe falava:
- José, vai levar a pedra;
o rei a tempo esperava
José respondeu a ela:
- Eu disso nem me lembrava.
Ele aí pegou a pedra
Foi levar ao rei senhor
Que gratificou a ele
Com dois tantos do valor
E lhe fez mais um presente
De um titulo superior.
O rei disse ainda a ele
(quando entregou-lhe o dinheiro)
- Como eu te considero
inda mais que um conselheiro
vou mandar-te fazer a barba
pelo meu próprio barbeiro.
No palácio de José
Quando o barbeiro chegou
Entrou respeitosamente
Dizendo o cumprimentou:
- Vim fazer a vossa barba
que o monarca mandou.
Estava fazendo a barba
Quando a princesa sorriu
O barbeiro admirou-se
Da formosura que viu
Assim que findou a barba
No mesmo instante saiu.
Quando chegou no palácio
Foi dizendo: - Rei senhor
Agora vi uma moça
Mais linda que uma flor
Na casa do coronel:
Pra mim tem todo valor!
- Rei meu senhor, se apronte
não perca esta ocasião
vá lá no palácio dele
e preste bem atenção
pois a moça que vi lá
faz render um coração.
O rei mandou vir um carro
E perguntou: - Como é?
Você me diz essas coisas
Porem eu não tenho fé;
À tarde foi passear
Onde morava José.
Passando o carro por baixo
Avistou logo a princesa
Debruçada na janela
Em traje de camponesa
Deu um ataque e caiu
Quando viu a boniteza.
Ai pegaram o rei
Pensando que ele morria
Deram-lhe medicamento
Porem ele nem bebia
Levaram ele pra corte
Foi tornar no outro dia.
No outro dia o barbeiro
Foi ao rei aconselhar
Dizendo: - Não desanime
Eu tenho jeito pra dar
Tenha mais perseverança
Que sempre vem a gozar.
Disse o barbeiro ao rei:
O moço, seu coronel
Talvez com essa invenção
Nos caia a sopa no mel
Mande ele no reinado
Das laranjas de Babel.
- Diga que a sua esposa
desejou muito comer
uma laranja de lá
para o filho não perder
está grávida há seis meses
vive em tempo de morrer.
O rei tomou o conselho
Mandou logo chamar
Por esse mesmo barbeiro
Que o recado foi dar
Disse a José: - Apareça
Que o rei quer lhe falar.
- Uma laranja mimosa
quero que vá me buscar
no Reino das Laranjeiras
pra em dez dias chegar
se não fizer o que digo
eu lhe mando degolar.
O pobre banhado em pranto
Chorando em casa chegou
A princesa comovida
Depressa lhe perguntou:
- O que foi, José?
- Foi o rei que me mandou....
- O rei disse que fosse
uma laranja buscar
no Reino das Laranjeiras
como é que posso acertar?
Se não chegar em dez dias
Ele manda me matar.
- Não tenhas medo, José
descansa para jantar
enquanto eu existir
algum remédio hei de dar
vou te arranjar um cavalo
que ti possas viajar.
Pega ela a ensinar
Como devia fazer
Dizendo: - Pelas três horas
Você irá receber
De um moleque um cavalo
Que vem lhe oferecer.
Ele compreendeu tudo
Foi para o ponto esperar
Com pouco viu um moleque
Em um cavalo a saltar
Muito gordo e bem selado
Capaz dum homem montar.
Dizendo: - Quem quer comprar
Por cinco contos de réis
Um cavalo muito gordo
Calçado de mãos e pés?
Disse José: - Compro eu
Tu pedes cinco eu dou dez.
Ele pagou ao moleque
Aquela grande quantia
Porem todo privilégio
O cavalo possuía
O mesmo estava arreado
Da forma que ele queria.
A princesa chamou ele
Tornou a recomendar:
- Daqui lá só são mil léguas
numa hora hás de chegar
porem este teu cavalo
não é preciso açoitar.
- Basta que de hora em hora
você dê-lhe uma lapada
corra, siga à toda pressa
não te importes com nada
porem quando chegar lá
encontra a porta fechada.
- Fique ali bem escondido
pra ninguém o perseguir
quando bater meia-noite
o portão há de se abrir
entre sem fazer zuada
para ninguém não o vir.
- Dentro tem leões e lobos,
ursos, camelos urrando,
cobras, serpentes assanhadas
leão, leoa rosnando
pantera, porco do mato
sobre as laranjas avançando.
- Não te importes com nada
porque assim determina
quando entrar vá chamando:
Oh! Laranja tangerina
Me acompanha a um chamado
Do Reino da Pedra Fina.
José chamou a laranja
Ela veio, ele levou-a
Fez como a princesa disse
E não deu passada à-toa
Montando no seu cavalo
Corria como quem voa.
José dizendo as palavras
Todo bicho se mordia
Para tomar a laranja
Um puxava outro queria
José arribou com ela
Já acabou-se a porfia
Correu com essa laranja
Os bichos atrás pra tomar
Numa grande violência
Viu-se o portão se fechar
Nem a cauda do cavalo
Eles puderam pegar.
Não é preciso saber
Quanto o cavalo corria
Nem mesmo uma ave rapina
A favor da ventania
Basta dizer que tirava
Umas mil léguas por dia
José que vinha contente
Com a laranja na mão
Entregou ela à princesa
Ela prestou atenção
Disse José: - Veja bem
A laranja é esta ou não?
Disse ela: - Vou te mostrar
O poder da natureza
Pegou, partiu a laranja
Em cima de uma mesa
Saiu de dentro uma moça
Mais linda que a princesa
Disse a princesa a José:
- Esta é a minha irmã
que o leão carregou
um dia pela manhã
depois juntou as bandas
e a laranja ficou sã.
Chamava-se Romana
O corpo um tanto delgado
Olhos pretos muito vivos
Nariz bastante afilado
Dentes alvos, boca linda,
Rosto bem feito e corado.
Elas ficaram falando
Em tudo que se passou
Que o rei queria a laranja
Como de fato, chegou
José foi levar no dia
Que o tempo completou.
O rei ficou satisfeito
E lhe deu muito dinheiro
Deu-lhe mais uma medalha
Com honra de brigadeiro
Depois tirou-lhe também
Para ser seu conselheiro.
José foi com o barbeiro
Este voltou na carreira
Dizendo ao rei: - Vi agora
Outra moça verdadeira
Lá na casa do José
Mais linda que a primeira!
Disse o barbeiro ao rei:
- Todas elas são donzelas
eu nunca vi neste mundo
duas figuras tão belas
rei meu senhor faça tudo
para gozar todas elas.
- Ainda temos outro jeito
rei senhor mande chamar
José pra ir no reinado
Das limeiras de Tupar
Ele indo essa viagem
Nunca mais há de voltar.
José seguiu para a corte
Fingindo ter paciência
Para acudir o chamado
Que vinha com muita urgência
Cumprimentou os vassalos
Cheio de benevolência.
Disse o monarca: - José
Esta vez é a terceira
Para buscar-me uma lima
No Reinado das Limeiras
Já que tiveste coragem
De voltar das Laranjeiras
Disse a princesa: - José
Eu lhe hei de proteger
Preste-me bem atenção
Repare o que vou dizer
Ensinou tudo a José
Como devia fazer
Saiu ele à toda pressa
Correndo por uma estrada
Saiu de casa ao meio-dia
Foi chegar de madrugada
Achou o portão fechado
Esperou pela entrada.
Chegou, ouviu o sussurro
De muitos bichos que havia
Ele morrendo de medo
Porem não se remexia
Até o próprio cavalo
De medo também tremia
Quando batiam seis horas
Ia o portão se abrindo
Ele entrou e foi vendo
Feras de dentes rangendo
Debaixo da limeira
Tinha um leão dormindo.
Ele entrou e foi chamando
Pela lima camponesa
- Eu venho aqui te buscar
obrigado a natureza
preciso que não me faltes
ao chamado da princesa
José agarrou a lima
Com uma mão segurou
As feras partiram em cima
Porém José se livrou
Quando ia chegando perto
Ai o portão se fechou.
Como ele correu com medo
Não podia ter demora
Chegando, entregou a lima
Na mão de sua senhora
Disse ela: - Quero ver
O que vão inventar agora.
No reinado tinha uma
Do Reino das Laranjeiras
Depois chegou a caçula
Do Reno das Limeiras
Era a caçula mais bela
Do que as duas primeiras.
A lima ficou partida
Ela com jeito fechou
Não tinha nenhum defeito
A José ela entregou
Depois que findou o prazo
Foi quando José voltou.
O rei recebeu a lima
Foi tratando de pagar
Deu tanto dinheiro a ele
Que não tinha onde botar
O barbeiro foi com ele
Para seu cabelo cortar.
Chegou junto com José
O barbeiro conhecido
Quando viu as três princesas
Foi correndo espavorido
E sem poder dizer nada
Do que tinha acontecido.
Disse ele: - Rei senhor
Eu lhe digo com franqueza
Fui à casa de José
E lá vi outra princesa
Que aquela só sendo feito
Pela mão da natureza.
- Pra rei senhor gozar nelas
outro conselho vou dou
mande José ao inferno
dizendo que precisou
de saber noticia certa
do finado seu avô.
- Rei meu senhor mande logo
fazer um grande alçapão
dizendo: - É este o caminho
vai por debaixo do chão
quando entrar, feche a porta
morrerá sem remissão.
Mandaram chamar José
Ele depressa chegou:
- Quero que vá no inferno
o monarca assim falou:
- Para levar um oficio
ao finado meu avô.
- Traga noticia de lá
e volte pra me dizer
isto que estou lhe dizendo
o senhor tem que fazer;
volta José soluçando
na certeza de morrer.
A princesa disse a ele:
- O rei faça o que quiser
eles agora vão ver
a força duma mulher
ninguém judia contigo
enquanto eu vida tiver.
- Pega estas duas pedras
leva elas duas na mão
elas num lugar escuro
te servem de lampião
lá tu fazes um discurso
na porta do alçapão.
Nesta hora por ali
Fica tudo admirado
Afrouxes as pedras da mão
E dás um pulo de lado
O fogo que sai das pedras
Deixa tudo encandeado.
José compreendeu tudo
Aprontou-se pra sair
Quando o réu deu o oficio
Pegou ele a discutir
Pulou dentro, saiu fora
Sem ninguém o pressentir.
Todos disseram: - Aquele
Nunca mais há de voltar
Que só do pulo que deu
Viu-se o fogo brilhar
Labaredas do inferno
Na porta veio encontrar.
José no mesmo momento
Pra sua casa voltou
Chegando mais que depressa
Em um quarto se trancou
A mulher pegou a roupa
No fumeiro desprezou.
Todo dia ela queimava
Muito enxofre no fumeiro
Porem sempre às escondidas
Fazia muito ligeiro
Assim foi continuando
Completou um ano inteiro.
José como quem está preso
Seu cabelo não cortava
Não lavava pés nem mãos
As unhas nunca aparava
Um banho nunca tomou
Nem nunca se barbeava.
Vou dizer o que fazia
O rei com seu barbeiro
Que mostrava no seu carro
Na roupa só tinha cheiro
Iam visitar as moças
Só chegavam no terreiro.
No palácio de José
Quando o rei ali saltava
A princesa na janela
Mas nem o cumprimentava
Se o rei subia a calçada
O palácio se fechava.
O rei andava de novo
Começava a rodear
Ela deixava a janela
Procurava outro lugar
Depois de desenganou
E não quis mais passear.
Vamos tratar de José
De qual forma se arranjou
Lhe disse a princesa um dia:
- Eu vou ver que jeito dou
para o barbeiro passar
pelo que você passou.
Quis a princesa vingar-se
Do que o barbeiro fazia
Escreveu uma resposta
Com grande aristocracia
Com letras feias e gregas
Que só o diabo sabia.
Dizendo: “Meu caro neto
Eu aqui estou sossegado
Fiquei ciente de tudo
Que me foi participado
Pelo mesmo portador
Lhe comunico o passado.
Eu aqui sou um guerreiro
Não me sujeito a ninguém
Mande sem falta o barbeiro
Que por hora aqui não tem
Para cortar meu cabelo
E minha barba também”.
Vinha na carta dizendo:
“as suas ordens estou
mande cá o seu barbeiro
bem sabe que lá não vou
aceite mil saudações
do finado seu avô”.
Aí José se vestiu
Com a roupa esfarrapada
Fedendo muito a enxofre
A espada enferrujada
Com os cabelos de monge
A barba toda assanhada.
Botou a carta no bolso
No mesmo instante levou
Antes de chegar na corte
Ele com a um praça encontrou
Ele era um general
E o praça não se importou.
Ele repeliu o praça
Com muita benevolência
Dizendo: - Sou general
Conheço a jurisprudência
Vá mudar de roupa nova
Pra me fazer continência.
José entrou no palácio
Foi logo avisando o rei
Que de longe perguntou-lhe:
- Que és que até me espantei?
- Sou o general da carta
que do inferno cheguei.
- Ontem cheguei de viagem
ele mandou um oficio
receba ele esta aqui
pra trazer fiz sacrifício
só não fui mal na viagem
porque lá vi um patrício.
Quando ele leu o oficio
Pelo assunto primeiro
Viu logo que seu avô
Mandou chamar o barbeiro
Disse o rei: - Vá se aprontar
Pra ir no mesmo roteiro.
- É pra seguir amanhã
não deixe mais demorar
meu avô manda chamá-lo
e eu não posso negar
é para fazer-lhe a barba
e seu cabelo cortar.
Disse ele: - Sigo já
Como o general seguiu;
Fez também o seu discurso
Quando o alçapão abriu
Ele, navalha e tesoura
No grande abismo caiu.
Ele morreu de repente
Daquela morte fatal
Ficou José descansando
De quem lhe fez tanto mal
Depois morreu sempre o reis
Ficou sempre o general.
José que era o rei
De toda aquela nação
A princesa disse a ele:
- Teu pai está na prisão
tua mãe também está presa
junto com o teu irmão.
- Pois é bom que saia cedo
vai para aquele lugar
espera pelo teu povo
que eles têm que passar
e os toma dos soldados
quero com eles falar.
José foi para o ponto
Com pouco avistou seu pai
Sua mãe e seus irmãos
Dando suspiro e ai
Diz ele às praças: - Este povo
Daqui pra diante não vai.
Os soldados responderam:
- Vão todos ao processados
os levamos para o juiz
para ser interrogados;
respondeu José com raiva:
- Dêem meia volta, soldados!
José levou todos eles
E entregou à princesa
Ela foi cortou-lhes as cordas
Sentou-se numa marquesa
Ficaram todos com medo
Quando chegaram na mesa.
Disse a velha: - Com certeza
Nós todos vamos morrer
Pois o réu não se ocupa
Beneficio nos fazer;
Disse o velho: - E é na forca
Pegaram a se maldizer.
Botaram o jantar pra eles
Pra Antonio, feijão com bredo
Pra João, banana com casca
Ficaram todos com medo
Disse a velha consigo:
- Está descoberto o segredo.
A primeira disse a ela:
- Vejo tudo amedrontado
minha velha sente-se aqui
me conte o que foi passado
senão disser morre tudo
de um por um degolado.
- A senhora me responda
quantos filhos já tem tido?
- Só tenho Antonio e João
outros já têm morrido;
- A senhora não tem outro
que está no mundo perdido?
- Conta a história direito
não é preciso negar,
quede José, seu caçula?
Deve inda se lembrar;
Disse a velha: - Essa história
Eu não preciso contar.
A velha morta de medo
Sempre lhe fez o pedido
Dizendo: - Eu tive José
Meu caçula querido
Faz dez anos que ele
Anda no mundo perdido
- Ele era inteligente
não sei se era por sina
pois desejou ver as pernas
das moças da Pedra Fina
meu marido teve medo
foi com ele à disciplina.
Disse a princesa: - O menino
Apanhar não merecia
Se por acaso a senhora
Visse ele conhecia?
Lhe disse a velha: - Conheço
Em qualquer hora do dia.
Ela perguntou à velha
(porem lhe mostrando agrado):
- A senhora conhece aquele
que se acha ali sentado?
Lhe disse a velha: - É o rei
Que governa este reinado.
José não agüentou mais
Partido de comoção
Abraçou-se com a velha
Chorando pediu perdão
Ajoelhou-se aos pés dela
Para tomar-lhe a benção.
José abraçou a todos
Como era bom irmão
Casou Antonio com Romana
A caçula com João
Foram viver no reinado
Na mais perfeita união.
Portanto devemos ter
O pensamento adiantado
José, um menino pobre
Trabalhando no roçado
Desejou ver a princesa
Por isso foi castigado.
Viveram todos felizes
Gozando mil maravilhas
José como uma estrela
Que no firmamento brilha
Mostrou que ele sozinho
Felicitou a família.
Literatura de Cordel quarta, 12 de setembro de 2018
PELEJA DE BERNARDO NOGUEIRA E O PRETO LIMÃO (FOLHETO DE JOÃO MARTINS DE ATHAYDE)
PELEJA DE BERNARDO NOGUEIRA E O PRETO LIMÃO
João Martins de Athayde
Em Natal já teve um negro
Chamado Preto Limão
Representador de talento
Poeta de profissão
Em toda parte cantava
Chamando o povo atenção
Esse tal Preto Limão
Era um negro inteligente
Em toda parte que chega
Já dizia abertamente
Que nunca achou cantador
Que lhe desse no repente
Nogueira sabendo disto
Prestava pouca atenção
Dizendo: – eu nunca pensei
Brigar com Preto Limão
Sendo assim da raça dele
Eu não deixo nem pagão
O encontro destes homens
Causou admiração
Que abalou o povo em roda
Daquela povoação
Pra ver Bernardo Nogueira
Brigar com Preto Limão
Eu sou Bernardo Nogueira
Santificado batismo
Força de água corrente
Do tempo do Sacratíssimo
Quando eu queimo as alpercatas
Pareço um magnetismo
Me chamam Preto Limão
Sou turuna no reconco
Quebro jucá pelo meio
Baraúna pelo tronco
Cantador como Nogueira
Tudo obedece meu ronco
Seu ronco não obedeço
Você pra mim não falou
Até o diabo tem pena
Das lapadas qu’eu lhe dou
Depois não saia dizendo:
– Santo Antônio me enganou!
Bernardo eu não me enganei
Agora é que eu pinto a manta
Cantor pra cantar comigo
Teme, gagueja, se espanta
Dou murro em braúna velha
Que o entrecasco alevanta!
Você pra cantar comigo
Precisa fazer estudo
Pisar no chão devagar
Fazer o passo miúdo
Dormir tarde, acordar cedo
Dar definição de tudo…
Você pra cantar comigo
Tem de cumprir um degredo
Pisar no chão devagar
Bem na pontinha do dedo
Dar definição de tudo
Dormir tarde, acordar cedo…
Cantor que canta comigo
Estira como borracha
O suor do corpo mina
Os olhos saltam da caixa
Quer tomar pé mas não pode
Procura o fôlego e não acha…
Nogueira, estás enganado
Queira Deus você não rode
Teimar com Preto Limão
Você quer porém não pode
Se cair nas minhas unhas
Hoje aqui nem Deus acode!
Moleque, se eu te pegar
Me escancho em tuas garupas
Das pernas eu faço gaita
Da cabeça uma cumbuca
Dos queixos um par de tamanco
Da barriga chupa-chupa
Nogueira se eu te pegar
Até o diabo tem dó!
Desço de goela abaixo
Em cada tripa dou nó
Subo de baixo pra cima
E vou morrer no gogó
Da forma qu’eu te deixar
Não vale a pena viver
Porque teus próprios amigos
Não hão de te conhecer
Corto-te os beiços de cima
Faço te rir sem querer!
Você vai ficar pior
Send’eu já estava chorando
Porque de ora em diante
Hás de falar bodejando
Corto-te a ponta da língua
Fica o tronco balançando
O resto de tua vida
Terás muito o que contar
Dês de perto, abertamente
Se acaso desta escapar
Diga que foste ao inferno
Depois tornaste a voltar
Tive uma pega com Inácio
Moleque bom na madeira
É negro que não se afronta
Com dez léguas de carreira
Dum açoite que dei nele
Quase larga a cantigueira
Você cantou com Inácio
Porém só foi uma vez
E faz vergonha contar
O que foi qu’ele te fez
Te pôs doente um ano
Aleijado mais dum mês
Inácio não me fez nada
Porque vivia cismado
Duma surra qu’eu dei nele
Há vinte do mês passado
De preto ficou cinzento
Quase morre asfixiado
Moleque tu me conhece
Como cantor afamado
No lugar qu’eu ponho a boca
É triste teu resultado
Tive uma pega com Inácio –
Já vi serviço pesado!
É porque você não viu
Preto Limão enfezado
Acendia os horizontes
De um para o outro lado
Rasga as decondências dele
De um negro encondensado
Tive aperreado um dia
Fiz a terra dar um tombo
No recreio da parcela
O mar é surdo urubombo
Cobri o mundo de fogo
E nada me fez assombro
Você fazendo tudo isso
Dá prova de homem forte
Eu já o considerava
Pela sua infeliz sorte
Se você chegasse a ir
Ao Rio Grande do Norte
Se eu for lá ao Rio Grande
Até você desanima
O sol perderá seus raios
A terra, o mundo e o clima
Tapo a boca do rio
Deixo correndo pra cima!
Se me tapares o rio
Verás como eu sou tirano
Rasgo pela terra a dentro
E vou sair no oceano
Deixo a maré do Brasil
Enchendo uma vez por ano!
Moleque, o que você tem?
Parece um pinto nuelo?
Contaste tanta façanha
Como estás tão amarelo?
Quanto mais você se visse
Seu Nogueira no martelo
Se eu cantar o martelo
Você encontra banzeiro
Qu’eu perco a fé em doente
Quando muda o travesseiro
Afinal siga na frente
Qu’eu irei por derradeiro
O cantor qu’eu pegá-lo no martelo
Pego na goela
O cabra esmorece
A língua desce
Os olhos racha
Salta da caixa
Por despedida
Procura a vida
Porém não acha
Tenho chumbo e bala
Para seu Nogueira
Cantador goteira
Pra mim não fala
Dentro duma sala
Fica entupido
E amortecido
E sem recurso
Até o pulso
Lhe tem fugido
É na bebedeira
Que o preto morre
Tropeça e corre
Topa ladeira
Mede porteira
E passadiço
E alagadiço
Se for com trama
Se encontrar lama
Topa serviço
Duro de fama
Dura bem pouco
Que o pau que é oco
Não bota rama
Chora na cama
Qu’é lugar quente
Quebro-te dente
Furo-te a língua
Faço-te íngua
Cabra insolente
Vante o perigo
É qu’sou valente
Sou a serpente
Do tempo antigo
Negro comigo
Não tem ação
Boto no chão
Quebro a titela
Arranco a moela
Levo na mão
Nogueira, tu reparaste
Num sujeito que chegou?
Trouxe um recado urgente
Que minha mulher mandou
Por hoje eu não canto mais
Fique cantando qu’eu vou…
Não quero articulação
Vá se embora seu caminho
Canário que estala muito
Costuma borrar o ninho
Quem gosta de surrar negro
Não pode cantar sozinho
Naquele mesmo momento
Saiu o Preto Limão
Deixou o povo na sala
Tudo em uma confusão
Uns diziam que correu
Outros diziam que não
Quando o Preto voltou
Nogueira tinha saído
Preto Limão disse ao povo:
– Vão chamar o atrevido
Venham olhar bem de perto
Como se açoita um bandido
Foram chamar o Nogueira
Estando ele descansado
Deitado na sua rede
Quando chegou-lhe o recado
Nogueira com muito gosto
Foi acudir ao chamado
Quando Nogueira chegou
Encontrou Preto Limão
Acuado numa sala
Ringia que só leão
Naquele mesmo momento
Começaram a descrição
Cantador qu’eu pegá-lo de revés
Com o talento qu’eu tenho no meu braço
Dou-lhe tanto que deixo num bagaço
Só de murro, tabefe e pontapés
Só de surras eu dou-lhe mais de dez
E o povo não ouve um só grito
Faz careta e se vale do Maldito
Miserável, tua culpa te condena
Mas quem é que no mundo terá pena
Deste monstro que morre tão aflito?
Cantador com Nogueira não peleja
Sendo assim como o tal Preto Limão
Só se for pra tomar minhas lição
Ele engole calado e não bodeja
Vai comendo da mesa o que sobeja
Precisa me tratar com muito agrado
No instante fazer o meu mandado
É de pressa, é ligeiro, é sem demora
Qu’eu não gosto de moleque que se escora
Pois assim é qu’eu o quero por criado
Vale a pena não seres cantador
É melhor trabalhares alugado
Vai cumprir por aí teu negro fado
Vai viver sob o ferro dum feitor
Da senzala já és um morador
Teu trabalho é lá na bagaceira
O que ganhas não dá pra tua feira
Renego tua sorte tão mesquinha
Que te assujeitas às amas da cozinha
E te ofereces pra delas ser chaleira
Este homem já vive desvalido
É descrente de Deus e da Igreja
Lúcifer o teu nome já festeja
Tu só podes viver é sucumbido
Sois tão ruim que só andas escondido
Para Deus nunca mais serás fiel
Tua raça é descendente de Lusbel
Que do Céu já perdeste a preferência
Farás tua eterna convivência
Lá embaixo dos pés de São Miguel
Tu pareces que vinhas na carreira
Sempre olhando pra frente e para trás
Como quem chega assim veloz de mais
Eu vi bem quatro paus de macaxeira
Uma jaca partida e outra inteira
Também vi dois balaios de algodão
Creio que tu já foste um ladrão
Com o peso fazia andar sereno
Às dez horas da noite, mais ou menos
Encontrei-te com esta arrumação
Meus senhores de dentro do salão
Este enorme convívio de alegria
Exaltar este homem é covardia
Só lhe falta o nome de ladrão
Para o povo tem sido muito exato
Só o que tem é que peru, galinha e pato
No lugar que ele mora não se cria
Muita gente aqui já desconfia
Que ele passa lição a qualquer rato
Quiosque fechado não se vende
Cantador sem rimar é desfeitado
Como tu neste banco te alevantas
Não precisa que o povo me encomende
Quem é cego de nada compreende
Vive numa masmorra anzolado
Por que eu já o tenho protejado
Desta tua incivil sorte mesquinha
Eu te deixo no mato sem caminho
Sob as garras dum gancho pendurado
Cantador capoeira não me aguenta
Inda duro e valente qu’ele seja
Com Bernardo Nogueiras não peleja
Adoece, entisica e se arrebenta
Dou na testa, dou na boca, dou na venta
Desta pisa ele fica amortecido
Endoidece, fica vário do sentido
Eu o boto na roda e no manejo
Ficará satisfeito meu desejo
Pra não seres cantador intrometido
Te arrepende da hora que nasceste
Seu Nogueira como é tão infeliz
Tua vida no mundo contradiz
Contra mim pelejando não venceste
Na prisão de masmorra já sofreste
Tua vida já perde as esperança
Eu armei uma forca e uma balança
Num minuto hás de ser bem degolado
Ficará todo mundo consolado
Preto Limão só assim terá vingança!
Eu já tenho um moinho de quebrar osso
Uma prensa inglesa preparada
Qu’inda ontem imprensei um camarada
Qu’era duro, valente e muito moço
Eu já tenho guardado o teu almoço
Qu’é um bolo de ovos com manteiga
Pra cantor malcriado que lá chega
Eu agarro na gola desse cuba
Piso a carne diluída e faço puba
Se eu não matar levo ele para a pega
Quando eu apareço numa casa
Que me mandam então eu divertir
Quatro, cinco dias vê cair
Relâmpago, trovão, curisco e brasa
Cantador comigo não se atrasa
E quem for valente, já morreu
A tocha de fogo já desceu
Meu martelo é de ferro e aço puro
Cantador comigo está seguro
Nunca houve um martelo como o meu…
Você diz que no martelo é atrevido
E somente porque não considera
Você nas minhas unhas desespera
Fica louco e quase sem sentido
Numa hora ficarás doido varrido
Teu repente não passa de besteira
As peiadas que eu te dou levanta poeira
Todo o povo já lhe tem é compaixão
Eu te deixo embolando pelo chão
Como porco que bebe manipueira
Dou-te sufregada
Dou-te tapa-queixo
Com pouco te deixo
Com a boca lascada
A língua puxada
Três palmo de fora
Casco-te as esporas
P’rós teus suvaco
Faço raco-raco
Danado, tu chora!
Dou-te bofetão
No pé do cangote
Eu vou no pacote
Do Preto Limão
Eu boto no chão
E piso a barriga
Espirra a lombriga
Os pinto comendo
O povo dizendo:
– Agüenta a espiga…
Literatura de Cordel quarta, 05 de setembro de 2018
PELEJA DE PINTO COM MILANÊS (FOLHETO DE SEVERINO MILANÊS DA SILVA)
Milanês estava cantando em vitória de Santo Antão chegou Severino Pinto nessa mesma ocasião em casa de um marchante travaram uma discussão.
M – Pinto, você veio aqui se acabar no desespero eu quero cortar-lhe a crista desmantelar seu poleiro aonde tem galo velho pinto não canta em terreiro
P – mas comigo é diferente eu sou um pinto graúdo arranco esporão de galo ele corre e fica mudo deixa as galinhas sem dono eu tomo conta de tudo
M – Para um pinto é bastante um banho de água quente um gavião na cabeça uma raposa na frente um maracajá atrás não há pinto que agüente
P – Da raposa eu tiro o couro de mim não se aproxima o maracajá se esconde o gavião desanima do dono faço poleiro durmo, canto e choco em cima.
M – Pinto, cantador de fora aqui não terá partido tem que ser obediente cortês e bem resumido ou rende-me obediência ou então é destruído
P – Meu passeio nesta terra foi acabar sua fama derribar a sua casa quebrar-lhe as varas da cama deixar os cacos na rua você dormindo na lama
M – Quando vier se confessar deixe em casa uma quantia encomende o ataúde e avise a feguezia que é para ouvir a sua missa do sétimo dia
P – Ainda eu estando doente com uma asa quebrada o bico todo rombudo e a titela pelada aonde eu estiver cantando você não torna chegada
M – O pinto que eu pegar pélo logo e não prometo vindo grande sai pequeno chegando branco sai preto sendo de aço eu envergo sendo de ferro eu derreto
P – No dia que eu tenho raiva o vento sente um cansaço o dia perde a beleza a lua perde o espaço o sol transforma-se em gelo cai de pedaço em pedaço
M – No dia que dou um grito estremece o ocidente o globo fica parado o fruto não dá semente a terra foge do eixo o sol deixa de ser quente
P – Eu sou um pinto de raça o bico é como marreta onde bate quebra osso sai felpa que dá palheta abre buraco na carne que dá pra fazer gaveta
M – Eu pego um pinto de raça e amolo uma faquinha faço um trabalho com ele depois pesponto com linha ele vivendo cem anos não vai perto de galinha
P – Milanês, você comigo desaparece ligeiro eu chego lá tiro raça me aposso do poleiro e você dorme no mato sem poder vir no terreiro
M – Pinto, agora nós vamos cantar em literatura eu quero experimentá-lo hoje aqui em toda altura você pode ganhar esta porém com grande amargura
P – pergunte o que tem vontade não desespere da fé do oceano, rio e golfo estreito, lago ou maré hoje você vai saber pinto cantando quem é
M – Pinto, você me responda de pensamento profundo sem titubear na fala num minuto ou num segundo se leu me diga qual foi a primeira invenção do mundo
P – Respondo porque conheço vou dar-lhe minha notícia foi o quadrante solar pelo povo da Fenícia os babilônios também gozaram a mesma delícia
M – Como você respondeu-me não merece disciplina hoje aqui não há padrinho que revogue a sua sina se você souber me diga quem inventou a vacina?
P – Não pense que com pergunta enrasca a mim, Milanês foi a vacina inventada no ano noventa e seis quem estuda bem conhece que foi Jener Escocês
M – Sua resposta foi boa de vocação verdadeira mas queira Deus o colega suba agora essa ladeira me diga quem inventou o relógio de algibeira?
P – No ano mil e quinhentos Pedro Hélio com façanha em Nuremberg inventou essa obra tão estranha cidade da Baviera que pertence a Alemanha
M – Pinto, cantando não gosto de amigo nem camarada se conhece a história Roma onde foi fundada? o nome do fundador e a data comemorada?
P – Em l7 e 53 antes de Cristo chegar nas margens do Rio Tibre isso eu posso lhe provar Rômulo ali fundou Roma a 15 milhas do mar
M – Pinto, eu na poesia quero mostrar-lhe quem sou relativo o avião perguntando ainda vou diga o primeiro balão quem foi que inventou?
P – Em mil seiscentos e nove Bartolomeu de Gusmão no dia oito de agosto fez o primeiro balão hoje no mundo moderno chama-se o mesmo avião
M – Pinto estou satisfeito já de você eu não zombo mas não pense que com isto atira terra no lombo disponha de Milanês pra ver se ele agüenta o tombo
P – Milanês, você comigo ou canta ou perde o valor você me responda agora seja que de forma for de quem foi a invenção do primeiro barco a vapor?
M – Eu quero lhe explicar digo não muito ruim a 16 a 87 você não desmente a mim o inventor desse barco foi o sábio Diniz Papim
P – Em que ano inaugurou-se da Europa ao Brasil a linha pra esse barco a vapor e mercantil? Se não souber dê o fora vá soprar em um funil
M – Foi um navio inglês que levantou a bandeira em 18 a 51 veio a terra brasileira sendo a nove de janeiro fez a viagem primeira
P – E qual foi a 1a guerra feita a barco a vapor? Você ou diz ou apanha da surra muda de cor quebra a viola e deserta nunca mais é cantador
M – Em l8 e 65 a esquadra brasileira dentro do Riachuelo içou a sua bandeira na guerra do Paraguai foi a batalha primeira
P – Milanês, você comigo ou canta muito ou emperra não pode se defender salta, pula, chora e berra qual foi a primeira estrada de ferro, na nossa terra?
M – Foi quando Pedro II tinha aqui poderes mil em 18 e 54 no dia trinta de abril inaugurou-se em Mauá a primeira do Brasil
P – Milanês, você é fraco não agüenta o desafio eu ainda estou zombando porque estou de sangue frio me diga quem inventou o telégrafo sem fio?
M – Pinto, você não pense que meu barco vai a pique em mil seiscentos e oito na cidade de Munique Suemering inventou este aparelho tão chique
P – Eu já vi que Milanês não responde cousa à toa se ainda quiser cantar hoje um de nós desacoa puxe por mim que vai ver um pinto de raça boa
M – Pinto, o seu pensamento pra todo lado manobra mas eu não conheço medo barulho pra mim não sobra é fogo queimando fogo é cobra engolindo cobra
P – Do pessoal do salão levantou-se um cavalheiro dizendo: quero que cantem pelo seguinte roteiro Milanês pergunta a Pinto como passa sem dinheiro
M – Oh! Pinto, você precisa dum palitó jaquetão uma manta, um cinturão uma calça, uma camisa está de algibeira lisa não encontra um cavalheiro que forneça ao companheiro pra fazer-lhe um beneficio olhe aí o precipício como compra sem dinheiro?
P – Eu recomendo a mulher que compre na prestação um palitó jaquetão a camisa se tiver quando o cobrador vier ela esteja no terreiro eu fico no fogareiro pelo oitão vou furando ele ali fica esperando assim compro sem dinheiro
M – Você em uma cidade precisa de refeição porém não tem um tostão que mate a necessidade ali não há caridade na casa do hoteleiro só encontra desespero fala e ninguém lhe atende fiado ninguém lhe vende como come sem dinheiro?
P – Eu levo um carrapato guardado dentro do bolso vou no hotel peço almoço no fim boto ele no prato faço logo um desacato chamo o garçon ligeiro ele me diz: cavalheiro cale a boca, vá embora; saio por ali a fora assim como sem dinheiro
M – Você precisa casar para ser pai de família precisa roupa e mobília cama para se deitar você não pode comprar cadeira nem petisqueiro atoalhado estrangeiro mesa para refeição você não tem um tostão como casa sem dinheiro?
P – Se a moça amar-me enfim me tendo amor e firmeza não especula riqueza nem diz que eu sou ruim ela ontem disse a mim: eu quero é um cavalheiro e você é o primeiro para ser meu defensor quero é gozar teu amor e assim caso sem dinheiro
M – Você depois de casado sua esposa cai doente você não tem um parente que lhe empreste 1 cruzado ver seu anjo idolatrado gemendo sem paradeiro olhe aí o desespero na porta do camarada só ver pobreza e mais nada como cura sem dinheiro?
P – Eu boto-a nos hospitais do governo do estado pra quem está necessitado aquilo serve demais as irmãs especiais chamam logo o enfermeiro: — Vamos com isto ligeiro tratam com mais brevidade; se interna na caridade assim curo sem dinheiro
M – Oh! Pinto, camaradinha você precisa ir à feira para comprar macaxeira arroz, batata e farinha bacalhau, charque e sardinha tomate, vinho e tempero gás, açúcar e candeeiro biscoito, chá, macarrão bolacha, manteiga e pão Como compra sem dinheiro?
P – Eu dou um jeito no pé envergo um dedo da mão um dali dá-me um pão outro dá-me um café à tarde vou à maré espero ali o peixeiro ele é hospitaleiro humanitário e carola dá-me um peixe por esmola e assim como sem dinheiro
M – Com este verso do Pinto encheu de riso o salão houve uma recepção naquele nobre recinto ergueu-se um rapaz distinto com frase meiga e bela disse: mudem de tabela pra uma idéia mais grata: nem a polícia me empata de chorar na cova dela
P – Eu tive uma namorada bonita igual Madalena parecia uma verbena pela manhã orvalhada a morte tomou chegada matou a minha donzela quando sepultaram ela quase a tristeza me mata nem a polícia me empata eu chorar na cova dela
M – Eu amei uma criatura ela o coração me deu na minha ausência morreu eu sofri muita amargura fui à sua sepultura para abraçar-me com ela ainda via a capela toda bordada de prata nem a polícia me empata eu chorar na cova dela
M – Um dia um amigo meu, disse com toda bravura deixe de sua loucura se esqueça de quem morreu uma desapareceu Procure outra donzela; eu disse: igualmente aquela não existe nesta data nem a polícia me empata eu chorar na cova dela
P – Desperto de madrugada o sono desaparece me levanto e faço prece na cova de minha amada volto pela mesma estrada com o pensamento nela quando eu não avisto ela vou dormir dentro da mata nem a polícia me empata eu chorar na cova dela
M – Caros apreciadores qualquer que analisou nem Pinto saiu vaiado nem Milanês apanhou vamos esperar por outra que esta aqui terminou
Literatura de Cordel sábado, 18 de agosto de 2018
NO TEMPO DA MINHA INFÂNCIA, CORDEL, COM ISMAEL GAIÃO, AO VIVO
Literatura de Cordel quarta, 15 de agosto de 2018
ANTÔNIO SILVINO: O REI DOS CANGACEIROS (FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS)
ANTÔNIO SILVINO: O REI DOS CANGACEIROS
Leandro Gomes de Barros
O povo me chama grande
E como de fato eu sou
Nunca governo venceu-me
Nunca civil me ganhou
Atrás de minha existência
Não foi um só que cansou.
Já fazem 18 anos
Que não posso descansar
Tenho por profissão o crime
Lucro aquilo que tomar,
O governo às vezes dana-se
Porém que jeito há de dar?!
O governo diz que paga
Ao homem que me der fim,
Porém por todo dinheiro
Quem se atreve a vir a mim?
Não há um só que se atreva
A ganhar dinheiro assim.
Há homens na nossa terra
Mais ligeiros do que gato,
Porém conhece meu rifle
E sabe como eu me bato,
Puxa uma onça da furna,
Mas não me tira do mato.
Telegrafei ao governo
E ele lá recebeu,
Mandei-lhe dizer: doutor,
Cuide lá no que for seu,
A capital lhe pertence
Porém o estado é meu.
O padre José Paulino
Sabe o que ele agora fez?
Prendeu-me dois cangaceiros,
Tinha outro preso fez três,
O governo precisou
Matou tudo de uma vez.
Porém deixe estar o padre,
Eu hei de lhe perguntar
Ele nunca cortou cana
Onde aprendeu a amarrar?
Os cangaceiros morreram
Mas ele tem que os pagar.
Depois ele não se queixe,
Dizendo que eu lhe fiz mal,
Eu chego na casa dele,
Levo-lhe até o missal,
Faço da batina dele
Três mochilas para sal.
Um dos cabras que mataram,
Valia três Ferrabrás
Eu não dava-o por cem papas,
Nem quinhentos cardeais
Não dava-o por dez mil padres,
Pois ele valia mais.
Mas mestre padre entendeu
Que ia acertadamente
Em pegar meus cangaceiros
E fazer deles presente,
Quem tiver pena que chore
Quem gostar fique contente.
Meus cangaceiros morreram
Mas ele morre também,
Eu queimando os pés aqui
Nem mesmo o diabo vem,
Eu não vou criar galinhas
Para dar capões a ninguém.
Tudo aqui já me conhece
Algum tolo inda peleja,
Eu sou bichão no governo
E sou trunfo na igreja.
Porque no lugar que passo
Todo mundo me festeja.
No Norte tem quatro estados
À minha disposição,
Pernambuco e Paraíba
Dão-me toda distinção,
Rio-Grande e o Ceará
Me conhecem por patrão.
No Pilar da Paraíba
Eu fui juiz de direito,
No povoado - Sapé,
Fui intendente e prefeito,
E o pessoal dali
Ficou todo satisfeito.
Ali no entroncamento
Eu fui Vigário-geral,
Em Santa Rita fui bispo,
Bem perto da capital,
Só não fui nada em Monteiro,
Devido a ser federal.
Porém tirando o Monteiro,
O resto mais todo é meu,
Aquilo eu faço de conta
Que foi meu pai que me deu
O governo mesmo diz:
Zele porque tudo é seu.
Na vila de Batalhão,
Eu servi de advogado,
Lá desmanchei um processo
Que estava bem enrascado,
Livrei três ou quatro presos
Sem responderem jurado.
Só não pude fazer nada
Foi na tal Santa Luzia.
Perdi lá uma eleição,
A cousa que eu não queria,
Mas o velho rifão diz:
Roma não se fez n’um dia.
O padre José Paulino
Pensa que angu é mingau
Entende que sapo é peixe
E barata é bacurau
Pegue com chove e não molha,
Depois não se meta em pau.
Eu já encontrei um padre,
Recomendado de papa,
Tinha o pescoço de um touro,
Bom cupim para uma tapa,
Fomos às unhas e dentes,
Foi ver aquela garapa.
Quando o rechonchudo viu
Que tinha se desgraçado,
Porque meu facão é forte,
Meu baço é muito pesado,
Disse: vôte, miserável,
Abancou logo veado.
Eu gritei-lhe: padre-mestre,
Me ouça de confissão.
Ele respondeu-me: dane-se
Eu lhe deixo a maldição,
Em mim só tinha uma coroa,
Você fez outra a facão.
Eu inda o deixei correr
Por ele ser sacerdote,
Para cobra só faltava
Enroscar-se e dar o bote,
Aonde ele foi vigário,
Quatro levaram chicote.
Foi tanto qu’eu disse a ele:
Padre não seja atrevido
Tire a peneira dos olhos,
Veja que está iludido,
Eu lhe respeito a coroa,
Porém não o pé do ouvido.
O velho padre Custódio,
Usurário, interesseiro,
Amaldiçoava quem desse
Rancho a qualquer cangaceiro,
Enterrou uma fortuna,
E eu sonhei com o dinheiro!...
Então fui na casa dele,
Disse, padre eu quero entrar
Dez contos de réis em ouro
Achemos lá n’um surrão,
Três contos de réis em prata
Achou-se n’outro caixão,
Eu disse: padre não chore,
Isso é produto do chão.
O padre ficou chorando
Eu disse a ele afinal
Padre mestre, este dinheiro
Podia lhe fazer mal
Quando criasse ferrugem
Lhe desgraçava o quintal.
Ajuntei todos os pobres
Que tinham necessidade
Troquei ouro por papel
Haja esmola em quantidade
Não ficou pobre com fome
Ali naquela cidade.
O padre José Paulino
Acha que estou descansado
Queria fazer presente
Ao governo do Estado
Deu três cangaceiros meus
Sem nada lhe ter custado.
Um desses ditos rapazes,
Estava até tuberculoso,
O segundo era um asmático,
O terceiro era um leproso,
O urubu que o comeu
Deve estar bem receoso.
Tive nos meus cangaceiros
Um prejuízo danado,
Primeiro foi Rio-Preto,
Segundo Pilão-Deitado,
Os homens mais destemidos
Que tinham me acompanhado.
Eu juro pelo meu rifle,
Que o Padre José Paulino
Cai sempre na ratoeira
E paga o grosso e o fino,
Não há de casar mais homem,
Nem batizar mais menino.
Eu sempre gostei de padre
Tenho agora desgostado
Padre querer intervir
Em negócio do Estado?!...
Viaja sem o missal,
Mas leva o rifle encostado.
Em vez de estudar o meio
Para nos aconselhar,
Só quer saber com acerto,
Armar rifle e atirar,
Lá onde ele ordenou-se,
Só lhe ensinaram a brigar.
Depois ele não se queixe,
Nem diga que sou malvado,
Ele nunca assentou praça
Como pode ser soldado?
Não tem razão de queixar-se,
Se tiver mau resultado.
Quatro estados reunidos
Tratam de me perseguir,
Julgam que não devo ter
O direito de existir,
Porém enquanto houver mato,
Eu posso me escapulir.
Eu ganhando essas serras,
Não temo alguém me pegar
Ainda sendo um que pegue,
Uma piaba no mar,
Um veado em mata virgem
E uma mosca no ar.
Eu já sei como se passa
Cinco dias sem comer,
Quatro noites sem dormir,
Um mês sem água beber,
Conheço as furnas onde durmo
Uma noite se chover.
Uma semana de fome,
Não me faz precipitar,
Mato cinco ou seis calangos
Boto no sol a secar,
Quatro ou cinco lagartixas,
Dão muito bem um jantar.
Eu passei mais de um mês
Numa montanha escondido,
Um rapaz meu companheiro
Foi pela onça comido,
Por essa também
Eu fui muito perseguido.
Era um lugar esquisito,
Nem passarinho cantava!...
Apenas à meia noite
Uma coruja piava,
Então uma grande onça,
De mim não se descuidava.
Havia muito mocós,
Eu não podia os matar,
Andava tropa na serra
Dia e noite a me caçar,
No estampido do tiro
Era fácil alguém me achar.
Passava-se uma semana
Que nada ali eu comia,
Eu matava algum calangro
Que por perto aparecia
Botava-os na pedra quente
Quando secava eu comia.
Quando apertava-me a sede
Pegava a croa de frade
Tirava o miolo dela
Chupava aquela umidade
Lá eu conheci o peso
Da mão da necessidade.
Um dia que a tropa andava
Na serra me procurando
Viram que um grande tigre,
Estava em frente os emboscando
Um dos oficiais disse:
Estamos nos arriscando.
E o Antonio Silvino
Não anda neste lugar,
Se ele andasse, aquela onça
Havia de se espantar,
Eu estava perto deles,
Ouvindo tudo falar.
Ali desceu toda a tropa,
Não demoraram um momento,
Um soldado que trazia
Um saco de mantimento,
Por minha felicidade
Deixou-o por esquecimento.
Eu estava dentro do mato,
Vi quando a tropa desceu
O tigre soltou um urro,
Que o tenente estremeceu
Até a borracha d’água
Uma das praças perdeu.
Quando eu vi que a tropa ia
Já n’uma grande lonjura,
Fui, apanhei a mochila,
Achei carne e rapadura,
Farinha queijo e café,
Aí chegou-me a fartura.
Achei a borracha d’água
Matei a sede que tinha,
A carne já estava assada,
Fiz um pirão de farinha
Enchi a barriga e disse:
Deus te dê fortuna, oncinha.
Porque a tua presença,
Fez toda a força ir embora,
O ronco que tu soltasses,
Encheu-me a barriga agora,
Eu com a sede que estava,
Não durava meia hora.
E é agora o que faço,
Havendo perseguição,
Procuro uma gruta assim
E lá faço habitação,
Só levo lá, um, dois rifles
E o saco de munição.
Me mudo para uma furna
Que ninguém sabe onde é,
A furna tem meia légua
Marcando de vante a ré,
A onça chega na boca
Mas dentro não põe o pé.
A onça conhece a furna,
Desde a entrada à saída
Porém qual é essa fera
Que não tem amor à vida?
Uma onça parte assim,
Se vendo quase perdida!...
Quando eu deixar de existir
Ninguém fica em meu lugar,
Ainda que eu deixe filho,
Ele não pode ficar,
Porque a um pai como eu
Filho não pode puxar.
Pode ter muita coragem
Ser bem ligeiro e valente,
Mas vamos ver suporta
Passar três dias doente,
Com sede de estalar beiço
E fome de serrar dente.
Se não tiver natureza
De comer calango cru,
Passe um mês sem beber água
Chupando mandacaru,
Dormir em furna de pedra
Onde só veja tatu.
Não podendo fazer isso,
Nem pense em ser cangaceiro,
Que é como um cavalo magro
Quando cai no atoleiro,
Ou um boi estropiado
Perseguido do vaqueiro.
Há de ouvir como cachorro,
Ter faro como veado,
Ser mais sutil do que onça,
Maldoso e desconfiado,
Respeitar bem as famílias,
Comer com muito cuidado.
Andar em qualquer lugar
Como quem está no perigo,
Se for chefe de algum grupo
Ninguém dormirá consigo,
O próprio irmão que tiver,
O tenha como inimigo.
O cangaceiro sagaz
Não se confia em ninguém,
Não diz para onde vai,
Nem ao próprio pai se tem,
Se exercitar bem nas armas,
Pular muito e correr bem.
Em meu grupo tem entrado
Cabra de muita coragem,
Mas acha logo o perigo
E encontra a desvantagem
Foge do meio do caminho,
Não bota o meio da viagem.
Porque andar vinte léguas
Isso não é brincadeira,
E romper mato fechado,
Subir por pedra e ladeira,
Como eu já tenho feito,
Não é lá cousa maneira.
Pegar cobra como eu pego
Quando ela quer me morder,
Cascavel com sete palmos,
Só se Deus o proteger,
Mas eu pego quatro ou cinco
E solto-a, deixo-a viver.
Que é para ela saber,
Que só eu posso ser duro,
Eu já conheço o passado,
Nele ficarei seguro,
Penso depois no presente
Previno logo o futuro.
Literatura de Cordel quarta, 08 de agosto de 2018
COCO VERDE E MELANCIA (FOLHETO DE JOSÉ CAMELO DE MELO REZENDE)
Coco Verde e Melancia
José Camelo de Melo Resende
Coco-Verde e Melancia é uma história que alguém quer sabê-la mas não sabe o começo de onde vem nem sabe os anos que faz pois passam trinta de cem
Coco-Verde era filho de Constantino Amaral morador no Rio Grande mas fora da capital pois sua casa distava meia légua de Natal
Porém seu nome era Armando como o povo o conhecia mas a namorada dele essa tal de Melancia a ele por Coco-Verde chamava e ninguém sabia
Então dessa Melancia Rosa era o nome dela porém Armando em criança se apaixonando por ela para poder namora-la pôs esse apelido nela
Portanto, seu nome é Rosa seu pai Tiago Agostinho de origem portuguesa do pai de Armando vizinho seus sítios eram defronte divididos num caminho
Quando Rosa fez seis anos e Armando a mesma idade os pais de ambos trouxeram um professor da cidade para instruir as crianças daquela localidade
Fizeram logo uma casa sobre um alto, nela então Rosa e Armando começaram a receber instrução junto com outros meninos uns vizinhos outros não
Nessa escola começou Armando a namorar Rosa pois ela além de ser rica era bastante formosa inteligente e cortez muito séria e carinhosa
Rosa tinha por Armando uma grande simpatia de forma que quando o mestre dava nele ela sentia o mesmo fazia Armando quando ela padecia
Ao completarem dez anos tanto Rosa como Armando em lousas um para a outro viviam se carteando mas disfarçando que estavam nota de carta apostando
Depois Armando temendo que o mestre os descobria figindo que amava as frutas e nas notas que fazia tomou como namorada a chamada Melancia
Rosa também pelas frutas fingiu amor desmedido e tomou o Coco-verde já para seu pretendido porém o “Coco” era Armando ele estava prevenido
Rosa estava prevenida que a melancia de Armando era ela, então assim brincavam se carteando diziam aos outros que estavam notas de cartas apostando
Então defronte a escola tinha uma pedra isolada ficando ao lado direito do poente da estrada e dela não se avistava dos pais de Rosa a morada
Armando muito sincero quando da escola voltava bem ao pé da dita pedra satisfeito ele a esperava e dali para diante ele a Rosa acompanhava
Rosa ao fazer doze anos o mestre um dia calado levou todos os meninos pra um salão reservado ficando então as meninas no seu salão costumado
Armando quando se viu no salão longe de Rosa não deu lição nesse dia por não vê sua mimosa o mestre então castigou-o com sua mão rigorosa
Voltou Armando de tarde no pé da pedra esperou por Rosa quinze minutos mas ela ali não chegou e Armando vendo a demora pra casa triste marchou
Mas Rosa no outro dia deixou seus pais almoçando e caminhou para a pedra onde esperou por Armando e quando Armando chegou encontrou ela chorando
Armando lhe perguntou: Rosa, diz-me o motivo que te fez em me deixar tão tristonho e pensativo? diz-me se o nosso amor já morreu ou inda está vivo?
Rosa chorando lhe disse: foi o nosso professor que não deixou-me voltar por causa do nosso amor dizendo que foi meu pai que a ele fez sabedor
Disse-me mais que meu pai lhe disse que não convinha leu andar junto contigo pois estou quase mocinha portanto, só me deixasse vir da escola sozinha
Armando lhe respondeu: pois a coisa está ruim como eu não posso ver da nossa amizade o fim vou ausentar-me desta terra pra descansares de mim
– Amanhã em vou embora para nunca mais voltar pois minha presença aqui talvez te faça penar e mesmo não me convém ver-te sem poder-te amar
Disse Rosa: tu assim trazes pra mim um perigo porque se fores embora eu hei de acabar comigo pois a vida só me serve se eu me casar contigo
– Hoje não vejo quem tenha força capaz de fazer meu coração desprezar-te antes prefiro morrer pois pra tudo existe jeito e o jeito eu vou dizer
– Esta pedra de hoje em diante será pois a nossa agência poderemos deixar nela munidos de paciência todo dia um para o outro sincera correspondência
– Porque nosso amor precisa nutrir as suas raizes no coração um do outro para vivermos felizes; eis ai o meu destino vê agora o que me dizes
Armando lhe respondeu: pois deixo de ir-ma embora porque o meu coração te consagro nesta hora e para que me acredite eu vou te jurar agora
– Eu juro a Deus que jamais te deixarei esquecer um só instante em meu peito e juro também sofrer por ti qualquer desventura que alguém queira trazer
– Juro mais que te pertencem minh’alma, meu coração e juro também por ti desconhecer a razão porque para defender-te me sujeitarei a prisão
Rosa disse: em também juro por ti ser forte e ativa e o meu amor durar sempre como esta pedra nativa se eu não casar contigo juro a Deus não ficar viva
– E se meu pai não quizer-te como genro, inda te digo daqui do pé desta pedra juro a Deus fugir contigo juro mais que meu amor não obedece castigo
Nisto bateu a sineta da escola, convidando a entrada dos alunos pois todos iam chegando Rosa ai marchou com pressa de parelha com Armando
Então depois desse dia Armando quando passava na pedra para a escola uma carta encontrava e Rosa encontrava outra à tarde quando voltava
Quando Rosa ficou moça se tornou inda mais bela e Armando também rapaz consultou então com ela o que devia fazer para pedi-la ao pai dela
Então Tiago Agostinho não ficou surpreendido pois que Rosa amava Armando ele já tinha sabido logo foi franco em dizer-lhe que estava feito o pedido
Armando voltou contente Tiago Agostinho então procurou saber de Rosa qual a sua opinião se ela estava de acordo receber de Armando a mão
Rosa lhe disse: meu pai estou de acordo, sim porque nasci para Armando e Armando nasceu para mim e digo logo ao senhor que nosso amor não tem fim
Tiago disse consigo: a cousa está enrascada e se eu for muito ativo afundarei a jangada!… então respondeu-lhe rindo: breve estarás casada
Combinou com sua esposa com muita sagacidade um jeito para acabar aquela grande amizade mas queria fazer isto sem demonstrar má vontade
Mandou convidar Armando na tarde do mesmo dia e disse em vista dos dois que o casamento faria só com um ano depois pois era quando podia
Logo Armando concordou Rosa concordou também Tiago disse consigo: este acordo me convém tenho tempo pra lutar e espero sair-me bem
Com 2 meses depois disso ele falou pra comprar o sítio de Constantino para Armando se mudar se fazendo muito calmo pra ninguém desconfiar
Então o pai de Armando o Constantino Amaral concordou vender o sítio depois com o capital buscar se estabelecer com uma loja em Natal
Lhe disse Armando: meu pai se me tiver como amigo deixe de vender o sítio pois como homem lhe digo só sairei desta terra levando Rosa comigo
– Depois do meu casamento meu pai poderá vender seu sítio, pois dessa vez não terei o que dizer mas agora fará isso se não quiser me atender
Amaral lhe respondeu: meu filho estás atendido pois inda com sacrifício eu te atendia o pedido quanto mais que nosso sítio ainda não está vendido
Tiago Agostinho vendo que não podia comprar o sítio de Constantino para Armando se ausentar procurou por outra forma o casamento acabar
Chamou Armando e disse: Armando, o teu casamento não quero mais demorá-lo vamos dar nosso andamento e pra poupar-te as despesas um negócio te apresento
– Eu tenho uns cortes de panos arrematados num leilão e queria que tu fosses vende-los lá no sertão com o lucro tu farás toda tua arrumação
Armando logo aceitou o negócio esclarecido dizendo então que ficava a Tiago agradecido e com três dias partiu de fazenda bem sortido
Tiago tinha dois filhos sendo casado o primeiro residiam em Mamanguape então o filho solteiro numa loja do irmão servia como caixeiro
Assim que Armando partiu Tiago Agostinho então escreveu para seus filhos com a maior precaução dizendo que um viesse executar a traição
Com quatro dias, a noite chegou o filho solteiro pronto para executar o plano de traiçoeiro Tiago antes da carta interrogou-o primeiro
Pois perguntou ao filho: o que tu andas fazendo estas horas por aqui? parece que vens correndo? disse o filho: é sua nora que deixei quase morrendo
– Meu irmão foi quem mandou eu vir lhe participar o estado da mulher, para o senhor lhe mandar a nossa irmã Rosinha pra da cunhada tratar
– Com uma grande agonia ontem quase ela tem fim disse o doutor: ela morre se chegar ter outra assim; e meu irmão não confia seu trato a gente ruim
– Então fretei uma barca por desmedido valor a qual se acha no porto esperando quando eu for e quero levar Rosinha veja o que diz o senhor
Tiago lhe respondeu: em mando que Rosa vá e fico com muita pena de não ir com vocês, já porém depois de amanhã talvez eu chegue por lá
– Mas mando logo uma carta por vocês neste momento onde meu filho verá que fico em grande tormento por saber que minha nora está nesse sofrimento
Quando a carta estava feita Rosa estava preparada e acompanhada do mano partiu em marcha apressada pretendendo tomar a barca As quatro da madrugada
Assim que os dois embarcaram o remador que sabia remou para Mamanguape com prazer e alegria aonde chegaram em paz na manhã do outro dia
Quando no ponto saltaram Rosa com o irmão dela encontraram dois cavalos um pro mano e outro pra ela e um para o bagageiro com cangalha e não com sela
O irmão montando Rosa ela disse: eu entendia que do porto a Mamanguape meia légua não seria! Lhe disse o irmão: é longe… e montou sem mais profia
A cavalo em Mamanguape chegaram ligeiramente disse o irmão para Rosa: isso aqui é S. Vivente o bagageiro afirmou e logo tomou a frente
Da cidade de Mamanguape Rosa nada conhecia e por isso acreditou no que o irmão lhe dizia e açoitando o cavalo caminhou com alegria
As dez horas se serviram de doce com queijo e vinho e ao por do sol, o irmão à Rosa disse baixinho: Rosa, alviçaras, chegamos na casa de teu padrinho!
Rosa bastante espantada lhe respondeu: é mentira meu padrinho aqui não mora e se mora me admira eu ter vindo a Mamanguape e me achar em Guarabira
Mas logo no mesmo instante ouviu a voz do padrinho que dizia duma porta: viva! chegou meu sobrinho trazendo minha afilhada pra sossego de Agostinho!
Vou deixar Rosa um instante e dizer primeiramente quem era o padrinho dela e porque ficou contente para ninguém não dizer que não ficou bem ciente
Esse padrinho de Rosa era irmão do pai dela seu nome, Pedro Agostinho sua esposa Florisbela e foi um dos mais antigos que Guarabira viu nela
Então Tiago Agostinho combinou com seu irmão botar Rosa em sua casa por meio duma traição e para poder fazer mandou Armando ao sertão
Rosa que não conhecia de Guarabira o caminho deixou-se ir inocente para a casa do padrinho onde lhe veio a lembrança dum ardil mais que mesquinho
Por isso quando ela entrou na casa disse ao irmão que lhe quisesse explicar daquilo tudo a razão pois lhe estava parecendo um golpe de traição
Lhe disse o irmão: Rosinha vou te dizer a verdade é pra tu deixares aqui de Armando aquela amizade pois meu pai só deu-lhe o sim temendo uma falsidade
– Para que tu não fugisse meu pai deu a ele o sim porque se assim não fizesse a coisa estava ruim pois uma amizade grande é bem custoso ter fim
– Por isso ele ordenou-me eu te trazer inocente para aqui, porque aqui jamais encontrarás gente por quem tu possas mandar fazer a Armando ciente
Logo Rosa respondeu-lhe: porém meu pai bem podia quando Armando me pediu dizer-lhe que não queria porque um homem de bem odeia a hipocrisia
– Se eu soubesse que meu pai era assim tão fementido jamais deixaria Armando ter minha mão lhe pedido visto que aeu não era digna de te-lo como marido
– Para mim comete um crime a filha dum traiçoeiro que quer se fazer esposa dum honrado cavalheiro pois a honra é luz nas trevas a traição não tem luzeiro!
– Portanto, eu não deveria encher de amor um senhor filho de um pai honrado sendo o meu um traidor terei remorso por isto vergonha, susto e temor
– Ma se ainda ver Armando juro dizer-lhe a verdade que não serei dele esposa devido esta falsidade mas serei dele cativa se ele tiver-me amizade
Agora encerro este assunto porque preciso dizer o que foi que o pai de Rosa procurou logo fazer na hora que ela saiu antes do dia romper
Assim que Rosa saiu o pai pegou um vestido dos que ela em casa deixou e fê-lo em sangue embebido dum cabrito que sangrou lá num recanto escondido
Fazendo o vestido em tiras desceu um despenhadeiro até chegar num riacho aonde havia um banheiro então semeou as tiras ao poente do ribeiro
E com o resto do sangue do cabrito que sangrou ele encostado ao banheiro a maior porção jogou depois perto e mais longe outras porções derramou
As seis horas da manhã ele muito disfarçado fez uma grande balburdia gritando desesperado dizendo ao povo que Rosa um tigre havia pegado
Logo todos os vizinhos acudiram com presteza seguindo em busca do tigre com desmedida afoiteza porque a morte de Rosa os sinais davam certeza
Com bons cachorros de caça os homens da vizinhança na mata o dia passaram com sede de uma vingança e não encontrando indício voltaram sem esperança
Tiago Agostinho tinha um negro de confiança no mesmo dia de tarde chegou-lhe à sua lembrança de mandar o dito negro enganar a vizinhança
No outro dia de tarde o negro saiu dizendo: que tinha andado na mata e num lugar mais tremendo encontrou o corpo de Rosa porém num estado horrendo
Então Tiago Agostinho com as mãos cobrindo a face em presença dos vizinhos disse ao negro que voltasse ao lugar que estava o corpo e lá mesmo sepultasse
Uma sepultura falsa naquela mata esquisita e negro formou sozinho com precaução inaudita e no dia imediato houve ali grande visita
Logo Tiago e a esposa vestiram luto fechado e se espalhou a sinistra notícia, pra todo lado até que Armando sabendo voltou bastante vexado
Quando chegou foi à cova em visita fazer na cova deu-lhe um desmaio que andou perto de morrer passou depois oito dias sem quase nada comer
Com um mês não parecia coitado, ser ele Aramando pois não comia e passava noites inteiras vagando nas estradas sem destino tristonhamente chorando
E na pedra onde Rosa amor lhe havia jurado uma noite muito tarde ele na pedra ajoelhado derramou mais duma hora o seu pranto amargurado
Depois de ter pranteado tristonho balbuciou dizendo: neste lugar foi que Rosa a mim jurou seu amor, uma manhã mas coitada, se acabou!
– Portanto, o dever me ordena ir naquela mata escura e tirar os ossos dela de dentro da sepultura e em cima deles matar-me para cumprir minha jura
Armando ai como um louco para a mata caminhou chegando na cova de Rosa a terra fora jogou e ficou mais que surpreso já quando nada encontrou
Sem chorar refez a cova consigo mesmo a dizer: aqui existe um mistério e se Deus me favorecer haverei de desvendá-lo pois é este o meu dever
Noutro dia disse ao pai: meu pai me faça um pedido de vender seu sítio agora pois eu estou resolvido ir morar no Piaui visto Rosa ter morrido
Amaral foi a Tiago vendeu o sítio e saiu e Armando de Tiago tristonho se despediu figindo chorar por Rosa Tiago oculto sorriu
Armando no Piaui disse ao pai: meu pai, agora vou dizer-lhe um segredo que o senhor ignora olhe, Rosa não morreu o certo qu’ela está fora
– O pai em minha ausência preparou uma cilada pois cavei a cova dela dentro nõ encontrei nada Amaral sabendo disso teve uma raiva danada
Porém Armando lhe disse: meu pai, não tenha vexame pois Rosa aonde estiver talvez ainda me ame portanto, o senhor escreva uma carta àquele infame
– Essa carta irá tarjada lhe dizendo que morri com um mês e oito dias que cheguei no Piauí e ele acreditará sem mandar ninguém aqui
Como de fato, Amaral para Tiago escreveu uma carta onde mostrava ser sincero amigo seu narrando a morte de Armando como melhor entendeu
Oito meses já faziam que Rosa tinha saido e que Aramando se mudara ela não tinha sabido como também da cilada da onça haver lhe comido
Coitada, da terra dela ela não via um vivente empora que seu padrinho já estava bem ciente de tudo que se passou só ela estava inocente
Rosa então se comparava a uma prisioneira procurava ninguém vê-la e chorava a vida inteira numa sombra projetada por uma guabirabeira
Chorando dizia ela: oh! meu Deus, oh! pai clemente trazei conforto e consolo a uma pobre inocente que sem fazer mal a ninguém vive a sofrer cruelmente!
– Consenti Senhor, que 1 anjo produza um sonho a Armando que me veja assim tão triste constantemente chorando pra ele ficar sabendo que vivo nele pensando
Tiago tendo a certeza que Armando tinha morrido sorrindo disse à mulher: fui muito bem sucedido pois ganhei numa empresa que me julgava perdido
Foi a todos os vizinhos lhe dizendo a falsidade que tinha feito com Rosa devido aquela amizade pois sabia que Aramando morria na flor da idade
Logo mandou buscar Rosa que com seis dias chegou então foi quando ela soube de tudo que se passou depois da morte de Armando a carta o pai lhe entregou
Rosa quando viu a carta pôs-se a chorar sua sorte ela quando leu a carta deu-lhe um desmaio tão forte que passou quase uma hora sob o domínio da morte
Mas depois que melhorou disse ao pai bastante irada: meu pai, a morte de Armando fez-me uma desgraçada porém juro que não tarda eu também ser sepultada
– O Senhor foi o culpado desta desgraça fatal com mentiras criminosas fez Constantino Amaral vender seu sítio e sair fazendo a Armando esse mal!
– Mas juro, enquanto for viva viver coberta de luto pois a lembrança de Armando tem no meu peito um reduto juro não partir com outro meu amor absoluto!
Rosa depois desse dia tomada pelo desgosto uma mortal palidez apareceu no seu rosto e de Santa Madalena fez-se o modelo composto
Vendo os seus pais o desgosto começaram a ter receios então para distraí-la empregavam muitos meios até mesmo ordenando que ela fizesse passeios
Mas Rosa não pesseava se comprazia em chorar vivendo sempre num quarto sem querer se alimentar a bem da alma de Armando levava a vida a rezar
Armando no Piauí sonhou chegar-lhe um rapaz que tinha a vestes douradas cabelos louros pra traz e para fitar-lhe o rosto ninguém seria capaz
Armando lhe perguntava: quem és tu? Donde vieste? o rapaz lhe disse: eu sou um mensageiro celeste mas venho daquela pedra onde uma jura fizeste
– Como eu fui testemunha daquela grande amizade que juraste a uma jovem como doze anos de idade venho então da parte dela te dizer uma verdade
– Essa moça por ti vive constantemente a chorar e és tu que deverás o pranto dela exugar se não um dia o seu pranto virá também te molhar
Armando nisso acordou aflito e muito suado parecendo ainda ouvir uma voz dizendo ao lado é necessário que cumpras o que por ti foi jurado!
Armando disse chorando: que coisa misteriosa! pois bem, embora eu caia numa falta criminosa farei Tiago dizer onde foi que botou Rosa
E sem demora embarcou pro Rio Grande do Norte destinado a encontrar Rosa e toma-la por consorte disposto a morrer lutando a favor de sua sorte
Trouxe consigo um caboclo homem sério e destemindo então contou-lhe na viagem o que tinha acontecido e o amor dele por Rosa de quando havia nascido
Tiago buscou fazer na noite de S. João um briquedo em sua casa com grande reunião para ver se Rosa achava naquilo uma distração
Saltou Armando em Natal nessa noite de S. João e sobre a vida de Rosa teve exata informação então projetou fazer a Tiago uma traição
Às onze horas da noite quando Tiago Agostinho servia seus convidados algumas taças de vinho viram dois vultos passar ao poente do caminho
Não precisa que eu diga que um vulto era Armando e o outro era o caboclo que vinha lhe acompanhando e para se disfarçarem caminhavam conversando
Armando logo avistou sua amante idolatrada muito magra e diferente sem companheira, sentada num banco em frente a fogueira de luto desconsolada
Vendo Armando o seu estado tão tristonha a meditar sentiu tanta comoção que começou a chorar quis parar, mas o caboclo mandou ele caminhar
Armando exugou os olhos lhe veio então a lembrança ir na pedra onde Rosa ainda muito em criança jurou de fugir com ele com uma voz firme e mansa
Chegando Armando na pedra depois de bem refletir ensinou ao caboclo como ele podia ir levar um recado a Rosa sem ninguém lá pressentir
O caboclo disse a ele: pode ficar descansado que eu já estudei um plano para lhe dar o recado e tenho toda certeza que vai dar bom resultado
E sem demora seguiu e logo chegou contente no terreiro de Tiago chamando o povo parente se aproximou de Rosa e lhe pediu aguardente
Quando bebeu aguardente se aproximou da fogueira dizendo então que cantava cantigas de capoeira o povo então fez com ele animada brincadeira
Por fim o povo pediu para o caboclo cantar o caboclo bebeu mais e depois de se sentar com esta estrofe seguinte entendeu de começar
– Eu venho de muito longe do pé duma grande serra acompanhado de alguém mas não venho fazer guerra vim dizer a Melancia Coco-Verde está na terra
Rosa ouvindo essa conversa teve um susto de tremer e conheceu que o caboclo procurava lhe dizer um segredo que só ela era capaz de saber
O caboclo conhecendo que Rosa tinha ficado como que sobre-saltada olhando para o seu lado resolveu a se calar para ver o resultado
Mas logo Rosa lhe disse: seu peito não é ruim portanto cante de novo faça esse pedido a mim o caboclo fitou ela e seguiu dizendo assim:
– Eu não tenho o que cantar e outra que estou vexado pois cheguei agora mesmo inda não estou descansado só vim dar de Coco-Verde a Melancia um recado
– Se não fosse grande amigo de alguém que ficou chorando não me atrevia trazer o recado que estou dando Melancia, Coco-Verde está na pedra esperando
Rosa fitando o caboclo levantou-se sem demora dizendo que ia dormir o quarto fechou por fora e para o lado da pedra caminhou na mesma hora
Chegando perto da pedra avistou um vulto junto disse Rosa ao vulto: responde o que te pergunto se és anjo ou fantasma se és vivo ou defunto?
O vulto lhe respondeu: não tenha medo, querida que sou Armando Amaral a quem julgavas sem vida venho plantar em teu peito uma esperança perdida
Gritou Rosa: meu Armando me escuta por caridade eu te tinha como morto meu Deus, que felicidade! Jesus teve dó de mim e descobriu-me a verdade
Logo Armando abraçou-a louco de amor e chorando Rosa sem poder falar deu-lhe um beijo soluçando quando viram o caboclo vinha apressado chegando
Dando o braço Armando a Rosa lhe disse: vamos querida confia no meu critério pois tu és a minha vida Rosa só fez responder-lhe: por Deus fui favorecida
Na mesma noite em Natal saltaram em uma casa sob a proteção dum vento soprando de popa à proa até chegarem em Macau fizeram viagem boa
Saltando Armando em Macau deu ligeiro andamento a se esposar com Rosa cumprindo seu juramento e o padre da freguezia celebrou o casamento
E escreveu a Tiago uma carta que dizia: “senhor Tiago Agostinho me desculpe a ousadia de eu carregar sua filha para minha companhia”
“Eu sou Armando Amaral a quem o senhor julgava estar morto para sempre como a carta lhe afirmava aquilo foi para eu ver se Rosa ressuscitava
Abrindo a cova da mata descobri sua traição porém gurdei o segredo até nesta ocasião porque já tenho a certeza que não perdi a questão”
Vinte dias já faziam que Rosa tinha saido então ninguém não sabia pra onde ela tinha ido pelo qual já se julgava que ela tinha morrido
Em busca dela Tiago andava constantemente mas para dar-lhe notícia não encontrava um vivente quando recebeu a carta ficou de tudo ciente
Tiago muito zangado pensando disse consigo: é muito exato o adágio usado no tempo antigo “o amor quando é sincero zomba do seu inimigo”
Então a felicidade veio em socorro de Armando enricou sem proteção só com Rosa lhe ajudando e Tiago arrependido lhe pediu perdão chorando
Viveu Armando com Rosa na mais perfeita harmonia brincando Armando chamava a ela de Melancia e ela a ele Coco-Verde mais a amizade crescia!
Já demonstrei nesta história O amor o quanto é: Só o amante sem fé Esmorece sem vitória! Conservem pois na memória A opinião de Armando: Mostrou seu amor lutando E conseguiu triunfar Luto só fez assombrar O namorado nefando!
Literatura de Cordel quarta, 01 de agosto de 2018
O CASAMENTO DO CABEÇA DE CUIA COM A NUM-SE-PODE (FOLHETO DE PEDRO COSTA)
O CASAMENTO DO CABEÇA DE CUIA COM A NUM-SE-PODE
Pedro Costa
Essa história aconteceu
Em uma época passada
Quando Teresina ainda
Não era tão habitada
O povo só acredita
Porque ela é bem contada
Crispim, Cabeça-de-Cuia
Um sofrido pescador
Matou a mãe, virou monstro
Ficou fazendo terror
De rio abaixo e arriba
Sem conhecer o amor
A história de uma moça
Que viveu na solidão
Aparecia nas ruas
Em noite de escuridão
Deixou muitos cabras frouxos
Com suas calças na mão
A Num-se-Pode existiu
Há muitos anos atrás
Nas ruas de Teresina
Assombrou muito rapaz
Porém desapareceu
Não foi vista nunca mais
E o Cabeça-de-Cuia
Foi cumprir a sua sina
Nunca encontrou as Marias
Sofreu, viveu na ruína
Tornou-se lenda folclórica
Popular de Teresina
Porém o tempo passou
Teresina evoluiu
Os esgotos aumentaram
O rio então poluiu
E o Cabeça-de-Cuia
Das águas podres saiu
A Num-se-Pode que era
Vista na escuridão
Quando a luz de Teresina
Era só lampião
Também ela apareceu
Numa noite de Apagão
Foi no bairro Porenquanto
Numa noite em Teresina
Ela e o Cabeça-de-Cuia
Se encontraram em uma esquina
Foi um encontro fatal
Pra os dois mudarem de sina
Ele que há muitos anos
Viveu atrás de donzela
Ela que muitos rapazes
Correram com medo dela
Os dois disseram, amor
Vamos sair da banguela
A Num-se-Pode gritou
Êita que macho gostoso
Esse cabeça de cuia
É feio mas é charmoso
Responda amor, me responda
Você quer ser meu esposo?
Disse o Cabeça-de-Cuia
– Esse é o meu pensamento
Pedir ao Padre Quevedo
Pra fazer o casamento
Só ele tem o enigma
De acabar o encantamento
Acertaram logo a data
Para a tal celebração
Local: Encontro dos rios
Numa noite de Apagão
Na lista dos convidados
Veja só a relação
Veio Zabelê com Metara
Barba ruiva, pobre Jó
Até Saci Pererê
A Velha d’um Peito Só
O Pé-de-Garrafa montado
No cavalo Piancó
Chegou o Padre Quevedo
Numa Mula-sem-Cabeça
Vestindo uma bata preta
Dizendo não me aborreça
Que o enigma dos encantos
Na minha frente apareça
Veio de Sete Cidades
Aquela gente encantada
Iurupari, feiticeiro
Com a Indira apaixonada
A Tartaruga Gigante
Chegou numa disparada
O índio Mandaú veio
Para a festa, convidado
Porca do Dente de Ouro
Foi transformada em guisado
Seu dente virou aliança
Pra o noivo ser coroado
Num traje típico de noiva
Se trajou a Num-se-Pode
Tinha o Cabeça-de-Cuia
Já preparado o pagode
Dizia o padre Quevedo:
Nessa vida tudo pode
Zabelê era o padrinho
E Metara era a madrinha
Saci era a testemunha
A noiva estava na linha
Dizia o Cabeça-de-Cuia
Num-se-Pode agora é minha!
Tudo pronto pra o casório
Com os noivos no altar
Entraram Sete Marias
Buchudas pra descansar
Falou o Cabeça-de-Cuia:
Essa agora é de lascar
Padre Quevedo falou:
– Não é coisa verdadeira
Foram feitas essas estátuas
Pelo Nonato Oliveira
Os enigmas lhe deram vidas
Mas é uma brincadeira
Calma senhorita noiva
Que seu noivo é muito sério
E não existe segredo
Que eu não desvende o mistério
Que os encantos da noite
Cheguem com seu ministério
Cabeça-de-Cuia, o noivo
Ficou meio desmiolado
A Num-se-Pode assustada
Todo mundo arrepiado
E os convidados dizendo:
– Ô casório demorado
Falou o Padre Quevedo
Com a sua sapiência
– Que os encantos dos enigmas
Os mistérios da ciência
Unam esses dois pra sempre
Com toda benevolência
Terminado o casamento
O forró já começou
A Maria da Inglaterra
Cantando “O Peru Rodou”
E foi servido o jantar
Que todo mundo gostou
Carneiro, bode, leitão
Guiné, galinha, buchada,
Canjica, quibebe-mole
Mungunzá e abobrada
Chá-de-burro, angu de milho,
Mão-de-vaca e panelada
Farofa, carne-pisada
Peixe frito e cozidão
Vatapá, queijo, coalhada
Arroz-doce e requeijão
Sarapatel escaldado
Maxixada com feijão
Tinha Maria-isabel
Baião-de-dois com pequi
Carne-de-sol com cuscuz
Tripa assada, buriti
Enfim, as comidas típicas
Do Estado do Piauí
Muitos doces e salgados
Tinham com variedade
Alfenim e quebra-queixo
Manuê e caridade
Broa, suspiro, pamonha
Tudo em melhor qualidade
Quem preparou o cardápio
Foi Maria Tijubina
Teve bastante bebidas
E não faltou cajuína
Foi o maior casamento
Que já houve em Teresina
A festa só terminou
Quando o dia amanheceu
Foram embora os convidados
O sol também se acendeu
E eu que estava presente
Narrei o que aconteceu
Vi dizer que a Num-se-Pode
Tá esperando um filhinho
Que é o do Cabeça-de-Cuia
Feito com muito carinho
E já andam na cidade
À procura de um padrinho.
Literatura de Cordel quarta, 25 de julho de 2018
A LENDA DO CABEÇA DE CUIA (CORDEL DE PEDRO COSTA)
I.
O povo que não acredita
Em história de pescador,
De vaqueiro e cachaceiro,
De poeta cantador.
Motorista e seringueiro,
Marinheiro e caçador.
Dizem que toda mentira
Deturpa sempre a verdade,
Por menos que ela seja
Dita na sociedade,
Contada por muita gente,
Se torna realidade.
Uma história de verdade
Contada de uma maneira
Deturpada, duvidosa,
Como fosse brincadeira,
Por mais que seja real,
Nunca será verdadeira.
Existe história lendária
Que virou verdade pura,
Com o tempo ganhou fama
Com personagem e figura
Inserida no folclore,
Enriquecendo a cultura.
II.
Entre todas criaturas
Sempre o homem é o mais forte,
Enfrenta feras nas selvas,
Escapa no fio da sorte.
Tem o instinto voraz.
Só quem o vence é a morte
O homem tem enfrentado
Perigos no alto-mar,
Nos espaços siderais,
Monta usina nuclear,
Não domina o universo
Porque Deus não vai deixar.
Existe homem no mundo
Que desconhece o amor
E contra pais e irmãos
As palavras do Senhor.
Xinga Terra, Sol e astros
As coisas do Criador.
Muitos anos atrás
Existiu no Piauí
Um pescador que pescava
No Parnaíba e Poty.
A sombra da maldição
Estava perto de si.
III.
O seu nome era Crispim,
Cresceu sem religião,
Sem pai pra lhe dar conselho,
Sem amigo e sem irmão,
Sua mãe muito velhinha,
Sem mágoa no coração,
Acontece que Crispim
Não aprendeu a trabalhar.
Para sustentar a mãe,
Ele tinha que pescar.
Quando não pescava nada,
Danava a esbravejar.
Devido à necessidade,
Ele só vivia aflito,
Ameaçava sua mãe,
Dava soco, dava grito,
Agredia todo mundo,
Chamava o rio maldito.
Sua mãezinha chorava,
Muito tristonha e velhinha,
Sem esperança de vida,
Em sua pobre casinha,
O sofrimento do filho,
Com a pobreza que tinha.
IV.
Vendo o filho em desespero,
A mãe se compadecia.
Assim vivia Crispim,
Sem ter sorte em pescaria,
Xingava até sua sombra
E a roupa que vestia.
Um certo dia Crispim
Voltou pra casa zangado.
Não tinha pescado nada,
Crispim ficou irritado.
Xingando os rios e os peixes,
Tudo que tinha ao seu lado.
A mãe lhe disse: “Filhinho,
Não pense mais em mazela,
Coma um pirão com uma ossada
Que tem naquela panela”.
Crispim pega um corredor,
Bateu na cabeça dela.
A pancada foi tão grande,
Levou a velha ao chão.
A mãe antes de morrer
Jogou-lhe uma maldição:
“Serás transformado em monstro,
Num ente sem coração”.
V.
“Filho maldito e ingrato,
Tu foste muito ruim.
Matar tua genitora,
Te amaldiçoo, Crispim.
Serás um monstro maldito,
Triste será teu fim.
Nas águas desses dois rios,
Tu vais ficar a vagar.
Serás um monstro assombroso,
Até você devorar
As sete Marias virgens,
Mas nunca irás encontrar.”
Os anjos disseram amém
Na hora em que a mãe falou.
Sua madrinha não ouviu,
Jesus no céu escutou.
E de repente Crispim
No monstro se transformou.
Ficou todo transformado,
Com a cara muito feia.
A cabeça cresceu tanto,
Que dava uma arroba e meia.
Caiu nos rios e aparece
Em noite de lua cheia.
VI.
A velha foi sepultada
Como se fosse uma indigente.
Não ficou nem um registro,
Não apareceu parente.
E Crispim ainda vive
Querendo voltar a ser gente.
Até mesmo os pescadores
Nele não querem falar.
Quando falam sentem medo,
Passam noites sem pescar.
Todos temem a qualquer hora
Com Crispim se encontrar.
Cabeça de Cuia vive
Cumprindo sua trajetória.
Uma velha diz que viu,
Porém perdeu a memória,
Se assombra, fica louca
Quando escuta essa história
Todo final de semana,
Sempre, sempre é registrado
Nas águas desses dois rios
Alguém morrer afogado,
Deixando cada vez mais
Banhista desesperado.
VII.
Crispim Cabeça de Cuia
Vive ainda à procura
Das sete Marias virgens,
Cumprindo sua desventura
Rio abaixo e rio arriba,
Em noite clara ou escura.
Passaram séculos e séculos,
A história permanece.
Dizem quando os rios enchem,
Na correnteza ele desce,
Dando gargalhadas estranhas
Toda vez que aparece.
Ele vaga pelas águas
Do Parnaíba e Poty
E no encontro dos rios
Tem sua estátua ali
Descrevendo esta lenda
Folclórica do Piauí.
Literatura de Cordel quarta, 18 de julho de 2018
LABAREDA – O CAPADOR DE COVARDES (FOLHETO DE GONÇALO FERREIRA DA SILVA)
LABAREDA – O CAPADOR DE COVARDES
Gonçalo Ferreira da Silva
Como criação divina
a vida fosse entendida
representaria a morte
simples porta de saída
para conduzir o homem
à plenitude da vida.
Os audazes bandoleiros
do cangaço no sertão
não davam valor à vida
desprovidos de noção
do que ela representa
para o Pai da Criação.
Numa das reuniões
que sempre fazia às tardes
Lampião chamou um cabra
e lhe falou sem alardes:
– Tu serás o Labareda
o capador de covardes.
Os componentes do grupo
do famoso Lampião
tinham seus nomes-de-guerra
e muitos tinham função
embora não fosse regra
também não era exceção.
Coube ao negro Zé Baiano
o cruel ferro abrasante,
Mariano, a palmatória
para o sujeito arrogante,
a peixeira, a Labareda
para capar delatante.
Porém a Virgínio coube
a responsabilidade
de julgar caso por caso
e conforme a gravidade
o errado recebia
a dura penalidade.
Cunhado de Lampião
Virgínio era igual um mano
ditava suas sentenças,
mas provou que era humano
ao perdoar Bentevi
quando traiu Zé Baiano.
Emílio Ferreira, um
dos padres mais importantes
aconselhou Labareda
a capar os semelhantes
porém deixá-los com vida
por mais que fossem arrogantes.
Realmente Labareda
não tinha instinto malvado
principalmente porque
nunca capava zangado
desempenhava o trabalho
como quem cumpre um mandado.
Mas um dia caparia
com ódio no coração
por vingança e por dever
porque numa ocasião
sofreu de um miserável
uma dura traição.
Lampião ao sequestrar
o filho de um fazendeiro
mandou Labareda para
trazer de volta o dinheiro
em troca da liberdade
do jovem prisioneiro.
Labareda foi cumprir
a ordem do capitão
porém teve, infelizmente,
interrompida a missão
quando já tinha o dinheiro
escondido no gibão.
No momento em que o recado
do chefe era transmitido
um cabra do fazendeiro
se encontrava escondido
assim, sigilosamente,
foi Labareda seguido.
Pois todos os pormenores
o cabra do fazendeiro
ouvia, até a quantia
que ganharia em dinheiro
se pregasse uma surpresa
eficaz no cangaceiro.
Quando Labareda tinha
o dinheiro empacotado
juntamente com um recibo
devidamente assinado
saiu sem notar que era
por alguém observado.
Para sair da fazenda
na direção do sertão
tinha uma vereda orlada
de densa vegetação
ao longo da qual não tinha
vestígio de habitação.
Com a rapidez felina
do gato maracajá
o cabra do fazendeiro
subiu num pé de Ingá
envolto em muitas espessas
ramas de maracujá.
Providencia paulada
quando Labareda ia
passando sob o Ingá
na fronte dela caía
desmaiando até sem tempo
de ver o que acontecia.
No mundo escuro dos sonhos
Labareda mergulhou
ele mesmo nunca soube
qual o tempo que durou
desde a hora em que caiu
até quando despertou.
Recobrando a consciência
verificou abismado
que o pacote de notas
havia sido roubado
restava só o recibo
no seu bolso colocado.
Lampião ainda estava
com o grupo reunido
estranhando com razão
o tempo já transcorrido
achando que Labareda
tinha desaparecido.
Fitando o refém com ódio
Lampião foi taxativo:
– Se Labareda morrer
ou mesmo ficar cativo
toco fogo na fazenda
e depois lhe queimo vivo.
Lampião mandou dois cabras
que fizeram o fazendeiro
dizer o nome do homem,
o possível paradeiro
para obrigá-lo, com a força
a devolver o dinheiro.
Num belo dia em que o Sol
para o poente caía
num povoado distante
o dito homem bebia
cana, sem saber que aquele
era o seu mais negro dia.
O grupo do Lampião
com um refém da fazenda
invadiu o povoado
e ao penetrar na venda
Lampião, frio e sinistro
disse: – Sujeito, se renda.
– Cadê aquele dinheiro
roubado lá na vereda
empacotado e atado
com nós num pano de seda?
Já sabe o que quer dizer
prestar conta a Labareda?
Com dignidade o homem
disse: – Sei que estou marcado..
pelo que ouvi falar
já sei que vou ser capado
mas não vou tremer diante
dum bandoleiro safado.
Tais palavras foram ditas
com tanta convicção,
com tanto furor selvagem,
com tão voraz decisão
que houve um silêncio tenso
no grupo do Lampião.
Foi o capador do bando
quem o silêncio rompeu:
– Vou resolver este assunto
pois este homem é meu
e se alguém morrer em luta
terá que ser ele ou eu.
Só se viu quando um machado
sinistro riscou o ar
sem que o opositor
pudesse se desviar
o homem caiu roncando
no piso sujo do bar.
Uma peixeira afiada
surgiu repentinamente
nos dedos de Labareda
que o capou prontamente
mostrando os ovos do homem
para a multidão presente.
Foi este mais um capítulo
de maldade e tirania
da história do nordeste
para ser contado um dia
que acaso for abordado
assunto de valentia.
Literatura de Cordel quarta, 11 de julho de 2018
ALEXANDRE DE GUSMÃO (FOLHETO DE CRISPINIANO NETO)
ALEXANDRE DE GUSMÃO
Fundação Alexandre de Gusmão
01
Musa divina que inspira
Poetas do mundo inteiro,
Traz-me os fluidos do Parnaso
E o saber mais verdadeiro
Pra que eu decante à nação,
Alexandre de Gusmão,
Um grande herói brasileiro!
02
Mas não se trata de herói
De músculos, de espada e aço,
Nem dos quadrinhos que trazem
Superpoderes do espaço;
Não é filho de deus grego,
Caubói, nem homem-morcego,
Nem valentão do cangaço!
03
Mas como chamar de herói,
Que não brigou nem matou?
Quem não se impôs pela espada,
Quem canhão não disparou,
Quem a lança não brandiu,
Quem bombas nunca explodiu,
Quem País nunca atacou?
04
Tenha calma, meu leitor,
Vou lhe explicar, não se zangue,
A história desse herói,
Sem guerra, sem bangue-bangue.
Sem flecha, espada ou fuzil,
Que fez crescer o Brasil
Sem jamais derramar sangue!
05
Esse nome de Alexandre
Ele herdou do seu padrinho,
Um padre que lhe ensinou
Da justiça o bom caminho.
E o sobrenome Gusmão
Vem também do capelão
Como a Bíblia, a hóstia e o vinho.
06
Trouxe o destino de outro
Alexandre do passado,
O guerreiro macedônio,
De ser grande e preparado...
Só que o guerreiro iracundo
Que conquistou meio mundo
Fez com sangue derramado.
07
Alexandre de Gusmão
Nasceu no Porto de Santos
Em “Um, meia, nove, cinco”
Numa família de tantos
Irmãos e irmãs queridas;
Até então, oito vidas
Dadas às rezas e aos mantos.
08
Filho de Maria Álvares;
E Lourenço, cirurgião;
Dos doze filhos nascidos
Têm destaque, ele e o irmão,
Religioso e inventor,
Nosso “Padre-voador”
Bartolomeu de Gusmão!
09
Inventor do aeróstato,
Foi este padre exemplar
Que provou perante o rei
Que era possível voar;
Ao ver uma bolha quente
Fez um balão ascendente
Por ser mais leve que o ar!
10
Pois Bartolomeu levou
Alexandre pra Bahia,
No Colégio de Belém
Demonstrou sabedoria;
Foi pra o Colégio das Artes
Por ser de todas as partes
O melhor que existia!
11
Dali saiu preparado
Diplomado, competente,
Em Latim, Retórica e Ética,
E em Lógica, logicamente,
Em Metafísica, versado
E o título considerado
De “Filósofo excelente”.
12
Mil setecentos e dez
Com quinze anos de idade
O padre reconhecendo
Sua genialidade
Mandou-o pra Portugal,
Foi pra Corte Imperial
Fazer universidade.
4
13
Matriculou-se em Coimbra
Mostrando grande valor.
Ali estudou, formou-se,
Ganhou grau superior.
Com seu saber cientista
Se tornou iluminista
Ganhando anel de doutor.
14
Dali seguiu pra Paris.
Estudar mais era o plano;
Secretário da Embaixada
Logo assumiu sem engano...
Fez em Sorbonne, fantástico,
O Direito Eclesiástico,
O Civil e o Romano.
15
Na passagem pela Espanha,
Em Madrid passou semanas
Vendo o Tratado de Utrecht
Com falhas meridianas
E o limite natural
Entre Espanha e Portugal
Nas terras americanas.
16
Foi em Paris que Gusmão
Aprofundou seu saber
Na Ciência da Política
Mergulhou pra conhecer
Seu sentimento profundo
E o jogo eterno do mundo
Dos mistérios do poder!
17
Lá na Paris do Rei Sol
A nova luz se acendia
Na mente do brasileiro
Que trocou Teologia
Pela Razão e a Crítica,
Iluminismo e Política,
Direito e Diplomacia!
18
Desistiu do sacerdócio
Inquisidor antiquado.
Notou que o clericalismo
Da fogueira, era apagado;
E ao ler estratégia e tática
Conheceu a essência prática
Das duras razões de Estado.
19
E em 19 voltou
A residir em Lisboa.
O Rei Dom João acolheu-o
Como querida pessoa;
O nomeou secretário
E plenipotenciário
Pra defender a Coroa!
20
No ano 20 cumpriu
Missão muito especial
Negociando em Cambray,
Em plena França real;
Foi um bravo sem bravata
Que se sagrou diplomata
De nível internacional!
21
Bacharelou-se em Direito,
Tornou-se Doutor em Leis,
Foi destacado pra Roma
No ano de 23
Pra junto às cortes papais
Recuperar o cartaz
Do monarca português!
22
Até o ano de trinta
Atuou no Vaticano
Fazendo grandes acordos
Pra o bem do seu soberano,
Ganhou, por ser habilíssimo,
O título de “Fidelíssimo”
Pra o Monarca lusitano!
23
Com o título Dom João V
Compunha o trio de escol;
Pois o título equivalia
A “Rei Católico” espanhol
E o título invejadíssimo
Que era “Rei Cristianíssimo”
Da França, o próprio Rei Sol.
24
Sete anos e três papas
O viram nesta missão
De defender junto a Roma,
Sua querida nação.
Muitos litígios zerou,
E, de quebra, conquistou,
Dos papas o coração!
25
Benedito XIII, o Papa,
Chamou-lhe no Vaticano
Chegou a lhe oferecer
O título “Príncipe Romano”
Ele não quis aceitar
Só pra não contrariar
A Dom João, seu soberano!
26
No ano de 29
A Lisboa regressou
Logo Dom João pra o Brasil
Alexandre despachou
E a nossa realidade
Com muita profundidade
Gusmão de perto estudou.
27
Dois anos passou conosco,
Retornou a Portugal,
Lá transformou-se em Fidalgo
Da Nobre Casa Real;
Como Ciências, sabia,
Entrou para a Academia
Provando ser genial.
28
E logo foi nomeado
Pela própria Majestade,
Num cargo bem próximo ao Rei,
“Escrivão da Puridade”,
E por ter visão moderna
Cuidou da política externa
Com brio e capacidade!
29
Transformou-se em Conselheiro
Mostrando cultura e tino,
Escreveu livro de História
No idioma latino
E por ser hábil e ser sério
Assumiu um Ministério
No Conselho Ultramarino.
30
O cuidado com o Brasil
Foi um dos encargos seus;
Das relações com o Papa
Cuidava em nome de Deus
E cuidou mais, com denodos,
De ter relações com todos
Os países europeus.
31
No Conselho Ultramarino
Encontrou a solução
Pra poder qualificar
Nossa colonização
Trazendo família inteira
Dos Açores e Madeira,
Mas, sem escravização!
32
Trouxe quatro mil casais
Para a região sulina
Rio Grande e Paraná
Também Santa Catarina.
Cada família, uma área...
O que é reforma agrária,
É Gusmão quem nos ensina.
33
Recomendava a quem vinha
Para o Brasil trabalhar:
Estude rios e minas,
Flora, fauna, céus e mar,
O clima, a arte, a vertente
E os costumes dessa gente
Comer, vestir e rezar.
34
Dedicou-se a estudar
As produções cartográficas,
Missões, Entradas, Bandeiras,
As bacias hidrográficas,
Relevo, edificações...
Geopolítica por razões
Históricas e geográficas.
35
Concluiu que os países
Não podem ter suas áreas
Divididas ao sabor
De linhas imaginárias;
Que têm sempre as desvantagens
De deixar milhões de margens
Para interpretações várias.
36
Sua visão panorâmica
E a mente prodigiosa,
O seu saber filosófico,
Sua ação habilidosa
Deram-lhe mais competência
Para a área da Ciência,
Política e religiosa!
37
Foi quem criou três bispados
Pará, São Paulo e Gerais.
Criou mais as prelazias
De Cuiabá e Goiás
E como pensava em tudo
Fez o mais profundo estudo
Das questões industriais.
38
Naqueles tempos longínquos
Deixou um projeto exposto
Obrigando aos poderosos
A pagarem mais imposto
E rebaixando a quantia
Para o pobre que vivia
Do suor do próprio rosto!
39
E implantou o sistema
Chamado “capitação”
Pelo número de escravos
Que possuía o barão;
Fundiu o ouro e fez barras,
Pra ver se acabava as farras
De tanta sonegação.
40
Entre 29 e 30
No Brasil permanecia
Em São Paulo, Minas, Rio
Atuou com maestria
Em tudo que o rei mandou
E de quebra, inda aceitou,
Ensinar Filosofia.
41
Nesse período ele viu
Que as fronteiras da nação
Desenhada em Tordesilhas
Já não tinham mais razão
De usufruir validade
Pois, frente à realidade;
Era simples ficção!
42
Das Ilhas de cabo Verde
Trezentas, setenta léguas
Ninguém havia medido
E assim, sem metros e réguas
Bandeirantes desde cedo
Fora ocupando sem medo
Sem leis, limites ou tréguas.
43
Os espanhóis no Pacífico
Se entretiveram próximo ao mar,
Destruindo Incas e Maias
E a prata a desenterrar
Se esquecendo de um mundão,
Um profundo De-Sertão
Que tinha pra conquistar!
44
Neste “vazio” ficava
Pará, Rondônia, Amapá,
Catarina e Mato Grosso
Rio Grande e Paraná,
Amazonas, chão goiano...
Tudo... do Meridiano
De Tordesilhas pra lá!!!
45
Se a linha era imaginária,
Quem iria imaginar
Se ela ficava mais perto,
Se mais longe ia ficar...
E haja procurar tesouro,
Haja sonhar prata e ouro,
Haja índio escravizar!!!
46
E assim foram furando
Pântanos, matas, rios, serras;
Fazendo arraiais e vilas
Se apossando em novas terras
Chantando marcos e crivos
E oferecendo aos nativos
Vida escrava ou morte em guerras!
47
Era a espada cortando,
E a batina benzendo,
O arcabuz trovejando
E a aguardente fervendo,
Miçanga aos índios comprando,
O mato abrindo e fechando
E o nosso Brasil crescendo!
48
Matas cedendo ao machado,
À foice, ao Rabo-de-galo,
O chifre do boi tangido
Pelo casco do cavalo,
O “hinterland” se ampliando
E Tordesilhas ficando
Sem mais ninguém respeitá-lo!
49
Além de não existir
Marco e fiscalização
Durante umas oito décadas
Existiu a união
Entre Portugal e Espanha...
Cada qual comeu na manha
Milhões de léguas do “irmão”!
50
Enquanto aqui, portugueses,
Rasgavam matas a eito,
Cortavam serras e rios
Levando o Brasil no peito,
Na região asiática,
Espanha com a mesma prática
Agia do mesmo jeito!
51
Mas quando se separaram
As duas nações ibéricas,
As invasões prosseguiram
Fossem calmas, fossem histéricas
Espanha tomou chão luso
Na Ásia e sofreu abuso
De Portugal nas Américas!
52
Além disso, Sacramento,
Aonde a prata aflorava,
Portugal se achava dono
Mas por dono não se achava
Espanha entrou, não saía...
Quanto mais acordo havia
Mais acordo se quebrava.
53
Assim como portugueses
Em terras americanas
Comiam terras d’Espanha,
Na Ásia, mãos castelhanas
Com chumbo, espadas, botinas
Engoliam Filipinas,
Molucas e Marianas.
54
Quanto mais as ambições
No chão se concretizavam
Mais guerras se sucediam,
Mais ódios se destilavam,
Mais corações se partiam
Mais sangue as terras bebiam
Mais vidas se consumavam!
55
Foi quando se viu que a hora
Não era mais do leão
Que era a hora da raposa
Entrar no campo da ação
Trocando a dor da violência
Pela luz da inteligência;
O chumbo pela razão!!!
56
E então saíram da cena
Jagunços e generais;
Em vez de brutos guerreiros,
Finos intelectuais
Mapas em vez de canhões...
Em vez do tiro, as razões;
No lugar da guerra, a paz!
57
E aí brilhou Alexandre
Com mapas e argumentos...
A fala mansa e os estudos
No lugar dos armamentos,
A paciência que ensina
No lugar da adrenalina
Dos músculos sanguinolentos!
58
Defendeu que o limite
Fosse o rastro do colono,
Com base em rios e serras,
Não em linhas do abandono
Feitas de sonho e confetes...
Era o “Uti possidetis”
Quem ocupa e cuida, é dono.
59
Foi assim que em quatro anos
Agigantou-se a nação
Alexandre costurou
As bordas de um Brasilzão,
Do Oiapoque ao Chuí,
Até quase Potosí
Com jeitão de coração!
60
O arco de Tordesilhas
De cara, cresceu três vezes;
No Norte, no Sul, no Centro,
Com chão pra nobres, burgueses,
Pra índios, padres, reinóis,
Com a prata pra os espanhóis,
O ouro pra os portugueses!
61
Gusmão inda amarrou mais
Que a paz beijaria a terra,
Do Brasil, mesmo que as sedes
Dos reinos chegassem à guerra.
Venceu sem canhão nem bota
Com “quengo”, na maciota,
Que “o bom cabrito não berra”.
62
Pois este gênio, este herói,
Avô da diplomacia
Brasileira, que deu glórias
E terras à monarquia,
Que a Portugal deu poder
Que fez o Brasil crescer,
Foi vítima da tirania!
63
Quando Dom José cobriu-se
Com a coroa portuguesa
Marquês de Pombal cobriu
Gusmão com ódio e vileza
O fogo apagou-lhe os brilhos
Da esposa e de dois filhos
E ele morreu na pobreza
64
A História lhe roubou
As glórias que merecia
Por isto, eu faço justiça
Nesta humilde poesia
A ALEXANDRE GUSMÃO,
Gênio da paz, campeão
Da luz da diplomacia!
Literatura de Cordel quarta, 04 de julho de 2018
PELEJA DE PELÉ COM ROBERTO CARLOS (FOLHETO DE CÁRLISSON GALDINO)
PELEJA DE PELÉ COM ROBERTO CARLOS
Cárlisson Galdino
Meus amigos que acompanham
Esta rádio pela antena
Hoje temos dois gigantes
Duelando na arena
Rei do esporte e da cantiga
Atenção para essa briga
Ela não vai ser pequena
É o rei do futebol
Pelé, como é conhecido
Há muito aposentado
Um jogador bem vivido
Vindo aqui mostrar seu jeito
Está do lado direito
Pra provar que é mais sabido
No outro lado desta arena
Temos outro renomado
Disputando com Pelé
Para tentar derrotá-lo
De talento que agrada
É o rei da Jovem Guarda
É o rei Roberto Carlos
A disputa desses dois
Não será no futebol
Roberto jogar não pode
E o Pelé não joga só
A disputa desses dois
Será decidida, pois
Em repente sob o Sol
Pode parecer vantagem
Pro Roberto talvez seja
Pois ele é compositor
Mas Pelé vencer deseja
E é enfim chegada a hora
Vejam a arena agora
Que comece a peleja
Sou o Rei Roberto Carlos
Na disputa vou embora
Pelé não ganha de mim
Pois tenho uma longa história
Na música brasileira
Sou o Rei, não é brincadeira
Eu sou uma brasa, mora?
Quando eu estou aqui
Vivo um momento lindo
Muitos vêm torcer por mim
Todo mundo é bem-vindo
Vou ganhar, isso é normal
Pelé antes do final
Vai acabar desistindo
Você é o rei do futebol
O mais importante esporte
Mas nessa disputa hoje
Seu reinado pouco importe
Pois no canto e criação
O Pelé não tem vez não
Pois só no campo é forte
Nem sei porque falei tanto
Nem precisa tanto assim
Pois sou o rei da canção
A taça pertence a mim
Nem devia ter disputa
Mas se querem, a gente luta
Se você tá mesmo a fim
Já cantei de tanta coisa
Por protesto e por prazer
Por amor e por saudade
E o que tinha pra dizer
Hoje já está falado
Eu já falei um bocado
Fale um pouco de você
Roberto da Jovem Guarda
É o rei nesse reinado
Mas Pelé não é bagaço
Para ser ignorado
Além de ser jogador
Pelé já foi de cantor
Já teve disco gravado
Se você correu o mundo
Pelé já correu também
Sua voz viajou longe
Pelé foi mais longe além
E se há tanta gente boa
Sempre manteve a coroa
Nunca perdeu pra ninguém
O Pelé já foi ministro
Você nunca, que eu recorde
Se quiser ter uma chance
Deixa de moleza e acorde
E peleje de verdade
Pois todo mundo já sabe
Cão que ladra não me morde
O Pelé foi influência
Pra mais de uma geração
Muito mais do que ser rei
Foi a luz na escuridão
E num país em apuro
Foi uma luz no futuro
A esperança da nação
Por isso não se estufe
Não fale o que bem entende
Pois sei que o rei Roberto
Não é tudo o que ele vende
Nessa disputa acirrada
Não vai te sobrar é nada
Essa eu já ganhei, entende?
Meu caro Edson Arantes
Essa briga vai ser boa
Mas não fale do Pelé
Como fosse outra pessoa
Desse jeito colocado
Pareces um retardado
Isso bonito não soa
Roberto, fique na sua
Pois Pelé é o Pelé
Como falo não te importa
Falo como eu quiser
Sem força pra chegar junto
Fica mudando de assunto
Bom isso não é, entende?
Se você prefere assim
Não tenho nada com isso
Vamos à disputa logo
Tenho outro compromisso
Pois meu trabalho afinal
É intelectual
Não é força bruta, bicho
Roberto, você ofende
Todos falando assim
Pega mal ofender todos
Querendo ofender a mim
Futebol é uma arte
O físico é só uma parte
Que você nem tem por fim
Se for pra ganhar milhões
Correndo atrás de uma bola
Queria ter a outra perna
Perfeita, não como agora
Vocês no topo da escada
Por fazerem quase nada
Recebem milhões em dólar
Como se você fizesse
Esforço, cê não precisa
Ganha milhões em dinheiro
Sem nem suar a camisa
Faz um show de fim de ano
E a vida vai levando
Na água de coco e brisa
Se faço show todo ano
É que o povo me adora
E eu me esforço compondo
Fazendo show mundo afora
Quando eu não apareço
Tou na vida que “mereço”
É de ensaios toda hora
Pois assim é com a gente
Com quem vive de um esporte
Quando não está na TV
Treina pra ficar mais forte
Futebol é uma arte
Exigente em toda a parte
Férias tem só quem tem sorte
Essa arte de que falas
É discurso, é isso só
Molecada deixa a escola
Tantos que até tenho dó
Embora muita gente tente
Muitos viram é delinquente
No sonho do futebol
Não fale tanta besteira
Dessa arte que é tão bela
Futebol joga o rico
E o pobre da favela
Quero ver a arte que é sua
Tirar crianças da rua
Dando esperança a elas
Tudo bem, é uma arte
Futebol que você vende
Mas a disputa desviou
A disputa é entre a gente
E você não é problema
Pra não desviar do tema
Só quem é inteligente
Quem desviou foi você
Mas isso nem vem ao caso
Pois Pelé é inteligente
Não foi ministro ao acaso
E você, Roberto irmão
Cheio de superstição
Você é um prato raso
Qual o prato que é melhor
Deixo ao povo da cozinha
Na canção eu me garanto
Se eu fosse você, nem vinha
Ficava no seu reinado
Com a fama de coitado
Que eu soube que cê tinha
De onde foi que tirou isso
Essa fama nunca fiz
Você não tem argumento
Só besteira agora diz
A Xuxa já namorei
Com ela só não casei
Porque eu não quis, entende?
Duvido muito, mas deixa
A disputa é no argumento
Não quero levar um chute
De um homem violento
Na fama sua alcançada
Rasteira e cotovelada
Sem demonstrar sentimento
Tudo o que eu disputei
Desse jeito resolvido
Não foi por mal que ocorreu
Foi por um mal-entendido
E você, grande que alega
Terminou cantando é brega
Não é sabido, entende?
Não fale do romantismo
Se tiver pouca cultura
É preciso inteligência
Pra entender a candura
Do que escrevo hoje em dia
Você não entenderia
Se forçar, terá loucura
Pelé não é ignorante
Você não compreendeu
Preferiu parar o jogo
Sabe que a idade venceu
Não insiste na carreira
Senão vai fazer besteira
Igual contigo aconteceu
Se continuo cantando
É que ainda há talento
Diferente de outro rei
Que parou lá num momento
Com medo da decadência
Pois a sua inteligência
Era um frágil instrumento
É melhor ser recordado
Como rei de eterno brilho
Parei de jogar faz tempo
Mas na história fiz meu trilho
Uma carreira perfeita
Reinado que o mundo aceita
Não sou um rei só pro filho
Pelo que vejo, Pelé
Cada um tem seu orgulho
Seus defeitos e virtudes
Seu jeito de ver o futuro
Somos reis de dois reinados
Distintos e separados
Não dá pra quebrar um muro
É, Roberto, essa guerra
Já não tem nenhum sentido
Eu respeito a sua voz
E o sucesso conseguido
Você transmite emoção
Marcou uma geração
E ainda é ouvido
E você, caro Pelé
Bicho, você é o cara
No futebol, que é uma arte
Se ao fazer mil gols, cê para
Seu reinado é soberano
Ainda vão fazer mil anos
Pra surgir quem te encara
Roberto, você é o rei
E humilde, eu agradeço
Esta é a sua praia,
A vitória não mereço
Você grande amigo é
Quisesse matar Pelé
Eu nem tinha endereço
Qual é, Pelé, camarada
Você lutou um bocado
E o duelo dessa vez
Está agora acabado
Saibam todos sem enganos
Somos dois reis soberanos
Somos reis de dois reinados
Literatura de Cordel quarta, 27 de junho de 2018
MAL-ASSOMBRADA PELEJA DE FRANCISCO SALES COM O NEGRO VISÃO (FOLHETO DE FRANCISCO SALES ARÊDA)
MAL-ASSOMBRDA PELEJA DE FRANCISCO SALES COM O NEGRO VISÃO
Francisco Sales Arêda
Senhores, quem é poeta está sujeito encontrar com espírito maconheiro cheio de truque e azar que na vida foi poeta morreu inda quer versar.
Digo assim porque comigo deu-se uma trapalhada: noite de senhor São João eu caí numa emboscada que pensei me acabar sem ver o fim da jornada.
Já fazia cinco anos que eu havia abandonado a arte de cantoria mas recebi um chamado para atender um amigo dessa vez fui obrigado.
Peguei a viola e fui cheio de neurastenia era longe e cheguei tarde na casa da cantoria já encontrei tudo em festa na mais perfeita harmonia.
Assim que entrei no salão logo a viola afinei e com a ordem de todos a cantar continuei porém nos primeiros versos todo agitado fiquei.
Sentindo um grande calor e uma tremura geral como quem estava sentindo pelo corpo um grande mal dando a conhecer ao povo um desarranjo fatal.
Nisso alguém bateu na porta pediu licença e entrou era um negro estranho e feio que a todo mundo assombrou com uma viola velha junto de mim se sentou.
E foi dizendo em voz alta vim pra aqui sem ser chamado porque gosto de cantar com cantador preparado recorde o que aprendeu se firme e cante animado.
Com essas frases senti correr o suor na testa o cabelo arrepiou-se como quem se desembesta fiquei todo amortecido igual quem se manifesta.
Porém vi que era o jeito abraçar a discussão dei volta no pensamento a Deus pedi permissão mandei o negro seguir e fiquei de prontidão.
N.: – Ligue o fio umbilical na esfera mentalista dentro do quadro da sorte com sistema realista desdobrando a consciência em busca de nova pista.
F.S.: – Negro, quem és tu assim com tanto estilo e linguagem me dizes de onde vens pelo mundo sem paragem qual é tua procedência originada com margem.
N.: – Eu venho dos hemisférios zodiacais do destino nasci entre três planetas em um globo palatino sou livre igualmente o vento faço tudo que imagino.
F.S.: – Mas não é assim que quero saber sua identidade me diga seus pais quem são Estado e localidade que anos tens, onde vives não negue a realidade.
N.: – Sou filho de dois cativos do país dos sofrimentos já tenho 300 anos conheço todos relentos moro nos 32 pontos que forma a rosa dos ventos.
F.S.: – Negro, já conheci que tu não pertence a ser humano com tua filosofia me tapeias todo plano mas quero saber teu nome para sair do engano.
N.: – Eu me chamo Angó Visão fui quem instruí Nogueira Preto Limão, Hugolino Mufumbão e Pimenteira andei junto com Romano e Inácio da Catingueira.
F.S.: – Credo em cruz, Ave-Maria Mãe de Cristo redentor Este negro é o demônio inimigo traidor que anda desacatando os filhos do criador.
N.: – Você já vem com parolas como fez Joaquim Sem Fim botando santo no meio e me chamando ruim fazendo a mesma besteira para ver se ataca a mim.
F.S.: – Todo mundo tem direito de defender seu papel só você não se defende por ser infame e cruel porém eu tenho por mim Jesus Cristo e São Miguel.
N.: – Eu não empato você ter lá sua devoção nem fazer seu fraseado com santos e oração eu quero é cantar repente e dar-lhe uma lição.
F.S.: – Quem é você tão sabido pra conhecer mais do que eu nem rebaixar o poder que a natureza me deu se veio com essa idéia pode dizer que perdeu.
N.: – Essa sua natureza eu conheço ela a fundo sou capaz de descrever toda origem do mundo desde o mais potente ser ao mais péssimo vagabundo.
F.S.: – Você faz parte da fera que iludiu Adão e Eva manchando a lei do dever com o fruto da reserva mas não pense que me arrasta para o caminho da treva.
N.: – Adão e Eva pecaram por uma contradição mas aquilo foi somente para haver a geração mesmo sem haver pecado não havia salvação.
F.S.: – Mas a culpa de Adão foi por causa da serpente que atacou de surpresa a pobre Eva inocente e fez ambos se perderem pelo pecado somente.
N.: – Mas o eterno por ser um juiz tão poderoso para que deixou Lusbel entrar no jardim mimoso e botar Adão e Eva no pecado rigoroso?
F.S.: – Negro, não seja tão ruim querendo a Deus maltratar você sabe que Lusbel foi autor de todo azar por se ver perdido quis a nossos pais complicar.
N.: – É certo que Adão tem culpa porque a lei transgrediu mas quando Lusbel pecou e lá do trono caiu pra não entrar no jardim por que Deus não proibiu?
F.S.: – E por que foi que Lusbel quando ficou lá no trono substituindo a ordem de Deus eterno patrono orgulhou-se e propôs guerra querendo do céu ser dono.
N.: – Aquilo foi pra poder dar começo às gerações pois o eterno podia ter privado essas razões mas deixou Lusbel assim para cumprir-se as lições.
F.S.: – Negro, você não tem jeito de se chegar na verdade mas eu vou tirá-lo agora com o credo da trindade para nunca mais zombar do grande Deus de bondade.
N.: – Veja que asneira sua falando em reza pra mim se reza salvasse gente não havia ninguém ruim eu conheço tudo isso do começo até o fim.
F.S.: – Mas na reza tem prodígio que nos faz admirar quem não se benze e não reza não pode a Deus alcançar fica assim como você de mundo a fora a atentar.
N.: – Eu não ando atrás de reza que não sou padre nem papa ando atrás de quem canta com consciência no mapa e o mais sabido do mundo das minhas mãos não escapa.
F.S.: – Você diz assim porque é triste inconscencioso já perdeu todos direitos de nosso Deus poderoso não sabe o que é verdade só ver o quadro horroroso.
N.: – Eu conheço a descendência de Adão, Eva e Abraão Moisés, David e Jacó Manassés e Salomão mas nunca vi nenhum salvo por valor de oração.
F.S.: – Se oração não valesse Jesus não tinha orado São Pedro e todos apóstolos nenhum tinha acompanhado a religião dos santos para abater o pecado.
N.: – O Cristo orou porque quis mas já tinha a salvação e por isso qualquer um se meta nessa ilusão reze e não pratique o bem pra ver se tem o perdão.
F.S.: – Negro, você me parece que foi materialista desses que só dar valor no que pega e está a vista protesta toda verdade difamador anarquista.
N.: – Não queira saber quem sou nem me julgue bom ou mau cante mesmo se souber e se defenda no grau se tiver cantiga bote ou entregue o lombo ao pau.
F.S.: – Eu canto porque conheço rima, métrica e posição sentido, frase e conjunto sistema e complicação não é pra um negro imundo vir a mim passar lição.
N.: – Homens de muita ciência como Leandro e Zé Duca Romano, Hugolino e outros precisaram minha ajuda quanto mais um Zé Ninguém que na vida nada estuda.
F.S.: – Negro, não seja gabola naquilo que não convém seu estado miserável e consciência não tem um infeliz como tu nunca ajudou a ninguém.
N.: – Você é quem diz assim por não ter compreensão mas provo que Pedra Azul Ventania e Azulão, Serrador, Carneiro e Lino a todos eu dei lição.
F.S.: – Esses homens foram mestres da poesia simbólica enquanto vivo seguires a religião católica não precisaram de ti e nem da força diabólica.
N.: – Pedro Limão e Quirino e Josué de Teixeira, Pirauá, Laurindo e Gato e Manuel Cabeceira eu defendi muito eles no braço da regra inteira.
F.S.: – Meus senhores do salão cada um traga uma cruz e vamos rezar o credo no claro da santa luz pra desterrar este negro inimigo de Jesus.
N.: – Você pensa que reza santa e cruz me faz medo de noite nem de dia se previna e chame por Maria para ver se ela te conduz faça força que hoje vim apuz de enfrentar um poeta em todo artigo não me assombro, não corro e prossigo da forma que quiser eu também quero de qualquer lado que vir eu lhe espero não há santo que lhe empate ir comigo.
F.S.: – Mas eu creio em Deus Pai e Poderoso que criou o Céu e a nossa terra também criou em Jesus aonde encerra o poder de um astro glorioso um só filho do espírito venturoso Divino Cordeiro e inocente que padeceu pelos homens cruelmente foi perseguido, preso e arrastado para com seu sangue imaculado nos livrar das ciladas da serpente.
N.: – Você pensa que com isso se defende mas para mim és maluco e muito fraco de qualquer feito te boto no bisaco e a força de meu braço é quem te prende meu poder hoje aqui ninguém suspende vou provar-te daqui a meia hora que tu chegas a meus pés e me per si nem te Cristo te livra hoje aqui de um acocho da alma pular fora.
F.S.: – Meus senhores da sala é necessário arranjar-se um cordão e água benta pra lançar-se esta fera violenta com a força da Virgem do Rosário e pedimos a Cristo do sacrário que nos mande o anjo Gabriel descer com o Arcanjo São Miguel trazendo a espada e a balança para ver se nos livra desta trança e expulsar esta fera tão cruel.
N.: – Vem você com rosário e com Maria se valendo de medalha e balanceiro chamando por todo alcoviteiro que não há precisão em cantoria mas não pense que com esta bruxaria me faz medo nem me tange num segundo e meu astro é teórico e tão profundo como a luz que clareia a imensidade eu também tenho força e liberdade pra fazer qualquer coisa neste mundo.
F.S.: – Venha a mim São Gregório e São Bernardo Santo Cristo do Ipojuca e São José São Francisco padroeiro em Canindé São João Batista e São Ricardo Santo Antônio de Lisboa tão amado São Severino dos Ramos padroeiro São Jorge com a lança de guerreiro Defendei-me das portas do inferno São Pedro com as chaves do eterno me guardai deste negro traiçoeiro.
N.: – Não é com isto que pensa que me atrasa nem me faça correr de sua vista vamos ver quem ganha esta conquista e quem corre primeiro desta casa quero ver se você não se arrasa cantando comigo este duelo que sou forte no perigo e no flagelo e não temo enfrentar um cantor só você estando nas unhas de Angó não há santo que o livre do cutelo.
F.S.: – Maria imaculada Mãe de Cristo pelo verbo encarnado em vossa luz defendei-me com o nome de Jesus e vinde a mim pra ver se eu resisto não deixai que aqui o anti-Cristo lance mão de mim e mais alguém protegei-me Maria sumo bem pelo sangue que banhou a Santa Cruz e hora divina que Jesus foi nascido na gruta de Belém.
N.: – Arre com tanto pedido deste cantor tão teimoso só fala em santo e rosário isto é que é ser caviloso nem canta e só dá maçada com este abuso horroroso.
Levantou-se da cadeira rodando em cima de um pé e disse: – Eu não canto mais porque estou dando fé quem discutir com um doido é esgotar a maré.
E nesse momento o galo cantou saudoso e bonito o negro se remexeu soltou um tremendo grito fez corrupio na sala e se sumiu o maldito.
Todo povo que estava ali na reunião sentiu um cheiro abafado de breu, enxofre e carvão rezaram o credo e o ofício da Virgem da Conceição.
Faço ponto, meus amigos Sobre a tremenda porfia A todos peço desculpas Lendo esta poesia Espero de cada um Sua boa garantia.
Literatura de Cordel quarta, 20 de junho de 2018
A OPINIÃO DOS ROMEIROS SOBRE A CANONIZAÇÃO DO PADRE CÍCERO PELA IGREJA BRASILEIRA (FOLHETO DE EXPEDITO SEBASTIÃO DA SILVA)
A OPINIÃO DOS ROMEIROS DOBRE A CANONIZAÇÃO DO PADRE CÍCERO PELA IGREJA BRASILEIRA
Expedito Sebastião da Silva
No dia 8 de julho
Do ano setenta e três
A Igreja Brasileira
Decidiu por sua vez
Aqui em nossa nação
Do padre Cícero Romão
A canonização fez
Realizou-se em Brasília
Essa canonização
Sendo que do Santo Papa
Não houve autorização
Por aí o leitor veja
Foi à nossa santa igreja
A maior profanação
Quinhentos e onze padres
No momento se acharam
Também trinta e quatro bispos
Ali se apresentaram
E de jornais e revistas
Centenas de jornalistas
O ato presenciaram
Romeiros da mãe de Deus
Essa canonização
Que a Igreja Brasileira
Fez, não tem efeito não
É uma trama ilusória
Que fere a santa memória
Do padre Cícero Romão
Pois a Igreja Católica
Apostólica Romana
Por ser fundada por Cristo
Tem a ordem soberana
De canonizar na terra
Outra assim fazendo erra
E a boa-fé engana
Mesmo o nosso padre Cícero
A luz brilhante do Norte
Como um fiel pastor
Foi um baluarte forte
Da Santa Mãe Soberana
E a Igreja Romana
Defendeu até a morte
Deixou no seu testamento
Com toda realidade
Assinada por seu punho
Como cunho da verdade
A prova como um diploma
Pra com a igreja de Roma
A sua fidelidade
O nome do padre Cícero
Ninguém jamais manchará
Porque a fé dos romeiros
Viva permanecerá
Pois nos corações dos seus
Foi ele um santo de Deus
É e pra sempre será
E, portanto, o padre Cícero
Sempre foi santificado
Pelos seus fiéis romeiros
De quem é bastante amado
Finalmente é uma asneira
A Igreja Brasileira
Fazê-lo canonizado
Essa canonização
Feita, num sistema inculto
Os romeiros consideram
Como um verdadeiro insulto
Que a todo mundo engana
E com cinismo profana
Um admirável vulto
Creio se o padre Cícero
Vivo estivesse com nós
Seria ele o primeiro
A opor-se em alta voz
De forma alguma queria
Por completo repelia
Essa farsa de algoz
Pois ele nos seus sermões
Dizia com paciência:
A Santa Igreja Romana
De Deus é a pura essência
Não devemos desprezá-la
Portanto vamos amá-la
Fiéis com obediência
– Sem a Igreja Católica
Apostólica Romana
Ninguém pode se salvar
Porque a alma é profana
Por ser a religião
Que conduz todo cristão
Para a corte soberana
Aí se vê claramente
A grande veneração
E o respeito que tinha
O padre Cícero Romão
Pela igreja de Cristo
Que proveniente a isto
Sofrera perseguição
O padre Cícero com vida
Honrou a sua batina
E à igreja de Cristo
Tinha obediência fina
Não dava nenhum conceito
Quem faltasse o respeito
Pra com a santa doutrina
Como é que certos padres
Não conheceram direito
O padre Cícero de perto
Procuram com desrespeito
Canonizá-lo por conta?
É à Igreja uma afronta
Ou um rebelde despeito?
Pois a Igreja Romana
De forma nenhuma aprova
Essa canonização
Feita nesta igreja nova
Se eles estão a pensar
Que fácil vão nos laçar
Nos laçarão uma ova!
Ele dizia: O diabo
Todos os dias peleja
Para pegar os cristãos
Pois é o que mais deseja
Muitos poderão cair
Se por acaso ele vir
Laçando pela igreja
Mas estamos preparados
Conosco ninguém embroma
Porque é o padre Cícero
Do romeiro e ninguém toma
Que espera conformado
Pra vê-lo canonizado
Por nosso Papa de Roma
Já ouvi alguém dizer
O padre Cícero merece
Ser enfim canonizado
Já que o Papa se esquece
Proveniente a demora
Vem outra igreja de fora
E o seu valor reconhece
Mas a Igreja Romana
Primeiramente precisa
Fazer sobre o indicado
Uma severa pesquisa
Depois de colher com jeito
Todos os dados direito
É que ela canoniza
Não é só meter a cara
Como quem vai fazer guerra
E ludibriar a fé
Dos cristãos aqui na terra
Assim era ser profana…
Pois a Igreja Romana
De forma nenhuma erra
Aqui não estou falando
Contra a canonização
De que é merecedor
O padre Cícero Romão
Minha pena aqui acusa
A quem dele o nome usa
Fazendo profanação
Acho grande hipocrisia
E desaforo daquele
Que somente por ouvir
Muito falar sobre ele
Quer ao povo se unir
Para bem alto subir
Na sombra do nome dele
Sabem que o padre Cícero
O santo de Juazeiro
Tem romeiros espalhados
Por este Brasil inteiro
Então canonizam ele
Pra fazer do nome dele
Uma chama de dinheiro
Lá no céu o padre Cícero
Não pode estar satisfeito
Vendo o seu santo nome
Maculado desse jeito
E ainda depois disso
Vendo a igreja de Cristo
Sem o devido respeito
Mas ele apesar de tudo
Usará de complacência
Pedirá penalizado
À Divina Providência
Pro castigo revogar
E com amor perdoar
Essa desobediência
Aqui nós do padre Cícero
E da Virgem padroeira
Não estamos de acordo
Com a Igreja Brasileira
O nosso padre estimado
Queremos canonizado
Não assim dessa maneira
Sua canonização
Nós desejamos que seja
Feita pelo Santo Papa
Da forma qu’ele festeja
Mandar então colocá-lo
No altar de toda igreja
Todos seus fiéis romeiros
Que com fé o amam tanto
Num quadro tem ele em casa
No mais destacado canto
Pra quem chegar ali veja
Que só falta à Santa Igreja
Declará-lo como santo
Esperamos que o Papa
Antes que nos venha a morte
Canonize o padre Cícero
E brade numa voz forte:
“EU DECLARO FERVOROSO
SANTO CÍCERO MILAGROSO
DE JUAZEIRO DO NORTE”
Literatura de Cordel quarta, 13 de junho de 2018
A CANDIDATURA DE LAMPIÃO A PRESIDENTE DA REPÚBLICA (FOLHETO DE VICENTE CAMPOS FILHO)
A CANDIDATURA DE LAMPIÃO A PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Vicente Campos Filho
Das histórias que surgiram
No Nordeste do Brasil
Sobre um tal de Virgulino
Lampião, homem viril,
Tem uma que ficou fora
Dos registros da história
Pouca gente já ouviu.
Quem me contou com detalhes
Eu não sei se é mentira
Foi um velho ex-cangaceiro
Chamado Zé Macambira
Me disse que Lampião
Foi um herói do sertão
Esse título ninguém tira.
Me disse que era tanta
A fama de Lampião
Que um cangaceiro seu
Deu a sua opinião
Meu Capitão vosmecê
É quem merecia ser
Presidente da nação.
Pois não é que Lampião
Aceitou logo no ato
E disse em cima da bucha:
– Eu quero ser candidato
E quem não votar em mim
Só pode ser cabra ruim
Eu esfolo, capo e mato.
E o plano de governo
Do Capitão Virgulino
Amplamente divulgado
Pelo Sertão Nordestino
Teve logo aprovação
De toda a população
Homem, mulher e menino.
Vou tentar reproduzir
O plano do cangaceiro
Como foi que Lampião
Convenceu o povo inteiro
A aprovar o seu plano
E votar naquele ano
No famoso justiceiro.
Lampião já discursava
Pensavam como seria
Viver sem corrupção
Felicidade pra todos
Habitantes da nação
Por toda parte se ouvia
Dia e noite, noite e dia
– Vou votar em Lampião.
Virgulino aonde chegava
Era motivo de alegria
Conquistava toda a gente
Do Ceará à Bahia
E nos braços do povão
Provocava um arrastão
Era grande a romaria.
Os políticos invejavam
Tanta popularidade
Temiam que a promessa
Se transformasse em verdade
Se Lampião fosse eleito
De deputado a prefeito
Perdia a tranquilidade.
Por isso se reuniu
De vereador a prefeito
Naquela situação
Resolveram dar um jeito
Armaram aquela cilada
De tocaia na estrada
Montaram um plano perfeito.
Lá pras bandas de Angicos
Fuzilaram Lampião
Mas acabaram também
Com os planos da nação
De criar um país novo
Calaram a boca do povo
Venceu a corrupção.
No Nordeste inteiro o povo
Chorou a morte do bando
Do Capitão Virgulino
Ficavam só comentando
Ô cabra macho da peste
Representou o Nordeste
Viveu e morreu lutando.
Se o plano de Lampião
Tivesse ido à frente
A vida aqui no Brasil
Seria bem diferente
Não ia faltar o pão
Saúde e educação
Na vida da nossa gente.
Se um dia surgir aqui
Outro Lampião disposto
A mudar nossa história
Vai ser bem-vindo no posto
De Capitão da Justiça
Vai acabar com a injustiça
E recebido com gosto.
Isso foi o que eu ouvi
Da boca do ex-cangaceiro
Quem quiser que conte outra
Porque eu cheguei primeiro
Não diga que estou mentindo
Vá por aí repetindo
A estória do justiceiro.
Em todo lugar que ia
Seu lema era limpeza
Credo, cruz, Ave Maria
– Eu vou varrer desse mundo
Tudo quanto é vagabundo,
Era isso que dizia.
Prometia: – Vou banir
Desse mundo a ladroagem
Também prometo acabar
Com essa vagabundagem
Esse bando de safado
Vai se ver encurralado
Vou acabar com a bandidagem…
…Esses políticos corruptos
Vão provar minha chibata
Eu prometo acabar
Com essa tal de mamata
Palavra de Lampião
Cabra brabo do sertão
Feito dez siris na lata…
… O prefeito que roubar
Dinheiro da prefeitura
Vai ter que se ver comigo
E vai levar uma dura
Vou manda-lo pra prisão
Pra comer banha com pão
E feijão com rapadura…
… Prometo fiscalizar
Os atos dos deputados
Se andarem fora da linha
Eles vão estar lascados
Eu mando juntar tudim
O magote de cabra ruim
Todos eles amarrados…
…Depois boto num navio
Solto lá no mei do mar
Tudo quanto é tubarão
De comer vai se fartar
Quero ver dentro de um ano
Sem mentira e sem engano
Esse país se ajeitar…
…Vou mostrar pra essa gente
Que eu boto ordem na casa
Político ruim e safado
Comigo pega em brasa
Arranco o couro das costas
Capo, corto a trouxa em postas
Ladrão comigo se arrasa.
O programa de governo
Era voltado pro povo
E este logo aprovou
Sonhando com um Brasil novo
Um país justo e feliz
Dono do próprio nariz
Sem dever sequer um ovo.
O povo do meu sertão
Já estava até sonhando
Com uma vida melhor
Estavam todos contando
Pensavam como seria
Ter saúde e moradia
A educação prosperando.
Literatura de Cordel quarta, 06 de junho de 2018
AUGUSTO FREDERICO SCHMIDT, UM AUTÊNTICO BRASILEIRO (FOLHETO DE CHICO DE ASSIS)
AUGUSTO FREDERICO SCHMIDT,
UM AUTÊNTICO BRASILEIRO
Chico de Assis
01
Quero que Deus me ajude
Com a inspiração nata
Do poeta popular
Que canta o rio e a mata
Para contar a história
De um grande diplomata.
02
Falo de Augusto Schmidt
Que foi um grande escritor,
Foi jornalista e poeta,
Um grande empreendedor
E no mundo da política,
Exímio articulador.
03
Nasceu no Rio de Janeiro,
Mil novecentos e seis,
Nasceu em berço de ouro,
Filho de um casal burguês,
Mas sempre sonhou pôr fim
À pobreza, de uma vez.
04
Gozou na primeira infância
Paz, amor, felicidade,
Curtindo os prazeres da
Maravilhosa cidade
Não cedendo nem ao peso
Do peso da obesidade.
05
Não foi muito de estudar
Mas foi muito de aprender
Até mesmo reprovado
Schmidt chegou a ser
Não gostou de ler cartilhas
Mas ao mundo soube ler!
06
Mas logo com oito anos
O contratempo chegou
Pra Lausanne, na Suíça,
A família se mudou
E logo veio a doença
Que aos seus pais atacou.
07
Internos em sanatórios
Seus pais cumpriram um destino
Duro, sofrido, cruel
Marcado por desatino
E não puderam amparar
Os destinos do menino.
08
Quando completou dez anos
Viu o seu pai falecer;
Ficou sem rumo e sem prumo
Veio embora sem saber
O que faria da vida
Sem ter seu pai pra dizer.
3
09
Pra o Rio voltou tangido
Pela guerra mundial;
Voltou banhado de lágrimas
Pra sua pátria natal,
Sem pai, sem paz, mãe doente,
Num desamparo total.
10
No Rio peregrinou
Sem se enturmar, sem ter vez,
No Colégio São José,
Também no Liceu Francês
E no Colégio São Bento,
Saindo de todos três.
11
Sua mãe tuberculosa
Se foi dois anos depois
Morar no céu com o marido
E ele, longe dos dois,
Teve que pintar sozinho
O quadro que se compôs!
12
E eis que a mente se eleva
Por sobre o peito que chora
Não pode pagar colégios
Caros no Rio em que mora
Vai prosseguir seus estudos
Distante, em Juiz de Fora.
13
Sem ter por quem esperar
Ergue o peito, segue avante,
Arranja logo um emprego
De caixeiro-viajante;
Depois, de comerciário,
Passa a ser comerciante.
14
E em meio a talões de notas
Pedidos e encomendas
Schmidt foi cultivando
Do saber todas as prendas,
Logo surgiram poemas
Em meio às notas de vendas!
15
Trabalhava numa casa
Onde vendia tecidos
E artigos de armarinho.
Entre os estoques sortidos
De botões, pentes e panos,
Tinha livros escondidos!
16
Em meio às vendas frenéticas
Parava sempre pra ler
Na Rua do Ouvidor
Livraria Garnier
E brechava atrás da loja
A Livraria Briguier".
17
O seu patrão português
Baixava dele o conceito
Dizia: com tantos livros
Para ler, esse sujeito
Jamais dará pra o comércio,
"Esse gajo não tem jeito..."
18
Mas Schmidt deu o fora
Fugiu do patrão beócio,
Sua energia em excesso
Não lhe permitia o ócio
E ele partiu buscando
Montar seu próprio negócio.
19
Logo montou um engenho
Pra fabricar aguardente
Com isso foi conseguindo
Dinheiro rapidamente
Até que se transformou
Num empresário influente.
20
Instalou uma editora
Mostrando capacidade
E assim ficou junto da
Intelectualidade;
Tornou-se o ponto de encontro
Da cultura da cidade!
21
Empreendedor pé-quente
Sabia calcular risco
Competente, juntou grana
Ligeiro igual um corisco
Montou um supermercado,
Embrião da rede Disco.
22
Entrosou-se rapidinho
Com a turma modernista
Oswald e Mário de Andrade
E muito nacionalista
E até com Plínio Salgado,
Mas não foi integralista!
23
Entrou mesmo de cabeça
Na cultura e no seu clima
Lendo, escrevendo em jornais
Cultivando prosa e rima
Com Jackson de Figueiredo
E Alceu Amoroso Lima.
24
Chegou mesmo a editar
Nomes que viraram heróis
Um Graciliano Ramos,
Uma Raquel de Queiroz
E até um Jorge Amado
Que não tinha vez nem voz.
25
Editou Gilberto Freyre
Um crítico da realeza
Da Casa Grande & Senzala,
Lúcio Cardoso, a surpresa;
E um Otávio de Faria
Com a "Tragédia Burguesa".
26
Com Carlos Drumonnd de Andrade
Começou a se entrosar
Foi amigo de Bandeira,
Nosso poeta exemplar
Schmidt ia visitá-lo
Na Avenida Beira-Mar!
27
Envolveu-se na política
Sem nunca ser candidato
Com direita e com esquerda
Sempre conseguiu bom trato
E achava que pra servir
Não precisava mandato.
28
Foi dele a última conversa
Com Getúlio no Catete;
Enquanto a oposição
Baixava nele o cacete,
Getúlio traçava o plano
De fugir do tirinete!
29
Getúlio calmo demais
Em meio ao mar do despeito,
A lama golpista entrando
No Palácio sem respeito
E o velho pronto pra o gesto
De explodir o próprio peito!
30
Conversavam sobre a fome
Que empanava nossa glória...
No outro dia, Getúlio
Deu a resposta à escória
Pulando fora da vida
E entrando firme na História.
31
Schmidt então se aliou
Ao mineiro Juscelino,
Jogou suas esperanças
No médico diamantino
No desejo que o Brasil
Achasse um novo destino.
32
Apoiou sua campanha
Defendeu-lhe com afinco,
Das portas de uma vitória
Deu-lhe a chave, abriu o trinco,
Criando até o slogan
"50 anos em 5"
33
Pra Juscelino, Schmidt,
Resolveu muitos problemas
Articulava os apoios
Enquanto armava os poemas
Todo dia os dois trocavam
Dois ou três telefonemas!
34
Teve que aplacar a sanha
De alguns eternos golpistas
Por JK receber
Apoio dos comunistas
Num tempo de guerra fria
E militares fascistas.
35
Elaborava os discursos
Que JK proferia.
A fama de orador bom
Pra o presidente crescia
Mas seus discursos poéticos
Schmidt era quem fazia.
36
Algumas frases de efeito
Que JK citou cedo,
Eram lavra do poeta
Que escondia o segredo,
Como aquela: "Deus poupou-me
Do sentimento do medo"
37
E na área diplomática
O poeta destacou-se
Representava o Brasil
Com brilho, fosse onde fosse,
Á causa de um Brasil Grande
Ele sempre dedicou-se.
38
Idealizou a OPA
Tentando unir as Américas,
Aplainando as divisões
Geopolíticas hemisféricas
E pondo um freio no fogo
Das ameaças histéricas.
39
Dos direitistas raivosos
Ele explorava com afã
O medo de uma revolta
Ocidental e cristã
Que tirasse o continente
Das garras do Tio Sam!
40
Depois que a Segunda guerra
Levou Marx à Polônia,
Tchecos, búlgaros e alemães
Ele explorava a insônia
Dos yanques que o temiam
Do México pra Patagônia.
41
Depois que a China com Mao
Derrubou seus mandarins,
Implantando o comunismo,
Derrubando espadachins
Havia o pânico que ele
Chegasse aos nossos confins.
42
Logo naquele momento
Que Coréia e Vietnan
Se inspirando em China e Rússia
Pisavam os pés do titã
Fazendo bolhas de sangue
Nos calos do Tio Sam.
43
Quando Cuba já mostrava
Que ia brigar também
Pra derrubar um sargento
Que dizia só "Amém".
Não ia mais ser bordel
Nem quintal de "Sêo Ninguém"
44
Schmidt por cá mostrava
Que evitar revolução
Se evita com mais progresso,
Terra, emprego, paz e pão,
Justiça e democracia
Saúde e educação.
45
Na verdade ele tentou
Criar um Plano Marshal
Conseguiu a Aliança
Para o Progresso, afinal,
Dos países atrasados
Da América do Sul e Central.
46
Uma ação que veio antes,
Fruto do seu argumento:
Banco Interamericano
Para o Desenvolvimento;
O BID que continua
Nos trazendo investimento!
47
O grupo dos 21
Articulou e fez planos.
Este grupo reunia
Governantes veteranos
De todos os 21
Estados americanos.
48
Até mesmo a OEA
Foi fruto desse trabalho
Pra que todo o continente
Vestisse um mesmo agasalho
E um Estado não fosse
No outro meter o malho.
49
Porém na diplomacia
Não ficou só na estréia
Foi nosso representante
Com firmeza e boa idéia
Na grande Comunidade
Econômica Européia.
50
Se entrosou pela direita
Com Castelo, militar,
Junto a Raquel de Queiroz
Ajudou a derrubar
O governo e escreveu
Contra Brizola e Goulart.
51
Fundador do Instituto
De Pesquisas Sociais
E Econômicas também
Defendendo a todo gás
O sistema baseado
Nas idéias liberais.
52
Amou com força a política
Nos bastidores foi forte,
À labuta literária
Entregou-se até à morte
Mas ele também gostava
De incentivar o esporte.
53
Presidiu o Botafogo
De Futebol e Regatas,
Levando a ganhar
Troféus de ouros e pratas
Foi cartola e não meteu-se
Em trambiques e mamatas.
54
Havia dois botafogos
Cada qual pela metade
Juntou os dois em um só,
Cresceu-lhe a capacidade
E botou na presidência
Eduardo Góis Trindade!
55
É este o homem que trago
À memória brasileira;
Um homem que batalhou
Pelo bem a vida inteira
Tanto dentro do País
Quanto na terra estrangeira.
56
Em meio às atribuladas
Vidas de comerciante,
De político e diplomata,
De editor e viajante
Nunca deixou de botar
A poesia pra diante.
57
No ano de 28
Lançou seu livro primeiro
Que trazia o grande título
O "Canto do brasileiro,
O Augusto Frederico
Schmidt", tão verdadeiro.
58
Depois "Canto do Liberto"
Tendo seu nome seguido;
Já no ano 29
Lançou "Navio Perdido"
E em 30, o "Pássaro Cego",
Um livro reconhecido.
59
A "Estrela Solitária"
Lançou com glória e com brio
"Mensagem aos Poetas Novos"
Foi um grande desafio;
"Galo Branco" e "As Florestas"
Depois, "Caminho do Frio".
60
Lançou "Paisagens e Seres",
"Babilônia", uma canção...
Também belíssimos "Discursos
Aos Jovens" desta nação,
"Antologia de Prosa"
E "Prelúdio à Revolução".
61
Seus mais famosos trabalhos
No campo da poesia
Foram "Soneto Cigano",
"Quando", "Lembrança", "Elegia",
"Noiva", "Soneto a Camões",
Foi tudo pra Antologia!
62
"Retrato do Desconhecido",
"Quando eu Morrer" e "Vazio",
Sonetos, "Ouço uma Fonte"...
Fonte perdida no frio.
Encheu de poemas quentes
As brisas doces do Rio.
63
Casou com Yedda Ovalle,
Grande amor da sua vida,
Pra ela lavrou poemas,
E ela foi dele a querida
Até em 65
Quando fez a despedida...
64
Por fim, foi esse o Schmidt,
Um autêntico brasileiro,
Articulador gigante
Empreendedor pioneiro,
Augusto, doce, valente,
Diplomata competente.
Poeta de corpo inteiro!
Literatura de Cordel quarta, 30 de maio de 2018
RUI BARBOSA (FOLHETO DE CRISPINIANO NETO)
RUI BARBOSA
Crispiniano Neto
01
Quero contar a história
Verdadeira e gloriosa
De um diplomata de peso
De carreira luminosa;
Um crânio cheio de graça,
O nosso gênio da raça,
O baiano Rui Barbosa.
02
Rui foi um líder político,
Deputado e senador,
Ministro por duas vezes,
Foi filólogo e escritor,
Tradutor e jornalista
Um consagrado jurista
E um gênio como orador!
03
Porém existe um detalhe
Nas muitas aptidões
Deste crânio brasileiro.
Que deixou tantas lições:
É seu lado DIPLOMATA,
Onde ele compôs a nata
Do concerto das nações!
04
Foi aí que Rui Barbosa
Consagrou-se de verdade,
Tornou-se a “Águia de Haia”
Com tal legitimidade
Que armado de mente e lábios
Tornou-se um dos “Sete Sábios”
Maiores da humanidade.
05
Seu tipo físico era frágil:
Quase anão na estatura.
Um metro e cinquenta e oito,
72 de cintura.
Corpo encurvado e franzino,
Fisicamente um menino
Mas um titã na cultura!
06
Só quarenta e oito quilos
De peso e de sapiência;
A fragilidade física
Escondendo a inteligência...
Mas provou aos seus carrascos
Que “é nos menores frascos
Que mora a melhor essência”!
07
Rui Barbosa de Oliveira,
De Salvador, bom baiano.
Nasceu em mil e oitocentos
E quarenta e nove, o ano;
Foi a cinco de novembro
Que a luz viu o maior membro
Do saber brasiliano.
08
Seu pai, Doutor João José,
Viu no anão um titã,
Ensinou-lhe amar os livros,
Do saber tornou-lhe um fã.
Maria Adélia gerou-lhe
E com carinho ensinou-lhe
Amor e moral cristã.
09
Com a mãe também aprendeu
Amar os descamisados
Aos que a vida excluiu,
Aos pobres e explorados,
Ao humilhado e ao cativo...
Por isso tornou-se ativo
Defensor dos humilhados.
10
Com cinco anos de idade
Rui na escola ingressou;
Seu mestre Antônio Gentil
Muito espantado exclamou:
Meu Brasil, eu lhe apresento
O mais incrível talento
Que a Bahia já criou!
11
Aprendeu em quinze dias
Distinguir as orações
E dos verbos regulares
Fazer as conjugações,
Juntar letras, soletrar,
E com um ano a destrinchar
As mais difíceis lições.
12
Aos onze anos de idade
Já no Ginásio Baiano,
Professor Abílio César
Disse a seu pai: Não me engano.
Tudo que eu sei, Rui já sabe.
Portanto, João, já lhe cabe
Colocar Rui noutro plano.
13
Foi quando Rui recebeu
Sua maior honraria,
Uma Medalha de Ouro,
Do arcebispo da Bahia...
E entre milhões de imagens
De glórias e de homenagens
Desta, nunca esqueceria.
14
No ano sessenta e quatro
Conclui o ginasial.
Só tinha quatorze anos
Não tinha idade ideal
Para a faculdade e então
Foi estudar Alemão
Até o prazo normal.
15
Ao fazer dezesseis anos,
Já tendo idade e conceito
Foi para Olinda cursar
Faculdade de Direito,
Provando o fato verídico
Que para o mundo jurídico
Era o cérebro mais perfeito.
16
Porém em 68
Contraiu um grande mal
Adoeceu gravemente
De um “incômodo cerebral”
Deu um tempo em quase tudo
Paralisou o estudo
Até voltar ao normal,
17
E enquanto ficou em casa
Por um bom tempo abrigou
O poeta Castro Alves
Que Eugênia Câmara largou;
Castro, de Rui era um mano,
Pois no Ginásio Baiano
Na mesma turma estudou.
18
Rui fica bom e de novo
Sua faculdade enfrenta,
Se transfere pra São Paulo,
Curso que mais fama ostenta;
Ali virou bacharel.
Ganhou diploma e anel
Já no ano de 70.
19
Doutor, voltou à Bahia,
Seu solo amado e natal.
De novo sofreu as dores
Do “incômodo cerebral”
Mas foi logo advogar
Passando rápido a provar
Ser grande profissional.
20
Nesse tempo Rui Barbosa,
Mesmo sem ganhar fortunas
Por advogar pra os pobres
Já brilhava nas tribunas,
E os embates sociais
Travava pelos jornais
Com artigos e colunas.
21
No Diário da Bahia
Escrevia a pura prosa.
Neste tempo, o coração
Do genial Rui Barbosa
Por Brasília, jovem bela,
Caiu na triste esparrela...
A primeira crise amorosa.
22
Mas a dor-de-cotovelo
Ele logo compensou.
Discursos e conferências
Onde fazia, era show.
Pela força da Oratória
Em pouco alcançou a glória,
Seu nome se consagrou.
23
Casou-se em 76
Com uma bela baiana
Com quem construiu família:
Maria Augusta Viana
Bandeira da sua vida,
Amada e deusa querida,
Fantástica figura humana.
24
Augusta e Rui produziram
Uma família garbosa:
Que tinha nos nomes o
Sobrenome “Ruy Barbosa”.
Cinco filhos exemplares
Diplomatas, militares
E um político bom de prosa!
25
Rui ergueu-se em seu talento
Para enfrentar a ganância.
A ditadura e a maldade
Ele enfrentou com tal ânsia
Que esqueceu banca e saúde
Para abraçar com virtude
A causa e a militância!
26
No ano 77
De muita seca e horror
Rui se elegeu deputado
Erguendo um novo valor.
Pela grandeza exibida
Foi escolhido em seguida
Pra ser nosso senador.
27
Nabuco disse que Rui
Fez a República garbosa;
Benjamim lhe atribuiu
Revolução luminosa.
Patrocínio, disse então:
“Deus acendeu um vulcão
Na cabeça de Barbosa”.
28
E veio a Abolição
Da escravidão malvada;
Vimos três anos depois
A República proclamada,
Cujo primeiro decreto
Teve o talento completo
Da sua mão consagrada!
29
Fez a Constituição
Da República brasileira;
Poucos retoques fizeram
Sobre a redação primeira
Seu texto estava perfeito
Na política e no Direito,
Uma obra verdadeira.
30
E ao nascer a República,
Pelo seu saber notório
Foi primeiro vice-chefe
Do Governo Provisório.
Brilhante, firme, empolgado
O Brasil foi transformado
Em seu gigante auditório!
31
Rui Barbosa e Deodoro
Neste governo de início
Separaram Estado e Igreja
Evitaram o precipício
Com o tumulto controlado
Acabaram deputado
E Senado vitalício.
32
Rui, Ministro da Fazenda,
Pegou um cofre falido
Pela provisoriedade
Do governo instituído
Não conseguia dinheiro...
Nenhum país estrangeiro
Deu-lhe o empréstimo pedido.
33
Emitiu papel-moeda
Sem lastro em ouro na mão.
Mas desviaram o dinheiro
Do foco da produção
Que Rui Barbosa queria.
Por isso a Economia
Desandou na inflação.
34
Se afastou do Ministério
Mas inda fez uma ação.
Mandou queimar os papéis
Dos tempos da escravidão
Para evitar que ex-senhores
Ganhassem grandes valores
Pedindo indenização!
35
Logo veio Floriano
Com um chicote na mão.
Então as coisas mudaram,
Começou a repressão
E a liberdade sonhada
E democracia esperada
Fora para o rés do chão.
36
As revoltas começaram.
Rui contra o autoritarismo
Buscando o entendimento
Defendendo o legalismo
E Floriano, no berro,
Virou “Marechal de Ferro”
Na mão do militarismo!
37
Rui Barbosa ergueu a voz
Contra a intensa repressão.
Aos revoltosos da Armada,
Aos generais na prisão,
Também aos federalistas
Que queriam que as conquistas
Não sucumbissem ao canhão!
38
Pra os que estavam desterrados
Nas brenhas do Cucuí
Rui entrou com Habeas Corpus
Para tirá-los dali...
Dizia Barbosa: eu sei
Que um Brasil sem ter a lei
Não é Brasil é “brasí”!
39
Chegou a ser exilado.
Forçado deixou a terra
Que amou e foi pra o Chile,
Argentina e Inglaterra
E escreveu famosas cartas
Fazendo acusações fartas
Contra ditadura e guerra.
40
Combateu a intervenção
Militar contra Canudos
Provou que aqueles beatos
Pobres, sofridos barbudos
Não queriam monarquia
Queriam cidadania
Comida, trabalho e estudos!
41
Do nosso Código Civil
Ele fez a revisão
Mil e oitocentos artigos
Em tudo a observação
Corrigindo o Português
E a redação das leis
Pra não ter nenhum senão.
42
Mil novecentos e cinco
Resolveu ser candidato
Contra Hermes da Fonseca.
Seu discurso era um retrato
De um Brasil progressista
Contra um Brasil feudalista
De atraso e de maltrato.
43
Em 07 ele foi a Haia
Conferência Mundial
Defendeu a igualdade
Na Lei internacional
Nada de fraco e de forte
Rico e pobre, Sul e Norte
Com direito desigual.
44
Derrubou todas as teses
Da força da prepotência,
De Inglaterra, França, States,
De tudo que foi potência
Derrubou a força insana
De canhão, de bomba e grana
Com a força da inteligência.
45
Seu nome se destacou.
Foi primeiro sem segundo.
Entre Choate e Nelidoff,
O Barão Marshall profundo,
Meye, Tornielli e Leon
Foi ele quem deu o tom
Dos Sete Sábios do Mundo!
46
Tornou-se a “Águia de Haia”,
Do mundo recebeu louvo,
Quebrou a “lei do mais forte”
Criando um Direito novo.
E quando voltou pra o Rio
Foi só descer do navio
E cair nos braços do povo!
47
Da Academia de Letras
Foi dos membros varonis
Fundador da ABL,
Seu presidente feliz;
Provou seu grande valor
Ao se tornar sucessor
De Machado de Assis!
48
As suas obras são tantas,
De temas tão variados
Que fica muito difícil
Dizer em versos rimados
Os títulos que publicou
E a obra que legou
Nos seus geniais traçados.
49
“Contra o Militarismo”,
“Visita à Terra Natal”,
A grande “Oração aos Moços”,
“Acre Setentrional”,
Discursos, artigos, cartas,
Foi das produções mais fartas
Da Cultura nacional!!!
50
Português, Rui conhecia
Mais que os mestres portugueses
Fez um discurso em francês
Para saudar os franceses.
E diz até um ditado
Que quando foi exilado
Ensinou inglês a ingleses!
51
Contra Hermes da Fonseca
Mil novecentos e dez
Candidatou-se gritando
Contra atitudes cruéis
Na Campanha Civilista
Contrária ao militarista
Regime dos coronéis.
52
Ainda participou
De mais de uma eleição
Levando a campanha às ruas
Dando início na nação
Às campanhas democráticas
Chamando em frases enfáticas
O próprio povo à ação!
53
Em 18 recebeu
Uma agradável surpresa
Grande Oficial de Honra
De uma legião francesa
Mostrando um prestígio grande
E aí seu nome se expande
Pelo mundo com certeza!
54
Continuou escrevendo
Com sua verve eloquente,
No Senado fez trincheira
Mostrando ser combatente
Pela causa que lhe move...
Foi, de novo em dezenove,
Candidato a presidente!
55
Mas no ano 21
Demonstrou grande canseira
Renunciou ao mandato
De senador de primeira
Declarando estar cansado
E “o coração enjoado
Da política brasileira”!
56
Rejeitou ser chefe de
Grande Congresso em Paris.
De, na Liga das Nações,
Representar o País.
E no Tribunal de Haia
Como farol e atalaia,
Ser delegado e juiz!
57
Por tudo quanto ele fez,
Pela grande sapiência,
Por seu saber filosófico,
Saber jurídico e Ciência
Política, História e Gramática,
Seu nome virou, na prática,
Sinônimo de inteligência!
58
Na TV e no cinema
Foi personagem famoso
Foi retratado no filme
“Vendaval maravilhoso”
Brilhou em “Mad Maria”,
Minissérie que trazia
Um Brasil conflituoso.
59
E no “Brasília 18
Por cento”, filme recente
Rui aparece também
Trazendo exemplos pra gente
E há vinte anos passados
Na nota de dez cruzados
Seu rosto surge de frente.
60
Seu nome é nome de ruas,
De praça e Grupo Escolar,
De colégios e farmácias,
De cidade potiguar,
É nome de quase tudo
Só não vi em meu estudo
Seu nome em nome de bar.
16
61
A “Casa de Rui Barbosa”
Preserva sua memória;
“Instituto Rui Barbosa”
É relicário da História
Deste gênio brasileiro.
Baiano bravo, altaneiro
Que encheu o Brasil de glória!
62
Na grande guerra de ideias,
Na lei da fala macia,
Na batalha de argumentos,
Atuou com maestria...
Sem ser profissional
Foi “Pai intelectual
Da nossa diplomacia!!!”
63
Os princípios defendidos,
Suas argumentações,
As leis por ele propostas,
Seus motivos e razões
Pra os países serem iguais
São as colunas centrais
Do Concerto das Nações.
64
Se um dia Brasil reler
Suas imensas verdades
Se pautando pela ética
Respeitando as liberdades
Quando todos formos “Rui”
O nosso Brasil não rui
Nem triunfam nulidades!
Literatura de Cordel quarta, 23 de maio de 2018
GILBERTO AMADO (FOLHETO DE CRISPINIANO NETO)
GILBERTO AMADO
Crispiniano Neto
01
Quero que as musas me inspirem
Na arte de cordelista,
Para descrever a história
De um político e jornalista,
Professor e diplomata,
Bom poeta e romancista!
02
Falo de Gilberto Amado,
Um sergipano da gema
Que brilhou no mundo inteiro
Tendo o saber como lema;
Foi um campeão na prosa;
Foi bem melhor no poema!
03
Era Gilberto de Lima
Azevedo Souza Ferreira
Mais Amado de Farias,
Diplomata de primeira
Que se foi grande no nome
Foi bem maior na carreira.
04
Nasceu em 07 de maio,
No ano de oitenta e sete,
O século era dezenove
E morreu em 27
De agosto de meia nove
Conforme deu na manchete.
2
05
Na cidade de Estância
Lá no solo sergipano
No extremo sul do Estado
Perto do solo baiano
Gilberto Amado nasceu
Pra de Deus cumprir um plano.
06
Foi primeiro dos quatorze
Filhos de um casal decente:
Melchisedech e Ana,
Exemplo de boa gente,
Que logo que viu que o menino
Era vivo e inteligente.
07
Fez os estudos primários
Numa cidade vizinha
Por nome de Itaporanga,
Onde boa escola tinha;
Depois seguiu pra Bahia
Pra seguir na mesma linha.
08
Ali estudou Farmácia,
Mas viu que não tinha jeito
Para pipeta e proveta,
Reação, causa e efeito...
Partiu para Pernambuco
Onde foi cursar Direito.
09
Mesmo ainda como aluno
Já mostrou muito sucesso
Chegou a ir pra São Paulo
Representar, num Congresso,
Os seus colegas de curso
Que nele viram progresso.
10
Seu discurso progressista,
Sua mente especial,
Sua sensibilidade,
Seu currículo magistral
Tornaram-lhe catedrático
Para o Direito Penal.
11
Logo ao terminar o curso
Que concluiu com louvor,
Aplaudido por colegas
Bem visto pelo reitor,
Mudou direto de lado
De aluno pra professor.
12
Foi um professor brilhante,
Pois da matéria sabia.
Também sacava de História,
De Arte e Filosofia
Era um mestre em transmitir,
Bamba na Pedagogia!
4
13
E então como professor
Não ficou no trivial
Expandiu os seus saberes
Do modo mais genial,
Se transformando de fato
Num intelectual!
14
E já no ano de 10
Foi pra o Rio de Janeiro.
Para o Jornal do Comércio
Fez seu trabalho primeiro
Falando em Luís Delfino,
Victor Hugo brasileiro.
15
Se bem que ele já tinha
Começado em Pernambuco
Aonde escutou o último
Dos discursos de Nabuco
E trouxe para seu texto
Da cana o doce do suco.
16
Em 05 já escrevia
A secção "Golpe de Vista",
Em torno à obra de Nietsche
Provou ser bom polemista.
Escreveu artigo e ensaio
E provou ser bom cronista.
17
Para o "Jornal do Comércio"
No Rio escreveu primeiro
Para o "Mundo Literário"
"O País", "Época", "O Cruzeiro"
E em jornais de São Paulo
Também mostrou seu roteiro.
18
N'O Estado de São Paulo'
Foi lido em todo o Brasil,
N'O Correio Paulistano'
Pôs seu texto varonil
E ás vezes até usava
O pseudônimo Áureo ou Gil.
19
Mil, novecentos e doze,
À Europa viajou
Viu de perto a Belle Époque,
Com grandes crânios sentou.
Nas fontes do Modernismo
Bebeu, comeu e saldou.
20
Em 13 chegou de volta,
E pra mostrar sapiência
Foi ao Jornal do Comércio
Pronunciou conferência
Que mostrou sua grandeza,
Seu talento e inteligência.
6
21
Depois publicou em livro
Tudo quanto relatou:
"A Chave de Salomão"
Logo em 13 publicou
E ainda "Outros Escritos"
Ao seu livro acrescentou;
22
Em 15 ele foi de volta
Para o seu torrão natal
Candidatou-se, elegeu-se
Deputado federal,
Projetou-se no cenário
Da política nacional.
23
Na câmara, belos discursos
Cresceram seu cabedal,
Falou de instituições
Da política federal
E descreveu, do Brasil,
Nosso Meio Social.
24
E por ter se consagrado
Parlamentar de respeito,
No ano de 17
Conseguiu ser reeleito.
Vinte e um e Vinte e quatro,
Ganhou sempre em todo pleito.
25
Em 26 deu um tempo
Na política radical
Pra ser diretor da Caixa
Econômica Federal
E em 27 elegeu-se
Pra o Senado Nacional.
26
Já como parlamentar
Entrou no mundo que quis;
Falando de relações
Externas deste País
E indo a reuniões
Em Berlim, Roma e Paris!
27
Chegando a República Nova
Encetou nova conquista,
Deu um tempo na política
Foi chamado a ser jurista,
Deu cursos, formulou leis
Tendo visão de estadista.
28
No ano de 34
Chegou onde mais queria
Para o Itamaraty
Foi prestar consultoria
E entrou de vez no seu mundo
Feliz da Diplomacia.
8
29
Sucedeu a Bevilacqua
Que foi um grande causídico
E assim, da Política externa,
Tornou-se assessor jurídico
Mostrando que seu talento
Era completo e verídico.
30
Evoluiu muito rápido
Pois do lugar de assessor
Em 36 assumiu
O cargo de embaixador
Onde mostrou seu talento
Pra ser negociador.
31
Do ano de 39
Ao ano 47
Foi ministro na Finlândia
Fazendo o que lhe compete
E o mesmo êxito de sempre
Na Finlândia se repete.
32
E logo em 48
Ele sentou-se no trono
Da carreira diplomática...
De uma cadeira foi dono
Na Comissão de Direito
Internacional da ONU.
33
Já que Genebra era a sede
Desta nobre comissão
Foi residir na Suíça,
Deu grande contribuição
Ao Direito entre os países
Com muita publicação.
34
Não perdeu uma sessão
Da Assembleia Geral
Da ONU, em Nova Iorque,
Desde aquela inicial,
Até a última em que pôde
Botar seus pés no local.
35
Somente em 68
Parou de comparecer
E o seu saber jurídico
Nunca deixou de exercer.
Direito Internacional
Passou a vida a escrever.
36
Os "Direitos e Deveres
Dos Estados", foi legal,
"Definição de Agressão"
E até "Processo Arbitral",
"Reservas às Convenções..."
Da lei multilateral.
10
37
Foi embaixador no Chile
E na Itália também,
Cumpriu missão na Argentina
Lá se saiu muito bem
E em leis internacionais
Nunca perdeu pra ninguém.
38
Presidiu a Comissão
"Diplomacia e Tratados",
Os seus pareceres técnicos
Foram os mais abalizados
E mesmo depois de décadas
Ainda são consultados.
39
Do Barão do Rio Branco
Ele herdou o pacifismo.
Herdou de Bolívar, o sonho
De Pátria Grande e heroísmo
Pra consolidar as bases
Do Pan-americanismo.
40
Forjou todo o ideário
Da Pátria América Latina
Desde as ilhas caribenhas
À extremidade sulina
Cuba, Guianas, Peru,
Brasil, Chile e Argentina.
41
América de Zé Martí,
De Atahualpa e Guevara,
De Sandino e Tiradentes
De Zumbi, de Victor Jara,
De Farabundo e Allende
Sem águia que nos separa!
42
Um pan-americanismo
Com fronteiras sem alertas
Com o portunhol congregando
Tantas culturas libertas
Sem Batman e Drácula sugando
As nossas veias abertas!!!
43
No pós-guerra ele assumiu
Elevadíssimas missões;
Demonstrou grande prestígio
Logo em duas comissões
E foi delegado na
Conferência das Nações.
44
Essa grande conferência
Foi feita pra se estudar
Qual o poder das nações
Sobre o Direito do Mar
E foi aí que Gilberto
Conseguiu mesmo brilhar.
12
45
Defendia que o direito
Do Estado nacional
Sobre o mar devia ser
Não somente horizontal
Mas também devia ter
Um sentido vertical!
46
O Mar territorial
E também o Alto Mar;
Direito a pesca e minérios
À defesa, ao navegar,
Também aos fundos marinhos
E aos céus do mar pra voar!
47
Amado sempre dizia
Que neste embate tão duro
Entre o academicismo
E o direito prático e puro
Tinha que ver-se o interesse
Das nações e seu futuro!
48
Mas defendia também
Que interesses e ambições
Dos estados não turvassem
As modernas intenções
De forjar civilidade
Pra o futuro das nações!
49
Normalmente os diplomatas
Com décadas no estrangeiro
Acabavam se esquecendo
Do jeitinho brasileiro
De ser feliz, ser alegre,
Espontâneo e inzoneiro.
50
Mas Gilberto Amado, não.
Sempre voltava ao País,
Por aqui lançava livros,
Brincava e pedia bis
Sem jamais perder a ginga...
Sem medo de ser feliz!
51
Transformou-se em grande mito
Com mil estórias contadas
Das anedotas, das lendas,
Das ações inusitadas,
Dos ditos espirituosos,
Das saborosas tiradas!
52
Sempre que vinha ao Brasil
Um novo livro lançava;
Sua fama merecida
Crescia e multiplicava
Mas suas lendas e o mito
Cada vez mais se firmava.
14
53
Foi bom na prosa e no verso,
No romance e na memória,
Na crônica se destacou,
No ensaio alcançou glória
E em tudo quanto escreveu
Pôs sentimento e história!
54
Como escritor produziu
"A Chave de Salomão",
"Grão de Areia" e "Dias
E "Horas de Vibração",
"Espírito do nosso tempo",
Também "Suave Ascenção",
55
"Inocentes e Culpados"
"Interesses da companhia",
Sobre "Assis Chateaubriand"
Escreveu com maestria
Na "Dança sobre o Abismo",
Memórias e Poesia.
56
Na redação do Direito
Teve visão analítica
Descreveu muitas minúcias
Do vendaval da política
E em tudo que produziu
Pôs a visão lírica e crítica!
57
Maledicência, entreveros,
Valentões pernambucanos,
Amores, paixões platônicas,
O atraso daqueles anos,
Os sonhos da juventude
E o poder dos veteranos.
58
Foi quem melhor descreveu
A capital nordestina
Do que sobrou das senzalas
Da Casa Grande assassina,
Dos homens e caranguejos...
Vida e morte Severina.
59
Foi Gilberto um homem manso,
Mas também foi agitado.
Nunca levou desaforo
Pra dentro do lar sagrado,
Por isso é que ele foi tanto
Amado quanto odiado!
60
No acordo, um lorde inglês,
No agito era um Nabuco;
Às vezes, filósofo sóbrio;
Por vezes, gênio maluco;
Exímio, esgrimindo ideias;
Fatal, usando um trabuco!
16
61
Esse era Gilberto Amado,
Dono de todos conceitos;
Se foi bom na fala mansa
Foi melhor metendo os peitos...
Um ser humano completo
Em qualidade e defeitos!
62
Seu nome ficou marcado
Na nossa diplomacia,
Nosso país deve muito
À sua categoria
E à competência mostrada
Em tudo quanto fazia!
63
Foi amigo dos amigos;
Brasil foi sua paixão;
Amado amou a si próprio
Bem mais amou à nação,
Irmão da América Latina,
Pai de um mundo mais irmão
64
Que a memória de Amado
Nosso Brasil possa amar;
Que Gilberto esteja perto
Do Brasil que vai chegar;
Que os jovens possam seguir
Sua carreira exemplar!!!
Literatura de Cordel quarta, 16 de maio de 2018
BARÃO DO RIO BRANCO (FOLHETO DE CRISPINIANO NETO)
BARÃO DO RIO BRANCO
Crispiniano Neto
01
Peço inspiração poética
Às musas do mundo inteiro
Para falar de um grande
Diplomata brasileiro,
Bamba da Geografia
Que foi da diplomacia
Brasileira, o pioneiro!
02
Seu valor excede em muito
Mina, terra, indústria e banco:
José Maria da Silva
Paranhos Júnior, homem franco
Que brincou, lutou e amou
E a História o transformou
Em Barão do Rio Branco!
03
O Barão foi desses homens
Que a Natureza compôs,
Mas depois quebrou a fôrma
E o projeto não expôs...
Foi um daqueles gigantes
Que igual não houve antes;
Maior não terá depois.
04
O barão foi nosso craque
No gramado diplomático,
Foi o papa do acordo,
Foi estrategista e tático,
Negociador histórico,
Um pragmático teórico
Com um genial senso prático!
05
Nasceu no Rio de Janeiro
Quarenta e cinco era o ano;
O século era o dezenove
Vinte de abril, sem engano,
O seu pai era o Visconde,
Outro nome que responde
Como grande veterano!
06
Visconde do Rio Branco,
José Paranhos, seu pai
Foi Ministro da Marinha,
Diplomata no Uruguai,
Primeiro ministro honrado,
Diplomata e magistrado
Para a paz com o Paraguai!
07
Seu pai também demonstrou
Ser da História, um dos bravos,
Com a Lei do Ventre Livre
Que promulgou contra os travos
Da escravidão infeliz.
Depois dele, no País...
Não nasciam mais escravos!
08
Sua mãe era Tereza,
De Figueiredo Faria
Mulher de grande estatura,
Que com luz lhe educaria
Pra que ele pudesse ser
Um dos bambas do poder
Que por certo exerceria!
09
Assim cresceu o menino
Sob os cuidados dos pais
Fez no Dom Pedro Segundo,
Estudos colegiais
E prosseguiu no estudo
Procurando saber tudo
E lendo pra saber mais!
10
Teve uma infância feliz
Tendo oito irmãos ao lado,
Brincando em praias e parques
E em clube conceituado,
Bibliotecas e templos
Sempre seguindo os exemplos
Do pai, Visconde afamado!
11
O Barão, na juventude,
Ganhou fama de boêmio
Era um típico carioca
Que amava o bar e o grêmio
Mesmo com todo o respeito
Um rasgo de preconceito
Ele ganhou como “prêmio”
12
Porém não se descuidava
De aprender com o pai.
Nas lições sobre o Brasil
Bem cedo se sobressai
E ajuda o velho Visconde
Que nos acordos responde
Pela paz com o Paraguai.
13
Por estes tempos partiu
Para em São Paulo estudar
No Largo de São Francisco
Fez o seu vestibular
Mostrando o próprio cacife
E depois foi pra Recife
Pra enfim se bacharelar!
14
Nestes tempos começou
Uma carreira exemplar
De escritor e jornalista
Passando a biografar
O Comandante feliz
Do Navio Imperatriz,
Na “Revista Popular”.
15
Prosseguindo na imprensa
Logo ao desenho se lança.
Na Revista “Ilustração”
Que circulava na França
Fez um relato fiel
Ao descrever a cruel
Guerra da Tríplice Aliança.
16
Depois que voltou formado
Foi ensinar muito cedo,
Corografia e História
Das quais sabia o segredo...
Colégio Pedro Segundo.
Lá, sucedeu ao profundo
Joaquim Manuel de Macedo.
17
Deixou logo o magistério
Partiu pra o interior
Foi exercer o Direito
Demonstrando seu valor
Pra Nova Friburgo ia
Exercer com maestria
O cargo de Promotor!
18
Mas não se sentia bem
Distante da capital.
O pai usou do prestígio
E num pleito eleitoral
Conseguiu fazer do moço
Pelo Estado Mato Grosso,
Deputado federal.
19
No jornalismo seguiu
Demonstrando vocação
Além de escrever artigos
De grande repercussão,
Por conquistar o leitor,
Transformou-se em Redator
Do Periódico “A Nação”.
20
Porém, nem tudo eram flores
Na vida de Rio Branco,
Devido ao jeitão largado
Boêmio, liberto e franco,
Melindrou dogmas e teses
E sofreu alguns revezes
Topando tranco e barranco.
21
A filha de um figurão
Por ele se apaixonou.
Com ele quis se casar
Mas ele não aceitou.
Enfrentou muita dureza
Porque fora da nobreza
Seu coração se entregou!
22
Apaixonou-se por uma
Bailarina de beleza.
“Marrí Filomêne Stêvens”,
Contrariando a nobreza.
Deixou a nobre na mão
E entregou o coração
Pra belga com mais firmeza!
23
E como se não bastasse
Desagradar a elite,
Inda fez mais uma coisa
Que a época não admite.
A paquera engravidou
E o escândalo se instalou
Rompendo todo limite!
24
O visconde lhe impôs
Que a bailarina e atriz
Fosse embarcada à Europa
Pra ter o filho em Paris
Por isto o nobre rapaz
Perdeu a pompa e a paz
Vivendo muito infeliz.
25
Na França, “Marrí” chegou,
Logo deu à luz um filho.
Mas o futuro barão
Aqui vivia sem brilho,
Lutou, pediu, padeceu,
Morar no mundo europeu
Era seu único estribilho.
26
Foi assim que conseguiu
Emprego noutro país,
Instalou-se em Liverpool
Como cônsul... Mas se diz
Que tendo oportunidade
Escapava da cidade
Pra ver “Marrí” em Paris.
27
Nasceram mais quatro filhos
Desta paixão forte e pura.
Durante esta fase opaca
Ao nosso Brasil procura
Estudar profundamente
E vai penetrando habilmente
Nos bons círculos de cultura.
28
Até que em 83
Surge de forma sutil
Uma oportunidade
De mostrar seu varonil
Talento, saber e astúcia
Quando é mandado pra Rússia
Representando o Brasil.
29
Ali provou que era o homem
Certo no lugar certeiro.
Pois ao final da missão,
Da vida mudou o roteiro,
Abrindo um novo capítulo
Tendo recebido o título
De ilustre Conselheiro.
30
Um câncer roubou-lhe o pai
Lhe causando comoção.
Mas um novo mundo abriu-se
Surgindo mais promoção
E no ano da Lei Áurea
Recebeu mais uma láurea
Se transformando em Barão.
31
Foi ministro na Alemanha
No ano mil novecentos;
O seu nome foi crescendo
Apesar dos novos ventos
Da recém-vinda república
Sua ilustre vida pública
Conheceu novos momentos!
32
Mesmo sendo um monarquista
Fiel ao imperador,
Ideologicamente
Tido por conservador
Não teve cortados planos
Porque os republicanos
Entenderam seu valor!
33
Começou logo a assumir
Delicadíssimos serviços
Diplomáticos da República,
Em casos claros e omissos
Foi mostrando competências
Pra resolver as pendências
Dos conflitos fronteiriços.
34
Primeiro, A Questão de Palmas,
Um conflito com Argentina
Que pretendia tomar
Meia Santa Catarina
E mais meio Paraná
E o Barão trouxe pra cá
Toda esta terra sulina!
35
Para ganhar tanta terra
O competente barão
Provou com mapas e estudos
Que era nossa a região,
Usando, em vez de confetes,
A luz d’Usi Possidets,
De Alexandre de Gusmão!
36
Pelo Usi Possidets
A posse de alguma área
Não se dava por tratado
Feito em linha imaginária
Mas por uso e ocupação,
Investimento e ação
Morada e luta diária.
37
Esta vitória fantástica
Fez com que o Presidente
Que era Rodrigues Alves
O chamasse urgentemente
Pra comandar com valia
A nossa diplomacia
Pois o clima estava quente.
38
Outra vitória maiúscula
Que o barão mostrou firmeza
Foi contra a potente França
Pois da Guiana Francesa
Ganhamos tudo que está
Sendo hoje o Amapá,
Parte da nossa riqueza!
39
Mil novecentos e dois.
Sessenta mil brasileiros
Encontravam-se no Acre,
Como fortes seringueiros.
Eram chãos bolivianos
E ingleses e americanos
Queriam ser seus parceiros.
40
Era um grupo poderoso,
Um sindicato de empresas
Claramente imperialistas,
Americanas e inglesas
Queriam nos dar insônia,
No coração da Amazônia
Enfiando as suas presas!
41
O conflito engrossou tanto
Que o Barão mandar barrar
Os navios dos yanques
De em nosso rio passar
A Bolívia se agitou
Seis mil soldados mandou
Para nos ameaçar.
42
Foi aí que o barão
Que sempre pregou a paz
Achou que aquela ameaça
Estava sendo demais
E também mandou seis mil
Militares do Brasil
Garantirem os seringais!
43
Por fim chegou-se a um acordo,
Um negócio verdadeiro
O Tratado de Petrópolis
Pra o Acre ser brasileiro.
O Brasil também cedeu
E a Bolívia recebeu
Respeito, terra e dinheiro!
44
E definiu as fronteiras
Do Peru com mais clareza;
Noutra negociação
Com a Guiana Francesa
E usando do seu prestígio
Definiu sem ter litígio
Com a Guiana holandesa.
12
45
E assim o nosso Brasil
Fincou marcos e bandeiras
900 mil quilômetros
Quadrados, dessas maneiras
Se encaixaram em nosso mapa
Findando assim a etapa
Das disputas de fronteiras.
46
Graças ao grande Barão
Achamos nossos caminhos
Uma cerca sem arame
Seringueira, aguapés, pinhos
Respeito aos países manos...
Já são cento e trinta anos
Sem guerrear com os vizinhos.
47
Com ele o Brasil ganhou
A atual dimensão,
Esse porte de gigante,
Esse jeitão bonachão
Que ao nosso mapa reveste
Com Norte, Sul, Leste e Oeste
Desenhando um coração!
48
Onze vizinhos amigos,
Nada de expansionismo
A convivência pacífica,
O respeito com altruísmo,
O acerto ao momento certo
E um coração sempre aberto
Ao pan-americanismo!
49
Ao chegar ao ministério
Não existia estrutura
Vinte e sete servidores
Sem maior envergadura
Verbas em pouca quantia
E uma diplomacia.
Tateando em fase escura!
50
O Brasil que foi herdado
Pela Era do barão
Era pobre, endividado,
Voltado à exportação
Se ter um mercado interno,
Tendo por marcas do inferno
Latifúndio e escravidão.
51
Oitenta e quatro por cento
Do povo era analfabeto,
Revoltas por toda parte,
País injusto, incompleto,
Resíduos coloniais
Império frágil, sem paz
E a República sem projeto!
52
Ele, com força titânica
Se impôs pela consistência.
Fez do Itamaraty,
Reduto de inteligência,
Grande espaço cultural
Competente e triunfal...
Um centro de excelência.
53
Rio Branco cresceu tanto
Em respeito e inteligência,
Em talento e honestidade,
Em vitórias e em decência
Que seu nome foi lembrado
Para ser candidatado
Ao cargo da presidência.
54
Mesmo com a vitória certa
Ele não quis aceitar.
Preferiu ser chanceler
E a luta continuar
Tendo credibilidade
E a quase unanimidade
Com poucos a criticar.
55
Foi de quatro presidentes
Ministro do Exterior:
Rodrigues Alves e Afonso
Pena, viram seu valor,
Com Fonseca e com Peçanha;
Tornou toda questão ganha
Fez o Brasil vencedor!
56
Entre os intelectuais
Conquistou muitos amigos;
Para o Jornal do Brasil
Escreveu muitos artigos.
Foram tamanhos seus brios
Que recebeu elogios
Até de alguns inimigos.
57
Foi membro da Academia
De Letras e do Instituto
Histórico e Geográfico,
Dando seu grande tributo,
Da modernidade a mecha
Pr’um Brasil que tinha a pecha
De caipira e matuto.
58
Foram seus auxiliares
Escritores de mais fama
O grande Euclides da Cunha,
Mestre Domício da Gama,
Bilac, o parnasiano,
Rui Barbosa e Capistrano
De Abreu que a História aclama!
59
Graça Aranha também foi
Um dos seus mais preferidos,
Machado de Assis, o gênio,
Amigo em todos sentidos,
Nabuco, grande orador,
Que foi seu embaixador
Para os Estados Unidos
60
Quando ele se foi, deixou
Um país agigantado
Com as fronteiras definidas
Amigos pra todo lado
E uma cultura de paz
Que fez e que ainda faz
O Brasil mais respeitado!
61
Um Brasil não agressivo
Arauto do pacifismo,
A geopolítica da paz,
Diálogo, acordo e civismo,
Doze nações irmanadas
E as raízes adubadas
Do Pan-americanismo.
62
Hoje o nome do Barão
Destaca-se em toda parte:
Em rios, ruas, cidades,
Moeda, cédula, estandarte,
Livro, filme, distintivo,
Escola e clube esportivo,
Centros de cultura e arte.
63
Morreu aos sessenta e seis
De idade, em alto astral,
Na sala onde trabalhava,
Na véspera do carnaval
Causando assim, de momento
Pelo seu encantamento
Comoção nacional!
64
O BARÃO DO RIO BRANCO
Foi herói, foi líder, guia
Gigante da fala mansa
O PAI DA DIPLOMACIA...
Um exemplo de vitória,
Um construtor da história
Símbolo da cidadania!
Literatura de Cordel quarta, 09 de maio de 2018
AFONSO ARINOS (FOLHETO DE CRISPINIANO NETO)
AFONSO ARINOS
Crispiniano Neto
01
Inicialmente peço
Dos Céus auxílios divinos,
A inspiração mais fértil,
Os versos mais genuínos
Para compor um poema
Da Vida de Afonso Arinos.
02
Em Belo Horizonte - Minas
Gerais, do céu cor de anil,
Nasceu dia 27
Do onze, do ano mil
E novecentos e cinco
Para a honra do Brasil.
03
Seu currículo vale mais
Que cheque de qualquer banco.
Afrânio e Sílvia: seus pais,
Nomes que não deixo em branco.
Seu nome completo: Afonso
Arinos de Melo Franco.
04
Neto de Cesário Alvim,
Um destaque da nação;
Sobrinho de Afonso Arinos,
Autor de "Pelo Sertão",
De Virgílio Alvim de Melo
Era exatamente irmão.
05
Para não viver sozinho
Pensou numa companheira.
Ao encontrá-la aceitou
Como esposa verdadeira
Dona Ana Guilhermina
Rodrigues Alves Pereira
06
Mulher de família ilustre
De certa forma influente
Da história da política,
Um ramal sobrevivente.
Neta de Rodrigues Alves
Do Brasil, ex-presidente.
07
Fez formação humanística
No colégio Anglo-mineiro.
E no Dom Pedro II,
Já no Rio de Janeiro
Engrandecendo o currículo
Desse ilustre brasileiro.
08
Ao se transferir pra o Rio
Nos estudos se esmera
Escreve literatura
E sua paixão reitera
Colabora com a revista
"Estudantil Primavera".
09
Teve a força de vontade
Como principal critério.
Permaneceu por dez anos
Levando o estudo a sério,
Sendo exímio professor
E servindo ao magistério.
10
Se forma na Faculdade
Nacional de Direito,
Que no Rio de Janeiro
Goza de grande conceito.
Depois em Belo Horizonte
Foi promotor de respeito.
11
Formado aos vinte e dois anos
Faz do Direito um valor
Torna-se, além de jurista,
Político, historiador,
Grande crítico brasileiro,
Ensaísta e professor.
12
Para Genebra - Suíça,
Entendeu de viajar
Com o fim de seus estudos
Ali aperfeiçoar
Voltando ao Rio de Janeiro,
Passou a lecionar.
13
Professor no exterior
Em mais de uma disciplina,
Ministrou curso de História
Em Paris, cidade fina,
Montevidéu-Uruguai
E na capital argentina.
14
Em pleno Mil novecentos
E quarenta e seis, ingressa
No Instituto Rio Branco
Que um bom momento atravessa
Como professor de História
A sua história começa.
15
Foi catedrático em Direito,
Cito: Constitucional,
Ante as Universidades
Federal e Estadual
Ambas no Rio do Janeiro
Onde foi gênio imortal.
16
No ano quarenta e sete
Quarenta dois anos faz.
Em prol da democracia
Começa em Minas Gerais
Sua carreira política
Vitoriosa demais.
17
Contra a discriminação
Criou a base legal,
Foi por três legislaturas
Deputado federal
E líder da União
Democrática Nacional.
18
O preconceito de cor
Que tanto humilha e oprime
A partir de sua lei
É considerado crime.
A dignidade negra
Sua mão sábia redime!!!
19
No partido do governo
Trabalhou em união
Depois passou a ser líder
De um bloco de oposição
Ao governo JK,
Presidente da nação.
20
Dois fatos principalmente
Que até hoje são lembrados
Marcaram sua presença
Na Câmara dos Deputados
E graças a ele foram
Os projetos aprovados.
21
Como foi citada a lei
Contra a discriminação
Racial, que àquela época
Já provocava exclusão
Hoje existe, mas é menos
Dado à sua aprovação.
22
A lei: Um, três, nove, zero
De projetos genuínos
Que combatia, mormente,
Os preconceitos ferinos
Passou a ser conhecida
Como "Lei Afonso Arinos".
23
No ano cinquenta e quatro
No dia nove de agosto
Pediu em discurso a Vargas
Que renunciasse ao posto.
Seu gosto Vargas não fez
Mas teve um grande desgosto.
24
E quinze dias depois
Dessa frase proferida
Talvez se vendo acuado
Não achando outra saída
No Palácio do Catete
Getúlio se suicida.
25
Em 58, Arinos,
Nossa figura central,
Foi eleito senador
No Distrito Federal
Que logo virou Estado,
Rio de Janeiro atual.
26
Foi Senador pelo Rio,
O único dos Senadores
Que no governo de Jânio
Teve importantes labores
Quando foi ministro das
Relações Exteriores.
27
E até 66
Permaneceu no Senado
Durante esse tempo foi
Duas vezes afastado
Pra ser, pelo presidente,
Novamente nomeado.
28
O primeiro chanceler
Brasileiro que fez plano
E foi visitar a África
Em sessenta e um, o ano,
Pra conhecer e sentir
A dor do povo africano.
29
Chefia a Delegação
Do Brasil perante as
Nações Unidas, durante
As assembleias gerais
E com um ano depois
Volta chefiando mais.
30
Findou chefiando a
Delegação brasileira
À Conferência em Genebra
Onde, na pauta primeira
Estava o desarmamento,
Missão da nossa bandeira.
31
Nomeado presidente
Da citada Comissão
Provisória de Estudos
Para a elaboração
Do que se tornou decreto
Para a Constituição.
32
Por Sarney foi convidado
Como um dos homens finos
Assume uma comissão
Pra guiar nossos destinos
Que se tornou em seguida
Comissão Afonso Arinos.
33
Nunca deixou de fazer
O bem pra nossa nação
Foi dos Direitos Humanos,
Na sua declaração
O redator que fez tudo
Sem errar na redação
34
Pra o Conselho Federal
Sua pessoa compete
Foi por mérito nomeado
No ano sessenta e sete
Depois em setenta e três
Essa função se repete.
35
Foi do Instituto dos
Advogados, primeiro
Um membro de qualidade
Efetivo e verdadeiro
Também do Instituto Histórico
Geográfico Brasileiro.
36
E aos 81 anos
Em completa lucidez,
É eleito senador
No ano de 86
Depois o povo mineiro
O leva ao cargo outra vez.
37
Títulos: Professor Emérito,
Podemos citar primeiro,
Duas universidades
Deste país brasileiro
Da UFRJ
E a do Rio de Janeiro
38
Intelectual do ano
Setenta e três, sem favores
Ganha o prêmio "Juca Pato"
Que confirma seus valores
Perante a Sociedade
Paulista de Escritores.
39
Além de conquistar títulos
Famosos por mais de um fato
Conquistou três grandes prêmios
Provando ser literato:
"Luísa Cláudio de Sousa",
"Jabuti" e "Juca Pato".
40
O prêmio "Luísa Cláudio
De Sousa", ele assim ganhou
Do PEN Clube do Brasil
Isto por que publicou
"Rodrigues Alves", um livro
Que o Brasil todo comprou.
41
Vem o prêmio "Jabuti"
Mais uma satisfação
Ganho na Câmara do Livro
Mas em dupla ocasião
Dos volumes de memória,
Em sua publicação.
42
No ano 58
Toma posse da cadeira
25 que seria
Ilustrada a vida inteira
Recebido pelo grande
Poeta Manoel Bandeira.
43
Na ABL depois
Seu percurso se estende
Recebe Antonio Houaiss
E a mesma homenagem rende:
Guimarães Rosa, Oscar Dias
E a Otto Lara Rezende.
44
Como Senador preside
Da forma mais natural
Duas Comissões que o tornam
Expressão nacional
CRE, CCJ
No Senado Federal.
45
Autor de inúmeras obras
Para aumentar sua glória
Em História e em Direito,
Em Política e em Memória,
Para citar quatro temas
Vou começar por História.
46
Com destaque para estas
Publicações de beleza
Tal "O Índio Brasileiro",
A "Revolução Francesa",
"As Origens brasileiras",
Bondade da natureza.
47
Em "Um Soldado do Reino
E do Império" falado;
Nesta obra ele relata
O verdadeiro legado
Com base na vida do
Herói Marechal Callado.
48
Fez a "História do Povo
Brasileiro", a mais honrosa
Com a colaboração
De uma dupla famosa
O grande Antonio Houaiss
E Francisco Assis Barbosa.
49
"Estadista da República"
Do seu pai dando o perfil
Com a "História do Banco
Do Brasil" é nota mil
E a "Síntese da História
Econômica do Brasil"
50
Compondo três obras mais
Dando o esclarecimento
Sobre as ideias políticas
Exploradas no momento
Do Brasil, homens e temas
E o desenvolvimento.
51
Afonso Arinos portava
As melhores referências
Direito, História, Política,
Pesquisas sobre ciências,
Trabalhos Parlamentares,
Discursos e Conferências.
52
Em Direito, dou destaque,
Como grandes críticos dão,
Para "As leis Complementares"
Da nossa Constituição
Fazendo comparações
Com as de outra nação.
53
Na política ele escreveu
Sobre Nacionalismo,
De problemas brasileiros
E Presidencialismo,
Sobre civilização,
Crise e Parlamentarismo.
54
Faz em Críticas e Memórias:
"Postulando" ninguém toma
Como "O Som do Outro Sino"
"Mar de Sargaços", que soma
"Planalto", "Alto-Mar Maralto"
"Escalada" e "Amor a Roma".
55
Assim foi Afonso Arinos
Um gigante do saber;
Bamba da diplomacia
Fez nosso Brasil crescer;
Foi bom na oposição
E bem melhor no poder!
56
Intelectual cheio
De particularidades
Ímpar por estilo próprio
Múltiplo nas atividades
Raro porque foram poucos
Com as suas qualidades.
57
Do que poderia ser
Não foi mais e nem foi menos
Foi um político agitado
Um sábio dos mais serenos
Gigante pisando firme
Nos mais diversos terrenos.
58
Afonso Arinos de Melo
Grande desde que nasceu;
Aprendeu para ensinar
A missão que recebeu.
Conseguiu ficar famoso
Ensinando o que aprendeu.
59
Foi um exemplo de ética,
De grandeza e compostura
Combateu corrupção,
Denunciou a tortura
Forjou a democracia,
Condenou a ditadura!
60
Suas falas pelo mundo
Foram todas gloriosas
Saiu das Minas Gerais
Para as nações poderosas
Mostrando o brilho das mentes
Dos sábios das Alterosas.
61
Ouro, ferro e diamantes
Traçaram dele, os destinos,
Foi honra dos brasileiros
Ilustração dos Arinos,
A estrela mais brilhante
Dos céus belorizontinos.
62
A arte do Aleijadinho,
A luz dos inconfidentes,
A garra dos conjurados,
O sangue de Tiradentes,
Santos Dumont e Drummond
São dele os antecedentes.
63
E em mil e novecentos
E noventa, esse senhor
Ganha o derradeiro pleito,
Sofre a derradeira dor
Em pleno exercício do
Mandato de Senador.
64
Guerreiro de muitas lutas,
Vencedor de toda trama,
Caiu no campo da honra,
Encantou-se em plena cama.
Partiu, mas ficou lembrado,
É como diz o ditado:
"Vai-se o homem, fica a fama".
Literatura de Cordel quarta, 02 de maio de 2018
HISTÓRIA DA RAINHA ESTER (FOLHETO DE ARIEVALDO VIANA LIMA)
HISTÓRIA DA RAINHA ESTER
Arievaldo Viana Lima
Supremo Ser Incriado
Santo Deus Onipotente
Manda teus raios de luz
Ilumina a minha mente
Para transformar em versos
Uma história comovente
Falo da vida de Ester
Que na Bíblia está descrita
Era uma judia virtuosa
E extremamente bonita
Por obra e graça divina
Teve venturosa dita
Foi durante o cativeiro
Do grande povo Judeu
Um rei chamado Assuero
Naqueles tempos viveu
E com o nome de Xerxes
Na História apareceu.
O rei Assuero tinha
Pelo costume pagão
Um harém com muitas musas
As mais belas da nação
Mas era a rainha Vasti
Dona do seu coração.
Porém a rainha Vasti
Caiu no seu desagrado
Pois embora fosse bela
Não cumpriu um seu mandado
Vasti, durante um banquete
Não quis ficar a seu lado.
Com isto o Rei Assuero
Bastante se enfureceu
Mandou buscar outras moças
E por fim ele escolheu
Ester, a bela judia
Sobrinha de Mardoqueu.
Porque os seus conselheiros
Consideraram uma ofensa
A bela rainha Vasti
Não vir a sua presença
Perdeu a rainha o posto
Foi esta a dura sentença.
Ester era flor mais bela
Filha do povo judeu
Porém perdeu os seus pais
Logo depois que nasceu
Foi viver na companhia
De seu tio Mardoqueu.
Dentre as mulheres mais belas
Ester foi a escolhida
Pra ser a nova Rainha
Pelo rei foi preferida
Mardoqueu disse à sobrinha:
– Não revele a sua vida!
– Pois nosso povo é cativo
E vive na opressão
Talvez o rei não a queira
Vendo a sua condição
É melhor guardar segredo
Sobre seu povo e nação.
Não pretendo alongar-me,
Porém vos digo o que sei:
Mardoqueu era versado
Na Ciência e na Lei
Trabalhava no palácio
Era empregado do rei.
Mardoqueu um dia soube
Que dois guardas do portão
Tramavam secretamente
Perversa conspiração
Eram Bagatã e Tares
Homens de mau coração.
Tramavam matar o rei
E Mardoqueu descobriu
A conversa dos dois homens
Ele sem querer ouviu
Foi avisar a Ester
E ela ao rei preveniu.
Assuero indignado
Com esta conspiração
Mandou ligeiro prender
Os dois guardas do portão
Eles descobriram tudo
Quando os pôs em confissão
Os dois guardas receberam
Um castigo exemplar
Provada a sua traição
O rei os manda enforcar
Depois mandou os escribas
Em seus anais registrar.
Mardoqueu perante o rei
Subiu muito de conceito
Deu-lhe o rei um alto posto
Por ser honrado e direito
Por isso era invejado
Por Aman, um mau sujeito.
Este Aman de quem vos falo
Era o Primeiro-Ministro
Um dos homens mais perversos
De quem se teve registro
Tramava contra os judeus
Um plano mau e sinistro.
Por força de um decreto
Queria que o povo inteiro
Se ajoelhasse a seus pés
Sendo ele um embusteiro
Queria ser adorado
Igual ao Deus Verdadeiro.
Isso era um grande martírio
Para a raça dos judeus
Porque só dobram os joelhos
Em adoração a Deus
Fato que desperta a ira
Dos pagãos e dos ateus.
O Ministro indignou-se
Com todo o povo judeu
Porque não obedeciam
Àquele decreto seu
Pensava em aniquilar
A raça de Mardoqueu.
Mandou baixar um Edito
Marcando a hora e o dia
Para o povo ajoelhar-se
Porém Aman não sabia
Que a bela rainha Ester
Era uma princesa judia.
Mardoqueu leu o decreto
Gelou de medo e pavor
Comunicou a Ester
Que Aman, em seu furor
Queria exterminar
A raça do Redentor.
– Querida Ester, disse ele
Venho triste lhe contar
Que o Primeiro Ministro
Jura por Marduk e Isthar
Que o nosso povo judeu
Decidiu eliminar.
– Esse Decreto já foi
Pelo rei sancionado
Armou para nós a forca
O dia já está marcado
Matará todo judeu
Que não vir ajoelhado.
– Meu tio, responde Ester
Eu nada posso evitar
Pois quem se apresenta ao rei
Sem ele próprio chamar
Por um decreto real
Manda na hora enforcar.
Deixemos aqui Ester
Lamentando pesarosa
Vamos tratar de Aman
Criatura orgulhosa
E saber o que tramava
Essa cobra venenosa.
Disse ele a Assuero:
– Há um povo no reinado
Que tem um costume estranho
Não cumpre nenhum mandado
Que fira algum mandamento
Por seu Deus determinado.
– Constitui um mau exemplo
Para outros povos e assim
Considero que este povo
Viver conosco é ruim
Eu quero a tua licença
Porque quero dar-lhes fim.
Lavrou-se então o decreto
Do extermínio judeu
Aman pegou uma cópia
E em praça pública leu
Somente por ter inveja
Da glória de Mardoqueu.
Naquela noite Assuero
Não podendo dormir mais
Mandou chamar seus escribas
Para lerem os editais
Entre estes documentos
Encontravam-se os Anais.
O leitor sabe que o rei
Foi salvo de um atentado
Por dois porteiros teria
Sido ele assassinado
Se não fosse Mardoqueu
Ter o caso desvendado.
Pergunta então Assuero
Depois que o escriba leu
Os Anais onde constavam
Os feitos de Mardoqueu:
– Me diga qual foi o prêmio
Que este homem recebeu?
– Nenhum prêmio, majestade
Responde o escriba ao rei
Então Assuero disse:
– Agora compensarei
O grande favor prestado,
Gratidão é uma lei!
No outro dia Aman
Foi ao Palácio enredar
Quando Assuero o viu
Tratou de lhe perguntar:
– Que deve ser feito ao homem
Que o rei pretende honrar?
Pensando que era pra si
Aquela grande honraria
Aman disse: – Majestade
Eis então o que eu faria
Com minhas roupas reais
Este homem eu vestiria
Depois o faria montar
Um cavalo ajaezado
Com os arreios de ouro
E o brasão do reinado
Por alguém muito importante
Ele seria puxado.
E nas ruas da cidade
O guia deve bradar
Assim o rei Assuero
Manda agora publicar:
– Este é um homem de bem
Que o rei pretende honrar!
– Muito bem, diz Assuero
Bonito plano, este seu
Mande selar meu cavalo
Da forma que concebeu
E nele faça montar
Nosso amigo Mardoqueu.
Aman ficou constrangido
Mas resolveu perguntar
Qual o homem, majestade
Que o cavalo irá guiar
Disse o rei: – És tu, Aman
Quem o deve anunciar.
Aman saiu se mordendo
Foi o cavalo arrear
Depois mandou Mardoqueu
Sobre o mesmo se montar
Mas no íntimo dizia
Em breve irei me vingar.
E pelas ruas de Susa
Foi Mardoqueu aclamado
Vestindo as roupas reais
Num bom cavalo montado
E pelo ministro Aman
O ginete era puxado.
O leitor deve lembrar
Que Ester, a bela rainha
Já sabia do decreto
E qual a sorte mesquinha
Destinada a seu povo
Porém o medo a detinha.
Há dias que ela esperava
Uma oportunidade
Para falar com o rei
Contar-lhe toda a verdade
E, em favor de seu povo
Implorar-lhe a piedade.
Mas o tempo ia passando
Como o rei não a chamou
A dura pena de morte
Decidida ela enfrentou
Foi à presença do rei
Lá chegando se curvou.
Disse o rei: – Minha querida
A lei não é para ti
Não temas, pois não pretendo
Fazer qualquer mal a si
Diga-me logo o que queres
Porque tu vieste aqui?
Disse ela: – Majestade
Viva em paz, a governar
O motivo que me trouxe
É que vim te convidar
Para um singelo banquete
Que pretendo preparar.
Este banquete eu vou dar
Na noite de amanhã
Quero apenas que convides
O nosso ministro Aman
Espero que não me faltes
Espero com grande afã.
Disse o rei: – Vá sossegada
Por certo, não faltarei
Ao banquete que darás
Como sem falta eu irei
E o Primeiro Ministro
Em breve convidarei.
Ester não disse mais nada
Tratou de se retirar
Chamou as suas criadas
Foi depressa preparar
O banquete que em breve
Ela haveria de dar.
No outro dia Aman
Pelo rei foi convidado
Porém, como ignorava
O que estava preparado
Compareceu orgulhoso
Bastante lisonjeado.
Na presença do ministro
Assuero perguntou
Diz-me agora, ó rainha
Por que razão me chamou?
Então Ester decidida
Por esta forma falou:
– Majestade eu tenho a honra
De ser a tua consorte
Porém a mão do destino
Quer turvar a minha sorte
Porque o meu próprio povo
Está condenado à morte!
Diz o rei: – Quem concebeu
Este plano tão malvado?
Por que motivo o teu povo
À morte foi condenado?
Disse ela: Foi Aman
Ele é o grande culpado!
Pois este homem se julga
Acima do próprio Deus
Quer que todos se ajoelhem
E cumpram os desígnios seus
Por isso ele planeja
Exterminar os judeus.
Quando ela disse aquilo
Aman não pôde falar
Tremia ali de pavor
Sem poder se explicar
E o rei indignado
O mandou encarcerar.
No outro dia Aman
À morte foi condenado
Na forca que ele havia
Pra Mardoqueu preparado
Por um capricho da sorte
Foi nela própria enforcado.
Literatura de Cordel quarta, 25 de abril de 2018
A CHEGADA DE LAMPIÃO NO CÉU - 2 (FOLHETO DE GUAIPUAN VIEIRA)
A CHEGADA DE LAMPIÃO NO CÉU
Guaipuan Vieira
Foi numa Semana Santa
Tava o céu em oração
São Pedro estava na porta
Refazendo anotação
Daqueles santos faltosos
Quando chegou Lampião.
Pedro pulou da cadeira
Do susto que recebeu
Puxou as cordas do sino
Bem forte nele bateu
Uma legião de santos
Ao seu lado apareceu.
São Jorge chegou na frente
Com sua lança afiada
Lampião baixou os óculos
Vendo aquilo deu risada
Pedro disse: Jorge expulse
Ele da santa morada..
E tocou Jorge a corneta
Chamando sua guarnição
Numa corrente de força
Cada santo em oração
Pra que o santo Pai Celeste
Não ouvisse a confusão.
O pilotão apressado
Ligeiro marcou presença
Pedro disse a Lampião:
Eu lhe peço com licença
Saia já da porta santa
Ou haverá desavença.
Lampião lhe respondeu:
Mas que santo é o senhor?
Não aprendeu com Jesus
Excluir ódio e rancor?…
Trago paz nesta missão
Não precisa ter temor.
Disse Pedro isso é blasfêmia
É bastante astucioso
Pistoleiro e cangaceiro
Esse povo é impiedoso
Não ganharão o perdão
Do santo Pai Poderoso
Inda mais tem sua má fama
Vez por outra comentada
Quando há um julgamento
Duma alma tão penada
Porque fora violenta
Em sua vida é baseada.
– Sei que sou um pecador
O meu erro reconheço
Mas eu vivo injustiçado
Um julgamento eu mereço
Pra sanar as injustiças
Que só me causam tropeço.
Mas isso não faz sentido
Falou São Pedro irritado
Por uma tribuna livre
Você aqui foi julgado
E o nosso Onipotente
Deu seu caso encerrado.
– Como fazem julgamento
Sem o réu estar presente?
Sem ouvir sua defesa?
Isso é muito deprimente
Você Pedro está mentindo
Disso nunca esteve ausente.
Sobre o batente da porta
Pedro bateu seu cajado
De raiva deu um suspiro
E falou muito exaltado:
Te excomungo Virgulino
Cangaceiro endiabrado.
Houve um grande rebuliço
Naquele exato momento
São Jorge e seus guerreiros
Cada qual mais violento
Gritaram pega o jagunço
Ele aqui não tem talento.
Lampião vendo o afronto
Naquela santa morada
Disse: Deus não está sabendo
Do que há na santarada
Bateu mão no velho rifle
Deu pra cima uma rajada.
O pipocado de bala
Vomitado pelo cano
Clareou toda a fachada
Do reino do Soberano
A guarnição assombrada
Fez Pedro mudar de plano.
Em um quarto bem acústico
Nosso Senhor repousava
O silêncio era profundo
Que nada estranho notava
Sem dúvida o Pai Celeste
Um cansaço demonstrava.
Pedro já desesperado
Ligeiro chamou São João
Lhe disse sobressaltado:
Vá chamar Cícero Romão
Pra acalmar seu afilhado
Que só causa confusão.
Resmungando bem baixinho
Pra raiva poder conter
Falou para Santo Antônio:
Não posso compreender
Este padre não é santo
O que aqui veio fazer?!
Disse Antônio: fale baixo
De José é convidado
Ele aqui ganhou adeptos
Por ser um padre adorado
No Nordeste brasileiro
Onde é “santificado”.
Padre Cícero experiente
Recolheu-se ao aposento
Fingindo não saber nada
Um plano traçava atento
Pra salvar seu afilhado
Daquele acontecimento.
Logo João bateu na porta
Lhe transmitindo o recado
Cícero disse: vá na frente
Fique despreocupado
Diga a Pedro que se acalme
Isso já será sanado.
Alguns minutos o padre
Com uma Bíblia na mão
Ao ver Pedro lhe indagou:
O que há para aflição?
Quem lá fora tenta entrar
E também um ser cristão,
São Pedro disse: absurdo
Que terminou de falar
Mas Cícero foi taxativo:
Vim a confusão sanar
Só escute o réu primeiro
Antes de você julgar.
Não precisa ele entrar
Nesta sagrada mansão
O receba na guarita
Onde fica a guarnição
Com certeza há muitos anos
Nos busca aproximação.
Vou abrir esta exceção
Falou Pedro insatisfeito
O nosso reino sagrado
Merece muito respeito
Virou-se para São Paulo:
Vá buscar este sujeito.
Lampião tirou o chapéu
Descalço também ficou
Avistando o seu padrinho
Aos seus pés se ajoelhou
O encontro foi marcante
De emoção Pedro chorou
Ao ver Pedro transformado
Levantou-se e foi dizendo:
Sou um homem injustiçado
E por isso estou sofrendo
Circula em torno de mim
Só mesmo o lado ruim
Como herói não estão me vendo.
Sou o Capitão Virgulino
Guerrilheiro do sertão
Defendi o nordestino
Da mais terrível aflição
Por culpa duma polícia
Que promovia malícia
Extorquindo o cidadão.
Por um cruel fazendeiro
Foi meu pai assassinado
Tomaram dele o dinheiro
De duro serviço honrado
Ao vingar a sua morte
O destino em má sorte
Da “lei” me fez um soldado.
Mas o que devo a visita
Pedro fez indagação
Lampião sem bater vista:
Vê padim Ciço Romão
Pra antes do ano novo
Mandar chuva pro meu povo
Você só manda trovão
Pedro disse: é malcriado
Nem o diabo lhe aceitou
Saia já seu excomungado
Sua hora já esgotou
Volte lá pro seu Nordeste
Que só o cabra da peste
Com você se acostumou.
Literatura de Cordel quarta, 21 de março de 2018
BIOGRAFIA DE LAMPIÃO (FOLHETO DE SEVERINO CRISTÓVÃO)
BIOGRAFIA DE LAMPIÃO
Severino Cristóvão
Em Um Oito Nove Sete
Diz a sua certidão
No dia 7 de julho
Foi que nasceu Lampião
Ferreira em Serra Talhada
Chamado Rei do Sertão
Por sina ou maldição
Ou mesmo pelo destino
Tentado por um chocalho
Que tocava como sino
Mataram José Ferreira
Ele pai de Virgulino
Por causa disso o menino
Matou esse capitão
Da Polícia de Alagoas
Não sei se teve razão
E Virgulino Ferreira
Passou a ser Lamião
Lampião e três irmãos
A história assim revela
Reforçaram o banditismo
No sertão de Vila Bela
No lugar em que passavam
Deixavam caixão e vela
Lá mesmo em Vila Bela
Atacou de fazer dó
Pois na vida do cangaço
Lampião não era só
No ano de vinte e sete
Ele atacou Mossoró
A história de Mossoró
Constante de um arquivo
Conheço deste assunto
Colocando neste livro
Colchete virou defunto
E o jagunço Jararaca
Foi lá enterrado vivo
Enterraram ele vivo
No mesmo mês de São João
Vila Bela e Mossoró
Afirmo com perfeição
Ficaram assim na história
Por causa de Lampião
O famoso Lampião
Teve a fama dos anéis
Para o Rei dos Bandidos
Ainda dão nota dez
Quem disso isso é o poeta
Lá da terra dos Condés
Pra Lampião nota dez
Digo em rimas reais
Que o verdadeiro filho
Pune os ossos do pai
Homem como Lampião
O sertão já não dá mais
Quando mataram seu pai
Passou a ser cangaceiro
Na vida do banditismo
Foi o maior bandoleiro
Foi manchete nos jornais
Do Brasil ao estrangeiro
O famoso cangaceiro
A começar de menino
Foi ficando machucado
Pelas rodas do destino
Diz que toda culpa foi
Do saudoso Saturnino
Traçado como destino
Lampião não era só
Enfrentou quinhentos homens
Na cidade Mossoró
Entre todos os bandidos
Lampião foi o maior
Ele atacou Mossoró
E atacou no Pajeú
E mais algumas cidades
Terra do mandacaru
Lampião só respeitou
A nobre Caruaru
E lá em Mandacaru
Levado elo destino
Na cidade Água Branca
Lampião tocou o sino
Libertou todos os presos
Prendeu Cabo Severino
Porém desse Severino
Ele tomou dois mil-réis
E ao velho Padre Pedro
Lampião deu mais uns dez
Do Cabo Manoel Galdino
Cortou os dedos dos pés
Sem os dedos dos seus pés
Ficou lá ele sozinho
Lampião onde passava
Deixava um sinalzinho
Chegando em Tacaratu
Quase mata Arturzinho
Nunca estava sozinho
Sempre com a cabroeira
Virgulino era o terror
Lá da terra fazendeira
Mas ele só respeitava
O chefe Senhor Pereira
Lampião com a cabroeira
Rastejavam na poeira
Com as Forças Sergipanas
Pelejou sem brincadeira
Nesta luta pois morria
Sem mano Antônio Ferreira
Morria Antônio Ferreira
Um desumano vivente
Conduzia um rosário
Só de orelhas de gente
Recebendo em Juazeiro
A patente de Tenente
Foi promovido a Tenente
Afirmo com exatidão
E seu irmão Virgulino
Recebeu de Capitão
O Uchôa deu com ordem
Do Padre Cícero Romão
De instinto Lampião
Foi um bandido malvado
De R. de Santa Helena
Hoje já aposentado
Lampião matou seu pai
Em outro tempo passado
Cesário Gomes, coitado
De bandido era coiteiro
Tinha filho em Ministério
Lá no Rio de Janeiro
Em sua casa dormia
Lampião, o cangaceiro
MARIA BONITA
Lá na terra fazendeira
Sem qualquer um embaraço
Para José de Neném
Maria deu o fracasso
Fugiu com o Virgulino
Famoso Rei do Cangaço
Porém o Rei do Cangaço
Morreu juntinho com ela
Ela era da Bahia
Lampião, de Vila Bela
A Rainha do Cangaço
E o Rei marido dela
Ela era a mais bonita
Lá da terra fazendeira
Ela teve uma menina
De Virgulino Ferreira
Criada por seu irmão
O saudoso João Ferreira
O Virgulino Ferreira
Renomado Lampião
Sempre foi grande amigo
Do Padre Cícero Romão
Recebeu em Juazeiro
Patente de Capitão
O Capitão Lampião
De todos mais afamado
Com seus noventa bandidos
Sujos e esfarrapados
Lutaram em Serrote Preto
Contra Soldados Volantes
Mandados de 3 Estados
As Forças de 3 Estados
Praças e Oficiais
Ele com cinquenta homens
Cinquenta leões leais
Enfrentou duzentos e
Noventa e cinco policiais
O jagunço Pitombeira
Certo dia fez besteira
Violou uma gestante
Com ela fez muita asneira
Lampião fuzilou ele
Debaixo da Quixabeira
Fez do bandido a caveira
Porque era justiceiro
E na Furna de Penedo
Afirmo sem exagero
Lá dormia Lampião
Com uns trinta cangaceiros
Os cabras de Lampião
Beija-Flor e Tiririca
Ponto Fino e Zé Baiano
O Tetéu e Carrapicho
Luiz Pedro e Vitoriano
Torce-Bola e o Marmaço
E Manoel Pernambucano
Ventania e Zé Melão
Inácio e Sabiá
Chá Preto e Mato Redondo
Cobra Verde e Sarará
Gato e Adolfo Meia-Noite
Que fugiu do Ceará
Baraúna e Meia-Noite
Volta Redonda e Maçarico
Quinta-Feira e Cravo Roxo
Pilão Deitado, Grão de Bico
Barra Nova e Trovoada
Meia-Noite, fazendeiro rico
Pica-Pau, Boa Criança
Jararaca e Come-Cru
Galo Cego e Elétrico
Amoroso e Urubu
E o Poeta Guabiraba
Violeiro em Pajeú
Mergulhão e o Peitica
Jaçanã e Oliveira
Euclides e Juriti
Asa Branca e Ribanceira
Livino e Ezequiel
E o Antônio Ferreira
Tinha Antônio Ferreira
Maria Bonita e Nedina
Tinha Célia e Cordeiro
Corisco e a Corina
Tinha o Massilon Leite
Praticante em Medicina
Literatura de Cordel quarta, 14 de março de 2018
A INTRIGA DO CACHORRO COM O GATO (FOLHETO DE JOSÉ PACHECO)
A INTRIGA DO CACHORRO COM O GATO
A intriga é mãe da raiva
O mau pensamento é pai
Da casa da malquerença
O desmantelo não sai
Enquanto a intriga rende
A revolução não cai.
Quando cachorro falava
Gato falava também
Gato tinha uma bodega
Como hoje os homens têm
Onde vendia cachaça
Encostado ao armazém.
Com a balança armada
Para comprar cereais
E na bodega vendia
Bacalhau, açúcar e gás
Bolacha, café, manteiga
Miudezas e tudo mais.
Quando no tempo de safra
Comprava mercadoria
Chegada no armazém
Que todo bicho trazia
Vou dizer pela metade
Esta grande freguesia.
O peru vendia milho
O porco feijão e farinha
Com um cacho de banana
Mais tarde o macaco vinha
Raposa também trazia
Um garajau de galinha.
Carneiro passava a noite
Junto com sua irmã
Descaroçando algodão
E quando era de manhã
Para o armazém do gato
Botava sacos de lã.
Guariba vendia escova
Que fazia do bigode
Urubu vendia goma
Porque tem de lavra e pode
A onça suçuarana
vendia couro de bode.
Então todo bicho tinha
No armazém seu contrato
Porém vamos deixar isto
Para tratar de outro fato
Relativo à intriga
Do cachorro com o gato.
Rei leão mandou cachorro
Efetuar uma prisão
O cachorro passando
Na venda do gato então
Pediu para beber fiado
E o gato disse: pois não.
Subiu na prateleira
Uma garrafa desceu
Um cruzado de cachaça
O cachorro ali bebeu
Botou fumo no cachimbo
Pediu fogo e acendeu.
E disse compadre gato
Eu vou prender o preá
Porque carregou a filha
Do coronel cangambá
E mesmo já deve a honra
Da filha do seu guará.
E tornou dizer compadre
Bota mais uma bicada
Eu só sei prender valente
Depois da gata esporada
O gato sorriu e disse:
Esta não lhe custa nada.
O gato bebeu também
O cachorro repetiu
Botou o copo na banca
Saiu na porta e cuspiu
O gato puxou um lenço
Limpou a barba e tossiu.
Embebedaram-se os dois
Garrafas secaram três
Cachorro fez um discurso
Falava em língua inglês
Gato embolava no chão
Também falando francês.
A gata mulher do gato
Saiu do quarto veio cá
E disse muito zangada
Vocês dois procedem mal
O gato disse: mulher
Da porta do meio pra lá.
O gato ficou deitado
O cachorro foi embora
Ouviram dizer: ô de casa
A gata disse: ô de fora
E quem é respondeu raposa
Sou eu que cheguei agora.
Disseram entre comadre
O gato levantou-se
Sentou-se numa cadeira
Esposa também sentou-se
Ele contou à raposa
De que forma embebedou-se.
A raposa disse: compadre
Você não pensou direito
Bebendo com o cachorro
Um safado sem respeito
Se seus amigos souberem
O senhor perde o conceito.
Beba com os seus amigos
Seu irmão maracajá
O tenente porco-espinho
E o capitão guará
Major porco e doutor burro
E o coronel cangambá.
Eu também gosto da troça
Bebo, danço e digo loas
Mas com gente igual a mim
Civilizadas e boas
Que não vou andar com gente
De qualidade à-toa.
Só me dou com gente boa
Como compadre urubu
Dona ticaca de souza
E dona surucucu
A professora jiboia
E o meu primo timbu.
Você é conceituado
Da roda palaciana
Cachorro vive na rua
Tanto furta como engana
Com o baralho no bolso
Jogando e bebendo cana.
E ele compra fiado
Porque quer mas ele tem
Uma mochila de níquel
Que por detrás se vê bem
Pendurada balançando
Porque não paga a ninguém.
O gato se pôs em pé
Perguntou admirado
Comadre, isto é verdade?
Ele me deve um cruzado
Eu não dei fé na mochila
Por isto vendi fiado.
Porém eu vou atrás dele
Daquele cabra estradeiro
Dou-lhe um bote na mochila
Arranco e tiro o dinheiro
Sendo eu disse a raposa
Passava o granadeiro.
O gato se preparou
Amarrou o cinturão
Correu as balas no rifle
Passou lixa no facão
Botou um quarto e bebeu
De aguardente com limão.
Chegou lá disse ao cachorro:
É triste o nosso progresso
Você paga o meu cruzado
Ou quer que eu pague um processo
Cachorro afastou o pé
E lhe disse eu não converso.
Ali deu um tiro e disse:
É assim que eu despacho
Porém o gato abaixou-se
Passou-lhe o rifle por baixo
Deu-lhe uma balada certa
Que quase derruba o cacho.
O cachorro que também
Tem pontaria fiel
Tornou passar a pistola
A bala deu um revel
Cortou-lhe o rabo no tronco
Que descobriu o anel.
Depois que trocaram tiros
Divertiram no punhal
Pulava o gato de costas
E dava salto mortal
Cachorro por sua vez
Também traquejava igual.
E ali trancou-se o tempo
Na porta do barracão
Da baronesa preguiça
Comadre do rei leão
E ela telegrafou
Pedindo paz na questão.
O leão passou depressa
Um telegrama pra trás
Minha comadre alevante
A bandeira e grite paz
Ela não tinha bandeira
Levantou a macaxeira
E ali ninguém brigou mais.
Literatura de Cordel quarta, 07 de março de 2018
O OURO EM SERRA PELADA – E A LUTA DO GARIMPEIRO (FOLHETO DE CELESTINO ALVES)
O OURO EM SERRA PELADA - A LUTA DO GARIMPEIRO
Celestino Alves
Vinde, ó Musa Sacrossanta
Dai-me a inspiração
Para eu descrever um caso
Que me chamou atenção
E está abalando o povo
Do Pará ao Maranhão
Desde a colonização
Que o ouro é um mistério
Nos áureos tempos, em Minas
Houve problema tão sério
Revolução, luta, briga
Só por caus ado minério
Nem sempre as lutas trouxeram
Ao garimpeiro a glória
Mas eles sempre lutaram
E conquistaram vitória
Través do tempo escreveram
Linda página da história
É sempre um homem pacífico
Trabalhador e ordeiro
Valente como um leão
E manso como um cordeio
A palavra independência
Tem cheiro de garimpeiro
O garimpeiro é o homem
Que vive em demandada
Escala serra e montanha
Tabuleiro e baixada
Vai dormir tarde da noite
Levanta de madrugada
O ouro no Amazonas
No Pará, no Maranhão
Creio que foi explorado
No tempo de Salomão
Mas ninguém tinha encontrado
Desde a colonização
A Floresta Amazônica
Era mistério insondável
Depois da Transamazônica
Essa obra admirável
A mata desvirginou-se
Tornou-se mais penetrável
Houve o tempo da borracha
Que foi uma escravidão
Porque o capitalista
Formava expedição
Milhares de seringueiros
Sujeitos a um patrão
Compravam um barracão
Do preço que ele queria
A borracha que tiravam
Somente a ele vendia
Ante a febre malária
Sem nem uma garantia
A produção da borracha
Normalmente era explorada
Grava muita riqueza
Para a firma organizada
O pobre do seringueiro
Sempre ficava sem nada
Através dessas empresas
Todas mistas estrangeiras
Foram levadas sementes
E mudas de seringueiras
Para fazer seringais
Além das nossas fronteiras
Lá nas terras estrangeiras
O seringal foi plantado
Com boa técnica e adubo
Fácil acesso e bem cuidado
Assim puderam colher
Muito melhor resultado
Esse crime lesa-pátria
Ainda não foi punido
Fez o nosso seringueiro
Ficar no mato perdido
Sem nem uma aspiração
No mundo desiludido
O estrangeiro é vivo
E de ninguém sente dó
Também levaram a semente
Do nosso algodão mocó
Lá plantaram, ele nasceu
Mas quando floriu, morreu:
Saudade do Seridó
O seringueiro jogado
No imenso matagal
Tendo perdido o trabalho
Que teve no seringal
Apelou para viver
Em busca do mineral
Encontrou Serra Pelada
Sem calças e Carajá
E foi descobrindo ouro
Aqui, ali, acolá
Na Floresta Amazônica
No Maranhão, no Pará
E assim foi trabalhando
Nosso velho seringueiro
Meteu-e na mata adentro
Vencendo desfiladeiro
Sem ter outra alternativa
Transformou-se em garimpeiro
A Região Amazônica
É do mundo o brilhante
O farol que ilumina
Com seu raio fumegante
Ela era o berço esplêndido
Onde dormia o Gigante
Está sendo explorada
Mas sua exploração
Deve ser bem planejada
Evitar devastação
Para num futuro próximo
Não termos desilusão
A sua verde floresta
Faz nos chamar atenção
Seu subsolo é riquíssimo
Em ouro de aluvião
A Região está crescendo
Em verdadeira explosão
Ninguém tinha penetrado
Ainda em Serra Pelada
Por ser difícil o acesso
Meio longe da estrada
A grande reserva aurífera
Estava ali bem guardada
Certo dia em Marabá
Formou-se uma expedição
Cerca de dez companheiros
Tomaram uma decisão
De irem a Serra Pelada
Pesquisar a região
João Vieira dos Santos
E mais nove companheiros
Fazendo um total de dez
Destemidos garimpeiros
Caçadores de minério
Verdadeiros pioneiros
Saíram de Marabá
Numa linda madrugada
Que vai ficar na história
Para sempre registrada
Às nove horas do dia
Chegaram em Serra Pelada
São pequeninas fagulhas
Invés de grande pepita
Mas João Vieira vê nelas
O símbolo de sua dita
Deve contar a história
Quando um dia for escrita
Genésio e os companheiros
Puderam assim constatar
A existência de ouro
Abundante no lugar
Distribuíram os barrancos
Começaram a trabalhar
Não havia ambição
No meio dos companheiros
Começaram trabalhando
Os chegaram primeiro
A notícia se espalhou
No mundo dos garimpeiros
A notícia correu logo
Do Pará ao Maranhão
Começo a chegar gente
A pé e de caminhão
Em pouco tempo formou-se
Verdadeira multidão
O povo foi aumentando
Formando aglomeração
Onde existe muita gente
Nem sempre há união
Vindo às autoridades
Despertar a atenção
O Coronel Curió
Comandava o Batalhão
Destacado em Marabá
Lá perto da região
Resolveu ir visitar
Aquela população
O Coronel, um Tenente
Com a sua ordenança
Calmo, moderadamente
Com sua maneira mansa
Fez com que todos sentissem
Nele toda confiança
Foi em vinte e um de abril
O seu contato primeiro
Com sua categoria
Seu bom jeito de mineiro
Conquistou a confiança
De cada um garimpeiro
Em dezenove de mail
Começava seu labor
Voltava a Serra Pelada
Sendo Coordenador
Deu tudo de seu trabalho
Como organizador
No meio dos garimpeiros
Demonstrou eu heroísmo
Calmo, moderadamente
Como quem dá catecismo
Pregando a fraternidade
Sem dispensar o civismo
Foi logo criado um Posto
Da Polícia Federal
Que policia o garimpo
Em sua área central
E todo o dia se canta
O Hino Nacional
Nessa administração
Serra Pelada estourou
Muita gente, muito ouro
Muita riqueza gerou
Muita união fraternal
Lá jamais alguém brigou
Em junho de oitenta e dois
Deixou a Coordenação
Candidato a Deputado
Por aquela região
Consegui por voto livre
Sua primeira eleição
Começou a nova luta
Em favor dos garimpeiros
Pois o direito de lavra
Foi concedido a terceiros
Pararam a mina e quiseram
Expulsar os pioneiros
No Brasil, foi sempre assim
Desde a colonização
O homem descobre a mina
Trabalha como um leão
Mas jamais teve direito
À sua exploração
Hoje já está bem melhor
Porque é dos brasileiros
Pois antigamente era
Privativo do estrangeiro
O que não se deu ainda
Foi direito ao garimpeiro
Agora, em Serra Pelada
Tudo mudou e feição
Curió fez um projeto
Chamou da Câmara atenção
Permitindo ao garimpeiro
Cinco anos de exploração
Em cinco do mês de outubro
Sendo o projeto aprovado
Na Câmara, no dia sete
Aprovaram no Senado
Porem pelo Presidente
O projeto foi vetado
Os garimpeiros vieram
Assistir à votação
Eu gostei muito de ver
Deles a compreensão
Deram as suas presenças
Sem alarde nem pressão
Presidente Figueiredo
Teve um gesto decisivo
Viu que para os garimpeiros
Não tinha paliativo
Então mandou ao Congresso
Um projeto executivo
Concedendo aos garimpeiros
Três anos de exploração
À Vale do Rio Doce
Concede indenização
De setenta e oito bi
Pela sua concessão
Curió apresentou
Emenda e com razão
Que a Vale do Rio doce
Faz jus à indenização
Se provar o seu direito
Com a documentação
Antônio Lopes Carvalho
Vulgo Antônio Mineiro
Movimentou novamente
Um grupo de garimpeiros
Aqui veio acompanhar
O projeto alvissareiro
Novamente demonstraram
Civismo e educação
No Plenário acompanharam
Calmamente a votação
Sem alarde nem barulho
Sem qualquer agitação
O Deputado Curió
Deve estar bem satisfeito
Defendendo o garimpeiro
Mostrando o que tem direito
Vendo que o seu trabalho
Está surtindo efeito
No Estado do Pará
Pássaros fazem sucesso
Tem pássaro no Ministério
Tem um pássaro no Congresso
Se aumentar mais um pássaro
Vamos ter maior progresso
O Curió no Congresso
Bate as asas, canta, cisca
Em favor de garimpeiro
Cutuca, pula e belisca
Invés de cair no laço
Sempre está tirando a isca
Só entram para o cordel
Os autênticos brasileiros
O mundo dos cordelistas
São os fatos verdadeiros
Meus parabéns, Curió
Meu abraço aos garimpeiros
Chamaria Guerra Santa
A luta do garimpeiro
Lutando sem agressão
Vivendo sem desespero
Elegantemente mostra
Seu trabalho pioneiro
Brasília, 31 de maio de 1984
Celestino Alves - CALVES
Literatura de Cordel quarta, 28 de fevereiro de 2018
ARROLADA (FOLHETO DE DALINHA CATUNDA)
1
Vou contar um episódio
Uma história singular
Um Inusitado estupro
Que nem chegou a rolar
Mesmo estando desolada
A vítima inconformada
Resolveu denunciar.
2
Já que tinha decidido
Não mudou de opinião
Sujeito tão atrevido
Merece mesmo é prisão
E pensando assim sem dó
Já partiu paro o BO
Com muita indignação.
3
Logo pegou uma amiga
Que o sujeito conhecia
Juntinhas as duas foram
Direto a delegacia
Paciente o delegado
Que cuidava do condado
A tal vítima atendia.
4
Ele foi atencioso
Cumprindo sua função
Mandou a dupla sentar
E chamou o escrivão
Naquele exato momento
Tomou o depoimento
E pé da situação.
5
A senhora então me diga
Como tudo sucedeu
Como foi que o meliante
Com a dama procedeu
Para aqui eu registrar
E o sujeito procurar
Depois do relato seu.
6
A mulher envergonhada
Não sabia o que dizer
Na cadeira acanhada
Começou a se mexer
Entretanto o delegado
Todo cheio de cuidado
Ajudou no decorrer.
7
Com a voz mansa e pausada
Bem calmo naquele dia
Foi fazendo umas perguntas
Para ver o que colhia
De modo bem respeitoso
Educado e cauteloso
Pois o fato assim pedia.
8
Ele tirou sua roupa
E as calças dele arriou
E de dentro das cuecas
O órgão então retirou
E com o órgão na mão
Começou a infração
E da senhora abusou?
9
A mulher olhou pra amiga
Também para o delegado
Esqueceu sua mudez
E com um riso acanhado
Respondeu a indagação
Naquela ocasião
Com o rosto inda corado.
10
Doutor eu vou lhe dizer
Um órgão eu não vi não!
Era só uma cornetinha
Que mal cabia na mão
Eu nem sei como alguém
Que um tico de pinto tem
Se aventura nessa ação.
11
Quando ele me agarrou
Eu pensei: -Estou roubada
Porém vi que o elemento
Não estava era com nada
O que tinha na cueca
Era só uma merreca
Eu caí na gargalhada.
12
Ele com raiva de mim
Me deu logo um safanão
Me puxou pelos cabelos
Depois me jogou no chão
E acabou se dando mal
Não tinha material
Para cumprir a função.
13
Um ligeiro mal-estar
Deu-se na delegacia
O delegado respira
E o trabalho reinicia
Um tanto embaraçado
Com o que tinha escutado
E sem crer no que ouvia.
14
Olhou bem para a mulher
Sem saber o que falar
Aquela situação
Era um tanto singular
Queria prosseguir
Sem saber como seguir
E qual o rumo a tomar.
15
O delegado aturdido
Quase saiu do recinto
O escrivão que ouvia
Tentou ser bem mais sucinto
Ao digitar o relato
Porque era um desacato
A macular qualquer pinto.
16
O doutor respirou fundo
E assentou o pensamento
O trabalho era bem árduo
Tinha que dar seguimento
Mesmo estando descontente
Tocou o caso pra frente
Naquele depoimento.
17
Desta feita resolveu
A testemunha indagar
Para saber realmente
O que tinha pra contar
E do seu dever ciente
Tentando ser paciente
Resolveu recomeçar.
18
Olhou bem para as mulheres
Com um olhar de respeito
Temperou sua garganta
Para perguntar com jeito
E ter melhor resultado
No que fosse perguntado
E fazer tudo direito.
19
Ele sabe que a mulher
Não pode ser maltratada
E numa delegacia
Não deve ser humilhada
Fez sinal ao escrivão
Começou a arguição
Levando adiante a jornada.
20
De frente pra testemunha
Fez a sua indagação:
– A senhora é arrolada?
Não sou a rolada não!
Não caí nessa esparrela
A rolada aqui é ela
Seu doutor preste atenção.
21
Minha amiga já lhe disse
Como tudo aconteceu
Também sei que o Senhor sabe
Que a rolada não sou eu
O senhor tome tendência
E se não tem competência
Porque se estabeleceu?
22
O delegado espantado
Nem sabia o que fazer
Se ficava ou se corria
A vontade era correr
Porque sendo homem culto
Via aquilo como insulto
Danou-se a se maldizer
23
Ali naquele momento
Deu tudo por encerrado
Assinou o depoimento
Mas deixou engavetado
Louco com a confusão
Mudou de jurisdição
Partiu pra outro condado.
24
Aqui eu fui arrolada
Pra contar essa história
Não foi bem inspiração
Eu trazia na memória
Mesmo assim eu agradeço
A musa por seu apreço
Nessa contação simplória.
Literatura de Cordel quarta, 21 de fevereiro de 2018
A PALESTRA DAS 3 DONZELAS (FOLHETO DE (FOLHETO DE EROTILDES MIRANDA DOS SANTOS)
Palestravam três donzelas
Em assunto amoroso
Uma disse meu paquera
É por demais carinhoso
Nosso namoro é quente
E danado de gostoso
A segunda respondeu
Eu estou nessa jogada
Boto mesmo pra quebrar
Até alta madrugada
Nos braços do meu pãozinho
Não me lembro mais de nada
A terceira deu risada
E disse não fico atrás
Passo a noite com Zezinho
Entre suspiros e ais
Tudo que é meu é dele
Já não me domino mais
Ivone disse tá certo
Mas vamos voltar atrás
Não se faz toda a vontade
Quando gosta de um rapaz
Pra não perder certas coisas
Que não acha nunca mais
Tereza disse qual nada
Eu estou com Carmelita
A moça sendo bem quente
Todo rapaz lhe palpita
Sendo fria ninguém quer
Ainda sendo bonita
Eu só boto fumaçando
Ache ruim quem quiser
Quero ver pegando fogo
Dê o caso no que der
Comigo só vai assim
Pra isso nasci mulher
Quem for mole que se dane
Quero ver o cabra quente
Que chega sair faísca
Quando encosta na gente
Um desse topa comigo
Porque nós bota pra frente
Carmelita respondeu
O homem só presta assim
Que bote pra derreter
Do começo até o fim
Se eu pudesse ficava
Com todos eles pra mim
Ivone disse danou-se
Tu tá ficando tarada
Só quer tudo pra você
As outras ficam com nada
Eu também gosto da coisa
Porém sou mais conformada
Carmelita disse não
Eu nunca fui conformada
Em matéria de amor
Toda vida fui parada
Já dispensei mais de dez
Porque não deram pra nada
E dispenso qualquer um
Que não mate meu intento
Pra isso tem que ser vivo
E ter bom temperamento
Pra topar meu rebolado
Que é muito violento
O filho e Chico Bento
Começou me namorando
Dizendo ser uma brasa
Que só botava queimando
Mas comigo virou gelo
Só vivia cochilando
Tive que mandar embora
Pra não me aborrecer
Arranjei um tal de Zé
Na Fazenda Bom Viver
Esse no primeiro round
Botei logo pra correr
Depois me apareceu
O Manoel paquerinha
Peguei ele no estreito
Que deixei numa peinha
Só não matei dessa vez
Por pedido da vizinha
Tereza disse menina
Você é muito danada
Mas é assim que se faz
Com essa rapaziada
Pra nenhum sair dizendo
Fulana não é de nada
Eu também sou brasa viva
O meu namoro é tanino
Eu tenho horror de homem
Que anda falando fino
Nenhum gosta de mulher
E é por demais cretino
Meu primeiro namorado
Foi um tal de Chico Duro
Só queria namorar
Comigo no pé do muro
E dizia que namoro
Só prestava no escuro
Com essa experiência
Nós ficamos se gostando
Com o decorrer do tempo
Ele pegou afinando
Ficou trocando das pernas
E os olhos afundando
Eu aí disse pra ele
Você não vai aguentar
Se continuar comigo
Aumenta mais seu penar
Porque eu quando namoro
Boto pra tarrabufar
Ele vendo que morria
Dali desapareceu
Nunca mais tive notícia
Também não sei se morreu
Eu aí disse comigo
Aquele não era meu
Depois me apareceu
Por lá um paraibano
Dizendo que era o tal
Com ele não tinha engano
Mas comigo caiu duro
Também entrou pelo cano
Agora eu tenho um
Que me veio importado
Esse pé quente demais
Parece que é tarado
Se existe satanás
É esse meu namorado
Tratam ele de Chamego
Eu nunca vi tão danado
Mata todo o meu desejo
O bicho é acordado
Só assim eu osso ver
Meu sonho realizado
Esse deu certo comigo
Me entende muito bem
Ele faz minha vontade
Eu faço a dele também
Esse é todinho meu
Só meu e de mais ninguém
Carmelita suspirando
Disse eu também queria
Arranjar um desse tipo
Para minha alegria
Ele quente e eu fervendo
Aí o couro comia
Comia de todo jeito
Porque minha lei é dura
Se bater testa comigo
Só vai morrer na fartura
Se quiser como eu quero
Aí ninguém me segura
Ivone disse vocês
Querem ser as maiorais
Não tem homem que resista
Os seus instintos vorais
Pra satisfazer as duas
Só o próprio satanás
Porque homem deste mundo
E ordeiro a pelejar
Vocês botam pra correr
Quando não querem matar
Eu não sei se o diabo
Com vocês vai aguentar
Quando as duas se casarem
Os noivos de antemão
Podem preparar as covas
E cada um eu caixão
Pois o fogo de vocês
Mata qualquer um cristão
Tereza ali respondeu
Já um pouquinho alterada
Nenhuma de nós em culpa
De você não ser de nada
Nós que somos do embalo
Topamos qualquer parada
Tereza e Carmelita
Saíram dando risada
Ivone junto com elas
Se conservava calada
Aquela forte palestra
Ali ficou encerrada
Eu também vou encerrar
Falando das coisas belas
Que a Natureza cria
E se reveste com elas
Com base no pergaminho
Escrevi esse livrinho
Palestra das Três Donzelas
Literatura de Cordel quarta, 14 de fevereiro de 2018
A CHEGADA DE LAMPIÃO NO INFERNO (FOLHETO DE JOSÉ PACHECO)
A CHEGADA DE LAMPIÃO NO INFERNO
José Pacheco
Um cabra de Lampião
por nome Pilão Deitado
que morreu numa trincheira
um certo tempo passado
agora pelo sertão
anda correndo visão
fazendo mal assombra
Foi ele que trouxe a noticia
que viu Lampião chegar
o inferno nesse dia
faltou pouco pra virar
incendiou-se o mercado
morreu tanto cão queimado
que faz pena até contar
Morreu mãe de Canguinha
o pai de forrobodó
cem netos de parafuso
um cão chamado Cotó
escapuliu Boca Ensossa
e uma moleca ainda moça
quase queima o totó
Morreram cem negros velhos
que não trabalhavam mais
um cão chamado Traz Cá
Vira Volta e Capataz
Tromba Suja e Bigodeira
um cão chamado Goteira
cunhado de Satanás
Vamos tratar na chegada
quando Lampião bateu
um moleque ainda moço
no portão apareceu
quem o senhor cavalheiro
moleque eu sou cangaceiro
Lampião lhe respondeu
o moleque não sou vigia
e não sou seu pareceiro
e você aqui não entra
sem dizer quem é primeiro
moleque abra o portão
saiba que sou Lampião
o assombro do mundo inteiro
Então esse vigia
que trabalha no portão
dá pisa que voa cinza
sem fazer distinção
o cabra escreveu não leu
a macaiba comeu
ali não se faz perdão
O vigia disse assim
fique fora que eu entro
vou falar com o chefe
no gabinete do centro
por certo ele não lhe quer
mais conforme o que disser
eu levo o senhor prá dentro
Lampião disse vá logo
quem conversa perde hora
vá depressa e volte já
que eu quero pouca demora
se não me derem ingresso
eu viro tudo asavesso
tóco fogo e vou embora
O vigia foi e disse
a Satanás no salão
saiba vossa senhoria
que aí chegou Lampião
dizendo que quer entrar
eu vim lhe perguntar
se dou-lhe ingresso ou não
Não senhor Satanás disse
vá dizer que vá embora
só me chega gente ruim
eu ando meio caipora
eu já estou com vontade
de botar mais da metade
dos que têm aqui pra fora
Lampião é um bandido
ladrão da honestidade
só vêm desmoralizar
nossa propriedade
e eu não vou procurar
sarna pra me coçar
sem haver necessidade
Disse e vigia patrão
a coisa vai esquentar
eu que ele vai se danar
quando não puder entrar
Satanás disse é nada
convida aí a negrada
e leve o que precisar
Leve cem dúzias de negros
entre homem e mulher
vá na loja de ferragens
tire as armas que quiser
é bom avisar também
pra vir os negros que tem
mais compadre Lucifer
E reuniu-se a negrada
primeiro chegou Fuchico
com um bacamarte veio
gritando por Cão de Bico
que trouxesse o pau da prensa
e fosse chamar Tangença
na casa de maçarico
E depois chegou Cambota
endireitando o boné
formigueiro e Trupe Zupe
e o crioulo Quelé
chegou Caé e Pacaia
Rabisca e Cordão de Saia
e foram chamar Banzé
Veio uma diaba moça
com uma caçola de meia
puxou a vara da cerca
dizendo a coisa tá feia
hoje e negocio se dana
e gritou eita banana
agora a ripa vadeia
E saiu a tropa armada
em direção ao terreiro
com faca facão e pistola
canivete e granadeiro
uma negra também vinha
com a trempe da cozinha
e o pau de bater tempero
Quando Lampião deu fé
da tropa negra encostada
disse só na Abissínia
dá tropa preta danada
o chefe do batalhão
gritou de arma na mão
toca-lhe fogo negrada
Nessa voz ouviu-se tiro
que só pipoca no caco
Lampião pulava tanto
que parecia um macaco
tinha um negro nesse meio
que brigou tomando tabaco
Acabou-se o tiroteio
por falta de munição
mas o cacete batia
nego rolava no chão
pau pedra que achavam
e tudo que a mão pegava
sacudiam em Lampião
Chega trás um armamento
assim gritava o vigia
trás a pá de mexer doce
lasca os gamos de caria
trás um birro de massau
corre vai buscar um pau
na cerca da padaria
Lucifer mais Satanás
vieram olhar do terraço
todos contra Lampião
de cacete vaca e braço
o comandante no grito
dizia briga bonito
negrada chega-lhe o aço
Lampião pode apanhar
uma caveira de boi
e sacudiu na testa dum
e ele só fez dizer oi
ainda correu dez braças
e caiu enchendo a calça
mais não digo de que foi
Estava travada a luta
mais de uma hora fazia
a poeira cobria tudo
negro embolava e gemia
porem Lampião ferido
ainda não tinha caído
devido a grande energia
Lampião pegou um seixo
e rebateu em um cão
mas o qual arrebentou
a vidraça do oitão
saiu um fogo azulado
incendiou o mercado
e o armazém de algodão
Satanás com este incêndio
tocou no búzio chamando
correram todos os negros
que se encontravam brigando
Lampião pegou a olhar
não vendo com quem brigar
também foi se retirando
Houve grande prejuízo
no inferno nesse dia
queimou-se todo dinheiro
que Satanás possuía
queimou-se o livro de ponto
perdeu-se vinte mil contos
somente em mercadoria
Reclamava Lucifer
horror maior não precisa
os anos ruim de safra
e agora mais esta pisa
se não houver bom inverno
tão cedo aqui no inferno
ninguem compra uma camisa
Leitores vou terminar
o tratado de Lampião
muito embora que não possa
vos dá maiores explicação
no inferno não ficou
no céu também não chegou
por certo está no sertão
Quem duvidar desta historia
pensar que não foi assim
querer zombar do meu eu
não acreditando em mim
vá comprar papel moderno
e escreva paro o inferno
mande saber de Caim.
Literatura de Cordel quarta, 07 de fevereiro de 2018
PELEJA DE DOIS POETAS FALANDO DE VIOLÊNCIA (FOLHETO DE PEDRO PAULO PAULINO)
No sítio Bandeira Branca
Numa noite de viola,
Dois famosos repentistas
Puxaram pela cachola,
Pra falar da violência
Que o nosso Brasil assola.
Mangabeira e Curió,
Cada qual o mais batuta,
Para cantar qualquer coisa
Essa dupla não reluta,
Mais ou menos como segue
Foi começada a disputa.
*
Mangabeira
Há quem diga que museu
É que vive do passado.
Mas neste mundo moderno,
Cada vez mais avançado,
Vejo o homem mais confuso,
Como um velho parafuso
Por si próprio desgastado.
Curió
Com a ciência a seu lado
E a tecnologia,
Descobertas importantes
A gente vê todo dia,
Mas o homem não supera
Dentro dele a besta-fera
Do crime e da covardia.
Mangabeira
Com tanta sabedoria,
Com toda a sua potência,
O homem não se supera
Nessa brutal violência
Que de maneira infeliz
Domina todo o país,
Com a total resistência.
Curió
O crime e sua influência
Em nossa sociedade
É matéria tão comum
Que virou banalidade.
Perante a situação,
Hoje em dia o cidadão
É quem vive atrás da grade.
Mangabeira
Não se tem mais liberdade,
O povo vive acuado,
Para proteger a casa
De ferro eu vivo cercado;
Do portão para a janela
Nossa casa virou cela,
E o bandido solto ao lado.
Curió
Hoje, o crime organizado
Toma conta do Brasil,
A polícia não se entende,
Militar com a civil:
Enquanto a revolta assola
A política usa pistola,
O ladrão usa fuzil.
Mangabeira
São mais de quarenta mil
Assassinatos por ano.
São ocorrências sem conta
Todo dia, não me engano.
Pelas causas mais banais,
Já não se respeita mais
A vida do ser humano.
Curió
Governo diz que tem plano
Mas só na conversa fica.
Se tem a lei pra punir
O país não a pratica.
Já sendo a lei tão morosa,
A justiça vagarosa
Dorme mais que gato em bica.
Mangabeira
Agora, que a classe rica
É pelo drama atingida,
Com os donos do poder
Correndo risco de vida,
O governo, a quem comete
Solução, então promete
Adotar séria medida.
Curió
Mas como encontrar saída
Batendo a língua nos dentes?
Só discurso não resolve,
Sem as ações competentes.
Com tanta conversa mole,
Só vejo aumentar a prole
Da turma dos delinquentes.
Mangabeira
As crianças indigentes
Por aí abandonadas
São clonagens sucessivas
De gerações desprezadas,
Dessas que futuramente
Vão compor os contingentes
Das gangues organizadas.
Curió
Nas cidades avançadas
Se agrava a situação.
O terror tomou de conta
De toda a população.
Quanto mais o povo berra,
Ficada declarada a guerra
Do bandido ao cidadão.
Mangabeira
De trinta e oito na mão
É comum se ver menino
De doze anos de idade
Sendo um assaltante fino,
Pois tem lei pra protegê-lo,
Em breve será modelo
No submundo assassino.
Curió
O povo, no desatino,
Não achando um pulso forte,
Só malhando em ferro frio
Dando o voto, seu suporte,
No desespero fatal
Lança um apelo, afinal,
Pedindo a pena de morte.
Mangabeira
Não é esse o passaporte
Para o Brasil desejado:
Punir a morte, matando,
Será erro do Estado.
Já que o crime não compensa,
Certo mesmo está quem pensa
Tornar o povo educado.
Curió
Eu fico do outro lado,
Pois já penso diferente:
Eu acho a pena de morte
Uma saída excelente.
A revolta eu não escondo:
Quando o crime é hediondo,
Que se mate o delinquente!
Mangabeira
Vez por outra, um inocente,
Da maneira mais brutal,
Onde tem pena de morte
Pega a pena capital.
Da fogueira à guilhotina,
Nem a cadeira assassina
Nos libertou desse mal.
Curió
Se a ação policial
Não consegue dar um corte
Na violência, e o bandido
Tem a arma e tem o porte,
Mata a torto e a direito,
Eu acho muito bem feito
Haver a pena de morte.
Mangabeira
Para nossa triste sorte
A “pena” temos de fato:
São os crimes de extermínio
Com todo seu aparato,
As execuções sumárias,
Revoltas nas carcerárias,
Brigas por terra no mato.
Curió
O povão, que paga o pato,
É o mais desprotegido.
O governo é como cego
No tiroteio, perdido.
Cada ação que ele promete
Está jogando confete
Na folia do bandido.
Mangabeira
Agora, atendo um pedido
Que me chega da plateia,
É alguém dando uma ideia
Para acabar com bandido.
Neste país encardido
De desgraça, não convém
Adotar um plano, sem
Enxergar essa matéria:
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
Curió
No país do desemprego,
Que não resolve esse impasse,
Cada faminto que nasce
É um presente de grego.
Com o mal tem logo apego,
Que de encontro a ele vem,
Manda logo um pro além,
A vida vira pilhéria:
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
Mangabeira
A miséria traz sequela
Difícil de se apagar,
Basta a gente observar
A vida lá na favela.
Começa pela panela,
Quando a panela ali tem.
No viaduto também
A coisa fica mais séria:
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
Curió
É neste mundo moderno,
De programas sociais,
Pra combater marginais
Que a vida vira um inferno.
E nesse conflito eterno
No qual o povo é refém,
Por dia se matam cem
(Mais que a Aids na Nigéria):
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
Mangabeira
Enquanto o governo fala
Em proposta e mais proposta,
Lá no morro ou na encosta
Todo dia ronca a bala.
Uma guerra nessa escala
Assusta qualquer “Russein”.
Aqui é só o que tem
Da forma mais deletéria:
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
Curió
Desse jeito está a vida
Montada na corda bamba,
No Brasil de bola e samba,
Sequestro e bala perdida.
“Do que a terra mais garrida”
Muita coisa aqui se tem.
Está faltando, porém,
Uma lei honesta e séria:
É sepultando a miséria
Que eu vejo nascer o bem.
* * *
Sem vencido e vencedor
Terminou a discussão
Da dupla de repentistas
Aplaudidos no salão.
E pelo tema em cartaz
Deram em nome da Paz
Um forte aperto de mão!
Literatura de Cordel quarta, 31 de janeiro de 2018
DISCUSSÃO DUM FISCAL COM UMA FATEIRA (FOLHETO DE MANOEL CAMPINA)
DISCUSSÃO DUM FISCAL COM UMA FATEIRA
Manoel Campina
O homem quando viaja
Sempre encontra presepada
Sofre muito e também goza
Pega muita beliscada
E encontra alguma coisa
Que dá muita gargalhada
Certo dia eu viajei
Da cidade de Palmeira
Com destino ao sertão
Em Serra da Cachoeira
Vi uma grande questão
Dum fiscal com uma fateira
Começou a discussão
Por causa duma coleta
E a fateira zangou-se
Disse ao fiscal pegue a reta
Queime o chão e vá embora
Não quero ouvir indireta
Disse o fiscal minha dona
Nós vamos ser camaradas
Olhe bem que todas vendem
Porque estão coletadas
Disse ela inda mais esta
Porque elas são danadas
Porém eu sou diferente
Hoje seu imposto míngua
Sei entrar e sei sair
Porque é que eu tenho língua
E se quer ver bicha doida
Encalque na minha íngua
Disse o fiscal minha dona
Não interessa questão
Me pague 15 cruzados
Que eu passo o seu talão
Disse a velha feito vaca
Pegue a reta e queime o chão
Aonde você já viu
Pagar imposto de tripa
Hoje aqui em brigo muito
E não pago essa sulipa
Posso pagar na cadeia
Depois de passar-lhe a ripa
Eu posso pagar o chão
Porque é o meu dever
Porém pra tirar coleta
Isto é que ninguém vê
Tirar da boca dos filhos
Pra esse corno comer
Por que não vai trabalhar
Malandro de calça frouxa
Você comigo se lasca
Não pense que eu seja trouxa
Eu zangada sou o cão
E minha brigada é roxa
E disse conversar muito
É o que o senhor deseja
Eu não posso bater papo
Vamos deixar de peleja
Com pouco meu velho chega
Hoje aqui o pau troveja
Nisso chegou dois soldados
E um sargento também
Dizendo tire a coleta
Que a senhora se sai bem
Disse a velha agora sim
De onde é que vocês vêm
O senhor não é prefeito
Apenas policial
Também que veio fazer
No meio do pessoal
O caso aqui quem resolve
Só é o fiscal geral
O sargento disse dona
A senhora de adome
Resolva e pague a coleta
E dê ao fiscal o nome
A velha disse se dane
Do meu sangue ninguém come
Eu não gosto de soldado
Pegue a reta e vá furando
Peço que me deixe em paz
Antes que eu vá me zangando
Ou vocês querem que eu dê
De pé na bunda chutando
Disse o fiscal está presa
A sua mercadoria
Vá falar com Seu Ageu
Guarda da Coletoria
Não posso estar empalhado
Aqui nesta porcaria
Quando ele disse assim
A velha se engrenguenou
Saltou de lado da banca
Um mocotó agarrou
Passou-lhe no pé do ouvido
O fiscal ali tombou
Aí o povo invadiu
Naquela ocasião
A fateira como doida
Como mocotó na mão
Quando raspava de lado
Dois ou três iam pro chão
Disse a fateira hoje aqui
Com essa feira eu acabo
Botou logo pra correr
Um cara metido a brabo
Com o mocotó na mão
Ficou pior que o diabo
Dois soldados e o sargento
Caíram nesse paleio
Nisso chegou o véi dela
E entrou também no meio
Comum cacete de quina
Eu já vi serviço feio
E o pau falou no centro
Todas fateiras entraram
Defendendo sua parte
De mocotó se armaram
Não ficou banco de pé
Nessa hora reviraram
Quando o mocotó batia
Revirava de fileira
Quatro ou cinco de uma vez
Era aquela brincadeira
Pois nem o diabo ia perto
Do pé de boi da fateira
Uma fateira valente
Numa tripa deu um bote
E com a tripa na mão
Dava em gente de magote
Ond ela metia a tripa
Era igualmente um chicote
Era um dia de Missa
O padre correu pra fora
Dizendo meu povo calma
Que é isso minha senhora
As fateiras o agarraram
Como doidas nessa hora
Entraram igreja a dentro
Naquela revolução
Quebraram todas cadeiras
Que tinha sobre o salão
Vela, santo e oratório
Iam botando no chão
Bateram no altar -mor
Derrubaram ao Padroeira
E o povo todo em cima
Para pegar a fateira
Da rua para a igreja
Era aquela bagaceira
Quebraram Santa Sofia
Quebraram São Severino
Quebraram São Aniceto
Quebraram São Guilhermino
Quebraram Santo Agostinho
Quebraram São Marcelino
Quebraram Santa Tereza
Quebraram Santa Izabel
Quebraram Santa Cecília
Quebraram São Gabriel
Quebraram São Bonifácio
Quebraram São Rafael
Quebraram São Benedito
Quebraram São Ananias
Quebraram São Damião
Quebraram São Zacarias
São Renato e Santo Abel
São Joaquim, São Jeremias
Uma fateira agarrou
São Paulo e deu-lhe um sopapo
O Santo correu gritando
Desta eu sei que não escapo
E a fateira gritou
Corra senão eu lhe capo
Derrubaram São Luiz
Quebraram São Benedito
Derrubaram Santo Onofre
Quebraram Santo Expedito
O que foi de Santa fêmea
Foi um estrago esquisito
Santo Antônio caminhante
Já se ia escapulindo
São Miguel e São Ricardo
Ainda estavam sorrindo
São Sebastião olhou
Ainda viu o pau tinindo
A velha meteu a mão
Em cima do oratório
Sã o José se abaixo
E pegou-se em Santo Osório
Mocotó inda bateu
Na cara de São Gregório
São Benedito correu
Arrodeando um coreto
Dizendo valha-me Deus
Senão hoje eu me derreto
Estão dando em Santo branco
Quanto mais em Santo preto
Meteram o mocotó
Também em São Nicolau
São Judas Tadeu ficou
Mais mole do que mingau
A barba de São José
Quase voava no pau
São Jorge no seu cavalo
Saiu furando de espora
E o povo do barulho
Correu pela rua afora
E as fateiras exemplando
Todo mundo nessa hora
E não teve um argumento
A luta do mocotó
Onde a mão de boi batia
Era até de fazer dó
Terminou correndo todos
E elas ficando só
Foi grande o prejuízo
Nesse dia em Cachoeira
A polícia nunca mais
Quis prender uma fateira
E nem também o fiscal
Cobrou mais o chão de feira
Hoje tem outro prefeito
Vive tudo sossegado
A fateira ainda hoje
Vende tripa no Mercado
Ali só se paga o chão
Mas ninguém é coletado
Caçoada com fateira
Aquele que inventar
Mande logo abrir a cova
Pra nela se enterrar
Inácio, o fiscal da Feira
Na Serra de Cachoeira
Aguentou foi de amargar
Literatura de Cordel quarta, 24 de janeiro de 2018
O ENCONTRO DA VELHA QUE VENDIA TABACO COM O MATUTO QUE VENDIA FUMO (FOLHETO DE JOÃO PARAFUSO)
Leitores, peço atenção
Que agora vou descrever
Um livro de palhaçadas
Par ao bom amigo ler
Quem escutar vai sorrir
Para a barriga doer
Havia uma família
De matuto no sertão
Um certo casal que tinha
De filhos grande porção
Que sempre falava errado
Deixando interpretação
Este velho de quem falo
Era irmão de Zé do Chole
Chamava João Palascate
Filho de Pedro Tingole
E a sua esposa era
Maria do Bago Mole
Tinha um cavalo melado
Que era de Damiana
Mais uma besta castanha
Essa pertencia à Juana
E tinha o bode Rachado
Pertencente à Mariana
Seu Lascado era um menino
Que a família criava
Um porco era o Lascão
Que Iracema tratava
O cabeludo de Zefa
Era um gato que caçava
Então o filho do velho
Que se chamava Luiz
Vendia raiz de pau
Vivia muito feliz
O povo da vizinhança
Chamava-o Doutor Raiz
Uns vendiam tapiocas
Outros vendiam cocada
Iracema só com rola
Que pegava de emboscada
A velha só com tabaco
Ou se não castanha assada
Júlia vendia maxixe
Levava em grande porção
O velho só com banana
Do sítio do seu irmão
Que era o tal Zé do Chole
Vendendo fumo na mão
Eu que vivo viajando
Vinla do alto sertão
Na Feira de Cajazeiras
Uma certa ocasião
Vi um bando de matutos
Fiquei prestando atenção
Quando cheguei perto deles
Tudinho se levantou
Ou ouvi Zefa dizer
Essa vez agora eu vou
Butar as coisa de fora
Que a feira já começou
O velho disse pra ela
Acho mió esperar
Anda tá muito cedo
Nem convém você butar
As coisas de fora agora
Que o povo só quer pegar
Disse a velha a Iracema
O movimento tá poco
A vez o negócio tá
Fraco assim mode o pipoco
Arranhe a tapioca
Para o povo ver o coco
Damiana disse eu tou
Sentindo um grande comicho
Tirei um bicho do pé
Lá no Sítio do Rabicho
Pegou comichar agora
Bem no buraco do bicho
O velho disse pra velha
Você com esse bizaco
Venda tabaco ligeiro
Porque ele não é fraco
Só não deixe butar dedo
Pra remexer o tabaco
O velho com as bananas
Começou desarrumar
Eu tenho a penca comprida
Quem quiser pode encostar
Que eu vendia raiz
Assim começou gritar
Que sofre do intestino
Use cipó cabeludo
Eu garanto botar verme
Pequeno, médio e graúdo
Leve sol, chuva e sereno
Cague fora e coma tudo
O velho com as bananas
Uma mulher veio olhar
Dizendo quero uma palma
Ele disse vou mostrar
Leve uma penca comprida
Que a senhora vai gostar
Ele mostrou, ela disse
Essa está muito madura
Disse o matuto a senhora
Só gosta da que atura
Se não quiser levar mole
Vai levar mesmo da dura
Veja se eu não abro bem
Eu sou um sujeito macho
Trago banana pra feira
Quase madura no cacho
E quando eu tou arrumando
Atolo a dura por baixo
E os maxixe de Júlia
Se quer pode reparar
Depois nós faz outro preço
Se você quiser levar
Eu boto os maxixes fora
Mas deixo a banana entrar
A mulher pegou uma alma
De banana e perguntou
Dá essa por 2 mil-réis
Ele se admirou
E disse não posso dar
Que a banana alevantou
Zé do Chole numa palma
Oferecendo boró
Palascate perguntou
O Seu Culá tá mió?
Penso que Seu Cula teja
Já de pió a pió
Zé do Chole disse assim
Eu não sei lhe explicar
Se Seu Cula teja bem
Eu também já fui de lá
Não vou lá porque não tem
Dinheiro pra cumer lá
Disse o outro nosso mano
Morreu, Chica tá em paz
Seu Lascado ela me deu
Eu fiquei com o rapaz
Quem batia em Seu Lascado
Agora não bate mais
Abra a boca e diga lá
Tá boa a rapaziada?
Minha mulher tá agora
Fogosa que tá danada
Quando não vende tabaco
Vive de castanha assada
Zefa quando vai dançar
Se penera com despacho
Tá tão vadia que ontem
Raspou os pelos de baixo
Do sovaco e foi dançar
Agarrada com um macho
Amanhã em vou vender
Rachado de Damiana
O Cabeludo de Zefa
Melado de Mariana
O Lascão de Iracema
E a Castanha da Joana
O burro cego de Júlia
E a cabra de Rafael
O Lascão de Iracema
Eu entrego à Izabel
E o Lasca do da velha
Vou deixar pra Misael
Maria Seabra hoje
Queria vir mais Xixi
Mas passou um caminhão
Cheinho de abacaxi
E trepei com a menina
Viemos parar aqui
Disse o matuto do fumo
Para a velha como agrado
Se quiser fumar do bom
Eu tenho do macacado
Do que entala e da queda
Deixa o cachimbo lascado
A velha disse o fumo
Foi banhado em mel de furo
Desse que deixa o pigarro
Só tem que é mais escuro
Só gosto de fumo forte
Cheiroso, bem grosso e duro
O fumeiro disse diga
À mãe que eu tou aqui
E trate dos animal
Diga também à Bibi
Que se aguente com o buraco
Que eu só vou lá pra abrir
Diga à Chica que a roça
Cuide logo de limpar
Zele a minha macaxeira
Deixando a cova lascar
Que eu só tiro de dentro
Quando a mandioca engrossar
Esse pedaço de fumo
Leve pra Chica fumar
Ela gosta do boró
Mais este aqui vou mandar
Por see preto, grosso e duro
É capaz dela gostar
Daqui a duas semanas
Duas cartas vou mandar
Uma por dentro da a outra
Lembrança de Capalá
Porque uma chegando
É fácil a outra chegar
O fiscal se retirou
Deixou o velho ficar
Ele entrou numa loja
Foi uma calça comprar
Tinha uma pendurada
Ele pediu pra olhar
A mulher da loja disse
Está ruim pra tirar
Eu tenho outras melhores
Mas ele pegou teimar
Achei melhor a trepada
Outra não quero levar
Achei melhor a trepada
Só digo porque conheço
Porém sem eu pegar nela
Um tostão não ofereço
A senhora tire a calça
Que depois nós faz o preço
Ela trepou e tirou
Ele disse com moitim
O seu fundo é largo e chato
Gosto de ver calça assim
Abra as pernas bem abertas
Pra ver se ela dá em mim
Saiu João Palascate
Com a calção do agrado
O seus lhe acompanharam
E saiu todo apressado
Aqui amigos leitores
Vou terminar o tratado
Literatura de Cordel quarta, 17 de janeiro de 2018
A MOÇA QUE CASOU 14 VEZES E CONTINUOU DONZELA (FOLHETO DE APOLÔNIO ALVES DOS SANTOS)
No outro século passado
na fazenda Jequié
havia uma donzela,
religiosa de fé
no seu batismo lhe deram
o nome de Salomé
Salomé era uma virgem
de estimada simpatia,
filha de um fazendeiro
criou-se muito sadia,
era a moça mais formosa
do estado da Bahia
Contava 22 anos
aquela jovem tão bela
sempre, sempre aparecia,
namorado para ela
casou-se 14 vezes
e continuou donzela.
Um daqueles namorados,
que Salomé arranjou,
era um rapaz forte e moço
em poucos dias casou,
mas sua morte súbita
todo mundo admirou.
Porque em menos dum ano
que ele tinha casado,
começou enfraquecendo
pálido e desfigurado
a noite deitou-se vivo
e amanheceu finado.
Salomé ficou viúva,
a noite inteira chorou
o seu primeiro marido,
a morte ingrata o levou
mas que ainda era virgem
a ninguém nada contou.
Acontece que um dia
na festa dum batizado,
viuvinha arranjou
o segundo namorado
com 15 dias casou-se
num dia tão festejado.
Por segurança dos bens
casou também no juiz
a sua lua de mel
foram passar em Paris
Salomé voltou viúva
chorando a sorte infeliz.
Mas continuou a mesma
Viúva virgem sem sorte
porque o segundo esposo,
que era sadio e forte
esse também embarcou,
no barco negro da morte.
Porém Salomé por ser,
viúva de polidez
não demorou muito tempo,
casou-se terceira vez
com outro rapagão moço,
filho de um português.
Esse não durou um mês
começou ficando fraco
amarelo cadavérico,
da grossura dum cavaco
em poucos dias também
foi pra dentro do buraco.
Todo povo comentava,
– este caso é muito sério
o que há com Salomé
até parece um mistério,
já três maridos que ela
manda para o cemitério.
A quarta vez para ela
apareceu um baiano
um rapagão muito forte
descendente de cigano
noivaram no mês de outubro
casaram no fim do ano.
Esse também se findou,
no próximo ano vindouro
começou se definhando,
e o povo fazendo agouro
que no fim do mesmo ano,
também entregou o couro.
Coitada da Salomé
ficou viúva de novo
vivia tão pensativa,
calada que só um ovo
envergonhada de ouvir,
o comentário do povo.
Após passar muito tempo,
lamentando a desventura
apareceu outro jovem,
de forte musculatura
foi o quinto esposo dela
a entrar na sepultura.
Logo apareceu o sexto
era um rapaz arrasado
vendo que ela era filha
de um velho recursado
pensando enricar também
acertou logo o noivado.
Embora contrariado,
o velho o casório fez
esse também morreu logo
vivo não passou um mês
Salomé ficou viúva,
pela sua sexta vez.
Casou pela sétima vez
com um rapaz forasteiro
tocador de violão
boêmio e aventureiro
esse casou-se em dezembro
e faleceu em janeiro.
Certo dia ela contou
aquele segredo dela
a uma sua amiguinha
lhe dizendo: Maristela
Já me casei 7 vezes,
mas ainda estou donzela.
E logo pediu a ela
para guardar o segredo
porém a amiga falsa
no outro dia bem cedo
saiu pela vizinhança
espalhando aquele segredo.
O povo pra criticar
lhe chamavam na surdina
de viúva mata sete
ou viuvinha assassina
assim a pobre vivia,
lastimando a sua sina.
Os homens todos diziam
o fato não é comum
já se casou 7 vezes
e ainda está em jejum,
porque é que seus maridos
não fica vivo nenhum?
Assim a pobre vivia
neste dilema sofrido
por onde passava ouvia
do povo o “estampido”
– lá vai a viúva virgem
matadora de marido.
Ela vendo que ali,
rapaz nenhum lhe queria
por está muito manjada,
decidiu-se certo dia
viajar pra outro estado
que ninguém lhe conhecia.
Salomé saiu dizendo,
aqui eu não volto mais
partindo se despediu,
de seus extremosos pais
foi parar no Amazonas
a terra dos seringais.
Casou-se no Amazonas
Com um velho seringueiro
com 59 anos
mas ainda era solteiro
em pouco tempo também,
deu serviço ao coveiro.
Para encurtar a história,
Salomé foi se casando,
até inteirar quatorze
e viúva ia ficando
por fim se desenganou
sua sorte praguejando
Naquilo havia um mistério
que ninguém não conhecia,
que Salomé se casava,
o seu marido morria
o porquê desse mistério,
nem mesmo ela sabia.
Foi um bruxo que queria
se casar com Salomé
e apaixonou-se por ela,
um dia num candomblé
mas ela lhe deu um fora
mandou-o chupar picolé.
Por isso o bruxo maldito
fez pra ela um malefício
que a pobre Salomé
vivia neste suplício
levando todos maridos
à borda do precipício.
Toda vez que ela casava
o feitiço acontecia
porque na noite de núpcia
seu marido adoecia
sem conhecer a doença,
pelo desgosto morria.
Porque na primeira noite,
na hora do tererê
que o marido encostava
o seu corpo em Salomé
a sua moral caía
nunca mais ficava em pé.
Porém o seu último esposo
por ser esperto e matreiro
correu logo e procurou
um famoso feiticeiro
pra desmanchar o feitiço
do bruxo catimbozeiro.
Perguntaram a Salomé
se ela se lembraria
o nome daquele bruxo
de tamanha covardia
que fizera para ela
essa horrenda bruxaria.
Ela disse que sabia
o nome do infiel
então o segundo bruxo
logo pegou num papel,
escreveu em cruz o nome,
do feiticeiro cruel.
Disse para Ezequiel
vou desmanchar o feitiço
porém só por 2 milhões
posso fazer o serviço
e você pode assumir
sua esposa sem enguiço.
Ezequiel conseguiu
findou-se todo o mistério
Salomé ficou feliz
desfrutando aquele império
após enterrarem o nome
do bruxo no cemitério.
Ainda teve dois filhos
A moça de Jequié,
Livrou-se da bruxaria,
vivendo cheia de fé
Ezequiel adorava,
Sua esposa Salomé.
Literatura de Cordel quarta, 10 de janeiro de 2018
A VOLTA DE CAMÕES E NOVAS PERGUNTAS DO REI
Camões fez várias proezas
Muitas não foram contadas
Porém é incalculável
As que já foram versadas
Leia a volta de Camões
E dê boas gargalhadas
O leitor deve lembrar-se
Da última que Camões fez
Que correu deixando o reino
Depois o rei Milanês
Mandou chamá-lo de volta
Para o reinado outra vez
Camões voltou mas ficou
Bastante desconfiado
Milanês com falsidade
O recebeu com agrado
Dizendo: - Sentimos falta
De você neste reinado
Eu sei que fui o culpado
De tudo o que aconteceu
Vamos viver o presente
Que o passado já morreu
Camões pensava consigo
Vou lhe mostrar quem sou eu
O rei sempre procurava
Um jeito pra dar-lhe fim
Um dia Camões estava
Passeando no jardim
O rei lhe vendo o chamou
E foi lhe dizendo assim: -
Camões você é esperto
Então irá decifrar
Perguntas que vou fazer
Pra você adivinhar
Se errar uma somente
Eu o mando degolar
Camões disse: – Senhor rei
As suas ordens estou
Pergunte com rapidez
Que alguém ali me chamou
O rei disse: – então escute
E pra ele assim falou
Camões você me responda
E aqui perante o povo
Este problema que eu trago
É antigo e não é novo
Não se quebra com marreta
Mais se quebra com um ovo?
Camões disse: – Senhor rei
Esta pra mim é comum
Durante o ano têm muitos
Mas eu nunca guardei um
Digo com toda certeza
Que é um dia de jejum
O rei foi para o palácio
Com raiva e enfurecido
Dizendo consigo mesmo
Tudo que eu faço é perdido
Mas vou encontrar um jeito
Pra matar este bandido
Um dia Camões estava
Bastantemente feliz
O rei perguntou-lhe: o que
Mais cheira neste país?
Camões disse:- Não é rosa,
Nem cravo é o meu nariz.
O rei disse pra Camões
Nós dois estamos em guerra
Você parece que é
O mais esperto da terra
Então me diga por que
É que o boi sobe a serra?
Camões disse senhor rei
Vou dizer sem cambalacho
O boi possui muita força
Mas sabe o que é, que eu acho.
Que ele só sobe porque
Não pode passar por baixo
O rei disse: – Então responda
Cuidado pra não errar
Qual é o trabalhador
Que vive sem reclamar
Mas um tem defeito que
Só trabalha se apanhar?
Camões coçou a cabeça
Disse o rei nesta eu lhe pego
Camões falou tenha calma
Que ainda não mim entrego
Quem trabalha quando apanha
Na minha casa é o prego
O rei disse está exato
Revelador de segredos
Um dia eu vi lá na mata
Presa entre dois rochedos
Uma mão misteriosa
Mas ela não tinha dedos
Quero que você me diga
Na sua decifração
Qual foi a mão que eu vi?
Se errar vai para a prisão
Camões sorriu, e lhe disse:-
Foi uma mão de pilão
O rei respondeu, assim...
Já que você é sagaz
Quero que responda esta
Mostrando que é capaz
Só cresce antes de nascer
Nascendo não cresce mais?
Camões disse: – Senhor Rei
Com essa eu não mim comovo
Que ela é fácil de mais
Para mim e para o povo
É um bichinho redondo
Que nós chamamos de ovo
O rei disse: - Um deles tem
Cabeça e não tem miolo
Um tem miolo e não tem
Cabeça e parece um bolo
Me diga quem são os dois?
Veja se sai desse rolo
Camões disse: – Eu vou dizer
Sem fazer meditação.
É algo que precisamos
Um se come, o outro não.
Que o primeiro é um prego
E o segundo é um pão
O rei disse:– Então me diga
Na sua sabedoria
A onde é que está o boi
Às doze horas do dia?
Se errar você irá
Morar numa cova fria
Camões disse:– Eu tinha um boi
Um dia montei-me nele
Desci até o riacho
Para ir dá água a ele
E vi ele às doze horas
Em cima da sombra dele
Disse o rei esta correto
Você é muito perito
Veja se responde esta
Com estilo e gabarito
Diga onde é que passa o boi
Porém não passa o mosquito?
Camões disse é no buraco
Da teia de uma aranha
Onde o mosquito se engancha
Ela vem e lhe abocanha
Mas o boi passa rompendo-a
E ela não lhe apanha.
Rei Milanês afastou-se
Com uma raiva danada
E Camões também seguiu
Direto a sua morada
Mais esperando do rei
Logo em breve uma cilada
Com oito dias Camões
Por Milanês foi chamado
Chegando ao palácio o rei
Já tinha se acalmado
Pra fazer novas perguntas
Tinha tudo planejado
Foi perguntando a Camões
Diga se for competente
O que é que não tem boca
Mas come porque tem dentes?
Camões respondeu: serrote
Serrando rapidamente
O rei respondeu: – Camões
Você é um cabra da peste
Mais só escapará desta
Se agora passar no teste
Me diga qual é o pano
Que nenhum vivente veste?
Camões disse: – Eu tenho fé
No autor da criação
Pois foi ele quem me deu
O dom de adivinhão
E o pano que ninguém veste
É o pano de facão
O rei disse: – Muito bem
Nesta eu não lhe recrimino
Reconheço que você
É um sujeito ladino
Então me diga por que
Onça não pega menino?
Camões lhe disse: – O senhor
Deve estar com brincadeira
Onça não pega menino
Porque não é a parteira
O rei disse: – Eu faço outra
Pela seguinte maneira
Me diga o que é que anda
E vai pra todo lugar
Todos vemos mas ninguém
Consegue lhe segurar
E se ela entrar num riacho
Sai dele sem se molhar
Camões lhe disse:– É a sombra
De gente, ou de animal.
Com essa resposta o rei
Fez uma pausa geral
Pensou e disse responda
Se não irá se dá mal
Tem mais ou menos um palmo
Não é carne nem é osso
Quando envermelha a cabeça
Corre um caldo do pescoço
Com essa pergunta o povo
Fez ali grande alvoroço
Depois foram se acalmando
Camões disse: com certeza
Moça quando quer casar
Precisa de uma e deseja.
É uma vela que ela
Vai acender na igreja.
O Rei disse:– me responda
Esta que não é comum
O que é, que nesta terra.
Cada padre possui um
Até o papa tem dois
E Jesus não tem nenhum?
Camões disse: Eu lhe respondo
Sem fazer nenhum desdém
No nome de papa e padre
Observem muito bem
Que possui a letra p.
Mas no de Jesus não tem.
O Rei disse pra Camões
Essa você respondeu.
Quero quer você mim diga
Quem foi que nunca nasceu
Mas no dia que morreu
A própria mãe o comeu?
Camões disse:– Senhor Rei
Minha língua não emperra
Foi Adão que foi criado
Com o pó da própria terra
Morreu na certa ela come
Quem vive certo e quem erra.
Camões me diga o que é
Quem faz pra si não deseja
Quem nele está, não o vê!
Quem vê diz: – Deus me proteja.
Todos querem fugir dele
Por mais bonito que seja?
Camões disse: – Essa eu respondo
Com certeza é um caixão
Com um morto dentro dele
Sem saber qual a razão
Quem o vê não quer estar
Naquela situação
O Rei disse: – Muito bem
Outra lhe perguntarei
Foi na água que eu nasci.
E na água mim criei
Se me jogarem na água
Eu na água morrerei?
Camões disse: esta eu respondo
Até mesmo sem pensar.
É o sal que na comida
Dá o melhor paladar
É retirado de dentro
Das profundezas do mar.
O Rei disse pra Camões
Comprovaste a tua fama
Responda-me esta pergunta
Ligeiro sem fazer drama
O que é que a pessoa faz
Ao levantar-se da cama.
Camões disse: – Senhor Rei
Eu posso lhe afirmar
Que esta pergunta, eu já sei.
Porque pude observar
Pode prestar atenção
Que o primeiro é se sentar
Camões eu fui visitar
O meu Conselheiro Braz
E vi alguém trabalhando
Com a cabeça pra trás
Diga-me agora quem era
Se não achar que é de mais
Camões disse: – era a agulha
Que estava costurando
Com a cabeça para trás
Alguém num pano furando
Eu digo e não tenho medo
Pois sei o que estou falando
Disse o rei para Camões
Já vi que és competente
Responda-me esta pergunta
Procure na sua mente
Tem barba mas não é homem
Tem dente mais não é gente?
Camões falou: – eu lhe digo
Ligeiro e não me atrapalho
Que uma perguntinha dessa
Responderei e não falho
Na minha terra e na sua
É a cabeça de alho
Camões você me responda
Um homem entra na luta
Levando uma companheira
Porem ela não escuta
Mas o seu ouvido é bom
Sendo ruim não labuta
Que ouvido é esse dela
Que não escuta ninguém
Apesar de estar bom
E quem é ela também?
Se você não responder
Não verá o ano que vem.
Camões disse senhor Rei
Casamento é uma sina
E por companheira surda
Só quero uma carabina
Mas sendo mulher prefiro
A sua filha Cristina
O Rei disse: – pra Camões
Exijo que me respeite
Não fale na minha filha
Tenha cuidado e se ajeite
E me responda porque
Vaca parida dá leite?
Camões disse:– Senhor Rei
Com gosto vou responder
Vaca parida dá leite
Porque não sabe vender
Mas de me tornar seu genro
Talvez possa acontecer
Eu digo assim porque sei
Que a princesa a mim adora
O Rei teve tanta raiva
Que quis pegá-lo na hora
Porem Camões mais esperto
Dizendo assim foi embora
O rei no mesmo momento
Chamou Cristina atenção
E perguntou minha filha
Responda-me sim ou não
Se você ama Camões
De todo o seu coração
Cristina disse: – Papai
Se foi Camões a falar
Agora eu tenho certeza
Que comigo quer casar
Eu pensei que ele estivesse
Somente a me enganar
O Rei disse minha filha
Eu estou admirado
Vamos fazer uma festa
Comemorar seu noivado
Porém pensava consigo
Eu mato aquele danado
O Rei tinha um jardineiro
Que se chamava Crispim
Sujeito muito perverso
Da espécie de Caim
Desses que odeia o bom
E adora o que é ruim
O Rei foi à casa dele
Chamou, ele respondeu
Porém quando abriu a porta
Vendo o rei estremeceu
Depois perguntou com medo
Que quer do criado seu?
O rei disse: – Vai haver
Uma festa de noivado
De Camões com minha filha
O dia já está marcado
E eu tenho para você
Um trabalho complicado
Pegue este anel de brilhante
Com cuidado e atenção
Chegue perto de Camões
Na hora da agitação
E solte no bolso dele
Que ele passa por ladrão
Ali no meio da festa
Eu digo que fui roubado
Depois de examinar todos
O brilhante é encontrado
Ele é pego com o roubo
E será morto enforcado
Tudo ficou acertado
Até o dia da festa
Camões sem saber de nada
Será que escapa desta?
Agora é que vamos ver
Se adivinhação presta
Todos foram convidados
Até que chegou o dia
O noivado anunciado
Foi uma grande alegria
E Camões bem satisfeito
Beijava a noiva e sorria
Porém o tal jardineiro
Por perto dele passou
E o anel do rei de brilhante
No seu bolso colocou
O rei viu e no momento
Gritou alguém me roubou
A festa parou e foi
Um por um examinado
Chegou a vez de Camões
Foi o anel encontrado
O rei ordenou que ele
Depressa fosse amarrado
Camões ia ser levado
Direto pra guilhotina
Mais antes que o levassem
Disse a princesa Cristina
Deixai o réu defendesse
Segundo a lei determina
Não se condena ninguém
Sem ouvir a sua defesa
Se é culpado ou inocente
Precisamos ter certeza
Todos ali concordaram
Com a proposta da princesa
O Rei disse: – Está correto
Minha filha tem razão
Hoje Camões morrerá
Se não der a explicação
Como o meu anel sumiu
Do dedo da minha mão
Fez-se silêncio geral
Entre todos no salão
Esperando que Camões
Perante o Rei da nação
Desse provas que não era
Como acusado, um ladrão.
Camões disse: – Ontem à noite
Eu tive um sonho ruim
Que alguém com um anel
Aproximou-se de mim
E essa pessoa era
O jardineiro Crispim
Nesta hora o jardineiro
Começou a se tremer
E disse: –Tudo o que eu fiz
Foi com medo de morrer
Sendo uma ordem do rei
Tive que lhe obedecer
O rei combinou comigo
Pra na festa eu colocar
O anel dele em seu bolso
E depois lhe acusar
E assim talvez conseguisse
Um jeito de lhe matar
E quando estava dançando
Com a princesa eu passei
Por perto e o anel do rei
No bolso e coloquei
Confesso que foi só esse
O crime que pratiquei
Camões respondeu: – Por mim
Você estás perdoado
A culpa é do nosso Rei
Que fez tudo planejado
Obedecestes porque
A ele és subordinado
Ali todos deram vivas
Pra Camões adivinhão
O Rei na vista de todos
A ele pediu perdão
Dizendo: – És o meu genro
Futuro Rei da Nação
Liberto Camões ficou
Alegre junto a Cristina
Logo após o casamento
Viajaram pra Palestina
E foram viver felizes
Segundo a lei nos ensina
Literatura de Cordel quarta, 03 de janeiro de 2018
AS PERGUNTAS DO REI E AS RESPOSTAS DE CAMÕES (FOLHETO DE SEVERINO G. DE OLIVEIRA)
Leitor, se vós escutar
Esta pequena proposta
Da descrição de Camões
Acha interessante e gosta
Ouvindo o que ele fez
Ri para cair de costa
Camões foi um enjeitado
Ninguém sabe onde nasceu
Dizem que acharam ele
Na porta de um fariseu
Num dia santificado
De Santo Bartolomeu
O Fariseu quando achou
Levou-o para criar
Com 5 anos botou
Camões para estudar
Com 6 anos ele aprendeu
Ler, escrever e contar
Com 7 anos, Camões
Não era mais inocente
Começou a viajar
Pelo mundo abertamente
Profetizando o futuro
O passado e o presente
Na hora que o Rei soube
Desse Camões afamado
Mandou logo um Conselheiro
Depressa dar-lhe um recado
Que viesse com urgência
Comparecer ao Reinado
Camões, recebendo a ordem
Do Rei, seu superior
Foi direto ao Reinado
Chegando lá com amor
Saudou o Rei, depois disse
Ás ordens, Rei meu senhor
O Rei disse pra Camões
Ouça o que vou lhe dizer
Eu tenho 30 perguntas
Para você responder
E faltar uma das tais
Sem recurso vai morrer
Camões respondeu ao Rei
Meu trabalho é complicado
Porém o senhor comigo
Vai tomar o bonde errado
Faça lá suas perguntas
Que sou um pouco vexado
O Rei disse a Camões
Tu és um menino novo
Vou fazer-te uma pergunta
Aqui perante ao povo
Qual é o melhor da galinha
Camões respondeu o ovo
Com l ano e 4 meses
No dia de Carnaval
O Rei encontrou Camões
E perguntou afinal
Camões, me diga dom quê
Ele respondeu com sal
O Rei gritou, ora bolas
Agora eu vou enrascá-lo
Camões, você vá na Corte
Ante de cantar o galo
Não vá vestido nem nu
Nem a pé nem a cavalo
Camões pensou ali consigo
O Rei comigo não pode
Vestiu-se numa tarrafa
E assanhou o bigode
E para a casa do Rei
Saiu montado num bode
Camões chegando gritou
Chegou eu aborrecido
Nem a pé, nem a cavalo
Não cheguei nu nem vestido
O Rei disse nem o cão
Dá jeito a esse bandido
O Rei com essa resposta
Quase dava-lhe um murrinho
Chamou Camões e lhe disse
Você com a ordem minha
Vai desleitar um boi
Amanhã de tardezinha
Quando foi no outro dia
Camões saiu preparado
Perto da casa do Rei
Deu um grito agigantado
Quando o Rei olhou na porta
Camões vinha disparado
Quando Camões foi passando
O Rei disse credo em cruz
Ande vai? Camões disse
Com a ordem de Jesus
Vou buscar uma parteira
Que meu pai quer dar a luz
O Rei disse mentiroso
Me diz agora onde foi
Que viste homem dar luz?
Nessa vez Camões disse oi
Me diga qual é a terra
Que se tira leite em boi?
Nessa hora, o rei ficou
Em ponto de se morder
Disse Camões, me responda
Sob pena de morrer
Quanto mais cresce mais míngua
O que é que quer dizer?
Camões disse, Senhor Rei
A coisa está decidida
Um velho de 80 anos
Já tem idade crescida
Quanto mais cresce a idade
Mais minguam os dias de vida
Disse o Rei vou fazer outra
Preste atenção no momento
Quanto mais tira, mais cresce
Responda, em fingimento
Se você responder esta
Eu sei que é bem atento
Camões deu uma risada
Com gesto de mangação
Olhou para o Rei e disse
Vou dizer, preste atenção
Quanto mais tira, mais cresce
É um buraco no chão
O Rei ficou se mordendo
E saiu encabulado
Chegou em casa pensando
Qual era o plano acertado
Quando acertou disse eita
Morreste, Camões danado
Chamou Camões e lhe disse
Se não disser vai pra taca
Vou fazer uma pergunta
Responda se for matraca
Por que é que o bezerro
Só viaja atrás da vaca?
Camões respondeu ao Rei
Eu digo perfeitamente
Eu como não tenho estudo
Tenho cá na minha mente
Ele anda atrás da vaca
Porque ela vai na frente
O Rei responde está certo
Me respondeu na razão
Quero que responda outra
Qual é o animal então
Que luta com três sentido?
Dê-me essa explicação
Camões disse é um cachorro
Magro que só bacalhau
Com um sentido, ele late
Com outro, defende-se de pau
O outro vai no nariz
Farejando o bicho mau
O Rei disse adivinhou
Mas tenho outra pra dizer
Se firme, preste atenção
O que vou lhe esclarecer
Se não der resposta certa
O jeito é você morrer
Camões disse para o Rei
Minha língua não emperra
O Rei disse então responda
Ligeiro sem fazer guerra
Quem é que nasce e não morre
Em cima de nossa terra?
Camões disse, Senhor Rei
O meu pensar não é torto
Isso que o senhor pergunta
Só parte de um aborto
Quem nasce, não morre mais
Com certeza nasce morto
O Rei disse eu tenho outra
Para você responder
A pergunta é a seguinte
Responda se se atrever
O que é que o homem faz
Que Deus não pode fazer?
Camões disse para o Rei
Vou responder com franqueza
Muitos homens se embriagam
E caem até na fraqueza
De Deus não fazer isso
Eu tenho plena certeza
O Rei disse muito bem
Me responda num segundo
Quero que responda outra
Com seu pensar iracundo
Me diga qual o vivente
Que não tem amor ao mundo?
Camões respondeu é peixe
Que dentro das águas corre
Porém quando vê o mundo
E alguém não lhe socorre
Ligeiro perde a ação
Com 5 minutos morre
O Rei disse está certo
Mas vai perder seu valor
Com esta pergunta agora
Que vou fazer ao senhor
Me diga quem está acima
De Jesus o Salvador?
Camões disse eu vou dizer
Com a fé que tenho nele
Agora neste momento
Eu sou forçado a dizer-lhe
Quem vive acima de Cristo
Só é a coroa dele
O Rei ficou aí pensando
Com a tal declaração
Disse esse Camões danado
Não em cara de cristão
Pelo jeito me parece
Ser protegido do cão
Porém disse ali consigo
Agora eu vou lhe enrascar
Chamou Camões e lhe disse
Outra eu vou lhe perguntar
E esta eu quero ver
Você dizer sem pensar
Preste atenção, veja esta
Que muito decente eu acho
Me responda esta pergunta
Cuidado, não passe embaixo
Qual é o animal que
Nasce fêmea e morre macho?
Camões disse, Senhor Rei
Isso eu já sei o que é
É um bichinho pequeno
Peto da cor de café
É pulga e só vira bicho
Depois que entra no pé
Disse o Rei vou dizer outra
Talvez você não conheça
Se não for experiente
Talvez que você padeça
Qual é o bicho que anda
Com os pés sobre a cabeça?
Camões disse esta pergunta
Para mim serve de molho
É mesmo que um cozido
Com coentro, couve e repolho
Quem bota os pés na cabeça
Só pode ser um piolho
O Rei disse este danado
O cão é amigo dele
Na charada e na pergunta
No mundo ninguém dá nele
Pelo jeito que eu vejo
Nem o cão enrasca ele
Mas eu tenho outra pergunta
Para ele responder
Chamou Camões de lhe disse
É pra você me dizer
O que é que quem não tem
Também não deseja ter?
Camões pensou um pouquinho
E nessa ocasião
Chamou o Rei e lhe disse
Na minha decifração
Eu tenho pra mim que é
Doença, intriga e questão
O Rei ali levantou-se
E lhe disse vagabundo
Me responda outra pergunta
Em menos de um segundo
Divida a Terra e me diga
Onde fica o meio do Mundo?
Camões pegou um compasso
Com muita coragem e fé
Fez uma roda no chão
E no meio botou o pé
E disse para o Rei olhe
O meio do mundo onde é
O Rei disse pra Camões
Não interrompa a escrita
Me diga qual é a dor
Que todo homem palpita?
Camões sorriu e lhe disse
É uma moça bonita
Com essa resposta o Rei
Saiu todo encabulado
Chegando em casa contou
De Camões o resultado
A Rainha disse eu
Enrasco aquele danado
Nisso, a Rainha pegou
Um urinol cor de vinho
Superlotou-o e noite
E saiu muito cedinho
E onde Camões passava
Deixou ele no caminho
Quando Camões foi passando
Olhou, ficou abismado
Pegou o vaso dizendo
É muito certo o ditado
Quem não come da galinha
Rói os ossos e bebe o caldo
Camões sempre acostumava
Nesse lugar, à tardinha
Olhar para a atmosfera
Em uma pedra que tinha
O Rei, que sabia disso
Convidou logo a Rainha
Quando foi de manhãzinha
Da Corte os dois viajaram
Às cinco e meia da tarde
Na dirá pedra chegaram
Levaram ela e logo
Por baixo um papel botaram
Quando botaram o papel
Camões chegou apressado
Subiu na pedra e ficou
Olhando pra todo lado
Naquilo, o Rei perguntou
Que fez que está assombrado?
Camões disse Senhor Rei
Amargura não dá mel
Saiba Vossa Senhoria
O Mundo não está fiel
Porque a Terra subiu
A altura de um papel
Nessa hora, o Rei voltou
Pra casa desenganado
Chegando em casa formou
Um pensamento acertado
Dizendo com esta agora
Eu mato aquele danado
Depressa chamou Camões
E foi lhe dizendo assim
Eu quero que você faça
Um trabalho para mim
Com este, ou você escapa
Ou, na falta, leva fim
O trabalho é pra você
Ir lá naquele sobrado
Arrancar um cabedal
Que tem num quarto enterrado
Pra ver se por este meio
Acaba o mal-assombrado
Camões disse são muitos
Lá cada quarto tem três
Só não posso é arrancar
Todos eles de uma vez
Seis, garanto ao senhor
Em dar-lhe um todo mês
O Rei disse muito bem
Do que se passou eu lembro
Nosso contrato está feito
Hoje é 15 de novembro
Basta me dar o primeiro
No meado de dezembro
Camões foi lá ao sobrado
E um buraco cavou
Depois comprou uma jarra
No mesmo canto enterrou
Começou a estercar dentro
Até que superlotou
Quando a jarra estava cheia
Camões cobriu desta vez
Com 100 moedas de ouro
E saiu com rapidez
Foi convidar o Rei mesmo
No dia que fez um mês
O Rei saiu com Camões
Sem fazer cara de choro
E quando chegou no quarto
Que viu o grande tesouro
Disse camões eu preciso
Tomar um banho de ouro
Pegou a jarra e amarrou
Sob os caibros do telhado
Ficado debaixo dela
Bateu com um ferro pesado
Quando a jarra abriu-se em bandas
Foi merda pra odo lado
Camões desertou dali
E não quis mais brincadeira
Reinou tristeza na Corte
E nessa hora fagueira
Lembram-lhe este folheto
Do trovador Oliveira
Literatura de Cordel sábado, 30 de dezembro de 2017
O BICHO SERRA (CORDEL DE AUTORIA DESCONHECIDA)
O BICHO SERRA
Autor Desconhecido
Será esse o Bicho Serra?
(Agradecimentos ao escritor Robson José Calixto, colunista do Almanaque Raimundo Floriano, pela postagem da foto do suposto Bicho Serra. E ao primo João Ribeiro da Silva Neto, líder do Big Brasa, por ter recuperado a letra deste cordel, que seu pai, Alberto Ribeiro da Silva, meu primo, declamava nos tempos de outrora.)
O velho Mané Sinhô,
Achava-se num deserto,
Deitado de c* aberto,
Chegou um bicho e entrô.
Entrô, saiu e voltou,
Indo e vindo agoniado,
Dizem que o bicho é pelado,
Mas tem o pé cabeludo,
Roliço, porem nervudo,
Cego, rombudo e furado.
O bicho não é de carne,
De osso também não é,
Não tem braço nem pescoço,
Não se senta, fica em pé.
É liso que nem muçu,
Carrega os ovos num saco,
Na falta de outro buraco,
Costuma entrar pelo c*.
Não sei dizer o seu nome,
Ou se existe algum capricho,
Negar o nome do bicho,
E só fazer a descrição,
Me diga, Napoleão,
Que eu quero ver tão-somente,
Pra ver se na minha terra,
Tem esse bicho da serra,
Que entra no c* de gente.
Fica triste quando come,
Vomita o que não engole,
Ora está duro, ora mole,
Não sei dizer o seu nome.
Diz, porém, a Dona Chica:
"Se a capa for de pelica,
Feita por mãe-natureza,
Pode afirmar com certeza,
Que o nome do bicho é pic@!”
Literatura de Cordel quarta, 27 de dezembro de 2017
A PROPAGANDA DE UM MATUTO COM UM BALAIO DE MAXIXE (FOLHETO DE JOSÉ PACHECO)
Caros apreciadores
Na Feira do Caldeirão
Eu ouvi a propaganda
De um matuto do sertão
E já portanto escrevi
Tudo que vi e ouvi
Na sua conversação
Não é só a propaganda
Com também a disputa
Do fiscal com o matuto
Que quase dá-se uma luta
O mesmo livro contém
O comentário também
De uma mulher matuta
Quando o matuto chegou
Às Nove horas do dia
Com um balaio de maxixe
Era o que ele trazia
E dez almas de banana
Se o espírito não me engana
Foi essa a mercadoria
Espalhou no meio da Feira
Fez propaganda e gritou
Em tenho os maxixe grande
Agora mesmo encostou
Banana comprida e prata
Ma eu num vendo barato
Cá banana levantou
São 10 penca de banana
6 prata e 3 solancó
E uma penca comprida
Qui ainda é mai mió
Quer dizer que forma dez
Dou por um conto de réis
Entra a penca no cocó
As banana é de primeira
Os maxixe são graúdo
Um rapaz lhe perguntou
Quanto o senhor quer por tudo
Disse ele novecentos
Disse o rapaz dou quinhentos
Disse o matuto é canudo
Sendo somente as banana
O senhor por quanto dá
Ficando os maxixe fora
As banana pode entrar
Dou tudo por oitocentos
Não bote os maxixe dento
E vamos negociar
Minha banana tá mole
Pruque eu sou cuidadoso
Se trago a banana dura
Num vendo, fico raivoso
De madura tá vermeia
A casca por fora é feia
Mai o miolo é gostoso
Se os maxixe são grande
As banana inda são mai
Eu trouxe foi pra vender
Todo negócio se fai
Porém se ninguém compra
De tarde eu vou vortá
Com os maxixe pra trai
Ali chegou um parente
De tal matuto beócio
E lhe disse meu cumpade
Cuma vai o teu negócio
Cumpade, eu vou bem pur cá
Vai me dizendo pua lá
Cuma vai passando os nosso
Cuma vai cumade Chica
Sá Caboca e Zé Vintém
As menina de Tingole
E todos mai que lá tem
Tá todo bem e disposto
Disse o matuto é meu gosto
Qui tudo lá teja bem
Gosto danosa catinga
Pru muito seca que seja
Tu dá lembrança a Tingole
Pruque tra vei eu num veja
Recebi de Zé Bochudo
Lembrança pá cá pá tudo
Dessa terra sertaneja
Disse o matuto não sabe
Zefa fugiu com Fernande
Quem é esse, meu cumpade
Aquele que vende frande
Roubou ela da Serrinha
Correu a noite todinha
Passou na Pindoba Grande
Chegou o fiscal da Feira
Trazendo uns papéis na mão
E disse vamos matuto
Pague o direito do chão
Disse o matuto seu guarda
Ainda não vendi nada
Não tenho dinheiro não
Tinha 200 mil-réis
Comi de sarapaté
Comprei 4 pão fiado
E 3 chica de café
Isso aqui não é meu só
Porque a penca maió
E os maxixe é da muié
Não estou lhe perguntando
Pelos seus particulares
Estou cobrando imposto
Isto é e todos lugares
Não quero articulação
Se não quiser pagar chão
Vá negociar nos ares
Disse o matuto eu num pago
Nem um tostão dessa asneira
Qualquer coisa que se bota
No Mercado ou nessa Feira
O senhor vem com espanto
Cobrando tanto e quanto
Isso não é ladroeira?
O cobrador respondeu
Não admito porfia
Você não pode vender
Retire essa porcaria
Porcaria não senhor
Disse o matuto é favor
Tratar por mercadoria
A mulher do tal matuto
Chegou nessa ocasião
E um filho deles dois
Acabaram a discussão
Pagando a justa quantia
Que o cobrador queria
Pelo direito do chão
Venderam tudo de vez
Por mais ou menos dinheiro
Porque o retalhador
Que se chama verdureiro
Botou preço e atacou
Depois de justo pagou
Por quanto eu não dou roteiro
Foi-se embora o cobrador
Começaram a conversar
A mulher disse meu veio
Agora vou te contá
Quando tu vei mai João
Na tua costa um ladrão
Fo no poleiro roubá
Eu não peguei mai no sono
Já era de manhãzinha
Eu vi bulir no poleiro
Estrumei a cachorrinha
Quando Piaba peitou
O ladrão se abaixou
E vi ele cá galinha
Arribei os 3 cachorro
Peixim, Cascudo e Xerém
Pela brecha da parede
Vi mai não conheci bem
Dispoi reparei por baixo
Vi que era um cabra macho
Por um buraco que tem
E eu já hoje avisei
A cumade Manuela
Que é pa cumade ter
Cuida do ca casa dela
E cuma ela é vizinha
Ela pode ter ca minha
E eu muito mai ca dela
Disse o matuto muié
Nós precisa se cuidá
Se tranca todos os bicho
Mode o ladrão num roubá
Fale com a Fulozina
Venda os bicho das menina
Mas o seu deixe ficar
Venda a porca da Zefa
A cabra da Filismina
O capado da Zabé
A jumenta da Firmina
A besta russa da Chica
E a castanha da Lica
Vai ficá pra Bernardina
Venda o burro do Cosme
E o galo de Damião
A bezerra da Quitéria
O cachorro do Gusmão
A bacorinha da Terta
A borrega da Roberta
E o bode azul do Simão
A muié disse meu véio
Você com uma faceta
Já falou nos bicho todo
Es as garça da Riqueta?
Quanto são, nós também tranca
Disse ela 8 é branca
E 9 ca garça preta
E que se foi dos cachorro
O Pintado e o Felpudo
E o Melado ele disse
Num se vende fica tudo
Chico fica cu Pintado
Eu vou ficar cu Melado
E você cu Cabeludo
Depois da Feira voltaram
Às quatro horas e meia
Não sei eu horas chegaram
Talvez na hora da ceia
Quando os pobres camponeses
Por não erem luz às vezes
Acendem a pobre candeia
Finalmente terminei
Me desculpa populaça
A linguagem do matuto
Hoje é diversão na praça
Porque a conversação
É torta que só cordão
Dentro do bolso da calça
Literatura de Cordel quarta, 20 de dezembro de 2017
É BENEDITO ALVES TIU, FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO
o sertão do cariri Dentro do Sítio Ventura Começou a aventura Que eu vou contar aqui Quando estive lá ouvi E quem falou não mentiu Até sua mulher riu E disse fique à vontade Para falar a verdade De Benedito Alves Tiu
Antes de tudo que fez Vou dizer quando nasceu Se não for engano meu Foi no dia vinte e três E dezembro foi o mês Em que o menino surgiu Num cantinho do Brasil Cujo nome é até longo É de Santana do Congo O Benedito Alves Tiu
O ano foi trinta e um E o Estado Paraíba Não quero que se exiba Mas já ouvi o zum zum Que jamais em tempo algum Valente igual não se viu Quem o enfrentou sumiu Dizendo na região Só tem Brás e seu irmão O Benedito Alves Tiu
Naquele bravo sertão Cortava palma pro gado E plantava no roçado Algodão, milho e feijão Assim esse cidadão Seu sustento garantiu Mas quando dali partiu Pra morar noutra cidade Enfrentou dificuldade O Benedito Alves Tiu
Não se sabe exatamente Se fez alguma besteira Pois quando foi pra Pesqueira Foi tudo tão de repente Perguntei a muita gente Porque foi que ele partiu Mas quem sabia só riu Sem querer me dizer nada Pois é um bom camarada O Benedito Alves Tiu
Pra não viver de arrego Resolveu sair dali Partiu para Ouricuri À procura de emprego Porém não teve sossego E até saudade sentiu Então ele desistiu Voltando a terra do doce E foi lá que empregou-se O Benedito Alves Tiu
Mesmo sem habilidade Porém com muito vigor Foi trabalhar no motor Que dava luz à cidade Quando a eletricidade No nordeste evoluiu E a Paulo Afonso surgiu Ele foi aproveitado Por já ser capacitado O Benedito Alves Tiu
Voltando ao velho sertão Apenas pra passear Começou a namorar Uma filha de Bião Bonita e de tradição Como igual nunca se viu Mas quando a mão ele pediu Cunhados acharam ruim Porém casou mesmo assim O Benedito Alves Tiu
Com graça e com formosura Dona Socorro Pereira Quando chegou à Pesqueira Foi pra máquina de costura Hoje ta na prefeitura E também já assumiu A cadeira que surgiu De professora do Estado Tendo sempre lhe apoiado O Benedito Alves Tiu
Homem do sertão sofrido Que não cursou faculdade Tem a grande qualidade De ter nos filhos investido Lutando neste sentido Bom resultado já viu Pois ele já conseguiu Ter cinco filhos formados E tem dois encaminhados O Benedito Alves Tiu
Veranice era Tostão Dentro do seu arrebol Só porque no voleibol Dava muita empolgação Seu pai sentiu emoção Num jogo que assistiu Mas logo ela desistiu Para fazer faculdade Dando mais felicidade A Benedito Alves Tiu
Ela hoje é Enfermeira A profissão de Ana Nery E como o nome sugere É doutora de primeira Pois dedicou-se à carreira Com isso muito subiu Porém nunca se exibiu Mas seu nome sempre brilha E é a primeira filha De Benedito Alves Tiu
Vaneide era agitada Quando era pequenina Dizem até que essa menina Já deixou gente internada Porém sempre foi prendada E com um jeito sutil Quando cresceu conseguiu Ser professora do Estado Deixando mais sossegado O Benedito Alves Tiu
Não quis ir pra capital Para poder estudar Preferindo se casar Na sua terra natal Porém ela não fez mal Porque ali garantiu Outro emprego que surgiu E também fez faculdade Satisfazendo a vontade De Benedito Alves Tiu
Walkíria muito queria Cursar uma faculdade E pra sua felicidade Alcançou num belo dia Entrou em Sociologia Porém futuro não viu Então ela desistiu E fez Secretariado Deixando mais animado O Benedito Alves Tiu
Sua vida melhorou Logo no segundo emprego Pois sem precisar de arrego Em um concurso passou Foi trabalhar no Metrô Onde o salário subiu E o que mais conseguiu Pra ter vida predileta Foi dar um genro poeta A Benedito Alves Tiu
Nasceu José Valderi Que foi seu segundo filho Porém teve pouco brilho Pois ao céu teve que ir Mas pra substituir Outro garoto surgiu Pacato e também gentil Valderi Alves Pereira Fotocópia verdadeira De Benedito Alves Tiu
Formou-se em Agronomia E é muito competente Também é fã do repente E é bom de poesia Porém nossa parceria Que há muito tempo surgiu Somente se repetiu Na base do vai não vai Para falar do seu pai O Benedito Alves Tiu
Cristiane a mais mimada Ao chegar à capital E ver a vida infernal Ficou um pouco assustada Mas foi muito aconselhada Até que o medo sumiu Então ela insistiu Fazendo vestibular Pra poder tranqüilizar O Benedito Alves Tiu
Para sua alegria Passou no vestibular E o que a fez vibrar Foi passar no que queria Pois fez Odontologia Como a Deus ela pediu Além disso conseguiu Dá mais prazer ao painho Porque ela é o denguinho De Benedito Alves Tiu
O filho Chateaubriand Para mamãe é o dengo Porque nem mesmo o flamengo Consegui ter tanta fã Todo metido a galã Meu conselho já ouviu Porque a AIDS surgiu E eu disse tome cuidado Pra não deixar preocupado O Benedito Alves Tiu
Quando veio estudar Aqui nesta capital Pra fazer primeiro grau E tentar vestibular Chegou até a chorar Porque saudade sentiu Mas logo desinibiu Estudando com fervor E quer ser mais um doutor De Benedito Alves Tiu
Elétrico durante o dia Também de noite na cama Programou o ponta de rama Que é a sua alegria Pois nasceu como queria Um filho forte e viril Simpático e de muito brio Retrato de muito amor Que mostra todo vigor De Benedito Alves Tiu
Júnior de jeito pacato Estuda primeiro grau Jamais fez uma final Sendo do pai um retrato Porque este é sempre exato Assim dizem de Seu Biu Apelido que surgiu De amigos da profissão Sendo ele a emoção De Benedito Alves Tiu
Literatura de Cordel quarta, 13 de dezembro de 2017
A COLETA SELETIVA E A RECICLAGEM DE LIXO (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
Da Consciência Ecológica Devemos sempre lembrar Pois quem pensa no futuro Para a vida melhorar Não gera lixo jamais Só gera materiais Que possamos reciclar
Nós devemos começar Lembrando que antigamente O lixo era tudo aquilo Que não servia pra gente Mas hoje pro nosso bem Nosso lixo agora tem Um conceito diferente
O Lixo é basicamente O que a gente joga fora Que não servia pra nada Mas que hoje se explora Porque as sobras humanas De aglomerações urbanas Têm utilidade agora
Diferente de outrora Fazemos separação De tudo que é reciclável E do resto do lixão Porque garrafas pintadas Podem ser utilizadas Por quem faz decoração
Pra fazer a seleção De todos materiais Vamos separar os plásticos Papéis, vidros e metais Pois pra mandar reciclar Nós devemos afastar Esse lixo dos demais
Problemas ambientais Como a poluição Produzida pelo lixo Faz mal a população Hoje temos consciência Que o lixo da residência Deve sofrer redução
E pra isso a solução É a gente praticar A Coleta Seletiva Que consiste em separar O lixo que é descartável Do que é reaproveitável Para mandar reciclar
Reciclar é transformar Os materiais usados Noutros produtos que possam Ser comercializados E a Minimização Dos resíduos do lixão Pressupõe ter três cuidados
Três termos utilizados Para se minimizar O primeiro é Reduzir Depois Reaproveitar Pra que o verso não emperre O outro também tem R O R de Reciclar
Nós devemos separar Entre os materiais Os que não são recicláveis Como pratos e cristais Alimentos estragados E lixos contaminados Não se juntam aos demais
Pra todos materiais Existem recipientes Que facilitam a Coleta Tendo cores diferentes E a identificação É uma padronização De todos os continentes
Cinco cores diferentes Devemos utilizar No VERDE botamos vidro Mas sem precisar quebrar Pois com o vidro quebrado Se não for bem colocado Alguém pode se cortar
No AZUL vamos botar Todo lixo de papel Que seja grande ou pequeno Botaremos a granel E para não se enganar Todos devem procurar Aprender neste cordel
E dentro desse plantel De cores pra reciclagem VERMELHO é para o plástico Que serve de embalagem AMARELO é pra metal Que às vezes até faz mal Guardado numa garagem
Terminando essa listagem Do que é reaproveitável Tem recipiente CINZA Pro lixo não reciclável E assim quando for comprar Você deve procurar Embalagem retornável
Outra atitude louvável É pensar nos descendentes Não destruindo o planeta Com atos inconsequentes E o maior dos desafios É não agredir os rios Com produtos poluentes
As lâmpadas fluorescentes Nós devemos reciclar Pois elas liberam gases Que podem contaminar O solo e a água da gente Indo consequentemente Pra cadeia alimentar
Já tinha ouvido falar Em alguma reportagem Sobre a decomposição Chamada de Compostagem Agora eu tenho certeza Que com ela a natureza Faz a sua reciclagem
Microorganismos agem Nessa decomposição E animais invertebrados Têm a participação Na presença de umidade Eles fazem na verdade A sua alimentação
Com essa grande ação Eles ajudam a gente Porque transformam o lixo Em um adubo excelente E Deus com sua grandeza Mostra que a Natureza Preserva o Meio Ambiente
E assim daqui pra frente Nossa preocupação É dizer pra todo mundo Que temos obrigação De fazer o impossível Para acabar, se possível Com toda poluição
Vamos transmitir então Para o público em geral Que a Coleta Seletiva Hoje é fundamental E além de não poluir Ajuda a diminuir O aquecimento global
Ela é essencial Porque causa redução Dos gastos com energia E custos de produção Mas também se recomenda Porque gera emprego e renda Na comercialização
Ela tornou-se uma ação Barata e eficiente Pra proteger as florestas E a saúde da gente Se todo mundo ajudar Juntos, vamos preservar O nosso Meio Ambiente
Recife – outubro/2009
Literatura de Cordel quarta, 06 de dezembro de 2017
PRAZERES E VÍCIOS DO CIGARRO (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
Todo fumante me diz Fumar é muito gostoso E antes de acender Todo cigarro é cheiroso Mas quem aprende a tragar Com certeza vai entrar Num processo vicioso
Se você for cauteloso E prestar bem atenção Vai ver que pra ser fumante Tem mais de uma razão Além do doce e café Um outro motivo é Vício de imaginação
Vou dá uma explicação Sobre esse vício danado Basta o sistema nervoso Andar um pouco abalado Depois de dá um pigarro Bota na boca um cigarro Sem nem sequer ter notado
Hoje já está provado Na química e na medicina Que o vício de fumar É devido à nicotina Pois dentro de um vivente Deixa ele dependente Dessa triste toxina
O fumo é quem determina O seu viver rotineiro Pois não sabe fazer nada Sem esse seu companheiro Não tem fossa de vontade Pra buscar a liberdade E sair do cativeiro
Se acaso for ao banheiro De noite ou de madrugada Quando se deita na cama A pessoa viciada Mesmo que tente fugir Nunca consegue dormir Antes de uma tragada
Quando está com uma amada Por mais que faça esparro Percebendo que deixou Sua carteira no carro Deixa de lado quem ama Se levantando da cama Para ir buscar cigarro
Coloca cinza no jarro Quando não lhe dão cinzeiro E quem dele se aproxima De longe sente seu cheiro Porque quando um cidadão Bota um cigarro na mão Já polui o corpo inteiro
Parece até um bueiro O nariz de um fumante Um cigarro atrás do outro É fumaceiro constante Irritando muita gente Poluindo o ambiente E o cabelo da amante
Ele inventa a todo instante Um motivo pra tragar Quando bebe um gole dágua Procura logo fumar Porém não é invenção É sua submissão Que não pode dominar
Mal acaba de acordar Procura logo um cigarro Também a caixa de fósforos E um cinzeiro de barro Se estiver resfriado Depois que tiver tragado É que vai soltar o catarro
Depois que solta o catarro Volta a fumar novamente E faz isso tão ligeiro Que nem ele mesmo sente Antes de ingerir comida Deixa a casa fedida E polui a sua mente
Eu conheço muita gente Que começou a fumar Ainda na adolescência Somente pra se mostrar Hoje que está viciado Muitas vezes tem tentado Mas não consegue deixar
Só o fato de tragar Aumenta mais o prazer O cabra acha gostoso Depois é que vem saber Que ele foi programado Pra lhe deixar viciado E do fumo depender
Quando acaba de comer Um prato doce ou salgado Só sacia sua fome Depois que tiver tragado Essa é a triste sina De quem deixa a nicotina Fazer-lhe um viciado
Um fumante inveterado Não sente sabor nem cheiro Tendo consciência disso Pensa em deixar ligeiro Não precisa de estudo Pra saber que além de tudo Vive queimando dinheiro
É igual a cachaceiro Porque na vida não manda E nas suas decisões O cigarro é quem comanda Também é discriminado Pois além de isolado Em muitos carros não anda
Quando escuta a propaganda Do cigarro preferido Se estiver num local Cujo fumo é proibido Se afasta do lugar Só para poder fumar Sem ver que foi induzido
O cabra fica esquecido Se o cigarro lhe faltar Porque o fumo na mente Além de envenenar Também causa dependência E trás como conseqüência Não poder raciocinar
Quem por acaso andar Com um fumante ativo Mesmo odiando cigarro É um fumante passivo Porque em uma tragada A fumaça que é jogada Tem muito gás que é nocivo.
Esse é mais um motivo Pro cabra ser alertado Pois além da nicotina E do alcatrão falado O fumo tem componentes Pra matar seus dependentes E quem tiver ao seu lado
Não quero ser abusado Só quero lhe ajudar Por isso nesse momento Eu vou procurar mostrar Que além de bom pigarro Tem mais males que o cigarro Em breve vai lhe causar
Um edema pulmonar Uma asma, uma bronquite Uma angina no peito Talvez você não evite Sendo uma cabra de sorte Antes de chegar à morte Terá úlcera e gastrite
Aumentando o apetite Pelo cigarro padrão Você pode ter certeza Irá perder a tesão Se com isso não morrer Você ainda vai ter Um bom câncer no pulmão
Antes de ir pro caixão Terá esquizofrenia Aliás, essa doença Já é comum hoje em dia Por isso pra se salvar É melhor você deixar O vício que asfixia
Pra sair dessa agonia Precisa ter disciplina E ter força de vontade Para mudar a rotina Se não consegue sozinho Então o melhor caminho É partir pra medicina
O vício da nicotina Faz tudo mudar de rumo Pois além de dá prazer Ele estimula o consumo Até eu que era obeso De fumar e perder peso Um dia quase que sumo
Quem acredita que o fumo Faz conquistar avião Achando que dá status E lhe faz cidadão Depois vai ficar sozinho Sem avião nem carinho Em um maldito caixão
Tragar nos dá emoção É magia indefinível E para quem é fumante Ter que parar é terrível Mas posso lhe garantir Que se você decidir Vai ver que será possível
Nada lhe é impossível Ou tão difícil na vida Quando a força de vontade Por você é comedida Controlando a emoção Agindo pela razão Toda batalha é vencida
Quem saiu dessa com vida Hoje vive muito bem Pois não precisa pedir Nem dar cigarro a ninguém Vê a vida com amor Quando sente o sabor Que uma comida tem
Agora para o seu bem Deixo aqui o meu recado Pra você ser mais feliz Deixe o cigarro de lado Eu já cumpri meu papel Escrevendo este Cordel Até mais, muito obrigado.
Literatura de Cordel quarta, 29 de novembro de 2017
GERAÇÕES DE POETAS E REPENTISTAS QUE DIVULGAM A CULTURA NORDESTINA (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
Estou dividindo os tempos De quem foi bom repentista Faço a partir de oitocentos Cinco Gerações na lista Que a nata NUNES DA COSTA Teve a Primeira conquista
Essa família de artista Da cidade de Teixeira Teve o pai AGOSTINHO Para a Paraíba inteira Depois NICANDRO e UGULINO Seguiram sua carreira
Esta Geração Primeira Teve como descendente Uma família famosa Na viola e no repente É a família “Batista” Que canta até o presente
Falando de antigamente O MANOEL SERRADOR Junto com o BILINGUIM Formou dupla de valor E foi BERNADO NOGUEIRA Um grande improvisador
Sendo o maior cantador Da segunda geração É SILVINO PIRAUÁ Quem dá nome à divisão Pois ele fez a “sextilha” Modificando o “quadrão”
Para sua geração “Pirauá” serviu de elo Criando a “regra da deixa” E inventando o “martelo” Fazendo o nosso repente Cada vez ficar mais belo
Pelo nome dele eu zelo Mas não caio na besteira De dizer que foi maior Que ROMANO DO TEIXEIRA Pois esse foi o seu mestre Em toda sua carreira
Tinha ANSELMO VIEIRA No Ceará pra cantar Além de NECO MARTINS Cantador bom de lascar E ZÉ PRETINHO que criou O “Galope à beira-mar”
Eu agora vou voltar À cidade de Teixeira Lembrando FERINO GOIS Um cantador de primeira E GERMANO DA LAGOA Que não levava rasteira
Lembro CLAUDINO ROSEIRA Do agreste pernambucano E o filho do “Teixeira” Que foi JOSUÉ ROMANO Outro grande cantador Do solo paraibano
Seguiram no mesmo plano INÁCIO DA CATINGUEIRA Com JOSÉ QUEIROZ MORENO Junto a GAUDÊNCIO PEREIRA E um grande potiguar Foi MANOEL CABACEIRA
Teve GALDINO BANDEIRA O maior da divisão Na arte de fazer rima E da improvisação Que nos deixou quatro netos Para quarta geração
MANOEL PRETO LIMÃO Foi um grande repentista E o CEGO CESÁRIO LOPES Foi da terra do artista JOSÉ MARTINS PIRAUÁ Irmão do dono da lista
Essa terra é de artista Falo sem dizer boatos Pois já deu XICA BARROSA Para confirmar os fatos Por dar “Silvino” e “Galdino” Eu parabenizo a Patos
Devido aos anonimatos A lista não sai inteira Mas nela eu vou falar Que VITORINO FERREIRA Foi avô de dois da quarta E pai de dois da terceira
Levando sua carreira De Timbaúba pro mundo Ninguém pode esquecer Quem foi MANOEL RAIMUNDO O maior “martelador” E um poeta profundo
Foi primeiro sem segundo O ZÉ DUDA DO ZUMBI Que nasceu na Paraíba E veio viver aqui Sendo o maior repentista Segundo um livro que li
Essa eu não engoli Mas não vou julgar sozinho Quero apenas lembrar De um JACÓ PASSARINHO E de PEDRO BELARMINO Que estava neste caminho
ZÉ VICENTE é deste ninho Que só tem bom repentista Junto com HELENO BELO E ANTÔNIO GUEDES BATISTA Sobrinho de “Ugulino” Que foi da primeira lista
ODILON NUNES na lista De quem sabe improvisar Encontrou JOÃO MALAQUIAS Por este mundo a cantar E FRANCISCO PEQUENO fez Pedras de Fogo vibrar
Agora vamos falar Da Terceira Geração Que tem PINTO DE MONTEIRO Como representação Pois ele foi o maior Repentista da Nação
A minha admiração Pela inspiração que tinhas Me faz de pedir, ó Pinto Para abençoar as minhas Pois vou sair das “sextilhas” E entrar nas “sete linhas”
Hoje por onde caminhas Tu deves ter bom destino Porque encontras poetas Do tipo de ASCENDINO Desta tua geração Também partiu AZULÃO E JOAQUIM BERNARDINO
Foi JOAQUIM VITORINO Outro bom na cantoria Que nasceu em Pernambuco Nos dando muita alegria Porque nos deixou dois filhos Que vão seguindo seus trilhos Nos congressos de hoje em dia
Toda Paraíba ouvia O mestre ANTÔNIO GUERREIRO E ALEIXO DANTAS BARBOSA Da cidade de Monteiro No Rio Grande do Norte Feliz foi quem teve a sorte De ouvi DANIEL RIBEIRO
Faz parte deste celeiro O mestre JOSÉ FAUSTINO Que é pai de “Ivanildo” Outro grande paladino Tem também PEDRO AMORIM E um irmão de “Joaquim” O MANOEL VITORINO
Tem o JOSÉ BERNADINO Do sertão pernambucano Irmão de AMARO e “Joaquim” E teve MANOEL CAETANO Que foi o pai de “Raimundo” E também foi deste mundo ARCELINO AURELIANO
Cantador pernambucano Que também é deste ninho É o JOSÉ ANANIAS Que agora é meu vizinho Em São José do Egito O povo lembra do mito Que foi ANTÔNIO MARINHO
Tem JOSÉ ALVES SOBRINHO Poeta e radialista Que nasceu na Paraíba E teve DIMAS BATISTA Um grande pernambucano Juntamente com seu mano O OTACÍLIO BATISTA
Também LOURIVAL BATISTA Vem aumentar esta frota De São José do Egito Pra quem dez é pouca nota Pra Pernambuco o deleite Foi ROGACIANO LEITE E hoje é JÓ PATRIOTA
Seguindo na mesma rota A Paraíba é primeira Com o poeta do absurdo O saudoso ZÉ LIMEIRA E ainda na Paraíba Vem cantando JOÃO FURIBA Com quem “Pinto” fez carreira
Também tem JOÃO SILVEIRA Dentro desta geração E BELARMINO DE FRANÇA Que nasceu no mesmo chão E o grande MANOEL XUDU Cantou com ZEZÉ LULU Rompendo o nosso sertão
Nessa minha inspiração A Deus eu peço uma luz Pra falar do repentista Que foi JOSUÉ DA CRUZ E em solo paraibano O grande JOÃO CAETANO Não é ouro, mas reluz
A minha mente conduz Pra falar muito mais Lembrando JOSÉ PATRÍCIO E ROMANO ELIAS DA PAZ E também JOSÉ SOARES Que por diversos lugares Também foi dos maiorais
Repentista bom demais E de improviso forte Era DOMINGOS FONSECA Do Rio Grande do Norte Também RAIMUNDO PELADO Que era do mesmo lado E era do mesmo porte
Pena que não tive a sorte De ouvir outro potiguar Chamado MANOEL CALIXTO Que tinha o dom de rimar Mas hoje tem o seu filho Seguindo no mesmo trilho Da arte de improvisar
Um poeta popular E homem de muita fé Está nesta geração PATATIVA DO AÇARÉ Em Monteiro HELENO PINTO Foi irmão do mestre “Pinto” Como ninguém, hoje é.
Remando nessa maré Pernambuco faz bonito Pois teve AGOSTINHO LOPES De São José do Egito Exu mostra seu valor Com o JOÃO SERRADOR Que por lá nunca foi frito
Não ouvi, mas acredito. Que uma das coisas belas É ouvir MANOEL DOMINGOS Da cidade de Panelas Antes da lista vindoura Lembro EDUARDO MOURA Que nunca cantou balelas
Seguindo essas passarelas Vou pra Quarta Geração Em “Décima de sete sílabas” Mas não é exibição Só faço por um motivo É pra não ser cansativo Na minha elucidação
Para esta geração Dois nomes resolvi dar Pois o primeiro lugar Ninguém sabe escolher não Eles deram inspiração Pra esta lista inteira Eu escolhi na carreira Mas sei que você aprova IVANILDO VILA NOVA E o mestre PEDRO BANDEIRA
Neto do velho “Galdino” “Pedro Bandeira” é irmão De CHICO, DAUDETH e JOÃO Que vão no mesmo destino São cantadores de tino Do solo Paraibano E FRANCISCO AURELIANO Lá também fez cantoria BULE BULE da Bahia É cantador sem engano
No Vale do Pajeú Tem o ISMAEL PEREIRA E tem ADAUTO FERREIRA Que é de Caruaru “Eu sou melhor do que tu” Ele cantando alucina JOSÉ GALDINO em Carpina Deixa um negro maluco Esta arte em Pernambuco ANISTALDO LINS ensina
Ceará botou na lista Três cabras bons no repente Pra mim o que vem na frente É o ZENILDE BATISTA Mas neste rol de artista GERALDO AMANCIO é primeiro Ou pode ser o terceiro Porque para lhe ser franco Eu conheço LOURO BRANCO Outro grande violeiro
Tive muitas alegrias E considero foi sorte Do Rio Grande do Norte Já ouvi SEBASTIÃO DIAS Em um congresso há alguns dias Também ouvi ZÉ CARDOSO Que com um verso gostoso Por todos foi aplaudido E ANTÔNIO NUNES tem sido Outro poeta famoso
Tem SEVERINO FERREIRA Nesta terra potiguar Cantador bom de lascar Como SINÉSIO PEREIRA Numa “deixa” de primeira A Paraíba tem mais Como DOMINGOS THOMÁS Também sei que tu te encantas Se ouvir FENELON DANTAS Cantando nos festivais
Quando DINIZ VITORINO Participa de um congresso Ele faz muito sucesso Porque é cantador fino Cantando desde menino Na cidade de Monteiro É segundo ou é primeiro Como disse seu José Pois SEBASTIÃO SILVA é Outro grande violeiro
Pernambuco se levanta Dentro desta nova glosa Com SEVERINO FEITOSA Que no improviso encanta Muita gente se espanta Quando escuta minervina O que também me fascina É ver SANTINHA MAURÍCIO Que canta sem sacrifício “Tudo eu sei ninguém me ensina”
“Comigo o rojão é quente” Diz MOCINHA DE PASSIRA E quem nela se inspira Canta e glosa facilmente É Pernambuco presente Com sua matéria-prima Onde também tá de cima OLIVEIRA DE PANELAS Que faz poesias belas Na junção de versos e rima
DINIZ BATISTA tem tino E Timbaúba aprovou TINDARA também mostrou Que é repentista fino Da terra do paladino “IVANILDO VILA NOVA” JOSÉ GONÇALVES deu prova Que é mestre no repente Já cantou com muita gente E em quase todos deu sova
JOSÉ DIONÍZIO é quente Lá na cidade de Pombos Porque já deu muitos tombos Na viola e no repente É repentista excelente O grande JOSÉ CAETANO Cantador paraibano De muito juízo e tino Como HELENO SEVERINO Do agreste pernambucano
“Decassílabo” eu vou usar Para Atual Geração E na modificação Estou querendo provar Que a arte de improvisar Por ser rica e cristalina Nunca vai virar rotina Como a cantiga dos grilos Pois tem diversos estilos A viola nordestina
Pra dar nome a esta quinta geração Escolhi dois poetas não me engano O primeiro é JOÃO PARAIBANO Resistência da nobre profissão Sendo símbolo da arte no sertão O segundo já é bem conhecido Onde chega cantando é aplaudido Porque é cantador que tem refino Escolhi LOURINALDO VITORINO Porque tem essa arte defendido
Cantador do sertão pernambucano VALDIR TELES empolga no repente Porque é repentista inteligente Como é DIOMEDES MARIANO Pra cantar um “martelo alagoano” EDVALDO ZUZU é um doutor Em Carpina ele é o vencedor Por ser bom no repente e bom de glosa MAXIMINO BEZERRA em Venturosa Também é outro grande cantador
Ceará nos cedeu NONATO COSTA Revelando-se na nova geração Muito novo entrou na profissão Porém onde cantar o povo gosta JOÃO LOURENÇO também não perde aposta Cantadores com ele são fregueses E se ouvires ROGÉRIO MENEZES Com certeza eu sei tu te espantas Foi assim quando ouvi JOMACI DANTAS Dedilhando a viola tantas vezes
Quando canta um “rojão pernambucano” MOACIR LAURENTINO faz bonito E outro cabra que está virando mito É o mestre RAIMUNDO CAETANO Enfrentando FRANCISCO que é seu mano Ele faz uma grande cantoria Como faz um rapaz de Alexandria Que aonde cantar se pede bis Me refiro a FRANCISCO DE ASSIS Um dos grandes poetas de hoje em dia
Vendo ZÉ LUIZ CARLOS no improviso Todo mundo admira seu projeto E também se escutar ZÉ LUIZ NETO A platéia se escancara num sorriso O RAIMUNDO NONATO tem juízo Pra fazer boa glosa e fazer loa E o grande ANTÔNIO LISBOA Faz sucesso na terra potiguar Quando EDÍSIO CALIXTO vai cantar Eu já sei vai ter cantoria boa
Mil desculpas eu vou pedir agora Aos diversos poetas repentistas Que apesar de brilharem como artistas Deste meu cordelzinho ficaram fora Imprensei o que pude a toda hora Sinto muito não deu para escrever Mas a minha homenagem vou fazer Porque sempre os terei na minha mente “Viva sempre o poeta do repente Para nossa cultura não morrer!”
Literatura de Cordel quarta, 22 de novembro de 2017
É ASSIM QUE A GENTE FALA (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
No Brasil pra se expressar
Há diferenciação
Porque cada região
Tem seu jeito de falar
O Nordeste é excelente
Tem um jeito diferente
Que a outro não se iguala
Alguém chato é Abusado
Se quebrou, Tá Enguiçado
É assim que a gente fala
Uma ferida é Pereba
Homem alto é Galalau
Ou então é Varapau
E coisa ruim é Peba
Cisco no olho é Argueiro
O sovina é Pirangueiro
Enguiçar é Dar o Prego
Fofoca aqui é Fuxico
Desistir, Pedir Penico
Lugar longe é Caxaprego
Ladainha é Lengalenga
E um estouro é Pipoco
Qualquer botão é Pitoco
E confusão é Arenga
Fantasma é Alma Penada
Uma conversa fiada
Por aqui é Leriado
Palavrão é Nome Feio
Agonia é Aperreio
E metido é Amostrado
O nosso palavreado
Não se pode ignorar
Pois ele é peculiar
É bonito, é Arretado
E é nosso dialeto
Sendo assim, está correto
Dizer que esperma é Gala
É feio pra muita gente
Mas não é incoerente
É assim que a gente fala
Você pode estranhar
Mas ele não tem defeito
Aqui bala é Confeito
Rir de alguém é Mangar
Mexer em algo é Bulir
Paquerar é Se Inxirir
E correr é Dar Carreira
Qualquer coisa torta é Troncha
Marca de pancada é Roncha
E a caxumba é Papeira
Longe é o Fim do mundo
E garganta aqui é Goela
Veja que a língua é bela
E nessa língua eu vou fundo
Tentar muito é Pelejar
Apertar é Acochar
Homem rico é Estribado
Se for muito parecido
Diz-se Cagado e Cuspido
E uma fofoca é Babado
Desconfiado é Cabreiro
Travessura é Presepada
Uma cuspida é Goipada
Frente de casa é Terreiro
Dar volta é Arrudiar
Confessar, Desembuchar
Quem trai alguém, Apunhala
Distraído é Aluado
Quem estar mal, Tá Lascado
É assim que a gente fala
Aqui valer é Vogar
E quem não paga é Xexeiro
Quem dá furo é Fuleiro
E parir é Descansar
Um rastro é Pisunhada
A buchuda é Amojada
E pão-duro é Amarrado
Verme no bucho é Lombriga
Com raiva Tá Com a Bixiga
E com medo é Acuado
Tocar em algo é Triscar
O último é Derradeiro
E para trocar dinheiro
Nós falamos Destrocar
Tudo que é bom é Massa
O Policial é Praça
Pessoa esperta é Danada
Vitamina dá Sustança
A barriga aqui é Pança
E porrada é Cipoada
Alguém sortudo é Cagado
Capotagem é Cangapé
O mendigo é Esmolé
Quem tem pressa é Avexado
Uma sandália é Percata
Uma correia, Arriata
Sem ter filho é Gala Rala
O cascudo é Cocorote
E o folgado é Folote
É assim que a gente fala
Perdeu a cor é Bufento
Se alguém dá liberdade
Pra entrar na intimidade
Dizemos Dar Cabimento
Varrer aqui é Barrer
Se a calcinha aparecer
Mostra a Polpa da Bunda
Mulher feia é Canhão
Neco é pra negação
Nas costas, é na Cacunda
Palhaçada é Marmota
Tá doido é Tá Variando
Mas a gente conversando
Fala assim e nem nota
Cabra chato é Cabuloso
Insistente é Pegajoso
Remédio aqui é Meisinha
Chateado é Emburrado
E quando tá Invocado
Dizemos Tá Com a Murrinha
Não concordo, é Pois Sim
Tô às ordens é Pois Não
Beco do lado é Oitão
A corrente é Trancilim
Ou Volta, sem o pingente
Uma surpresa é, Oxente!
Quem abre o olho Arregala
Vou Chegando, é pra sair
Torcer o pé, Desmintir
É assim que a gente fala
A cachaça é Meropeia
Tá triste é Acabrunhado
O bobo é Apombalhado
Sem qualidade é Borreia
A árvore é Pé de Pau
Caprichar é Dar o Grau
Mercado é Venda ou Bodega
Quem olha tá Espiando
Ou então, Tá Curiando
E quem namora Chumbrega
Coceira na pele é Xanha
E molho de carne é Graxa
Uma pelada é um Racha
Onde se perde ou se ganha
Defecar se chama Obrar
Ou simplesmente Cagar
Sem juízo é Abilolado
Ou tem o Miolo Mole
Sanfona também é Fole
E com raiva é Infezado
Estilingue é Balieira
Uma prostituta é Quenga
Cabra medroso é Molenga
Um baba ovo é Chaleira
Opinar é Dar Pitaco
Axilas é Suvaco
E cabra ruim é Mala
Atrás da nuca é Cangote
Adolescente é Frangote
É assim que a gente fala
Lugar longe aqui é Brenha
Conversa besta, Arisia
Venha, ande, é Avia
Fofoca é também Resenha
O dado aqui é Bozó
Um grande amor é Xodó
Demorar muito é Custar
De pernas tortas é Zambeta
Morre, Bate a Caçuleta
Ficar cheirando é Fungar
A clavícula aqui é Pá
Um mal-estar é Gastura
Um vento bom é Frescura
Ali, se diz, Acolá
Um sujeito inteligente
Muito feio ou valente
É o Cão Chupando Manga
Um companheiro é Pareia
Depende é Aí Vareia
Tic nervoso é Munganga
Colar prova é Filar
Brigar é Sair no Braço
Nosso lombo é Ispinhaço
Faltar aula é Gazear
Quem fala mais alto ou grita
Pra gente aqui é Gasguita
Quem faz pacote, Embala
Enrugado é Ingilhado
Com dor no corpo, Ingembrado
É assim que a gente fala
Um afago é Alisado
Um monte de gente é Ruma
Pra perguntar como, é Cuma
E bicho gordo é Cevado
A calça curta é Coronha
Um cabra leso é Pamonha
E manha aqui é Pantim
Coisa velha é Cacareco
O copo aqui é Caneco
E coisa pouca é Tiquim
Mulher desqualificada
Chamamos de Lambisgóia
Tudo que sobra, é Bóia
E muita gente é Cambada
O nariz aqui é Venta
A polenta é Quarenta
Mandar correr é Acunha
Ter um azar é Quizila
A bola de gude é Bila
Sofrer de amor, Roer Unha
Aprendi desde pivete
Que homem franzino é Xôxo
Quem é medroso é um Frouxo
E comprimido é Cachete
Sujeira em olho é Remela
Quem não tem dente é Banguela
Quem fala muito e não cala
Aqui se chama Matraca
Cheiro de suor, Inhaca
É assim que a gente fala
Pra dizer ponto final
A gente só diz: E Priu
Pra chamar é Dando Siu
Sem falar, Fica de Mal
Separar é Apartá
Desviar é Ataiá
E pra desmentir é Nego
Quem está desnorteado
Aqui se diz Ariado
E complicado é Nó Cego
Coisa fácil é Fichinha
Dose de cana é Lapada
Empurrão é Dar Peitada
E o banheiro é Casinha
Tudo pequeno é Cotoco
Vigi! Quer dizer, por pouco
Desde o tempo da senzala
Nessa terra nordestina
Seu menino, essa menina!
É assim que a gente fala
Literatura de Cordel quarta, 15 de novembro de 2017
MENINO DE RUA (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)
Eu vi sua indiferença Quando você me olhou Mas por favor, pare um pouco E pense no que eu sou Se eu sou pequeno assim É que a vida não deu a mim O direito de crescer Eu vivo ao Deus nos acuda E preciso de uma ajuda Pra poder sobreviver
Seu filho nasceu feliz Pois pra dormir teve berço Eu também seria assim Se ao menos tivesse um terço Porém o que me sobrou Foi a rua onde estou E não as bancas da escola Sem estudo e sem comer Ao invés de aprender ler Aprendi a cheirar cola
Não me trate por bandido Porque bandido eu não sou Se eu aprendi a pedir A vida é que me obrigou Se eu pudesse escolher Juro que eu queria ser Um menino educado Filho de gente grã-fina Com casa boa e piscina Com saúde e alimentado
Você passa no seu carro Da vida toda contente Me olha de cara feia Como se eu não fosse gente Mas saiba que como os seus Também sou filho de Deus Apenas não tive sorte De ser filho da senhora Por isso eu lhe peço agora Não deseje a minha morte
Se não quer me fazer bem O mal também não me faça Porque eu não sou culpado De viver nessa desgraça Passando necessidade Vejo que a sociedade Esta sim é a culpada Porque na sua ganância Só quer tudo em abundância Deixando o pobre sem nada
Eu não sei o que é carinho Porque mamãe não me deu Pois em toda sua vida Sofreu tanto quanto eu Vivendo pra trabalhar Apenas pra sustentar Os seus filhinhos com vida Vive na infelicidade E ainda na flor da idade Já é uma velha sofrida
Eu sei que na sua casa Tem uma linda cadela E eu já seria feliz Se vivesse igual a ela Pois ela tem boa vida Carinho, banho e comida Cada qual no seu horário E também quando adoece Eu sei que logo aparece Um Médico Veterinário
Enquanto o seu filho tem Dentista, médico e hospital E uma boa enfermeira Se acaso passar mal Eu nunca fui ao doutor E quando sinto uma dor Aumenta mais o meu tédio Pensando que vou morrer Pois não tendo o que comer Como vou comprar remédio
Skates, patins, videogame Seu filho tem desde cedo Eu em toda minha vida Nunca ganhei um brinquedo Sou pequeno e magricela Sem ter nenhuma chinela Para proteger meus pés Vejo o seu filho lindo Ganhando e sempre pedindo O que já tem mais de dez
Sem poder me alimentar Mamãe me mandou pro mundo Mesmo guardando em seu peito Um sofrimento profundo Eu hoje vivo a pedir Sem ter para onde ir Pois meu teto é sol e lua Num mundo sem esperança Sem direito a ser criança Eu sou menino de rua
Recife, 17 de abril de 1993
Literatura de Cordel quarta, 08 de novembro de 2017
O COLORIDO DE COLLOR QUE A GLOBO NUNCA MOSTROU (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
Quero alertar o povo
Par votar consciente
Porque nem sempre o mais novo
É o melhor para a gente
Pois esse Collor de Mello
Que dizem ser o mais belo
Não é novo no cenário
E mesmo sendo de chita
Não é gaiola bonita
Que dá comer a canário
Votar pela aparência
Como muita gente faz
É falta de consciência
Que prejudica demais
Pra concurso de beleza
Até eu tenho certeza
Que Collor é favorito
Mas para ser presidente
E trabalhar pela gente
Não precisa ser bonito
Precisa ter compromisso
Com nossa gente sofrida
Tendo lutado por isso
Desde o início da vida
Precisa capacidade
Além de seriedade
Coisa que Collor não tem
Pois quem esconde o passado
Deixando o povo enganado
É demagogo também
Entre os dez candidatos
Que já estão em campanha
Sejam velhos ou novatos
Cada um tem uma barganha
Collor quer ser diferente
Se dizendo independente
Sem estar comprometido
Mas é tudo marmelada
Pois atrás tem uma cambada
De empresário escondido
Desde bancos nacionais
Deputados e prefeitos
Até multinacionais
Querem que ele seja eleito
Mas a grande Rede Globo
Que faz o povo de bobo
É o seu maior padrinho
Pois Collor na presidência
Vai aumentar a potência
De Seu Roberto Marinho
Collor é proprietário
De rádio e televisão
Mas vejo que empresários
Vivem sempre em comunhão
Porque o SBT
Que sempre quis ser poder
Também entrou no “Complô”
Levando Collor pra “Praça”
Pra “Hebe”, que é sem graça
E programa do “Jô”
Olhando para pesquisa
Não fico preocupado
Mas vejo que se precisa
Mudar este resultado
Pois conheço muita gente
Que inconscientemente
Diz que Collor é mudança
Mas mostrando seu passado
Provo que está enganado
Quem tem essa confiança
Collor que ser novidade
No meio dos concorrentes
Mas veja que na verdade
Seu passado não consente
Antes de ser deputado
Foi prefeito nomeado
Do falido P.D.S.
Foi colega de Sarney
Disso eu também já sei
E quem sabe não se esquece
Collor é renovação
Para quem está por fora
Mas preste bem atenção
No que vou dizer agora
Na eleição indireta
De maneira indiscreta
Em Maluf ele votou
E na antiga Arena
Que ele hoje condena
O seu pai foi senador
Tentando ser presidente
Com o apoio do povo
Só aparece pra gente
Dizendo que é o novo
Mas como vocês tão vendo
O que Collor vem dizendo
Da política brasileira
É só coisa descabida
Pois em toda sua vida
Foi político de carreira
Diz que vai moralizar
A política do país
Mas quando vai começar
Ninguém sabe ninguém diz
Pois Collor na prefeitura
Aprendeu com a ditadura
Que devia apadrinhar
E cinco mil filiados
Ele deixou empregados
Somente para mamar
O que fez na prefeitura
Achou que foi natural
Pois repetiu sem bravura
Na Câmara municipal
Onde provou para a gente
Como é incoerente
O discurso que ele faz
Porque sempre criticou
Mas também foi criador
Dos famosos marajás
ollor reclama que o povo
Está de mal a pior
Mas não soube ser o novo
Na capital Maceió
Pois pra fazer o serviço
Da retirada de lixo
Mais imposto quis criar
E quando alguém reclamou
A polícia ele jogou
Para o povo se calar
Eu não consigo parar
Em falar deste sujeito
Pois pra onde agente olhar
Aparece mais defeito
Diz que é político sério
Mas dentro do seu império
De rádio e televisão
Deixou muitos jornalistas
Sem direitos trabalhistas
Mostrando ser mau patrão
Há muita incoerência
No Collor anda falando
E com certa paciência
Eu vou dizendo e provando
Pois sendo governador
Muita coisa ele aprontou
Com o seu eleitorado
E tendo vida bacana
Nunca esteve uma semana
No governo do estado
Sabendo do que ele fez
Num passado bem recente
Eu mostro mais uma vez
Que Collor é incoerente
O prefeito do interior
Que nunca se filou
Ao seu PRN
Sofreu discriminação
Ficando sem nenhum tostão
Do dinheiro do I.C.M.
Diz ao povo brasileiro
Que vai acabar com a fome
Esquece que sem dinheiro
Nenhum ser humano come
Pois quem foi seu funcionário
Perdeu muito salário
Porque Collor no poder
Foi um grande ditador
E também nunca pagou
Gatilho ou U.R.P.
Para ser renovador
Defende a democracia
Mas um observador
Vê que é demagogia
Pois provou que foi criado
E que também foi cevado
Na estufa da ditadura
Reprimindo jornalista
E também radialista
Pra cultivar a censura
Collor não quer debater
Com outro seu concorrente
Dizendo que vai fazer
A campanha diferente
Mas o medo que ele tem
É que apareça alguém
Para mostrar a Nação
Que a fama que ele ganhou
De ser um renovador
É pura tapeação
É um falso moralista
Pregando seriedade
Pois sendo oportunista
Usou da vivacidade
Quando a veja publicou
Que ele era o “caçador”
Dos famosos “Marajás”
O povo foi enganado.
Porque lá no seu Estado
Ele mesmo é um dos tais
Diz que vai erradicar
O nosso analfabetismo
Mas onde a Globo está
Só vejo oportunismo
Pois ela sempre apoiou
O Governo ditador
Que nos deu tanta inflação
Por isso fique ciente
Se Collor for presidente
Vai ser o fim da Nação
Se a gente for comparar
Com o Reino de Avilan
A Globo é Ravengar
E Collor é Lucian
Pois no lugar de Sarney
Ele será como um rei
Sem ter pena de ninguém
Porque este concorrente
Ao cargo de presidente
É o pior que se tem
Se você ficou chocado
Com tudo que eu falei
Me chame cabra safado
Diga que sou Sarney
Pra poder desabafar
Pode me esculhambar
Dizendo que eu pirei
Pois posso rasgar dinheiro
Mas como bom brasileiro
Em Collor não votarei
Se pensa votar em Collor
Apenas pra protestar
Eu peço por Deus Apolo
Pense antes de votar
Pois o povo brasileiro
Quer da um voto certeiro
Para não ser enganado
Por isso lembro a você
Veja o que vai fazer
Com nosso povo explorado
Ismael Gaião
Condado, junho de 1989.
Literatura de Cordel quarta, 01 de novembro de 2017
JOAQUIM HONROU A SUA TOGA - NÃO DEFENDE SAFADO NEM LADRÃO (FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO)
O Ministro Joaquim honrando a sua toga,
não defende safado nem ladrão
(Mote do poeta Allan Sales)
Allan Sales:
O juiz que mostrou que tem coragem E peitou seu Gilmar tão prepotente Afro toga mostrou que é decente E deixou para nós bela mensagem Com Joaquim não terá tal vassalagem Só justiça terá com tal varão Com Gilmar sem o Dantas na prisão Dona justa que ali toma no boga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Ismael Gaião:
No Brasil muita gente ainda pensa Que a justiça é feita para o povo Mas já vimos que não é fato novo Corrução e a venda de sentença Basta dar uma grande recompensa Que o rico não vai para prisão A Justiça lhe dar a proteção E o povo é quem toma no boga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Allan Sales:
Um juiz que possui dignidade Que falou do decoro do supremo Pois tem cabra que ali é voz do Demo Promover entre nós a impunidade Joaquim com caráter da hombridade Só povão do Brasil é seu patrão Com Gilmar que perdeu a discussão O Brasil por justiça muito roga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Ismael Gaião:
Um prefeito eu vi denunciado Por ter sido eleito ilegalmente A Justiça lhe deu grande presente Pois deixou seu processo arquivado Isso eu vi na cidade de Condado Ocorrer na penúltima eleição Comprovando pra minha frustração Na Justiça o dinheiro é o que voga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Allan Sales:
Joaquim nos honrou com sua fala E falou o que nós aqui pensamos E com ele lutar como lutamos E deixar podridão feder na vala Joaquim cabra bom Gilmar não cala Rabo preso não tem retidão O supremo na voz com decisão O clamor popular nunca se afoga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Ismael Gaião:
O prefeito cumpriu o seu mandato Como se, nada ali fosse errado E ficou para o povo do Condado Que aquilo era apenas um boato Mas eu pude verificar o fato E saber que sem ter filiação O prefeito entrou na eleição E ninguém contra ele advoga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Allan Sales:
Defendeu com coragem o pensamento E falou que Gilmar tem seus capangas E não foi vacilão em meio às zangas Fez de si honorável instrumento Joaquim foi sublime este momento Foste voz do pensar desta Nação Estarás entre nós és nosso irmão O sentir da justiça desafoga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Ismael Gaião:
Eu já vi um Juiz apavorado Com a mudança que houve em Pernambuco Porque ele ficou feito um maluco E depressa saiu lá do Condado Por um tempo fiquei desconfiado Mas depois tive a comprovação Porque esse Juiz tem caminhão E o contrato o prefeito só prorroga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Allan Sales:
Quem falou e peitou tal poderoso E mostrou como faz homem de bem Tribunal bem maior que o povo tem Contra todo chacal mais mafioso Joaquim teve gesto corajoso Nos orgulha tens raça ó negão Foi Zumbi que guiou-te a falação Com Gilmar aplacando tanta goga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Ismael Gaião:
Ministros do Supremo Tribunal Fizeram homenagem a Gilmar Pois um ano acabou de completar Não importa se o que ele faz é mal O que importa é que a Corte Federal Quis mostrar para o resto da Nação Que Joaquim mesmo tendo retidão No Supremo a sua voz não voga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Allan Sales:
Tribunal que será daqui pra frente Com você por demais mais respeitado Um poder tão fulcral de nosso estado Que merece gestão da mais decente O povão massacrado já descrente Com os tais tão venais por profissão Vamos nós pra louvar-te com razão E banir do Brasil toda essa droga O Ministro Joaquim honrando a toga Não defende safado nem ladrão
Recife, 02 de maio de 2009
Literatura de Cordel segunda, 30 de outubro de 2017
O MENINO QUE ATRAVESSOU O ARCO-ÍRIS (FOLHETO DE DALINHA CATUNDA)
1
Vou contar uma história
E garanto que é verdade
Pois o fato acontecido
Deu-se na minha cidade
Com um pai ignorante
Que de maneira arrogante
Quis mostrar autoridade.
2
Juninho era diferente,
Dos meninos do lugar,
Gostava de ver a mãe
Sentadinha a costurar
Fazia casa na mão
Até pregava botão
Tinha jeito pra ajudar.
3
O jovem cresceu alegre
Repleto de animação.
Ô menino dançador!
Dizia a população,
Dançava bem de verdade
Essa era a realidade
Chamava mesmo atenção.
4
Tinha o cabelo bonito
Bem cheiroso e bem tratado
Era muito vaidoso
Mas o pai desconfiado
Achava tão diferente
Aquele faceiro ente
Por ele um dia gerado.
5
Vendo sua mãe ocupada
Corria para ajudar
Botava os pratos na mesa
No almoço e no jantar
Muito jeito ele tinha
Limpava toda cozinha
Pois gostava de arrumar.
6
Um dia Junior chegou
Com as orelhas furadas
Duas bonitas argolas
Nas orelhas penduradas
A mãe achou tão bonito...
O pai meteu logo o grito
Quis dar umas bofetadas.
7
Junior com a ira do pai,
Ficou muito apavorado
Até tentou falar grosso,
Mas saiu desafinado
Pois o pai enfurecido
Via bem enraivecido
O seu filho desviado.
8
Quando a mãe quis defender
Começou a desgraceira.
Pois o pai bradava irado
Um monte de baboseira
Foi a maior confusão
E começou o sermão
Que rendeu a tarde inteira.
9
Menino que usa pulseira,
Tem um destino cruel,
Hoje vai usando brincos
E acaba usando o anel
Levando vida sem lei
Termina virando gay
Não aceito este papel.
10
Juninho bem revoltado
Com aquela situação,
Pensou consigo mesmo
Vou deixar o meu rincão
Sonhava ser passarinho
Bater asas do seu ninho
Pra fugir da opressão.
11
A mãe aflita rezava
Pedindo a nosso senhor
Rogando pelo seu filho
Chorava na sua dor
Pedia com devoção
A Deus uma solução
Implorando com fervor.
12
Resolveu que seu menino
Não seria humilhado
Ele era inteligente
E foi muito bem criado
Podia ser diferente
Porém muito inteligente
E ela estava ao seu lado
13
Mãe e filho conversaram
E chegaram a conclusão
Junior tinha que partir
E deixar o seu torrão
Bem longe do seu lugar
Trabalhar e estudar
Buscando uma profissão.
14
Almejava novo mundo,
Queria crescer na vida.
Foi para cidade grande
Numa atitude atrevida
E viu tudo melhorar
Porque soube batalhar
Procurando uma saída.
15
Não demorou muito tempo
Para mostrar seu talento.
A sua fama crescia,
Também seu contentamento
Correto em sua postura
Fazendo alta costura
Crescia a cada momento
16
Seu nome estampou revista
Foi noticia no jornal
Os vestidos das dondocas
Carregavam seu aval
Desfilava e competia
Nas festas a fantasia
Em tempos de carnaval.
17
Um artista de mão cheia
Estava fadado a ser.
O sucesso se notava
Ele batalhou pra ter
Se hoje é grande estilista
Costurando para artista
Ele fez por merecer.
18
A mãe que sempre o amou
Aplaudiu o seu sucesso
O seu pai baixou a crista
Esqueceu o retrocesso
Ficou até orgulhoso
Em ter um filho famoso
E saber do seu progresso.
19
O acossado menino
Virou Gente de dinheiro
Viajou pra todo lado
Foi até ao estrangeiro
E cresceu na profissão
Teve a sua ascensão
Fama como costureiro.
20
Jamais esqueceu a mãe
O anjo da sua estrada
Pra ela dava de tudo
Não deixava faltar nada
Com ela sempre contou
Carinho nunca faltou
Daquela mãe adorada.
21
Aquele pai tão severo
Cheio de preconceito
Notando a fama do filho
Até mudou de preceito
Deixou de ser rigoroso
O dinheiro milagroso
Fez do filho um bom sujeito.
22
O dinheiro muda tudo,
Retrógrado pensamento.
Filho não importa o sexo
É fruto de sentimento
É preciso ponderar
E com lisura acatar
Evitando sofrimento.
23
Cada palavra ofensiva
Cada agressão do passado
Que vem de pai para filho
Fica no peito marcado
Se um pai se torna carrasco
A vida vira um fiasco
Para o filho amargurado.
24
Os tempos hoje são outros
Vamos prestar atenção
Em vez de execrar um filho
Melhor mesmo é dar a mão
Aceitar as diferenças
Modificar nossas crenças
Praticar compreensão.
Fim
Cordel de Dalinha Catunda
Literatura de Cordel sábado, 28 de outubro de 2017
HISTÓRIA DAS SETE CIDADES DA SERRA DA IBIAPABA - CE (FOLHETO DE APOLÔNIO ALVES DOS SANTOS)
COM AGRADECIMENTOS A PEDRO FERNNDO MALTA
A poesia adverte Ao meio estudantil Falando sobre um Estado Que há em nosso Brasil A terra de Iracema Belo torrão varonil.
É sobre o Ceará Que dou esta explanação Suas terras, seus encantos E sua vegetação Seus pontos mais pitorescos De grande admiração.
Eu já tenho escrito várias Histórias interessantes Com esta quero atingir Os pontos mais importantes O que outros escritores Nunca escreveram antes.
Porém esta trajetória Um instante eu vou mudar Seguindo em outro roteiro Quem vai mais interessar À muitos estudiosos Que gostam de pesquisar.
Na história brasileira Minha ideia penetrou Portanto quero versar O que outro não versou Uma história que a história Do Brasil pouco contou.
Antes da vinda de Cristo Há mil cento e tantos anos A Tróia fora invadida Pelos gregos desumanos Deixando subjugado Todos os poderes troianos.
E depois disso dez anos Começou a emigração Em todas terras de Tróia Gente de outra nação Foram os cários comandados Por outra rebelião.
E em todo território Pelos gregos comandados Serviu para os povos cários Que vinham desnorteados Com todos seus descendentes Ficaram aí situados.
Então os filhos de Tróia Que se acharam vencidos Em combates com os gregos Ficaram então destruídos Sem terra despatriados Da sorte desprotegidos.
Logo o chefe dos fenícios Tomou uma decisão Reuniu todo seu povo Formando grande esquadrão E seguiu de mar a dentro N’uma grande expedição.
Há mil cem anos então Antes de Cristo, chegou Aquela frota fenícia Em uma costa ancorou No nordeste do Brasil E um porto ali fundou.
Ali entre dois Estados Ceará e Maranhão Os fenícios que vieram Na citada expedição Fizeram ali de Tutóia Sua grande fundação.
É o porto de Tutóia Na capital São Luiz Estado do Maranhão Que aquele povo quis Lembrando Tróia a cidade E seu passado infeliz.
Antes da vinda de Cristo A mil e cinqüenta anos Nas margens do Parnaíba Houve ali muitos planos Dos bons colonizadores Com seus ideais humanos.
E naquela mesma época Os colonos ancestrais Nas margens do Parnaíba Plantavam seus cereais Aproveitando os baixios Até chegar em Goiás.
De toda Ibiapaba Foram cultivando a serra Pela subida do rio Parnaíba, que encerra As tribos dos Tabajaras Se apossaram da terra.
Fundou-se ali uma sede Pelo comando geral Da tribo dos tabajaras E a província atual Chama-se Sete Cidades Ou Parque Nacional.
Também tem sete cidades No vale do grande rio Chamado de Acaraú O qual no tempo de estio A sua margem oferece Um majestoso plantio.
As suas belas cidades São: Massapé e Sobral Santana do Acaraú Morrinhos que é legal Marcos e a Bela Cruz E Acaraú afinal.
Os chefes das grandes tribos Fizeram muito gentis Dali das Sete Cidades Com seus terrenos fertis Uma sede sobre ordem Do congresso dos Tupis.
Tupi era o nome dado Por todos com grande afã Que veneravam o poder Do supremo Deus Tupã A religião pregada Por aquele fé cristã.
-Pelos Sacerdotes Cários que vieram ao Brasil juntamente aos Fenícios na mesma época de mil antes da vinda de Cristo pela base estudantil.
Foram catequizadores Com ordem benevolente Da mesma ordem dos três Reis Magos do Oriente Que adoraram em Belém A Jesus Onipotente.
Nesse tempo o rei Hiram De Tiro, fez aliança Com rei Davi da Judéia Visando uma esperança De explorar a Amazônia Brasileira, com pujança.
Isto há mil e oito anos Antes de Cristo chegar O rei Davi da Judéia Concordou se aliar Com o rei Irã de Tiro A fim de compartilhar.
Com pouco tempo depois Daquela combinação Faleceu o rei Davi Mas deixando a sucessão A seu filho ainda jovem Chamado de Salomão.
Então o rei Salomão Depois que foi proclamado Com o rei Hiram de Tiro Continuou aliado Para explorarem a Amazônia Conforme foi combinado.
A um grande rio deram O nome de Solimões Em homenagem ao vulto Querido das mulheres Salomão o grande rei Que ditou boas ações.
E a cidade de Tiro Foi destruída depois Há anos antes de Cristo Trezentos e trinta e dois Por rei Alexandre Magno Com outra ordem se opôs.
E durante setecentos E sessenta e nove anos Continuou relações Marítimas, com vários planos E transas comerciais Com ideais soberanos.
A Fenícia atual Síria Com bases fundamentais Tratava com o Brasil Contatos comerciais E descobrindo das terras As riquezas colossais.
Com quatro anos após Foi a grande expedição Do rei Alexandre Magno Na sua peregrinação Para a América do Sul Com heroísmo e brasão.
Depois da era de Cristo Chegou uma grande frota Trazendo Fernando Telles Esse nobre patriota Onde os fenícios e Cabral Usaram a mesma rota.
Então o Fernando Telles Veio a serviço real Usando as calmarias Pois o rei de Portugal Pesquisou todo roteiro Antes de enviar Cabral.
Foi em mil e quatrocentos E setenta e três, realmente Que chegaram a terra excelente E a sede do comando Instalaram certamente.
Fundou-se as 7 cidades Da serra de Ibiapaba Viçosa e depois Tinguá Que se eleva até a aba Pois as suas tradições Nem seu progresso se acaba.
É a terceira cidade Chamada de Ubajara Na serra do mesmo nome Tem sua beleza rara A quarta é São Benedito Cidade formosa e cara.
A quinta é Ibiapina A sexta é Guaraciaba A sétima é Flexeirinha Onde dá muita mangaba São estas 7 cidades Da serra de Ibiapaba.
A Gruta do Ubajara E o Parque Nacional É uma lembrança eterna Um símbolo memorial Quando os fenícios e os cários Chegaram aqui afinal.
E Pedro Álvares Cabral Segundo os ensinamentos Chegou em Porto Seguro No ano de 1500 O Brasil inda não tinha Progresso, nem andamentos.
-Só índios bravos selvagens comandavam as regiões as qualidades dos mesmos eram de cinco milhões divididos em várias tribos quase trezentas nações.
As principais tribos eram Tabajaras, Potiguares Onde as terras inda não eram Divididas em hectares Eram todas devolutas Sem terem donos nem lares.
A terceira raça era A tribo dos Cariris Os descendentes dos Cários E a tribo dos Tupis Que chamavam a Deus Tupã Igualmente os Guaranis.
No sudeste do país Ocupavam as grandes serras Longe da orla marítima Viviam naquelas terras E contra a civilidade Sempre promoviam guerras.
A região dos Tupis No sul de Itaparica No delta do Parnaíba Terra fértil e muito rica Abundante em cajueiros Carnaúba e oiticica.
O grande Fernando Telles Era um governador Possuía grande frota Ao seu inteiro dispor Eram oito caravelas Cada qual de mais valor.
-Então o Fernando Telles Com sua intuição Requereu de El-Rei Uma certa doação Pra d’uma ilha distante Fazer sua exploração.
-Instruiu a petição com minucioso mapa daquelas sete cidades que naquela mesma etapa visitou pessoalmente conforme ver-se na capa.
Entrou também na história O Joaquim Coriolano Junto a José Luiz Alves Sem empenharam sem engano E Bruno Alvas da Costa Todos pensavam um só plano.
Estes se encarregaram Em fazer demarcações Das partes mais importantes Que faziam ligações E o rio Acaraú Ficou sendo as divisões.
Entre os grandes Estados Ceará e Maranhão No vale do Parnaíba Aonde viviam então Os tupis e potiguares Ocupando a região.
-Grande várzea em extensão até o rio Acaraú ao leste do Estado lá viviam o índio nu colhendo frutas indígenas pequi, mangaba e umbu.
Então quando viajou Pedro Alvares Cabral Já vinha orientado Pelo rei de Portugal Para usar as calmarias Pela costa ocidental.
-assim em duas etapas foi descoberto o Brasil primeiro Fernando Telles navegador varonil segundo Pedro Cabral nos trouxe prazeres mil.
Primeiro Fernando Telles Afirmamos com certeza Achou as 7 cidades N’uma terra de grandeza Que foi mantido em segredo Pela corte portuguesa.
O grande rio Parnaíba Nascia duma lagoa Chamada Upá-Açu Duma água fina e boa Aonde o povo habitante Navegava de canoa.
Hoje é o grande açude Por nome de Sobradinho Cujo açude é uma fonte Para o povo vizinho Abundante e favorável Para quem mora pertinho.
…O Jaguaribe e Piranha da mesma também nasciam e na mesma vice-versa diversos rios caíam formando uma delta gigante rios entravam e saiam.
O rio Acaraú Nasce de uma catarata Numa grandiosa serra Sua água é cor de prata Dum lago subterrâneo No centro da grande mata.
Assim ficou na história Como marco oficial Nosso Brasil descoberto Por Pedro Álvares Cabral Em abril de 1500 Data histórica universal.
…Mas afirma Schwennhagen que a história real vem do arquivo exclusivo do Tombo de Portugal na repartição das ilhas é esta a prova legal.
E em mil e novecentos E vinte dois com razão No dia do centenário Houve a comemoração Do Brasil independente Ficando livre a nação.
Na Serra Ibiapaba No nordeste do Estado Junto a cidade Morrinhos Um estrangeiro chamado Afonso Estreito, ficou Ali naturalizado.
Devemos grande homenagem A esse nobre senhor Que foi oficialmente O primeiro agricultor Da nossa terra Brasil Como colonizador.
Pois foi ali no estreito Sobre as encostas do rio Chamado de Mucuripe Onde seu clima é sadio Que se fundou a província Terra do índio bravio.
Na serra de Ibiapaba Houve como integração Apoio daquele chefes Donos dessa região Igual Jerônimo Albuquerque Governo do Maranhão.
E em mil setecentos E dezoito, Ibiapaba Conhece oficialmente O chefe daquela taba O governador dos índios O grande Morubixaba.
Nessa época os Potiguares Com objetivo pleno Em nome do povoado Que fundaram em seu terreno Prestaram ajuda ao guerreiro Martim Soares Moreno.
Para evitar desembarque Dos inimigos Franceses Nosso nobre Afonso Estreito Instrutor dos camponeses Em vigilância aguardava Invasão dos holandeses.
-Ao mesmo tempo esperava Sem temer nenhum perigo O grande Fernando Ulmo Seu velho sócio e amigo Genro de Fernando Telles E seu sucessor antigo.
Entre as afirmações Deste trabalho tão fino Dolorido assinado Pelo herói nordestino Francisco Onofre da Ponte Que compõe seu belo hino.
…E Maestro arranjador compositor e artista internacionalmente conhecido folclorista professor da nossa música popular, nacionalista.
…Este é filho natural da cidade de Morrinhos Estado do Ceará Onde seus pais com carinhos O ensinaram a trilhar Os mais brilhantes caminhos.
Belas terras cearenses Que ilustra o meu poema Onde só se conhecia O amargo da jurema E as florestas selvagens Do índio e da tangapema.
Pois em mil e novecentos E cinqüenta e oito nasceu A cidade de Morrinhos Com todo prestígio seu Depois que o desbravador Daquela prole morreu.
-Por isso pode chamar-se uma cidade Menina com as glórias primitivas que a tradição determina permitindo a sua planta na região nordestina.
…Antigamente era um sítio abrigo dos camponeses para colonizadores fenícios e portugueses onde hoje é terra culta para criação de rezes.
Mostramos também o hino Com letra e música grã-fina Do maestro filho nato Da região nordestina Onofre homenageado Sua cidade Menina.
Aqui prezados leitores Acabo de descrever Levando este romance Verá que tem mais prazer Estes que moram em Morrinhos Sabendo bem se have
Literatura de Cordel quarta, 25 de outubro de 2017
O ENCONTRO DE MICHAEL JACKSON COM O MENINO JESUS
Para muitas gerações Michael Jackson brilhou, Com canções maravilhosas Que a todo mundo encantou E no dia que partiu O mundo todo chorou.
Sua carreira baixou Porque ele cometeu Alguns deslizes na vida E o mundo todo sofreu Mas com a sua magia Aos poucos se reergueu
Eu sei que Michael morreu Como um facho de luz Mas quando chegou ao céu Usando um lindo capuz Perguntou logo a São Pedro: Cadê Menino Jesus?
São Pedro pegou a cruz E começou a falar Antes de entrar no céu Procure se ajoelhar Pois pra falar com Jesus Você precisa rezar
E Michael sem reclamar Fez algumas orações Depois perguntou ao Santo Se ali tinha Mansões, Uma sala com Cinema E Parque de Diversões
Michael queria Galpões, Para poder abrigar Animais raros, exóticos Do seu Zoo particular, Jardins e Quadra de Tênis Pois gostava de jogar
Ele queria encontrar Uma Estação de Trem Muitas Passagens Secretas E um grande Lago também, Tudo na maior luxúria Pois isso Neverland tem
Sempre foi gente do bem Porém a sua alegria Era viver só de luxo Cercado de mordomia Por isso fez Neverland “A Ilha da Fantasia”
As coisas que ele pedia Pareciam esquisitas E São Pedro respondeu: Aqui tem coisas bonitas, Só não existem crianças Para lhe fazer visitas
Com essas palavras ditas Michael logo entristeceu E esperando Jesus Que lá não apareceu, Perguntou para São Pedro: Cadê o Menino, meu?
São Pedro logo entendeu Que Michael não entendia Que o Menino Jesus Ali já não existia Pois o pequeno menino, É um homem hoje em dia
Michael naquela agonia Não parava de rezar E São Pedro admirado Escutou ele falar: Se aqui não tem menino, Então me deixe voltar!
Aqui é o seu lugar, São Pedro foi lhe dizendo, E trate de ficar calmo, Reze mais, vá se benzendo Porque Jesus chega já Mas não quer vê–lo tremendo
Do jeito que estou vendo Por ser astro popular, Você não quer ouvir reza Nem veio se confessar Quer cantar uma canção Pra dançar e rebolar
Mas quero lhe avisar Que agora, daqui pra frente, Você vai ter que levar Uma vida diferente Pois seu reinado acabou É bom que fique ciente
Se você antigamente Dançava se requebrando, Fazia muito sucesso Dançando bem e cantando Aqui só fará sucesso Ficando calmo e rezando
Nisso Jesus foi entrando De maneira disfarçada Era um homem moreno Da pele bem bronzeada E Michael não percebeu Por isso não falou nada
Como num conto de fada Jesus se aproximou Olhou para Michael Jackson, E a Pedro perguntou: Mas não foi um homem negro Que há pouco tempo chegou?
Nisso Michael se sentou E começou a falar, Se o Senhor é Jesus Eu quero lhe explicar Eu sou um artista negro E também sou “Pop Star”
Jesus sem pestanejar Disse eu vou lhe ser franco Quando boto cor no homem O resto da tinta eu tranco, Se você é homem negro Como é que morreu branco?
Às vezes até destranco Mas se houver precisão E com você não me lembro De dar essa permissão Mas se você ficou branco, Dê-me uma explicação!
Michael Jackson, então Disse: fiquei a perigo, Por favor, Jesus entenda, O que ocorreu comigo Minha pele foi mesclada Por causa do vitiligo.
Eu não vou lhe dar castigo E poço dar-te o perdão Porque já sei o motivo Dessa Luva em sua mão Só quero que você prove Que tem um bom coração
Minha preocupação, Deixa uma esperança Quero que você me diga “Homem do canto e da dança” Por que é que você tem Tanta atração por criança?
Essa é uma cobrança Que o mundo todo me faz E eu já sofro com isso Desde que era rapaz Mas só durmo com criança Para me sentir em paz
Eu não sou um “Barrabás” Como muita gente diz E com todas as canções Que na minha vida fiz Lutei e fiz o que pude Pra ver o mundo feliz
Por tudo que você diz Sei que fala a verdade Porque que eu sendo Jesus Conheço a sua bondade Pois eu apenas queria Ver sua sinceridade
Eu sei a capacidade E o talento que tens Por isso agora te dou Perdão, e meus parabéns Pois antes de vir a mim Repartistes os teus bens
Agora aqui obténs A vida em plenitude Sem a preocupação De tratar tua saúde Porque eu sei que em vida Foste bom pra juventude
Com essa tua virtude Sei que és fenomenal E enorme influência Para a arte musical Por isso o mundo te deu Atenção especial
Com esse teu bom astral Michael Jackson te digo Sê bem vindo a esta Casa E podes contar comigo Venha me dar um abraço Meu velho e querido amigo
Lá na terra teu jazigo Será muito visitado Em função da tua fama Serás sempre comentado Teu Espírito imortal, Aqui está preservado.
Recife, 08 de julho de 20
Literatura de Cordel sexta, 20 de outubro de 2017
A LUTA DE UM HOMEM COMUM LOBISOMEM (FOLHETO DE ABRAÃO BATISTA!
(COM AGRADECIMENTOS A PEDRO FERNANDO MALTA, PELO ENVIO)
Agora que eu andei pelas florestas do além penetrei no inconsciente íntimo que cada um tem, sinto-me autorizado para escrever o que vem.
Fui aos céus pra ver Jesus e no inferno eu vi Caifaz; nestes cantos eu tive a luz que na terra ninguém faz, meus pensamentos aqui pus descrevendo uma luta assaz.
Presenciei por sete tempos a luta de um certo homem na mais cruenta das lutas com o mais cruel lobisomem; lá nesta peleja eu vi miolo, coração, abdomem.
Numa encruzilhada que tem cortando certa avenida fazendo ponto estratégico com o segredo da vida bem na boca das cobras para lá fui em seguida.
Não conduzia arma de fogo’ nem pau, peixeira ou foice mas, tive coragem bastante de olhar seja o que fosse pois um barulho daquele era pra guerra e danou-se.
Aproximei-me com cuidado pra não entrar numa fria… foi quando eu percebi a vida e a agonia a luta de um certo homem com uma fera vã e baldia.
A sete metros fiquei para melhor distinguir os clarões das peixeiradas os gemidos e o grunhir as pancadas e os fungados do homem e fera ao cair.
Não sei dos dois o valente em cada um, mais ação nunca vi tanta destreza tanta ligeireza na mão nunca vi dar tanto pulo nem cair tanto no chão.
O homem tinha uma faca a fera tinha os seus dentes mãos cabeludas com garras pelos horríveis, pendentes e de cada gemido do bicho saíam águas ardentes!
Era um bafo tão medonho que da boca dele saía muriçoca e qualquer inseto depressinha morria e se o cabra fosse fraco ali mesmo caía.
O homem levantava a faca o bicho se agachava com um pulo de banda de revestrez avançava o homem como um felino pulando de costa ele dava.
A faca trincava nos dentes do lobisomem horrendo os coices que o tipo dava deixava o piso tremendo mas o homem era ligeiro com a peixeira ia tecendo.
O lobisomem tinha um aspecto de um homem e dum guaxinim era feio e fedorento andava em pé e assim como andava os outros bichos que roem e comem capim.
O lobisomem falava quando dava um golpe bom com uma voz seca e fanhosa com a boca cor de batom os olhos verdes de fogo como as águas lá do Leblon.
Era feio que a feiura chamava a máxima atenção para os detalhes que tinha nas garras de gavião as mãos como de homem e os pés chatos no chão.
O que mais admirei foi no poder que ele tinha de mudar diversas cores quando o homem mantinha a superioridade nesta luta sem linha.
O lobisomem também dava tapa de lutador dava golpes de caratê querendo ser o senhor mas o homem lhe respondia como nenhum domador.
Era uma luta sem igual nunca vi disposição um homem, só, com uma faca dar estouros como o trovão nem ser humano aguentar por tanto aquele rojão.
Nos ombros daquele bicho tinham espinhos afiados como os espinhos de jurema maiores, verdes e dobrados e brilhavam como relâmpagos cortando os verdes dos prados.
Das orelhas de morcego saía fumaça amarela que gemia como prantos de gentes em sentinela as ventas, roxas e truncadas como as abas duma gamela.
O homem dizia assim destemido, sem arremedo: bicho feio e ruim a mim tu não metes medo desapareces se não amarro-te neste arvoredo!
Prendo-te aqui e amanhã vou te mostrar na cidade que lobisomem pra mim não passa de veleidade e sentou a faca no bicho que quase arranca a metade.
Eu quero hoje descobrir se é verdade ou boato arranco tua língua, maldito e com ela tiro o retraio vou mostrar para a gente toda a história de fato.
Neste momento eu notei um sangue grosso correndo já molhava os meus sapatos que o barro ia embebendo; e em qualquer folga que tinha a terá o sangue bebendo.
Quando o sangue ele bebia recobrava todo o vigor e o homem que aquilo via ficava pálido de horror mas a peleja travava com ânimo brusco e calor.
E da fumaça que surgia rasteira, leve, dos dois uma voz me descrevia aquela cena pois, pois do homem com o lobisomem é o que acontece com nós…
O lobisomem é uma face que se desconhece no homem são os frutos da maldade que os povos todos consomem cada homem tem em si de homem e de lobisomem.
Um lobisomem oculto todo homem tem guardado quem não vencer a maldade está com o espírito mofado esta luta é muito antiga não fique decepcionado.
O lobisomem é o orgulho é a gula, é a injustiça é a felicidade oculta que o vizinho cobiça; é a falta de caridade dos que vão e rezam a missa.
Todo ser humano tem um limite no pecar pode ser uma falta grande que Jesus vem perdoar mas quando foge da linha por si mesmo vai pagar.
Existe um dito antigo que ficou nesta cachola o medo é de quem o faz aprendi bem; rapazola quem planta o mal meu rapaz paga o mesmo na bitola.
Quem não respeita os outros e despreza uma criancinha quem não dá aos necessitados e vive fora da linha é lobisomem em folha só falta a viradinha.
Ninguém se engane portanto com a verdade da fé de homem que é lobisomem o mundo está cheio, pois é a injustiça sem caridade é seu diploma de pé.
Enquanto a fumaça falava eu atento a ouvia mas a contenda travava com a maior rebeldia o rasgo da faca do homem nos dentes do bicho rangia.
Os pés do bicho, achatados davam patadas de foice; ó que se pegasse no homem tinham o impacto dum coice eu nunca vi ligeireza que não livrasse o que fosse.
Às vezes saía fogo das pedras da rodovia quando a garra afiada do lobisomem zunia e o homem mais espritado gritava: Virgem Maria!
A cor do couro do bicho tinha um vermelho de prata na altura das canelas um amarelo de afavaca das costas resplandecia um arco-íris de naca.
O lobisomem, a certa altura disse assim enraivecido: com esta faca tu não me vences tu pra mim és o vencido já noto o teu braço esquerdo de cansaço amortecido.
Entregues logo teus pontos que te quero, ó meu irmão o meu prato predileto é o fígado e o coração o resto deixo na estrada prós urubus do sertão.
— Eu sou quem vou te pegar e amarrar, não tenho medo meto-te a faca na nuca e deixo-te comendo bredo pois daqui pró sol nascer amarro-te naquele arvoredo.
Agora vais me dizer disse o homem destemido porque viras lobisomem isto é máscara ou é vestido tu pareces um palhaço de mulher sem ter marido.
Se quiseres meter medo arranje outra cara agora pra que esta fumaceira antes de se ver a aurora lobisomem para mim é boa noite e vá embora.
O lobisomem quis chorar porque viu que não vencia aquele homem tão valente que há tempo ele não via e da briga se lastimou que de longe se ouvia.
Não vou ser mais lobisomem encontrei um homem assim eu pensei que este era ladrão, infame e ruim mas a bondade no mundo põe a maldade no fim.
E falando desse jeito quis pegá-lo pelo meio: mas dum pulo foi desfeito a malícia e o arrodeio com uma facada no toitiço fez o monstro fazer feio.
O homem deu uma risada e disse: toma seu peste lobisomem assim chorando está perdido no agreste cabra feio e duvidoso por ele não há quem ateste.
O lobisomem já em prantos foi dizendo: valha-me Deus este homem é valente não quero castigos seus como escapulir daqui são os problemas meus.
Tu não vais escapulir porque vou te amarrar amanhã toda a cidade vai todinha admirar este feio aspecto teu muito tempo vai guardar.
O povo guardando imagem dessa tua estatura talvez se arrependa e não caia na desventura de ser também lobisomem com esta horrenda figura.
Lobisomem é uma lenda mas que se torna verdade quem não sabe, aprenda criança, velho e abade lobisomem é o conflito do amor e da maldade!
Lobisomem tem cada um guardado no coração as vezes muito escondido que não enxerga a visão para nas noites de lua sair virado no cão.
Quando o homem é bondoso e traz no peito a justiça o amor vence o maldoso vence o mal e a cobiça e lobisomem, num desses não vinga nem com malícia.
Cada um faça por si pra não virar lobisomem pois quem virar neste bicho nunca mais é o mesmo homem inda mais fica com um cheiro que os urubus não consomem.
Eu já ia esquecendo da contenda sem rival do homem com o lobisomem majestoso e teatral nunca vi coisa mais feia nem ardor descomunal.
Do chão saíam faíscas subindo fumaça e pó de cada rasgo da faca rangia como uma mó de cada baque que dava enterrava o mocotó.
O lobisomem pulava o homem pulava também o chão estremecia como se passasse um trem e a faca dele corria e eu dizia: amém.
Era noite, mas eu via porque havia um clarão a lua brilhava muito que se via no chão uma agulha ou alfinete ou um caroço de algodão.
O lobisomem se enraivecia porque não podia acertar naquele homem valente difícil de entregar… e com golpes desconhecidos para ele foi atacar.
Eu notei que o lobisomem lançava vômitos de fogo o homem se defendia depressa, sem fazer rogo e a estória dessa luta em versos, quis fazer logo.
A força que o homem tinha não vencia o lobisomem e a destreza do monstro não desbancava o homem e sendo da bondade dele minhas palavras se tomem.
Finalmente o bicho quis num esforço descomunal pegar o homem de jeito e para ele foi o fatal o homem acertou-lhe bem no peito com o seu punhal.
A faca entrou de cheio do lado do coração o lobisomem gritou: acode, meu guardião! e sete raposas chocas saíram dum furacão.
Quando o homem viu aquilo lembrou-se do seu rosário que estava dentro do bolso e mostrou ao perdulário o rosário de Maria e a Santa Cruz do Calvário.
Nisso deu-se um estrondo abalando légua e meia o lobisomem e os felinos desapareceram na peia fazendo ponto final daquela briga tão feia.
Se quiser não acredite nesta estória aqui contada mas são coisas que acontecem na psicologia da estrada no caminho do saber onde o burro não ver nada
Literatura de Cordel quarta, 18 de outubro de 2017
PADRE HENRIQUE, UM MÁRTIR DA DITADURA (FOLHETO E ISMAEL GAIÃO)
Foi no ano de 40 Que Padre Henrique nasceu E a 28 de outubro Para o mundo apareceu Paulo José Barros Filho Descreveu com muito brilho Como foi que ele viveu
Seu nascimento se deu Na Veneza Brasileira Com o nome do avô Antonio Henrique Pereira Foi menino genial E lutando contra o mal Construiu sua carreira
Sua infância foi ordeira Sem querer religião Mas ainda quando jovem Já chamava a atenção E quando fez 15 anos Ele então mudou seus planos Causando admiração
Fez primeira comunhão E entrou pro Seminário Decidindo que iria Tornar-se um Celibatário Sendo muito inteligente Daquela data pra frente Começou o seu Calvário
Foi da Igreja operário Com bonitas pregações E juntando pais e filhos Nas suas reuniões Se tornou admirado Tendo como resultado Aproximar gerações
Por essas suas ações Uma bolsa ele ganhou E pros Estados Unidos A Igreja lhe indicou No entanto um capelão Agiu com perseguição E quase lhe atrapalhou
Mas Henrique viajou Cumprindo a sua missão E nos Estados Unidos Fez especialização Foi muito discriminado Mas estando preparado Voltou pra nossa Nação
Após sua ordenação Começou a renovar Procurou quebrar conceitos Da Igreja secular E a maior inovação Foi fazer celebração Sem cobrar pra celebrar
E também pra batizar Dinheiro não recebia Se lhe pediam ajuda O que tinha dividia Pois era muito envolvente E agradava a toda gente Com a sua simpatia
Por tudo que ele fazia Ganhou fama nacional Sendo Padre de destaque No trabalho Pastoral Das coisas que defendia Respeito à cidadania Foi seu maior ideal
Vendo seu potencial Dom Helder lhe convidou Para ser seu Secretário Assim que se ordenou Com a sua inteligência Trabalhou com competência E aos seus fiéis agradou
Sempre se preocupou Com a classe estudantil E durante o sacerdócio Não mudou o seu perfil Com essa sua postura Discutia a conjuntura Dos problemas do Brasil
Porém o Governo hostil Implantado na Nação Proibia qualquer tipo De conscientização Henrique não recuou E assim continuou Na evangelização
A Igreja até então Se mostrava dividida E a classe universitária Era sempre reprimida Pelo Governo opressor Que praticava o terror Sem nenhum respeito à vida
Dom Hélder por sua lida Começou a incomodar Mas pela sua importância O Governo Militar Usava de sabotagem Porém não tinha coragem De mandar lhe assassinar
Então para se vingar O Governo Ditador Perseguiu o Padre Henrique Que passou dias de horror Pois constantemente lia As cartas que recebia Com tom ameaçador
Todo esse ódio e rancor Que no Governo existia Não era pra defender A nossa soberania Era só pra nos roubar Mas pro Golpe Militar Isso era ideologia
Criaram a guerra fria Praticando todo o mal Só para fortalecer Os donos do capital Tanto da nossa Nação Quanto da maior porção Que era internacional
A repressão foi brutal E fez o povo sofrer Não se podia falar De quem tava no poder E o povo sendo explorado Tinha que ficar calado Se não quisesse morrer
Ao invés de nos proteger A Polícia Militar, O Exército e a Civil, Serviam pra torturar Já as famílias sofrendo Foram seus entes perdendo Sem poder nem enterrar
Sem aceitar se calar Os jovens contestadores Que fossem padres, políticos Estudantes, professores De vez em quando sumiam E os governantes fingiam Não serem os torturadores
Pensando nesses horrores Que vivemos na Nação A Igreja usou um lema Pregado em cada sermão “Que a maior prova de amor É a de um leigo ou pastor Dar a vida pelo irmão”
E a Igreja usava então Com muita prioridade Esse lema pra Campanha Em prol da Fraternidade Mas não imaginaria Que o Padre Henrique seria Refém da perversidade
Saindo sem ter maldade Pra última reunião Henrique ouviu uma moça Pedindo orientação Ela veio com malícia Mandada pela Polícia Pra lhe fazer traição
Sequestrado pela mão Do Governo linha dura O Padre Henrique virou Um Mártir da Ditadura Pois ele foi arrastado Enforcado e assassinado Com bala, faca e tortura
Numa manhã obscura Em uma estrada precária Da nossa tão importante Cidade Universitária Seu corpo foi encontrado Pois foi lá que foi jogado Da forma mais arbitrária
A Polícia sanguinária No ano sessenta e nove Cometeu a atrocidade Que até hoje nos comove O matou barbaramente E não há inconsequente Que esse ato não reprove
Mas existe quem aprove Os atos da Ditadura Que em 27 de Maio Na maior descompostura Tentou abafar o fato Dizendo que era boato Que existia tortura
Sem a menor compostura O caso foi apurado E nenhum dos assassinos Do Padre foi condenado Henrique tombou sem sorte Mas esse “esquadrão da morte” Teve o processo arquivado
Com o Padre assassinado O Governo que o matou Achando pouco o que fez E o crime que praticou Tentou desmoralizá-lo Querendo caluniá-lo Porém isso não vingou
Muito tempo já passou Da farsa que foi montada É bom que a Justiça lembre Que a vida que foi ceifada Era de um Mestre e Pastor Que só pregava o amor Querendo a paz e mais nada.
Recife, 28 de outubro de 2009
Literatura de Cordel quarta, 11 de outubro de 2017
BUMBA MEU BOI, A MAIOR FESTA DO MARANHÃO - FOLHETO DE JOÃO PERON
Terra do bumba meu boi Tradição dos ancestrais Onde guará é vermelho E outros lindos animais De um verde encantador Dos ricos carnaubais Mês de junho no maranhão
As ruas viram calçadas Os turistas se deleitam Com as praças enfeitadas E festas animadíssimas Até altas madrugadas Tudo isso em louvor
A São Pedro e São João Santo Antônio e São Marçal São os santos de tradição Dessa forma assim começa A festa do Maranhão As mais autênticas brincadeiras
Quadrilha que não é pouco Lelê e tambor de crioula Cacuriá coisa de louco Encanta toda plateia A linda dança do coco Quem criou todas elas
Não posso afirmar quem foi Se é fã de algumas delas Eu peço que me perdoe Porque dela a que mais gosto Pois é o Bumba meu Boi. Porém uma certa vez
Viajei pro Maranhão Conheci lá uma pessoa De um meigo coração Perguntei se ela não tinha Livros velhos da região.
Índia, uma das componentes importantes
Ela disse por exemplo Eu respondi no momento É sobre Bumba meu Boi Sem haver constrangimento Por acaso adquirir Tem meu agradecimento
A mulher disse eu tenho Uma boa coleção Vou dar tudo de presente Não cobrarei um tostão Só porque você gosta Das coisas do Maranhão
O nome dessa mulher Chama Dona Vitória De acordo com o que li E o que tenho na memória Vou descrever o caminho E o roteiro da história.
Era um casal de negros Que morava na fazenda Simplesmente moradores De barraca ou de tenda E sua esposa lhe pediu Uma difícil encomenda.
Pois o casal de escravos Vivia na triste sina Trabalhando de sol a sol Como o patrão determina Mas vivia satisfeito Seu Francisco e Catarina.
A mulher estava grávida O filho próximo a nascer Desejou imediato A língua do boi comer Exigiu que Chico trouxesse Antes do dia amanhecer
Seu Francisco encabulado Sem ter outra solução Nunca lhe foi na memória De um dia ser patrão Furtou o touro mais lindo Do seu querido patrão.
O fazendeiro ao chegar Viu o gado num só brilho As galinhas no terreiro Cantando e comendo milho Só estava ali faltando O seu querido novilho.
O patrão disse vão todos Vê se uma cobra mordeu Revire toda fazenda Vejam o que aconteceu Só retorne com a notícia Se o novilho apareceu.
Bem antes do meio dia Chega um vaqueiro sem ar Disse olha meu patrão É muito triste o seu penar Eu achei seu novilho Tenha calma vou contar.
Quando eu encontrei o boi Estava no mato sozinho Achei perto da braúna Afastado no caminho Levaram a língua do boi Ficou o resto todinho.
O fazendeiro cara dura Não dava uma risada Deu ordem a seus capangas Pra dar uma averiguada E descubro com urgência O autor da presepada.
Após grande investigação Só teve Chico culpado Foram prender seu Francisco Mas ao ser localizado Nega o fato acontecido Daquele crime passado.
Chico foge do seu patrão Se embrenha no matagal Mas o fazendeiro quer Saber porém afinal Por qual motivo Chico Fez aquilo com animal.
Grande tribo de índios Formada pelo patrão Para procurar Francisco Nas matas do Maranhão Os indígenas sabem bem Como a palma de sua mão.
Sem ver dificuldade Logo logo foi encontrado Preso pelos indígenas Pai Francisco desarmado Conduzido ao seu patrão Após ser localizado.
Ao chegar na fazenda Nega todo envolvimento Vem aí o interrogatório Tristonho e violento Após uma grande tortura Ele deu o depoimento.
Querido nobre patrão Que minha pena lhe faz Eu furtei da sua fazenda O boi que gostava mais A mulher estava grávida E tirou a minha paz.
Pediu a língua de um boi Pra arrumar em qualquer canto Quando ela falou isso Eu tive o maior espanto Pedi perdão a Deus E me valei de todo santo.
Meu consciente falando Talvez você se arrependa Só pensava no meu filho E na difícil encomenda Fiz todo crime sozinho Afastado da fazenda.
O patrão disse eu vou ver Se o seu santo é muito forte Vamos ver qual de nós dois Quem é que tem mais sorte Se o boi ressuscitar Escapa da pena de morte.
Primeiro foi os doutores Com sua alta formatura Foi feito todo possível Mas o boi não teve cura Chico tristonho dava Um passo pra sepultura.
Um índio disse patrão Nunca perca sua fé Vá na tribo do Cazumba E procure nosso Pajé Só ele é quem sabe como Deixa o seu boi em pé.
O fazendeiro mandou Um vaqueiro dar o recado Falasse para o Pajé Que viesse aqui vexado Dar vida a seu novilho Com o seu poder sagrado.
O Pajé de imediato Desembrenhou no matagal Ao chegar na fazenda Fez aquele ritual Finalmente conseguiu Ressuscitar o animal.
Isso sim que é preservar A cultura da região O Bumba Meu Boi é Maior festa de tradição Essas e muitas outras No estado do Maranhão.
(João Peron de Lima, nascido em Recife aos 14 de agosto de 1985. Contatos: Rua São João, 219 – Distrito de Anjinhos, Santa do Cariri/CE. CEP 63190-000 – Fone: (88) 3545-0006).
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Literatura de Cordel domingo, 08 de outubro de 2017
PELEJA DE OSCAR ALHO E FRANCISCO MALAGUETA - FOLHETO DE GONÇALO FERREIRA DA SILVA
Quem não leu ainda, leia a mais acirrada e preta peleja que já se viu em cima deste planeta a luta de Oscar Alho e Francisco Malagueta.
Malagueta era filho de João Antônio Barbalho nunca violeiro algum lhe deu o menor trabalho assim queria encontrar-se com o famoso Oscar Alho.
Cantava o velho Oscar Alho alegre e descontraído quando avistou Malagueta mas na distração lhe fez este convite atrevido
Francisco Malagueta
Meu Oscar Alho não pense numa só palavra tola senão você não dará alimento à sua rola e até o dono da casa lhe chamará de baitola.
Oscar Alho
Trocar alho por cebola é trocar leite por creme o dono da casa acha que hoje aqui ninguém treme portanto pede que nós cantemos na letra eme.
Francisco Malagueta
Você hoje chora e geme pede ajuda a satanás cantando na letra M nome comigo não faz querendo siga na frente que eu enrabicho atrás.
Meu amigo Malagueta Não posso cantar assim É tanto M que chego Até tropeçar em mim O meu estoque de emes Já está chegando ao fim.
Francisco Malagueta
Meu Oscar Alho é ruim Falar numa letra só A última vez que cantei Com o velho saudoso Mó Ele terminou, coitado Morrendo em meu mocotó,
De você não tive dó Não preciso que lhe mate Eu sendo grande poeta, Você sendo grande vate Não há vencedor na sala Vamos brindar o empate.
Cachorro não canta, late Mas eu vi a coisa preta Não me meto com você Você também não se meta E aceite um forte abraço Do amigo Malagueta.
Literatura de Cordel sábado, 07 de outubro de 2017
MANÉ PIPOCA, CORDEL AO VIVO, DECLAMAÇÃO DE ISABELA FERREIRA
COM AGRADECIMENTOS A ANTONIO ESTEVAM NEIVA, QUE ME ENVIU ESTA PRECIOSIDADE
Literatura de Cordel quarta, 04 de outubro de 2017
QUEM JÁ FOI PREFEITO E NÃO PRESTOU, NÃO MERECE VOLTAR A GOVERNAR - FOLHETO DE ISMAEL GAIÃO
A Justiça Eleitoral deu o recado
E devemos observar de fato
O passado de cada candidato
Para o povo não ser mais enganado
Eu não quero dar o meu voto errado
Mas aqui tá difícil de acertar
Em nenhum de nós pode confiar
Pois com eles o povo se enganou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Este ano está triste a eleição
E por isso eu vou votar em branco
Só porque, meu amigo, pra ser franco
Pra prefeito não tenho opção
Nossa gente ficou sem solução
Para ver a cidade melhorar
Quatro anos a mais vai amargar
Aos desmandos de quem já governou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Eu só voto para vereador
Pois pra isso nós temos opções
Muita gente disputa as eleições
Cada um nos mostrando seu valor
Seja homem, mulher ou o que for
Lá na Câmara tem que fiscalizar
Pois senão nosso povo vai penar
Com um prefeito que verbas desviou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Hoje em dia a imprensa tem mostrado
E a CNBB já faz campanha
Pra que o povo não vote por barganha
Em político que tem nos enganado
“Ficha suja” não deve ser votado
Nem devia poder se registrar
Pois se teve uma conta irregular
Do dinheiro do povo abusou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
“Ficha suja” tem conta rejeitada
E processo por improbidade
Também tem por irregularidade
Mas se não foi julgado não tem nada
Considero uma coisa muito errada
“Ficha suja” poder se candidatar
E por isso não poderei votar
Em quem o Tribunal já reprovou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Eu já disse uns quatro “veja bem”
Procurando escolher qual o melhor
Não dá nem pra saber quem é pior
Os defeitos de um, o outro tem
Decidi que não voto em ninguém
Pra mais tarde não ter que lamentar
Todos dois por aqui já vi passar
E do povo daqui nenhum cuidou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quem agora quer a reeleição
Quatro anos não quis saber do povo
Não vai mais nos dizer que é o novo
E é contra quem faz corrupção
No mandato só fez enganação
E procurou os impostos aumentar
No comércio local não quis comprar
Sem merenda e sem creche nos deixou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Pacientes reclamam no momento
Que a Saúde está abandonada
Pois de bom por aqui não se fez nada
E o povo só tem constrangimento
Muita gente já diz: eu não aguento
Propagandas só pra nos tapear
O hospital não serviu pra internar
Pois dinheiro de lá se extraviou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quem deixou de lado a Educação
Com certeza não fez trabalho sério
E por isso recebeu do Ministério
Notas baixas na avaliação
Não cumpriu sequer a obrigação
Dos recursos que teria que aplicar
E o dinheiro para se capacitar
Veio um Mercadinho e embolsou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Propaganda foi feita todo dia
Em jornais, rádios e carro de som
Pra dizer que o prefeito é muito bom
E o que vimos foi só demagogia
Porém eu que vivi o dia a dia
Tenho todo direito de falar
Porque sou cidadão deste lugar
E o dinheiro daqui sei quem levou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quem vivia incentivando invasões
Nunca fez de um terreno o pagamento
E até hoje ninguém tem documento
Dos terrenos que fizeram construções
Moradores só têm decepções
Pois fizeram suas casas pra morar
Porém nunca puderam escriturar
Porque quem foi prefeito não pagou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quando estava gerindo a prefeitura
Muitas vezes mudou-se o tesoureiro
Pois prefeito que é louco por dinheiro
Também joga os outros na loucura
Eu só sei que foi grande a aventura
Botar esse para administrar
E por isso o meu voto não vou dar
Porque sei o que foi que ele aprontou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Na gestão parecia brincadeira
Todo dia que chegava o dinheiro
Pois ninguém descobria o paradeiro
Do prefeito com sua tesoureira
Tinha gente que saía na carreira
Procurando o gestor para cobrar
Ninguém sabe onde ia despachar
E com dinheiro do povo ele brincou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quem falou: não vou ter comissionado
Empregado para não fazer nada
Não passou de uma conversa fiada
Pois queria apenas ser votado
E o povo outra vez foi enganado
Porque foi nesta frase acreditar
Hoje ver receber sem trabalhar
Até gente que aqui nunca pisou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quem olhar para gestão atual
Ver a Praça Wanderley como está feia
E o total abandono da Cadeia
No passado nunca vimos nada igual
Ver também o Clube Municipal
Que faz pena até a gente olhar
E o prefeito ao invés de conservar
Teve tanto dinheiro e desprezou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Hoje o povo se sente infeliz
Vendo a Praça São Cristóvão abandonada
A João Pereira que está toda quebrada
E o abandono da Nicanor Muniz
Mesmo assim ainda tem gente que diz
Que o prefeito é quem sabe trabalhar
Mas com isso não posso concordar
Porque sei o que foi que ele estragou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Até hoje um prefeito não fez nada
Nas ruínas do Antigo Mercado
O local continua abandonado
E a cidade é quem fica envergonhada
Uma obra não foi arquitetada
Para o centro da cidade embelezar
E quem pede para administrar
Teve verbas e nunca se importou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Lembro bem da administração
Que não tinha um médico na cidade
Quem chegava lá na maternidade
Terminava fazendo confusão
Pois não tinha ambulância de plantão
Nem remédios pra gente se curar
Só se ouvia o povo reclamar
A cidade parece que acabou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Quatro anos na administração
Uma obra na cidade não se viu
Pois a única que aqui se construiu
Foi a Quadra de Esportes “O Paulão”
Mesmo assim não chegou a conclusão
Foi preciso um outro terminar
Pois o teto ameaçava desabar
E a verba ninguém sabe onde parou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Há quem diga que o povo era ajudado
Mas eu via era o povo muito mal
Porque para ganhar só um real
Era mais de um dia humilhado
O mandato era todo bagunçado
E tinha gente demais para mandar
O prefeito não gostava de pagar
E ao povo somente enrolou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Nós estamos sofrendo há muitos anos
Com prefeitos que não fazem quase nada
A cidade é mal administrada
E o povo sofrendo desenganos
Quem é jovem e vive a fazer planos
Para ver a cidade prosperar
No passado não viu nada mudar
E agora já viu que piorou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Candidato que a muitos iludiu
Prometendo empregos na campanha
Quando chega a eleição e ele ganha
Se esquece daquilo que assumiu
Esta história muita gente já ouviu
E por isso não vai mais acreditar
Em quem hoje quer nos ludibriar
Pois se lembra do tempo que passou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Tenho dito que a honestidade
Não é mais do que uma obrigação
Sinto muito, mas nessa eleição,
Nenhum deles tem esta qualidade
Sou mais um eleitor desta cidade
Que não tem candidato pra votar
Quem usou o poder só pra fraudar
Não me engana dizendo que mudou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Nosso povo vai ser prejudicado
Elegendo um prefeito desse jeito
Pelo menos terei o meu direito
De dizer: não votei, não sou culpado
Não aceito dar o meu voto errado
Pois errar é votar pra se enganar
Qualquer um desses dois só quer ganhar
Pra tirar o que ainda não tirou
Quem já foi um prefeito e não prestou
Não merece voltar pra governar
Condado, agosto/2008
Literatura de Cordel domingo, 01 de outubro de 2017
O SAPO MAIS HONESTO DO BRASIL, CORDEL, COM RAUL CANAL
Literatura de Cordel quarta, 27 de setembro de 2017
A VENDA DE JOCA GALEGO
Essa história começou Quando seu Joca nasceu Mas sua mãe não pensou No fruto que ela deu Pois quando Joca nascia Seu intuito já dizia Que não ia ter emprego Ia ser comerciante E ter futuro brilhante Na Venda de Joca Galego
No Engenho Gameleira Da cidade de Itambé Foi do peito à mamadeira E aprendeu ficar de pé Era criança travessa E trazia na cabeça Que só ia ter sossego Quando pudesse fundar O tão sonhado lugar Da Venda de Joca Galego
Quando tinha sete anos Viu sua mãe falecer Aos doze com desenganos Foi com um tio viver Na Vila de Goianinha Onde fazia farinha Ainda pedindo arrego Mas não tirava da mente De um dia ir pra frente Na Venda de Joca Galego
Era no Sítio Timbó Que o seu tio morava E a todos dava dó A vida que ele levava Pois sendo trabalhador Joca foi um sofredor Trabalhando sem sossego Mesmo sendo uma criança Mas mantinha a esperança Da Venda de Joca Galego
Ali seu Joca viveu Até os dezoito anos Quando lhe aconteceu De fazer mais alguns planos Queria ser militar Pra sua vida mudar E arranjar um emprego Porque não tinha um vintém Pra fazer o armazém Da Venda de Joca Galego
No corre-corre da vida Querendo vida melhor Saiu sem ter despedida Joca do Sítio Timbó E no Recife foi parar Aprendendo a atirar Sem a isso ter apego Pois no exército só pensava E na mente arquitetava A Venda de Joca Galego
Quando a farda ele deixou Não encontrou vida boa Pois até fome passou Na capital João Pessoa E cumprindo sua sina Trabalhou numa oficina Onde achou aconchego Para dormir e sonhar No dia que ia fundar A Venda de Joca Galego
E por força do destino Foi ao Rio de Janeiro Com sonho de nordestino De lá arranjar dinheiro De calunga de caminhão Ele aprendeu a lição Que lá não tinha sossego E voltou pra Goianinha Fundando uma barraquinha A Venda de Joca Galego
Na Vila de Goianinha Do campo velho pra frente Seu Joca abriu uma vendinha Um barraco bem decente Era lá que ele morava E a vendinha ficava Lhe servindo de emprego Mas logo ela ganhou fama E hoje o povo só chama A Venda de Joca Galego
Seu Joca vindo da roça Do sítio de Seu Nezinho Casou com uma linda moça Do Engenho Cauzinho Foi com ela pra cidade Pois na sua mocidade Já pensava em aconchego E hoje ela arruma e passa Cozinha e vende cachaça Na Venda de Joca Galego
Dona Masé uma moça Filha de Mitonho Gaião Deixou a vida da roça Pra trabalhar no balcão Pois toda vida passava Colhendo o milho e a fava Dia a dia sem sossego Por isso não sonharia De ser feliz hoje em dia Na Venda de Joca Galego
O velho Mitonho Gaião Não queria esse namoro E metido a valentão Só vinha com desaforo Mas Joca com paciência Um dia pediu licença Pra casar e ter sossego E fez o velho afrouxar Indo também despachar Na Venda de Joca Galego
Além da agricultura Masé tinha outro trabalho Pois a máquina de costura Era o seu quebra-galho Para fazer suas roupas A vida não era sopa E não tendo um emprego Mesmo antes de casar Às vezes ia ajudar Na Venda de Joca Galego
Nesta vidinha sem graça Masé lhe deu nove filhos Só ele sabe o que passa Pra dá de comer e vesti-los Pagar remédios e escolas Comprar bonecas e bolas Se pensar perde o sossego É dura a vida de pai Pois o dinheiro só sai Da Venda de Joca Galego
Senhor Joca sempre quis Freqüentar uma escola Mas o destino infeliz Nunca lhe deu esta bola Mas hoje vive lutando Pra ver seus filhos estudando E conseguir um bom emprego Mas antes de estudar Tiveram que ajudar Na Venda de Joca Galego
Ivaneide na Rural Formou-se em Zootecnia E como é natural Já está de agonia Sem ter onde trabalhar Resolveu ir ensinar Enquanto não tem emprego Pois não deseja voltar Pra novamente ajudar Na Venda de Joca Galego
Ismael já é formado No curso de Agronomia Ficou um pouco atrasado Porém o seu dia a dia Já se tornou natural Pois trabalha na Rural E não deseja outro emprego Porque já teve ascensão Pra não voltar pro balcão Da Venda de Joca Galego
Izabel já se formou Em Fonoaudiologia E um consultório montou Porque produzir queria Pra crescer na profissão Fez Especialização Depois arranjou emprego Pois o dinheiro não dava E no seu sonho não tava A Venda de Joca Galego
Ivone na Unicap Formou-se em Economia Não foi válvula de escape Pois era o que ela queria Não gostava de boneca Era mesmo uma sapeca E como filósofo grego Queria tudo mudar E até o lucro aumentar Na Venda de Joca Galego
Itamir lá na Rural Formou-se em Veterinária E por gostar de animal Caiu bem na sua área Lutando que só a peste No INAMPS fez um teste E arranjou um emprego Ficando feliz da vida Porque livrou-se das idas Pra Venda de Joca Galego
Isis na FESP está Estudando Medicina Mas teve que trabalhar Pra poder ficar por cima Teve um trabalho danado Se não tivesse cuidado Perdia a fé e o sossego Depois tinha que voltar Pra outra vez despachar Da venda de Joca Galego
Hibernon é diferente Nunca gostou de estudar Por isso daqui pra frente Vai ter é que trabalhar Ficando lá na bodega Vendendo e fazendo entrega Ou procurar outro emprego Pois pra vestir e comer Sem trabalhar não vai ter Na Venda de Joca Galego
A Íris agora está Em Administração Vive só pra estudar Sem ter remuneração Ela também faz Direito Deixando o pai satisfeito E a menina em sossego Porque ela não gostou Do sufoco que passou Na Venda de Joca Galego
Ivonalda ainda está Fazendo segundo grau Porém não quer mais voltar Pra sua terra natal Só quer a felicidade De entrar na faculdade E arranjar bom emprego Porque estava cansada De abrir de madrugada A Venda de Joca Galego
Ismael ficou feliz Quando nasceu Isabela Por isso ele sempre diz Que não existe mais bela Porém Joca não gostou De ser chamado de avô Dizendo que isso é grego Mas da vida se esquece Quando a netinha aparece Na Venda de Joca Galego
E Ítalo o outro neto O filho de Itamir Não consegue ficar quieto Mexendo aqui e ali Mas Joca se engraceja Despachando uma cerveja A um freguês de apego Ouvindo o mesmo dizer Este neto faz chover Na Venda de Joca Galego
Vendo a família aumentar O rosto de Joca brilha Por isso vive a sonhar Com filhos de todas filhas E pra aumentar seu brilho Vem ai Ismael Filho Fazendo ele ter apego De ver o neto ficar Ajudando a despachar Na venda de Joca Galego
Como é da natureza Crescer e depois morrer Entre riqueza e pobreza Disso ninguém vai correr Além de sofrer demais Joca perdeu os seus pais Mas não perdeu o apego De no balcão agradar Aquele que vai comprar Na Venda de Joca Galego
Com sua tamanha idade Já tem muito a ensinar Sempre gostou da verdade Nunca deu pra enganar De briga já nem se fala Porque se existe bala É de menino sossego E o revólver é de mel Até parece um céu A Venda de Joca Galego
A Vila se emancipou Crescendo pra todo lado E um novo nome ganhou Hoje se chama Condado E a venda que o povo gosta É Mercearia Costa Mas por causa do apego O povo não quis mudar E continua a chamar A Venda de Joca Galego
O campo velho acabou Virou área de lazer Mas sei que o povo gostou Porque futebol vai ver Num campo sofisticado Que fica um pouco afastado Longe daquele aconchego Mas continua agradar Naquele mesmo lugar A Venda de Joca Galego
No entra e sai de mandato Dessa tal de prefeitura O povo é quem paga o pato De tanta nova moldura Pois Rua José Gaião Já foi Rua do Pião E o povo não tem sossego Mas ainda continua Abrindo as portas pra rua A Venda de Joca Galego
Se o Brasil for dividido Formando o país Nordeste Vai ver que no bom sentido Os homens cabra da peste Que são do lado de cá Não são como os de lá Pois se viram sem emprego E um deles até fundou Com futuro promissor A Venda de Joca Galego
Agora vou lhe contar As qualidades da venda Mas em um livro não dá Pra escrever sua prenda Ali só tem coisa boa Quem compra lá ri a toa Sem precisar de arrego Pois lá o dinheiro cresce Até milagre parece A Venda de Joca Galego
Desde quando foi fundada Sempre tratou com respeito Agradando a garotada Com bolo, doce e confeito É a melhor da cidade Vendendo à comunidade Rico, pobre, branco e nego Todos com satisfação E também sem distinção Na Venda de Joca Galego
Pra qualquer tipo de festa Que precisar de mantimento Aquela venda se presta Pra todos a todo momento Tem champanhe pro natal Talco para o carnaval Sabonete pro chamego E peixe na semana santa Por isso o povo se encanta Na Venda de Joca Galego
Aquela venda é das boas Pois além de fazer feira Você pode dizer loas Depois de uma bebedeira Alguém vai lá comprar pão Mas ao chegar no balcão Sentindo seu aconchego Toma logo uma lapada Da aguardente afamada Da Venda de Joca Galego
Se tem amigos bebendo Mesmo estando ocupado Joca vai se entretendo E até fica inspirado Dizendo espirituoso Loas precisa e de gozo Das que causam um chamego Deixando a turma animada Caindo na gargalhada Na Venda de Joca Galego
“O pinto quando nasceu Olhou pra mãe e sorriu Bebe tu e bebo eu Bebe a puta que partiu” Essa é mais uma loa Que escutei numa boa E escuto quando chego Prestando bem atenção Debruçado no balcão Da venda de Joca Galego
Se um gaúcho chegar E procurar chimarrão No atendimento exemplar Ele babe um alcatrão O mesmo é se aparecer Um gringo e quiser beber Uma bebida de grego Por certo vai engolir Outra pra substituir Na Venda de Joca Galego
Pitu, cerveja, sardinha Cigarro, pão, guaraná Bolo, biscoito, farinha Pasta, refresco, fubá No tempo do carnaval Como é festa especial Tem talco para o chamego Tem maizena e colorau Pra levantar seu astral Na Venda de Joca Galego
Da grande a pequena conta A sua venda abastece Vendendo de ponta a ponta Nesta cidade que cresce Às vezes de bicicleta Ou numa caminhoneta Ele faz o seu chamego Da cidade ao barracão Sem quebrar a direção Da Venda de Joca Galego
De fila lá não carece Nem ninguém fica por fora Pois quando o freguês aparece É atendido na hora Pra comprar arroz, feijão Café, açúcar ou sabão Assim com tanto sossego Não existe outro lugar Por isso só vou comprar Na Venda de Joca Galego
Além disso, que falei Vou lhe contar mais um fato Lá se criou uma lei Pra só se vender barato E dos cantos onde andei Eu juro nunca encontrei Preço bom assim que chego E pra economizar O povo só vai comprar Na Venda de Joca Galego
A cidade foi crescendo Muita coisa já mudou Mas a Venda vem atendendo Do jeito que começou Ela fica numa esquina Como uma bela menina Seduzindo branco e nego Vem gente de todo canto Todos dizendo é um encanto A Venda de Joca Galego
Caro amigo leitor Aquela venda te espera Com amizade e amor Apareça em qualquer era Quando estiver folgado Passe um dia em Condado E visite o aconchego Pois mesmo sem ir comprar No coração vai levar A Venda de Joca Galego
Esse pequeno trabalho Literário de poesia Tenta contar em retalho Um bonito dia a dia De um pai sacrificado Que tem lutado um bocado Para tirar do emprego Estudo, saúde e pão Sem tirar sua atenção Da Venda de Joca Galego
Tive um trabalho danado Pra esses versos escrever Pois estava preocupado Em agradar a você Por isso caro leitor Se o cordel não lhe agradou Não tenha desassossego Pois para lhe compensar Peço que vá visitar A Venda de Joca Galego.
Literatura de Cordel sábado, 23 de setembro de 2017
A CHEGADA DE LAMPIÃO NO CÉU
Lampião foi no inferno
Ao depois no céu chegou
São Pedro estava na porta
Lampião então falou:
– Meu velho não tenha medo
Me diga quem é São Pedro
E logo o rifle puxou
São Pedro desconfiado
Perguntou ao valentão
Quem é você meu amigo
Que anda com este rojão?
Virgulino respondeu:
– Se não sabe quem sou eu
Vou dizer: sou Lampião.
São Pedro se estremeceu
Quase que perdeu o tino
Sabendo que Lampião
Era um terrível assassino
Respondeu balbuciando
O senhor… está… falando…
Com… São Pedro… Virgulino!
Faça o favor abra esta porta
Quero falar com o senhor
Um momento meu amigo
Disse o santo faz favor
Esperar aqui um pouquinho
Para olhar o pergaminho
Que é ordem do Criador
Se você amou o próximo
De todo o seu coração
O seu nome está escrito
No livro da salvação
Porém se foi um tirano
Meu amigo não lhe engano
Por aqui não fica não
Lampião disse está bem
Procure que quero ver
Se acaso não tem aí
O meu nome pode crer
Quero saber o motivo
Pois não sou filho adotivo
Pra que fizeram-me nascer?
São Pedro criou coragem
E falou pra Lampião
Tenha calma cavalheiro
Seu nome não está aqui não
Lampião disse é impossível
É uma coisa que acho incrível
Ter perdido a salvação
São Pedro disse está bem
Acho melhor dar um fora
Lampião disse meu santo
Só saio daqui agora
Quando ver o meu padrinho
Padre Cícero meu filhinho
Esteve aqui mas foi embora
Então eu quero falar
Com a Santa Mãe das Dores
Disse o santo ela não pode
Vir aqui ver seus clamores
Pois ela está resolvendo
Com o filho intercedendo
Em favor dos pecadores
Então eu quero falar
Com Jesus crucificado
Disse São Pedro um momento
Que eu vou dar o seu recado
Com pouco o santo chegou
Com doze santos escoltado
São Longuinho e São Miguel,
São Jorge, São Simão
São Lucas, São Rafael,
São Luiz, São Julião,
Santo Antônio e São Tomé,
São João e São José
Conduziram Lampião
Chegando no gabinete
Do glorioso Jesus
Lampião foi escoltado
Disse o Varão da Cruz
Quem és tu filho perdido
Não estás arrependido
Mesmo no Reino da Luz?
Disse o bravo Virgulino
Senhor não fui culpado
Me tornei um cangaceiro
Porque me vi obrigado
Assassinaram meu pai
Minha mãe quase que vai
Inclusive eu coitado
Os seus pecados são tantos
Que nada posso fazer
Alma desta natureza
Aqui não pode viver
Pois dentro do Paraíso
É o reinado do riso
Onde só existe prazer
Então Jesus nesse instante
Ordenou São Julião
Mais São Miguel e São Lucas
Que levassem Lampião
Pra ele ver a harmonia
Nisto a Virgem Maria
Aparece no salão
Aglomerada de anjos
Todos cantando louvores
Lampião disse: meu Deus
Perdoai os meus horrores
Dos meus crimes tão cruéis
Arrependeu-se através
Da Virgem seus esplendores
Os anjos cantarolavam
Saudando a Virgem e o Rei
Dizendo: no céu no céu
Com minha mãe estarei
Tudo ali maravilhou-se
Lampião ajoelhou-se
Dizendo: Senhora eu sei
Que não sou merecedor
De viver aqui agora
Julião, Miguel e Lucas
Disseram vamos embora
Ver os demais apartamentos
Lampião neste momento
Olhou pra Nossa Senhora
E disse: Ó Mãe Amantíssima
Dá-me a minha salvação
Chegou nisto o maioral
Com catinga de alcatrão
Dizendo não pode ser
Agora só quero ver
Se é salvo Lampião
Respondeu a Virgem Santa
Maria Imaculada
Já falaste com meu Filho?
Vamos não negues nada
– Já ó Mãe Amantíssima
Senhora Gloriosíssima
Sou uma alma condenada
Disse a Virgem mãe suprema
Vai-te pra lá Ferrabrás
A alma que eu pôr a mão
Tu com ela nada faz
Arrenegado da Cruz
Na presença de Jesus
Tu não vences, Satanás
Vamos meu filho vamos
Sei que fostes desordeiro
Perdeste de Deus a fé
Te fazendo cangaceiro
Mas já que tu viste a luz
Na presença de Jesus
Serás puro e verdadeiro
Foi Lampião novamente
Pelos santos escoltado
Na presença de Jesus
Foi Lampião colocado
Acompanhou por detrás
O tal cão de Ferrabrás
De Lúcifer enviado
Formou-se logo o júri
Ferrabrás o acusador
Lá no Santo Tribunal
Fez papel de promotor
Jesus fazendo o jurado
Foi a Virgem o advogado
Pelo seu divino amor
Levantou-se o promotor
E acusou demonstrando
Os crimes de Lampião
O réu somente escutando
Ouvindo nada dizia
A Santa Virgem Maria
Começou advogando
Lampião de fato foi
Bárbaro, cruel, assassino
Mas os crimes praticados
Por seu coração ferino
Escrito no seu caderno
Doze anos de inferno
Chegou hoje o seu destino
Disse Ferrabrás: protesto
Trago toda anotação
Lampião fugiu de lá
Em busca de salvação
Assassinou Buscapé
Atirou em Lucifer
Não merece mais perdão
Levantou-se Lampião
Por esta forma falou
Buscapé eu só matei
Porque me desrespeitou
E Lucifer é atrevido
Se ele tivesse morrido
A mim falta não deixou
Disse Jesus e agora
Deseja voltar à terra
A usar de violência
Matando que só uma fera?
Disse Lampião: Senhor
Sou um pobre pecador
Que a Vossa sentença espera
Disse Jesus: Minha mãe
Vou lhe dar a permissão
Pode expulsar Ferrabrás
Porém tem que Lampião
Arrepender-se notório
Ir até o “purgatório”
Alcançar a salvação
Ferrabrás ouvindo isto
Não esperou por Miguel
Pediu licença e saiu
Nisto chegou Gabriel
Ferrabrás deu um estouro
Se virou num grande touro
Foi dar resposta a Lumbel
Resta somente saber
O que Lampião já fez
Do purgatório será
O julgamento outra vez
Logo que se for julgado
Farei tudo versejado
O mais até lá freguês.
Literatura de Cordel terça, 19 de setembro de 2017
LENDA DO CAIPORA - FOLHETO DE GONÇALO FERREIRA DA SILVA
A humana criatura se pergunta insatisfeita: Como uma coisa existe sem nunca ter sido feita? – Quem prega não prova nada quem escuta não aceita.
Diz a gênese mosaica que Deus Pai Onipotente disse: “Faça-se a luz” e a luz obediente do atro abismo do nada surgiu repentinamente.
Assim também são as lendas as vezes surgem do nada ou como reminiscência duma cultura importada que sempre sensibilizam gente não civilizada.
De acordo com tais lendas há o regente do mar, o deus dos mananciais, o gênio que rege o ar, e é de um desses gênios que nós queremos falar.
Vivendo na intimidade da aconchegante flora como um guardião que zela a quem mais ama e adora é o protetor da fauna o lendário caipora.
E o caçador prudente ao conduzir o seu cão antes de entrar na mata deve, por obrigação ao caipora pedir a sua autorização.
Senão estará sujeito a ser desafortunado ou inexplicavelmente ficar desorientado andando em círculo na mata por tempo indeterminado.
Outras vezes algo estranho fica o cachorro sentindo andando em torno do dono se lastimando e ganindo sem que o dono perceba quem o está perseguindo.
Outro artifício que é pelo caipora usado é reter o cão esperto infantilmente acuado latindo muito diante dum toco designado.
“Hoje não é o meu dia” pensa imediatamente o caçador convidando o cão desobediente que abana o rabo, entretanto, volta a latir novamente.
Agora o caçador sente um inexplicável frio tenta dominar o medo porém sente um arrepio algo como um mudo aviso, um sentimento sombrio.
Pedras à feição de trempes bota na mata fechada acende fogo dizendo: – Vamos parar a jornada só depois da hora-grande reinicia a caçada.
Mas depois da hora-grande incompreensivelmente ouve o caçador um longo assovio à sua frente o caçador intrigado escuta detidamente.
Gira sobre os calcanhares segue oposta direção mas não percorre uma jarda tem ele a decepção de saber que o assovio já mudou de posição.
E assim pra todo lado em que o caçador for segue o assovio como se o assoviador se entretenha mangando da cara do caçador.
Um caçador nos contou um curioso ocorrido um caso igualmente aquele nunca tinha acontecido dessa vez o caipora se deixou ser percebido.
Quando entrou na mata virgem repentinamente viu três porcos-do-mato que quando ele os pressentiu os alvejou um por um até que o último caiu.
Quando ia dirigir-se aos porcos mortos no chão um moleque apareceu com um enorme ferrão montado num porco-espinho na densa vegetação.
E enfiando o ferrão nos flancos dum animal mandou-o se levantar que o tiro não foi mortal o porco saiu correndo por dentro do matagal.
Repetiu com o segundo essa mesma operação e no terceiro também ele enfiou o ferrão os animais dispararam sem vestígios de lesão.
A seguir o caipora dirigiu-se a um ribeiro simulando raiva disse: – Vou amanhã ao ferreiro consertar este ferrão pra ele ficar linheiro.
Logo o caçador pensou: “Amanhã eu vou ficar na porta da oficina ver se alguém vai chegar com um ferrão como este para mandar consertar”.
Chegando em casa, sequer colocou da porta a tranca num dos cantos da latada colocou sua alavanca e depois da sua esposa acariciou a anca.
E foi dormir levemente para acordar muito cedo para saber se o ferreiro conhecia algum segredo porque durante a caçada pra ser franco, teve medo.
O sol já estava alto… o caçador conversando com seu amigo ferreiro sobre negócios tratando quando avistaram um vaqueiro que vinha se aproximando.
Quando o vaqueiro apeou foi exibindo um ferrão dizendo para o ferreiro: – Tenho muita precisão que conserte este instrumento com a maior perfeição.
Sem querer teve o ferreiro um leve estremecimento mas consertou o ferrão naquele mesmo momento e disse para o vaqueiro: – Eis aí seu instrumento.
Disse o vaqueiro: – O ferrão está como me convém fitando o caçador disse: – Preste atenção muito bem o que você viu de noite não conte nunca a ninguém
Literatura de Cordel segunda, 18 de setembro de 2017
DISCUSSÃO DO MACUMBEIRO E O CRENTE, FOLHETO DE GONÇALO FERREIRA DA SILVA
Carnaval e futebol ficaram pra se curtir, Os santos ensinamentos são para o crente seguir, religião e política embora mereçam crítica não são pra se discutir
Evangelista e Pilintra não pensam do mesmo jeito, pois enquanto Evangelista diz que foi por Cristo aceito Pilintra bate no bumba dizendo que é na macumba que se faz tudo bem feito.
Porém, embora os dois pensem de maneira diferente, nunca tinham discutido porque até o presente não tinham, por sorte rara, oportunidade para um encontro frente a frente.
Mas um dia Evangelista voltava alegre do culto quando avistou muito longe de Pilintra o negro vulto que já vinha da macumba no morro da Catacumba já foram trocando insulto.
E onde os dois se encontraram era uma encruzilhada onde havia uma bebida à Pomba Gira deixada e uma galinha preta pertinho de uma valeta para um Exu colocada
– Que pecado monstruoso – disse o crente, o dedo em riste é triste um pecador crer num troço que não existe e fazer o mal com isto agravando a Jesus Cristo é vinte mil vezes triste
Pilintra lhe respondeu: – Preste muita atenção, moço, se macumba não existe não carece de alvoroço Deus também nunca lhe disse pra querer ter a burrice de ser santo em carne e osso.
Não era tarde da noite, umas dez horas, e tantos, começou a chegar gente vinda de todos os cantos, outros vinham feito loucos, os que há pouco eram poucos já não se sabia quantos.
A rua ficou lotada de toda espécie de gente, muitos pelo macumbeiro, outros a favor do crente; os aplausos ao combate serviam para o debate ficar cada vez mais quente
Pilintra disse: – Vocês os crentes só fazem o bem mas falam de todo mundo, razão só vocês que têm e eu na minha macumba vivo bem com minha dumba sem falar mal de ninguém.
O crente bateu com as juntas dos dedos na negra capa da Bíblia e ameaçou dar no macumbeiro um tapa e disse: – Na minha crença eu não admito ofensa mesmo que seja do Papa.
Portanto pode chamar seu caboclo furacão Pena Branca de Aruanda, São Cosme e São Damião Zé Pilintra e Preto Velho que a luz do meu Evangelho deixa todos sem ação.
Respondeu Pilintra: – Os guias não são para ser chamados para assistir bate-boca nem para fazer mandados. São emissários benditos que quando estamos aflitos vêm nos fazer consolados.
O crente cego de ódio disse: – Cara, muito bem qual é a luz que um espírito que vive nas trevas tem? E como é que tu levas fé num espírito das trevas que nunca ajudou ninguém?
– O mal – respondeu Pilintra que mais combato e censuro e que o reino de Deus é pra vocês no futuro, estão errados, declaro para vocês tudo é claro para os demais é escuro.
Convide seus Orixás Iansã, Nanã, Ogum, Omulu, Xangô, Oxóssi, Iemanjá e Oxum, Mariazinha da Praia que quero dar uma vaia pois não respeito nem um.
– Atire esta Bíblia fora – disse Pilintra arrogante, respeite a religião que segue o seu semelhante senão eu lhe meto o murro porque o destino do burro é morrer ignorante.
Um dos espectadores quis o Pilintra agredir, a turma do “deixa disso” fez intruso sair com a recomendação de não entrar na questão deixando os dois discutir.
A discussão nesta altura já parecia uma briga, vai ofensa, vem ofensa e no meio da intriga que parecia arruaça a plateia achava graça de dar cãibra na barriga.
Os homens tinham energia na garganta como poucos, dando socos no espaço, já completamente roucos uns riam pelo que viam, outros riam dos que riam, era um festival de loucos.
Ninguém mais se entendia no meio da discussão. Evangelista deixou a Bíblia cair no chão, e Pilintra não sabia porque razão discutia com tão voraz decisão.
Certo é que nem um queria perder aquela disputa, Pilintra não ia dar mole nem que fosse a força bruta, até o quinto mandamento não cumpriria no momento para não perder a luta.
Parecia que a disputa, duraria a noite inteira, mas antes da hora grande Pilintra com voz maneira disse: – Acabo a raça sua, vou chamar seu Tranca-Rua, Encruzilhada e Caveira.
Evangelista com isso perdeu logo a esportiva e disse: – Convide alma de preta velha cativa, de velho catimbozeiro que quero ver mandingueiro comigo ter voz ativa.
Um gozador que ouvia a disputa atentamente fez um boneco de pano muito negro e reluzente, jogou para o alto o treco e a droga do boneco caiu bem nos pés do crente.
O crente soltou um grito e quis sair na carreira, mas ao escutar as vaias daquela cambada inteira ouviu do canto da praça um sujeito achando graça igualmente uma caveira.
O crente, no desespero quis esboçar reação, buscando apoio do povo disse acenando com a mão: – Todo infeliz macumbeiro é bandido e maconheiro, é assassino e ladrão.
Com estas frases Pilintra ficou muito indignado e disse: – Cara não faça juízo precipitado, até o momento presente não sei porque todo crente tem a fala de viado.
Destas palavras pra frente ninguém entendeu ninguém, foi muito grande o tumulto guias chegaram do além, para esquentar o ambiente no final até o crente recebeu santo também.
Quando o guia incorporado no crente foi novamente para região celeste todo o pessoal presente entre risos e charadas, num festival de risadas todos mangavam do crente.
No morro da Catacumba Pilintra lia convencido da discussão o poema achando não ter perdido, o crente em sua Assembleia também lia a epopeia certo que tinha vencido.
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Literatura de Cordel sábado, 16 de setembro de 2017
AS CONSEQUÊNCIAS DA COMPRA DO VOTO
Quem negocia seu voto Prega a corrupção, Não pode exigir depois Nenhuma pequena ação Daquele seu candidato Que escolheu na eleição.
Aquele que vende o voto Sem saber faz aumentar A injustiça social, Pois não pode nem cobrar Trabalho do candidato Depois que este ganhar.
O crápula que compra votos Do povo não quer saber, O que ele pretende mesmo É adquirir o poder Pra roubar dinheiro público E assim enriquecer.
O triste que compra voto Não tem nenhum compromisso Com saúde, educação Nem quer saber se há serviço Pro homem trabalhador Da favela ou do cortiço.
Cidadão que vende o voto Por carência ou ingenuidade É vítima dos poderosos, Que vêm com ar de bondade, Disfarçados de cordeiros Pra esconder toda maldade.
Quem oferece seu voto Em troca de uma vantagem Contribui para aumentar O capitalismo selvagem Que instalou-se em nosso meio E é pai da politicagem.
Por isso meu caro amigo Preste muita atenção, No dia que for votar Não se leve por emoção, Escolha quem é honesto, Quem ao pobre dá razão.
Quando escolher candidato Veja bem o seu passado: Se lutava pelo pobre, Denunciava o errado, Se nunca aceita propina, Se parece equilibrado.
É preciso estar atento Pra não cair em cilada, Pois de político esperto A rua está tomada, Portanto pense, analise O que diz o camarada.
Desconfie quando o sujeito Em tempo de eleição De repente fica simples, Vai logo dando-lhe a mão, Pondo no colo criança Dizendo cheio de esperança: É o futuro da nação!
Cuidado com o camarada Que só vive garantindo Resolver todo problema, Que diz nunca está mentindo, Que dá tapinha nas costas, Chamando amigo nas portas E que só vive sorrindo.
Não se engane com o político Que vive a prometer Emprego e vida fácil Depois que ele se eleger, Isso é conversa pra trouxa Que não tem o que fazer.
Não deixe o seu lugar Ser chamado de banal E não ser reconhecido Por curral eleitoral Como quem usa cabresto, Pois ninguém é animal.
Não faça como José, Morador da Barra Funda, Que dizia: – O meu voto, O de Pretinha e Raimunda É só pra quem tem dinheiro, Quem não pensar desse jeito Leva logo um pé na bunda.
Não imite Severino, Que no dia da eleição Andava com os bolsos cheios Achando-se com razão Para comprar todo o povo Que não tinha condição.
Se assim você agir Com certeza vai sofrer As conseqüências depois, O sujeito vai querer Recuperar seu dinheiro Quando alcançar o poder.
E logo não vai poder Fazer o que prometia E se você reclamar, Quiser uma benfeitoria Depressa ele vai falar: – Po’daqui se retirar Comprei seu voto, sabia?
É triste a sina de quem Empresta ou vende o voto. Joaquim disse: – menino Eu nunca que me importo Com essa tal corrupção Quem me pagar na eleição Viro ateu ou devoto.
E chegou um candidato Dirigiu-se a Joaquim: – Dou-lhe uma chapa novinha Se você votar em mim, Compro a de baixo no pleito E a outra se eu for eleito Espero não ache ruim.
Veja só o constrangimento Desse ingênuo eleitor Ao saber que o candidato A eleição não ganhou, Pois ficou sem mastigar E muita gente zombou.
Há também quem compre voto Por um quilo de farinha, Por um par de alpargatas Ou até mesmo uma galinha Fazendo o povo objeto À noite ou de manhãzinha.
Só que todo o corrupto Age bem a qualquer hora, Oferece o que tiver, Mas cobra juro de mora Do povo quando eleito, Engana e não vai embora.
Para que tudo isso mude O povo tem que agir Em busca de um mundo novo, Solução é construir A nossa independência E sabendo com freqüência Político sério exigir.
Não é fácil a tarefa, Mas precisamos tentar Porque a corrupção Está em todo lugar, Para ter um mundo honesto Fuja de político esperto E não se venda ao votar!
Literatura de Cordel sexta, 15 de setembro de 2017
DISCUSSÃO DO CARIOCA COM O PAU-DE-ARARA - FOLHETO DE APOLÔNIO ALVES DOS SANTOS
Já que sou simples poeta poesia é meu escudo com ela é que me defendo já que não tive outro estudo vou mostrar para o leitor que o poeta escritor vive pesquisando tudo
Certo dia feriado sendo o primeiro do mês fui tomar uma cerveja no bar de um português lá assisti uma cena agora pego na pena para contar pra vocês
Quando eu estava sentado chegou nessa ocasião um velho pernambucano daqueles lá do sertão com a maior ligeireza foi se sentando na mesa pediu uma refeição
O português logo trouxe um prato grande sortido o nortista vendo aquilo ficou logo enfurecido com um gesto carrancudo começou mexendo tudo depois falou constrangido
Patrício não leve a mal nem me queira achar ruim toda espécie de comida que você tem é assim? desculpe minha expressão mas a sua refeição não vai servir para mim
Nesta hora o português ficou zangado também lhe respondeu ora bola donde é que você vem? difamando deste jeito me diga qual o defeito que esta comida tem?
O nortista disse eu sofro um ataque entistinal a carne está quase podre o arroz tem muito sal o feijão está azedo de comer eu tenho medo que pode me fazer mal
” O meu estômago não dá pra receber este entulho prefiro morrer de fome mas não como este basculho pois comendo sei que morro lá no norte nem cachorro não come todo bagulho
O português respondeu você é péssimo freguês vá embora e faz favor não vir aqui outra vez mas antes tem que pagar não posso lhe perdoar a desfeita que me fez
O nortista disse eu pago que isto não me embaraça para você não pensar que eu vim comer de graça mas o nortista de nome embora morra de fome mas não come esta desgraça
Acontece que ali se achava um carioca disse ele só conhece farinha de mandioca todo nortista poeira só gosta de macacheira girimum e tapioca
Disse o nortista é porisso que o nordestino é forçoso porque no meu velho norte se come pirão gostoso com farinha de mandioca aqui só dá carioca doente tuberculoso
C. ” Respondeu o carioca não queira tanto agravar seu nordeste é muito bom mas lá ninguém quer ficar deixou lá seu pé de serra e veio pra minha terra para poder escapar
N. ” Aqui também me pertence o nortista respondeu eu sou nato brasileiro o Brasil é todo meu o homem precisa andar para poder desfrutar do país onde nasceu
C. ” O carioca rompeu nordestino é curioso além de ter olho grande é demais ambicioso chega aqui se amaloca na terra do carioca doente tuberculoso
N. ” Disse o nortista é porque nosso Rio de Janeiro precisa do nordestino pois é um povo ordeiro pra quem derrama suor aqui no Rio é melhor para se ganhar dinheiro
C. ” Mas no Rio de Janeiro tem operário de sobra não precisa nordestino vir aqui fazer manobra nordestino é atrevido aqui já é conhecido por camondonga de obra
N. ” Você me diz isso tudo pra me desclassificar mas aqui as companhias preferem mais empregar os nordestinos que vem pois carioca não tem coragem de trabalhar
C. ” É porque o carioca gosta da civilidade não é defeito ninguém viver da facilidade pois ninguém não é cavalo pra viver criando calo sem haver necessidade
N. ” O carioca só gosta de viver da malandragem do jogo e da bebedeira do vício e da vadiagem porisso o país da gente não pode ir para a frente por causa da pilantragem
C. ” O carioca está certo pensando assim pensa bem o carioca não gosta de ser sujeito a ninguém nem dá valor a operário que só vive do salário luta muito e nada tem
N. ” Já eu penso diferente você precisa entender que nosso mundo é composto de tudo precisa ter se não fosse o operário o rico milionário como podia viver?
C. ” Mas o nortista trabalha porque é muito uzurario tem alguém que vem pra qui mas lá é proprietário pois devido a ambição enfrenta até fundação com os olhos no salário
N. ” É porque o nordestino é um homem acostumado a só viver do trabalho não ignora o pesado não é como o carioca que só vive da fofoca da malandragem e do fado
C. ” Tinha graça o carioca se misturar com cimento como faz o nordestino que chega ficar cinzento carioca só procura um emprego que figura moral e comportamento
N. ” Não é todo carioca que tem a capacidade de assumir um emprego de alta dignidade precisa de estudar para assumir um lugar de responsabilidade
C. ” Você aí está certo o estudo está na frente porque o mundo ficou para o mais inteligente assim diz quem for ativo o operário é cativo num país independente
N. ” Pois eu gosto do trabalho e vivo sempre disposto pois o homem que trabalha a Jesus dá grande gosto porque Deus disse a Adão hás de ganhar o teu pão com o suor do teu rosto
C. ” Então você é Adão que veio do paraíso faça lá o que quiser que de você não preciso nem vou na sua maloca porque sou um carioca que honro o chão onde piso
N. ” Nem de você eu preciso que você é fracassado pelos traços já se vê que você é pé rapado e quem fala deste jeito só pode ser um sujeito ignorante atrasado
C. ” Disse o carioca eu vivo com minha alma tristonha vou embora para onde o nordestino nem sonha vou esconder minha cara para este pau-de-arara não me matar de vergonha
Literatura de Cordel quinta, 14 de setembro de 2017
O DEZRÉIS DO GOVERNO, FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Conversavam dous vizinhos Moradores de um sobrado Exclamou, um oh! vizinho! Já viu o que tem se dado? O quê? – Perguntou o outro Os 5 réis do estado.
Pergunta outro vizinho Não é esse do vintém? É um imposto damnado Que não escapa ninguém, É peior do que bexiga Não repara mesmo alguém.
Bexiga ainda tem vacina Que um outro sempre escapa Mais esse imposto d’agora! Só a doutrina do Papa Qualquer cousa que se compra Os fiscais dão mão de raspa.
Não me recordo do dia Já estraguei a lembrança Meu tio tem avó em casa Foi fazer uma mudança Pois para tirar a velha Foram com ella a balança.
Morreu uma italiana No pateo de São José Pesavam cento e dez quilos Os bichos de cada pé, Foi pesada e pagou tudo Veja o mundo como é.
O carcamano pai d’ella Humilde que só um réu Dizia senhor perdoe-me Isso faz chamar o céo, Disse o fiscal faz lá nada Isto aqui é um pitéu.
Senhor! Exclamava o velho Não tem isso nem aquilo Dizia serio o fiscal Aqui não escapa um grilo, Á de pagar o estado Cinco réis por cada kilo.
Outro italiano velho Que vivia aqui na praça Com dez kilos de remendo Que tem no fundo da calça, Quis sahir para a Italia E não pode sahir de graça.
O gringo velho exclamava Lançando um olhar no mundo Oh! Senhor! este Brasile É um abismo profundo, Eu hei de levar a calça Mas hei de deixar o fundo.
Comprou 3 caixas de flandre Um funileiro atrasado Ia sahindo escondido Levando o flandre guardado Disse um fiscal não senhor Seu flandre á de ser pesado.
Nosso Brasil hoje está Como quando inda era inculto Quem foi quem já viu pagar Por um meio absoluto? Pesar-se em meio da praça Até fumo de matuto!
Eu já tive uma idéia Encuti no pensamento Quando entrar outro governo A novo regulamento, Eu creio que inda se pesa Chuva, sol, poeira, e vento.
Não sei o que descubram mais Para acabrunhar o povo É medonho o disparate Que traz o governo novo Fica tudo igual ao pinto Que morre dentro do ovo.
Antes de haver eleição Só vê-se é prometimento Dizerem tudo melhora Muda-se o regulamento A melhora é augmentarem Do que está sento por sento.
O mundo vai tão errado E a cousa vai tão feia A garantia do pobre É ponta-pé e cadeia, As creanças já não sabem O que é barriga cheia.
A Semana tem seis dias Quem quiser andar direito Há de dar dous ao estado E dois e meio ao prefeito, E não á de se queixar Nem ficar mal satisfeito.
O commercio nada perde Ganha com isso tambem Cresse cinco réis de imposto Elle cá sobe um vintem, E diz: chore quem chorar Eu não sou pai de ninguem.
Entretanto o Brasileiro Tem muito o que padecer O governo que era o unico Que podia proteger, Diz: eu enchendo a barriga Tudo mais pode morrer.
Assim mesmo ha homem Inda esperando melhora E vê que a justiça é cega Disse hontem e nega agora, E surda não ouve o echo Do pobre aflicto que chora.
Literatura de Cordel quarta, 13 de setembro de 2017
A ONÇA E O BODE, FOLHETO DE JOSÉ COSTA LEITE
Uma pobre onça vivia em uma mata deserta dormindo ali, acolá não tinha morada certa exposta a chuva e o vento cochilando no relento sem travesseiro ou coberta.
Certa vez a onça estava pensando na sua vida havia chovido a noite ela estava enfraquecida com fome e toda molhada além disso, resfriada pois se molhou na dormida.
A onça disse consigo: “Isso assim não fica bem vivo por dentro dos matos sofrendo como ninguém nunca pude preparar uma casa pra morar e quase todo bicho tem”.
E esse plano na mente pegou idealizar dizendo assim: Quando chove eu só falto me acabar se Deus do céu me valer brevemente eu vou fazer uma casa pra morar.
Na ribanceira dum rio viu o canto apropriado a onça limpou o terreno deixando tudo ciscado resolveu ir descansar pra depois de recomeçar quando passasse o enfado.
Acontece que o bode teve o mesmo pensamento disse: Eu durmo no mato passo a noite no relento exposto a muitos perigos a sanha dos inimigos sujeito a chuva e o vento.
– Eu vou cuidar em fazer uma casa pra morar quando estiver chovendo eu tenho aonde ficar fazendo inveja aos demais pois todos os animais zombar vendo eu me molhar.
Na ribanceira dum rio achou um lugar varrido o bode disse: Eu aqui farei o meu lar querido aqui ninguém me aperreia o rio dando uma cheia eu estarei garantido.
Cortou madeira no mato e cavou na mesma hora os buracos dos esteios já com a língua de fora cansado de trabalhar resolveu ir descansar tomou banho e foi embora. A onça chegando viu o trabalho prosperando disse assim: É Deus do céu que está me ajudando cortou folhas de palmeira trabalhou a tarde inteira e foi-se embora cantando.
O bode chegando achou o serviço quase no fim disse: “Parece que Deus está ajudando a mim pegou tapar o mocambo trabalhou que ficou bambo plantou até um jardim”.
Tomou banho e foi embora e quando a onça chegou botou portas no mocambo e o que faltava tapou cortou folhas de palmeira fez na base de uma esteira forrou tudo e se deitou.
O bode chegando teve uma alegria danada já viu a casa com portas porém não foi caçoada foi chegando perto dela e quando olhou da janela avistou a onça deitada.
E quando o bode falou a onça disse que tinha feito a casa pra morar pois sofrendo muito vinha porém o bode na hora disse: Minha não senhora porque esta casa é minha.
A onça disse: Eu limpei o canto e fui descansar o bode disse: Eu cortei a madeira e fui cavar os buracos dos esteios assim por todos os meios nela sou quem vou morar.
A onça disse: Eu cortei palmeira e cobri ela o bode disse: Eu tapei e fiz o jardim perto dela disse a onça: Eu vou caçar pois eu não quero brigar só sei que vou morar nela.
O bode ficou deitado e a onça foi caçar lá ela matou um bode e trouxe para jantar o outro bode, coitado vendo seu irmão sangrando deu vontade de chorar.
A onça disse ao bode: – Quando me ver pinotear é que está chegando em mim a vontade de brigar da minha casa eu não saio e de fome sei que não caio todo dia irei caçar.
Disse ao bode: Quando eu ficar de pé, espirrando pinoteando bem alto e a barba balançando estou rosnento e voraz pior do que Satanás é bom ir se preparando.
Na caçada o bode viu uma onça pendurada tinha caído no laço ele matou-a de pancada chegou em casa com ela a onça vendo a irmã dela ficou toda arrepiada.
Fez um churrasco da onça e comeu que ficou deitado depois pegou espirrar dando salto agigantado com a barba balançando deitando e se levantando com o maior bodejado.
A onça com medo dele também pegou pinotear para dizer que estava com vontade de brigar nos dois pés se levantou mas o bode nem ligou e danou-se pra espirrar.
O bode de cara feia ficou perto da janela pra pinotear e correr antes do fim da novela ela estava no pagode era com medo do bode e o bode com medo dela.
O bode espirrou de novo fez um grande bodejado a onça saltou no terreiro e entrou no mato fechado o bode correu também no mato inda hoje tem o mocambo abandonado”.
Literatura de Cordel terça, 12 de setembro de 2017
OS SOFRIMENTOS DE JESUS CRISTO
Oh Jesus meu Redentor dos altos Céus infinitos abençoai meus escritos por vosso divino amor leciona um trovador com divina inspiração para que vossa paixão seja descrita em clamores desde o princípio das dores até a ressurreição.
Dentro do Livro Sagrado São Marco com perfeição nos faz a revelação de Jesus crucificado foi preso e foi arrastado cuspido pelos judeus por um apóstolo dos seus covardemente vendido viu-se amarrado e ferido nas cordas dos fariseus.
Dantes predisse o Senhor meus discípulos me rodeiam e todos comigo ceiam mas um me é traidor só a mão do pecador meu corpo ao suplicio vai porém vos digo que vai do homem que por dinheiro transforma-se traiçoeiro contra o Filho de Deus Pai.
Todos na mesa consigo clamavam em alta voz Senhor, Senhor qual de nós vos trai dos que estão contigo disse Cristo: é quem comigo juntamente molha o pão e todos me deixarão mas São Pedro respondeu mestre garanto que eu não vos deixarei de mão.
Em verdade deixarás nesta noite sem tardar antes do galo cantar três vezes me negarás Pedro com gestos leais disse em voz compadecida eis-me a morte preferida mas não serei teu contrário ainda que necessário me seja perder a vida.
Estava tudo benquisto com Pedro dizendo igual até na hora fatal da prisão de Jesus Cristo então quando se deu isto Pedro a espada puxou num fariseu despejou um golpe tão destemido que destampou-lhe o ouvido quando a orelha voou.
Ouviu a voz sublimada de Cristo em reclamação dizendo em repreensão Pedro guarde a tua espada deixa não promovas nada porque tudo é permitido não sejas enfurecido não tentes e nem te alteres pois se com o ferro feres com ele serás ferido.
Jesus na frente seguia na hora que lhe prenderam todos discípulos correram mas Pedro atrás sempre ia de longe coitado via Jesus de queda e de trote sobre as mãos do grande lote cada bordoada um passo até chegar no terraço da casa do sacerdote.
Depois da tropa chegada Jesus foi interrogado bastantemente acusado e Pedro viu da calçada quando veio uma criada perguntando com rigor – Tu és acompanhador do que está preso aqui? Pedro disse: eu nunca vi nem conheço esse Senhor.
E assim continuou de quando em vez a negar antes do galo cantar 3 vezes Pedro negou depois então se lembrou do que Jesus tinha dito amargo e bastante aflito derramou pranto no chão porque fez a transgressão do que disse a Jesus Cristo.
Jesus além da prisão bofetes e pontapés ainda diziam: tu és réu da crucificação e procuravam razão para o tal cruel transporte uma testemunha forte com legalidade pura que lhe desse a desventura passando a pena de morte.
O sacerdote indagou perante os fariseus tu és o Filho de Deus disse Jesus Cristo: eu sou em breve verão que vou pra meu pai Celestial eis a voz sacerdotal pra que testemunha mais do que as blasfêmias tais da boca do mesmo tal.
E rasgando-lhe o vestido cuspiram as faces divinas logo das mãos assassinas foi espancado e ferido nas cordas foi envolvido atado de braço e mão no outro dia então ordenou Pôncio Pilatos dizendo aos insensatos dai-lhe crucificação.
Pilatos bem que sabia quase com realidade que por inveja ou maldade deu-se essa algozaria mas Jesus nada dizia Pilatos quis revogar mas não podia falar tantos que lhe cercavam que lhe pedindo gritavam: mandai-o crucificar.
Sob o poder dos ingratos escribas e fariseus Jesus o Filho de Deus foi entregue por Pilatos os mais horrendos maus-tratos cada um deles fazia Jesus a cruz conduzia golpe de sangue lançava do peso que carregava quando topava caía.
Do seu vestido brilhante brutamente lhe despiram depois noutro lhe vestiram de púrpura agonizante uma coroa infamante de espinhos tecida a mão pra fazerem mangação na cabeça lhe botando todos gritavam zombando viva o rei da nação.
Um algoz lhe espancou com uma cana pesada que com esta bordoada sua cabeça sangrou seu sangue se derramou lavando-lhe os ombros nus e marchando em passo truz para em Gólgota chegar aonde ia se findar morto e pregado na cruz.
Jesus depois de cravado ouviu-se os gemidos seus clamando Deus oh! Meu Deus porque fui abandonado e viu-se o astro nublado trevas pelo mundo inteiro um centurião fronteiro disse verdadeiramente este homem é inocente filho de Deus verdadeiro.
E um algoz suspendeu uma esponja flocada numa cana enfiada botou vinagre e lhe deu logo ali Jesus morreu com seu gesto divinal que tormento sem igual daquela tão vil derrota foi Judas Escariota o sacerdote fatal.
Que profano traidor equiparado a Lusbel da morte fria e cruel foi ele o traidor que fez nosso Salvador na cruz de prego cravado pelo corpo retalhado fitas de sangue corriam dos pregos que lhe feriam cada qual mais aguçado.
Veio José de Arimatéia pediu seu corpo e foi dado pareceu sendo tocado por uma divina ideia tirou no meio da plateia inda pregado na cruz afastou-se dos tafus antes do morrer do sol envolvido num lençol deu sepultura a Jesus.
Numa pedra natural que tinha grande abertura ele deu a sepultura ao seu corpo divinal felizmente este local muito fácil ele encontrou ali o depositou a rocha era rachada revolveu outra pesada cobriu com ela e deixou.
Perto estava Madalena que sempre a Jesus seguia ela com outra Maria ali chorava com pena depois dessa triste cena seguiram na noite escura compraram essência pura num vaso branco trouxeram logo de manhã vieram incensar-lhe a sepultura.
Porém um anjo sentado em verdade lhe dizia eis a rocha que jazia Jesus o crucificado mas já foi ressuscitado para o alto tribunal está na graça real na corte santa e perfeita da parte da mão direita de Deus Pai Celestial
Literatura de Cordel segunda, 11 de setembro de 2017
UMA VIAGEM AO CÉU, FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Uma vez, eu era pobre, Vivia sempre atrasado, Botei um negócio bom Porém vendi-o fiado Um dia até emprestei O livro do apurado.
Dei a balança de esmola E fiz lenha do balcão Desmanchei as prateleiras Fiz delas um marquezão Porém roubaram-me a cama Fique dormindo no chão.
Estava pensando na vida Como havia de passar, Não tinha mais um vintém Nem jeito pra trabalhar O marinheiro da venda Não queria mais fiar.
Pus a mão sobre a cabeça Fiquei pensando na vida Quando do lado do Céu Chegou uma alma perdida, Perguntou: – Era o senhor, Que aí vendia bebida?
Eu disse que era eu mesmo E a venda estava quebrada, Mas se queria um pouquinho Ainda tinha guardada Obra de uns dois garrafões De aguardente imaculada.
Me disse a alma: – Eu aceito E lhe agradeço eternamente Porque moro Céu, mas lá Inda não entra aguardente São Pedro inda plantou cana Porém perdeu a semente.
Bebeu obra de 3 contos, Ficou muito satisfeita Disse: – Aguardente correta, Imaculada direita, Isso é que eu chamo bebida Essa aqui, ninguém enjeita!
Perguntei-lhe: – Alma, quem és? Disse ela: – Tua amiga, Vim te dizer que te mude Aqui não dá nem intriga Quer ir para o Céu comigo? Lá é que se bota barriga!
Eu lá subi com a alma Num automóvel de vento Então a alma me mostrava Todo aquele movimento, As maravilhas mais lindas Que existem no firmamento.
Passamos no Purgatório, Tinha um pedreiro caiando, Mas adiante era o Inferno Tinha um diabo cantando E a alma de um ateu Presa num tronco, apanhando.
Afinal, cheguei no Céu A alma bateu na porta, Como pouco chegou São Pedro Que estava pela horta, Perguntou-lhe: – Esta pessoa Ainda é viva, ou é morta?
Então a alma respondeu: – É viva, estava no mundo Não tinha de que viver Está feito um vagabundo, Lá quem não for bem sabido Passa fome, vive imundo!
São Pedro aí perguntou: – O mundo lá, como vai? Eu aí disse: – Meu Santo, Lá filho rouba do pai, Está se vendo que o mundo Por cima do povo cai…
Eu ainda levava um pouco Da gostosa imaculada, Dei a ele e ele disse: – Aguardente raciada! E aí me disse: – Entre, Aqui não lhe falta nada!
Arrastou uma cadeira E mandou eu me sentar Chamou um criado dele Disse: – Cuide em se arrumar Vá lá dentro e diga a ama Que bote um grande jantar.
Quando acabei de jantar, O Santo me convidou, Disse: – Vamos lá na horta Fui, ele então me mostrou Coisas que me admiraram E tudo me embelezou.
Vi na horta de São Pedro Arvoredos bem criados Tinha pés de plantações Que estavam carregados Pés de libras esterlinas Que já estavam deitados.
Vi cerca de queijo e prata, E lagoa de coalhada Atoleiro de manteiga Mata de carne guisada Riacho de vinho do porto, Só não tinha imaculada!
Prata de quinhentos réis Eles lá chamam caipora, Botavam trabalhadores Para jogar tudo fora, Esses níqueis de cruzado Lá nascem de hora em hora.
Então São Pedro me disse: – Quero fazer-lhe um presente, Quando você for embora Vou lhe dar uma semente, Você mesmo vai escolher Aquela mais excelente!
Deu-me dez pés de dinheiro, Alguns querendo botar, Filhos de queijo do reino Já querendo safrejar, Uns caroços de brilhante Para eu na terra plantar.
Galhos de libra esterlina Deu-me cento e vinte pés Deu-me um saco de semente De cédulas de cem mil réis Deu-me maniva de prata De diamante, umas dez.
Aí chamou Santa Bárbara, Esta veio com atenção São Pedro aí disse a ela: Eu quero uma arrumação Este moço quer voltar Arranje-lhe uma condução.
– Bote cangalha num raio, E a sela num trovão Veja se arranja um corisco Para ele levar na mão, Porque daqui para Terra Existe muito ladrão!
Eu desci do Céu alegre Comigo não foi ninguém Passei pelo Purgatório Ouvi um barulho além – Era a velha minha sogra Que dizia: – Eu vou também!
Eu lhe disse: – Minha sogra, Eu não posso a conduzir Ela me disse: – Eu lhe mostro Porque razão hei de ir E se não for apago o raio Quero ver você seguir!
Nisso o raio se apagou, Desmantelou-se o trovão, O corisco que eu trazia Escapuliu-se da mão E tudo quanto eu trazia Caiu desta vez no chão.
Aí a velha voltou Rogando praga e uivando, Quando entrou no Purgatório Foi se mordendo e babando Dizendo tudo de mim Lançando fogo e falando.
Bem dizia o meu avô: – Sogra, nem depois de morta Fede a carniça de corpo A língua da alma corta Não diz assim quem não viu Uma sogra em sua porta.
Eu vinha com isso tudo Que o santo tinha me dado Mas minha sogra apanhou O diabo descuidado Fiquei pior do que estava Perdi o que tinha achado.
E quando cheguei em casa A mulher quase me come, Ainda pegou um cacete E me chamou tanto nome, Disse que eu casei com ela Para matá-la de fome…
Se não fosse minha sogra Eu hoje estava arrumado, Mas ela no Purgatório Achou tudo descuidado, Abriu a porta e danou-se Veio deixar-me encaiporado.
Nunca mais voltei ao Céu Para falar com São Pedro, E ainda mesmo que possa Não vou porque tenho medo Posso encontrar minha sogra E vai de novo outro enredo.
Literatura de Cordel domingo, 10 de setembro de 2017
A SOGRA QUE ENGANOU O DIABO - CORDEL DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Dizem, não sei se é ditado, Que ao diabo ninguém logra; Porém vou contar o caso Que se deu com minha sogra. As testemunhas são eu, Meu sogro, que já morreu, E a velha, que é falecida. Esse caso foi passado Na rua do Pé Quebrado Da vila Corpo Sem Vida.
Chamava-se Quebra-Quengo A mãe de minha mulher, Que se chamava Aluada Da Silva Quebra-Colher, Filha do Zé Cabeludo. Irmã de Vítor Cascudo E de Marcelino Brabo, Pai de Corisco Estupor; Mas ouça agora o senhor Que fez a velha ao diabo.
Minha sogra era uma velha Bem carola e rezadeira, Tinha seu quengo lixado, Era audaz e feiticeira; Para ela tudo era tolo, Porque ela dava bolo No tipo mais estradeiro. Era assim o seu serviço: Ela virava o feitiço Por cima do feiticeiro!
Disse o demo: — Quebra-Quengo, Qual é a tua virtude? Dizem que és azucrinada E que a ti ninguém ilude? Disse a velha: — Inda mais esta! Você parece que é besta! Que tem você c’o que faço? Disse ele: — Tudo desmancho, Nem Santo Antônio com gancho Te livra hoje do meu laço!
Ela indagou: — Quem és tu? Respondeu: — Sou o demônio, Nem me espanto com milagre, Nem com reza a Santo Antônio! Pretendo entrar no teu couro! E nisto ouviu-se um estouro! Gritou a velha: — Jesus! Ligeira se ajoelhou E, depois, se persignou E rezou o Credo em cruz!
Nisto, o diabo fugiu. E, quando a velha se ergueu, Ele chegou de mansinho, Dizendo logo: — Sou eu! Agora sou teu amigo Quero andar junto contigo, Mostrar-te que sou fiel. Minha carta, queres ver? A velha pediu pra ler E apossou-se do papel.
— Dê-me isto! grita o diabo, Em tom de quem sofre agravo. Diz a velha: — Não dou mais! Tu, agora, és o meu escravo! Disse o diabo: — Danada! Meteu-me numa quengada! Sou agora escravo dela! E disse com humildade: — Dê-me a minha liberdade, Que esticarei a canela!
Disse a velha: — Pé de pato, Farás o que te mandar? Respondeu: — Pois sim, senhora, Pode me determinar, Porque estou no seu cabresto Carregarei água em cesto, Transformarei terra em massa, Que para isso tenho estudo; Afinal, eu farei tudo Que a senhora disser — faça!
Disse a velha: — Vá na igreja, Traga a imagem de Jesus. Respondeu: — Posso trazê-la, Mas ela vem sem a cruz, Porque desta tenho medo! Disse a velha: — Volte cedo! Ele seguiu a viagem E ao sacristão iludiu: Uma estampa lhe pediu Que só tivesse uma imagem.
A velha, então, conheceu Do cão o quengo moderno, E, receando que um dia A levasse para o inferno, Para algum canto o mandou E em sua ausência traçou Com giz uma cruz na porta. Voltou o cão sem demora, Viu a cruz, ficou de fora, Gritando com a cara torta.
Gritou o cão no terreiro: — Aqui não posso passar! Venha me dar minha carta, Quero pro inferno voltar! Disse a velha que não dava, Mas ele continuava A rinchar como uma besta. — Pois fecha os olhos! ela diz. Ele fechou e, com giz, Fez-lhe outra cruz bem na testa!
Aí entregou-lhe a carta E o demo pôs-se na estrada, Dizendo com seus botões: — Não quero mais caçoada Com velha que seja sogra, Porque ela sempre nos logra! Foi, assim, a murmurar. Quando no inferno chegou, O maioral lhe gritou: — Aqui não podes entrar!
— Então, já não me conhece? Perguntou ao maioral. — Conheço, porém, aqui Não entras com tal sinal: Estás com uma cruz na testa! Disse ele: — Que história é esta? Que é que estás aí dizendo? Mirou-se dum espelho à luz: Quando distinguiu a cruz, Saiu danado, correndo!
E, na carreira em que ia, Precipitou-se no abismo, Perdeu o ser diabólico, Virou-se no caiporismo, Pela terra se espalhou, Em todo lugar se achou, Ao caipora encaiporando, Embaraçando seus passos E com traiçoeiros laços As sogras auxiliando…
Deste fato as testemunhas Já disse todas quais são. Agora, quer o senhor Saber se é exato ou não? Invoque no espiritismo Ou pergunte ao caiporismo, Este que sempre nos logra, Se sua origem não veio Do diabo imundo e feio E do quengo duma sogra!
Literatura de Cordel sábado, 09 de setembro de 2017
O HOMEM QUE CASOU COM A JUMENTA
Jesus pai poderoso Minha poesia aumenta Enquanto eu escrevo um causo Que todo mundo comenta O homem deixou a mulher Pra casar com a jumenta
Isto foi na Paraíba Município de Campina Deixou a sua esposa Por nome de Jarmelina E amigou-se com a Jega Para cumprir sua sina
Esse causo se deu Na Paraíba do Norte O homem pra casar com burra Precisa que seja forte Uns diz que é safadeza E outros diz que é sorte
No mundo aparece coisa Que parece uma novela Um homem assim não tem O valor de uma cadela Olhe na capa do livro Ele abraçado com ela
Seu nome Senhor Pereira Com Jarmelina casado Porém há mais de mês Que ele vinha amigado Namorando uma jumenta Lá num canto reservado
Ele avistando a jumenta Ficou hipnotizado la abanou as orelhas Como quem dar um recado E ele com ar de louco Quase morto e apaixonado
A jumenta olhou pra ele Fez um sinal de amor Ele abraçou-se com ela Chamando de minha flor Somente tu é quem cura A minha triste dor
E ai seguiu direto A casa do fazendeiro E lhe comprou a jumenta Pelo um avultado dinheiro E levou-a para casa dizendo És meu amor verdadeiro
Ele chegou em casa Botou na estribaria e abraçava com ela Alegremente sorria Era amigado com ela Mais a mulher não sabia
Desse dia por diante Ele ficou diferente Só ia em casa almoçar E voltava rapidamente Pra abraçar-se com a jumenta O seu amor excelente
Tudo que a mulher fazia Para ele não prestava Somente com a jumenta Ele se consolava Ele beijava a jumenta E ela também lhe beijava
E assim mais de dois meses Em casa ele não dormia Às dez e meia da noite De casa ele sumia E só voltava pra casa No romper do novo dia
Nas obrigações de casa Ele fez certo resumo A mulher desconfiada Como sempre e de costume E assim desta maneira Foi aumentando o ciúme
Ele trazia para casa Fava,farinha e pimenta, Milho, feijão e arroz Levava para jumenta E dessa vez sua esposa Quase que se arrebenta
A mulher ele dava dez contos E a Jega ele dava cem A mulher passando fome E a Jega passando bem Sua esposa dizia Outra mulher ele tem
A mulher se aperriou E ficou apavorada Ela dizia Pereira Tem outra namorada Mais eu tô indo e pego Os dois numa emboscada
Ela disse se eu pegar A parada vai ser cinzenta E eu meto pau nos dois Quebro perna, braço e venta Mas deixa que ele estava Amigado com uma jumenta
E assim ficou tocalhando Toda hora e todo dia Até que pegou os dois Dentro da estribaria Ele abraçado com a burra Fazendo o que bem queria
A sua esposa legítima Chama-se Jarmelina E ele brincando com a burra Chamava ela Cravina Dizia que vamos casar Que nosso signo combina
Ela dava beijo nele Ele dava beijo nela Ela se abraçava com ele Ele se abraçava com ela Sem verem que a velha estava Escondida na cancela
Ela abriu a porteira E saiu devagarzinho Chegou com um toro de pau Na ponta só tinha espinho E danou na cara dele Que arrebentou-lhe o fucinho
A jumenta pulou de lado Ele se esparramou ao chão Além da queda e da dor Levou mais um empurrão E a mulher foi a cidade Se queixar ao capitão
Ela contou toda a história Ao capitão Luiz Seu caso é judicial Só quem resolve é o juiz Ela disse eu vou agora Pra ver o que ele diz
Ao Juiz ela contou Como foi todo ocorrido Eu quero me desquitar Daquele cabra bandido Então vá buscar ele Prá o caso ser resolvido
O Juiz disse este homem Por certo é maluco Prá atender o Juiz No mesmo instante chegou E a sua história amorosa Ao Juiz ela contou
O Juiz disse a sua esposa Pede prá ser disquitada O senhor com uma jumenta Ela fica envergonhada Ele disse a burra é minha Isso não quer dizer nada
Eu também peço o disquite Meu com minha mulher Depois disto ela pode Casar com quem quiser E eu caso com a jumenta Dê o caso no que der
O Juiz pra ele falou Com a frase muito grosseira Você vai deixar sua esposa Nova bonita e fagueira Pra casar com uma jumenta E fazer sua caseira
Essa mulher que era minha Até o diabo arrenega O homem é ouro de lei Nada ruim não lhe pega Dessas mulheres que tem hoje É muito melhor uma jega
E mesmo o senhor está vendo A caristia é sem fim Eu faço a feira pra casa Ela ainda acha ruim E a jumenta eu sustento Com salambaia e capim
Nisso chegou Abraão Que viu todo negócio Disse perante ao Juiz Já que assinei o divórcio Vou casar com Jarmelina Para de Pereira eu ser sócio
Dentro de dois minutos Fizeram a transação Pereira casou com a Jega Prenda do seu coração Jarmelina também casou Com o poeta Abraão.
Literatura de Cordel sexta, 08 de setembro de 2017
PROEZAS DE JOÃO GRILO, FOLHETO DE JOÃO FERREIRA DE LIMA
C OM AGRADECIMENTOS A PEDRO FERNANDO MALTA
João Grilo foi um cristão que nasceu antes do dia criou-se sem formosura mas tinha sabedoria e morreu depois da hora pelas artes que fazia.
E nasceu de sete meses chorou no bucho da mãe quando ela pegou um gato ele gritou: não me arranhe não jogue neste animal que talvez você não ganhe.
Na noite que João nasceu houve um eclipse na lua e detonou um vulcão que ainda continua naquela noite correu um lobisomem na rua.
Porem João Grilo criou-se pequeno, magro e sambudo as pernas tortas e finas boca grande e beiçudo no sitio onde morava dava noticia de tudo.
João perdeu o pai com sete anos de idade morava perto de um rio ia pescar toda tarde um dia fez uma cena que admirou a cidade.
O rio estava de nado vinha um vaqueiro de fora perguntou: dará passagem? João Grilo disse: inda agora o gadinho de meu pai passou com o lombo de fora.
O vaqueiro botou o cavalo com uma braça deu nado foi sair já muito embaixo quase que morre afogado voltou e disse ao menino: você é um desgraçado!
João Grilo foi ver o gado para provar aquele ato veio trazendo na frente um bom rebanho de pato os patos passaram n’agua João provou que era exato.
Um dia a mãe de João Grilo foi buscar água à tardinha deixou João Grilo em casa e quando deu fé lá vinha um padre pedindo água nessa ocasião não tinha.
João disse; só tem garapa disse o padre: donde é? João Grilo lhe respondeu: é do engenho Catolé! disse o padre: pois eu quero João levou uma coité.
O padre bebeu e disse: oh! que garapa boa! João Grilo disse: quer mais? o padre disse; e a patroa não brigará com você? João disse: tem uma canoa.
João trouxe outra coité naquele mesmo momento disse ao padre: bebe mais não precisa acanhamento na garapa tinha um rato estava podre o fedorento.
O padre disse: menino tenha mais educação e porque não me disseste? oh! natureza do cão! pegou a dita coité arrebentou-a no chão.
João Grilo disse; danou-se! misericórdia, S. Bento! com isto mamãe se dana me pegue mil e quinhentos essa coité, seu vigário é de mamãe mijar dentro!
O padre deu uma pôpa disse para o sacristão esse menino é o diabo em forma de cristão! meteu o dedo na goela quase vomita o pulmão.
João Grilo ficou sorrindo pela cilada que fez dizendo: vou confessar-me no dia sete do mês ele nunca confessou-se foi essa a primeira vez.
João Grilo tinha um costume para toda parte que ia era alegre e satisfeito no convívio da alegria João Grilo fazia graça que todo mundo sorria.
Num dia de sexta-feira às cinco horas da tarde João Grilo disse: hoje a noite eu assombro aquele padre se ele não perdoar-me na igreja há novidade.
Pegou uma lagartixa amarrou-a pelo gogó botou-a numa caixinha no bolso do palitó foi confessar-se João Grilo com paciência de Jó.
As sete horas da noite foi ao confessionário fez logo pelo-sinal posto nos pés do vigário o padre disse: acuse-se; João disse o necessário.
Eu sou aquele menino da garapa e da coité; o padre disse: levante-se, eu já sei você quem é; João tirou a lagartixa soltou-a junto do pé.
A lagartixa subiu por debaixo da batina entrou na perna da calça tornou-se feia a buzina o padre meteu os pés arrebentou a cortina.
Jogou a batina fora naquela grande fadiga a lagartixa cascuda arranhando na barriga; João Grilo de lá gritava; seu padre, Deus lhe castiga!
O padre impaciente naquele turututu saltava pra todo lado que parecia um timbu terminou tirando as calças ficando o esqueleto nu.
João disse: padre é homem? pensei que fosse mulher anda vestido de saia não casa porque não quer isto é que é ser caviloso cara de mata bebé.
O padre disse: João Grilo vai-te daqui infeliz! João Grilo disse: bravo do vigário da matriz é assim que ele me paga o benefício que fiz?
João Grilo foi embora o padre ficou zangado João Grilo disse: ora sebo eu não aliso croado vou vingar-me duma raiva que tive o ano passado.
No subúrbio da cidade morava um português vivia de vender ovos justamente nesse mês denunciou de João Grilo pelas artes que ele fez.
João encontrou o português com a égua carregada com duas caixas de ovos João lhe disse: oh! camarada deixa eu dizer a tua égua uma pequena charada.
O português disse: diga, João chegou bem no ouvido com a ponta do cigarro soltou-a dentro escondido a égua meteu os pés foi temeroso estampido
Derrubou o português foi ovos pra todo lado arrebentou a cangalha ficou o chão ensopado o português levantou-se tristonho e todo melado
O português perguntou: o que foi que tu disseste que causou tanto desgosto a esse animal agreste? – Eu disse que a mãe morreu o português respondeu: oh égua besta da peste!
João Grilo foi a escola com sete anos de idade com dez anos ele saiu por espontânea vontade todos perdiam pra ele outro Grilo como aquele perdeu-se a propriedade
João Grilo em qualquer escola chamava o povo atenção passava quinau nos mestres nunca faltou com a lição era um tipo inteligente no futuro e no presente João dava interpretação
Um dia pergunta ao mestre: O que é que Deus não vê o homem vê qualquer hora? diz ele: não pode ser pois Deus vê tudo no mundo em menos de um segundo de tudo pode saber
João Grilo disse: qual nada quêde os elementos seus? abra os olhos, mestre velho que vou lhe mostrar os meus seus estudos se consomem um homem ver outro homem só Deus vão ver outro Deus
João Grilo disse: seu mestre, me diga como se chama a mãe de todas as mães? tenha cuidado no drama o mestre coça a cabeça disse: antes que me esqueça vou resolver o programa
– A mãe de todas as mães é Maria Concebida João Grilo disse: eu protesto antes dela nascer já esta mãe existia não foi a Virgem Maria oh que resposta perdida!
João Grilo disse depois num bonito português: a mãe de todas as mães já disse e digo outra vez como a escritura ensina é a natureza divina que tudo criou e fez
– Me responda professor entre grandes e pequenos quero que fique notável por todos nossos terrenos responda com rapidez como se chama o mês que a mulher fala menos?
– Este mês eu não conheço quem fez esta tabuada? João Grilo lhe respondeu: ora sebo, camarada pra mim perdeu o valor ter o nome de professor mais não conhece de nada
– Este mês é fevereiro por todos bem conhecido só tem vinte e oito dias o tempo mais resumido entre grandes e pequenos é o que a mulher fala menos mestre, você está perdido
– Seu professor, me responda se algum tempo estudou quem serviu a Jesus Cristo morreu e não se salvou no dia que ele morreu seu corpo o urubu comeu e ninguém o sepultou?
– Não conheço quem é esse porque nunca vi escrito; João Grilo lhe respondeu: foi um jumento está dito que a Jesus Cristo servia na noite que ele fugia de Belém para o Egito
João Grilo olhou de um lado disse para o diretor: fique sabendo o senhor sem dúvida exame não fez o aluno desta vez ensinou ao professor
João Grilo foi para casa encontrou sua mãe chorando ele então disse: mamãe não está ouvindo encantando? não chora, cante mais antes pois o seu filho garante pra isso vive estudando
A mãe de João Grilo disse: choro por necessidade sou uma pobre viúva e tu de menor idade até da escola saíste; João lhe disse: ainda existe o mesmo Deus de bondade
— A senhora pensa em carne de vinte mil réis o quilo ou talvez no meu destino que a força hei de segui-lo? não chore, fique bem certa a senhora só se aperta quando matarem João Grilo
João chegou no rio ás cinco horas da tarde passou até nove horas porém tudo foi debalde na noite triste e sombria João Grilo sem companhia voltava sem novidade
Chegando dentro da mata ouviu lá dentro um gemido os lobos devoradores o caminho interrompido e trepou-se num pinheiro como era forasteiro ficou calado escondido
Os lobos foram embora e João não quis descer disse: eu dormirei aqui suceda o que suceder eu hoje imito araquan só vou embora amanhã quando o dia amanhecer
O Grilo ficou trepado temendo lobos e leões pensando na fatal sorte e recordando as lições que na escola estudou quando do súbito chegou uns quatro ou cinco ladrões
Eram uns ladrões de Meca que roubavam no grito se ocultavam na mata naquele bosque esquisito pois cada um de persi que vinha juntar-se ali para ver quem era perito
O capitão dos ladrões disse: não fala ninguém? um respondeu: não senhor disse ele: muito bem cuidado, não roubem vã vamos ajuntar-nos amanhã na capela de Belém
— Lá partiremos o dinheiro pois aqui tudo é graúdo temos um roubo a fazer desde ontem que estudo mas já estou preparado; e o Grilo lá trepado calado e escutando tudo.
Os ladrões foram embora depois da conversação João Grilo ficou ciente dizendo em seu coração: se Deus ajudar a mim acabou-se tempo ruim sou eu quem ganho a questão
João Grilo desceu da árvore quando o dia amanheceu mas quando chegou em casa não contou o que se deu furtou um roupão de malha vestiu fez uma mortalha lá no mato se escondeu
À noite foi pra capela por detrás da sacristia vestiu-se com a mortalha pois a capela jazia sempre com a porta aberta João Grilo partiu na certa colher o que pretendia
Deitou-se lá num caixão que enterrava defunto João Grilo disse: hoje aqui vou ganhar um bom presunto; os ladrões foram chegando João Grilo observando sem pensar em outro assunto
Acenderam um farol penduraram numa cruz foram contar o dinheiro no claro de uma luz João Grilo de lá gritou: esperem por mim que vou com as ordens de Jesus!
Os ladrões dali fugiram quando viram a alma em pé João Grilo ficou com tudo disse: já sei como é nada no mundo me atrasa agora vou pra casa tomar um rico café
Chegou e disse: mamãe morreu nossa precisão o ladrão que rouba outro tem cem anos de perdão; contou o que tinha feito disse a velha: está direito vamos fazer refeição
Bartolomeu do Egito foi um rei de opinião mandou convidar João Grilo pra uma adivinhação João Grilo disse: eu vou, no outro dia embarcou para saudar o sultão
João Grilo chegou na corte cumprimentou o sultão disse: pronto, senhor rei (deu-lhe um aperto de mão) com calma e maneira doce o sultão admirou-se da sua disposição
O sultão pergunta ao Grilo: de onde você saiu? aonde você nasceu? João Grilo fitou ele e sorriu — Sou deste mundo d’agora nasci na ditosa hora que minha mãe me pariu
— João Grilo, tu adivinha? e Grilo respondeu, não eu digo algumas coisas conforme a ocasião quem canta de graça é galo cangalha só pra cavalo e seca só no sertão
— Eu tenho doze perguntas pra você me responder no prazo de quinze dias escute o que vou dizer veja lá como se arruma é bastante faltar uma está condenado a morrer
João Grilo disse: estou pronto pode dizer a primeira se acaso sair-me bem venha a segunda e a terceira venha a quarta e a quinta talvez o Grilo não minta diga até a derradeira
Perguntou: qual o animal que mostra mais rapidez que anda de quatro pés de manhã por sua vez ao meio-dia com dois passando disto depois a tarde anda com três?
O Grilo disse: é o homem que se arrasta pelo chão no tempo que engatinha depois toma posição anda em pé bem seguro mas quando fica maduro faz três pés com o bastão
O sultão maravilhou-se com sua resposta linda João disse: pergunte outra vou ver se respondo ainda; a segunda o sultão fez João Grilo daquela vez celebrizou sua vinda
— Grilo, você me responda em termos bem divididos uma cova bem cavada doze mortos estendidos e todos mortos falando cinco vivos passeando trabalham com três sentidos
— Esta cova é um violão com prima, baixo e bordão mortas são as doze cordas quando canta um cidadão canta, toca e faz verso cinco vivos num progresso os cinco dedos da mão
Houve uma salva de palma com vivas que retumbou o sultão ficou suspenso seu viva também bradou depois pediu silencio com outro desejo imenso a terceira perguntou
João Grilo, qual é a coisa que eu mandei carregar primeiro dia e segundo no terceiro fui olhar quase dá-me a tiririca se tirar mais grande fica não mingua, faz aumentar?
— Senhor rei, sua pergunta parece me fazer guerra um Grilo não tem saber criado dentro da serra mas digo pra quem conhece o que tirando mais cresce é um buraco na terra
— João Grilo, vou terminar as perguntas do tratado e Grilo disse: pergunte quero ficar descansado; disse o rei: é muito exato o que é que vem do alto cai em pé, corre deitado?
— Aquele que cai em pé e sai correndo no chão será uma grande chuva nos barros de um sertão; o rei disse: muito bem no mundo todo não tem outro Grilo como João
— João Grilo, você bebe? João disse: bebo um pouquinho e disse: eu não sou filho de Baco que fez o vinho o meu pai morreu bebendo eu o que estou fazendo? de boca aberta em seu ninho
O rei disse: João Grilo beber é coisa ruim e Grilo respondeu: qual o meu pai dizia assim: na casa de seu Henrique zelam bem um alambique melhor do que um jardim
O rei disse: João Grilo tua fama é um estrondo João Grilo disse: eu sabendo o que perguntar respondo disse o rei enfurecido: o que tem o pé comprido e faz o rastro redondo?
Senhor rei, tenho lembrança de tempo da minha avó que ela tinha um compasso na caixa do bororó como esse eu também ando fazendo o rastro redondo andando com uma perna só
João qual é o bicho, que passa pela campina a qualquer hora da noite andando de lamparina? é um pequeno animal tem luz artificial; veja o que determina
— Esse bicho eu já vi pois eu tinha por costume de brincar sempre com êle minha mãe tinha ciúme eu andava pelo campo uns chamam pirilampo e outros de vagalume
O rei já tinha esgotado a sua imaginação não achou uma pergunta que interrompesse a João disse: me responda agora qual é o olho que chora sem haver consolação?
O Grilo então respondeu: lá muito perto da gente tem num oiteiro importante um moço muito doente suas lágrimas têm paladar quem não deixa de chorar é olho d’água vertente
O rei inventou um truque do jeito que lhe convinha — Vou arrumar uma cilada ver se João adivinha mandou vir um alçapão fez outra adivinhação escondeu uma bacurinha
— João, o que é que tem dentro deste alçapão? se não disser o que é é morto, não tem perdão João Grilo lhe respondeu: quem mata um como eu não tem dó no coração
João lhe disse: esse objeto nem é manso nem é brabo nem é grande nem é pequeno nem é santo nem é diabo bem que mamãe me dizia que eu ainda caía onde a porca torce o rabo
Trouxeram uma bandeja ornada de muitas flores dentro dela uma latinha cheia de muitos fulgores o rei lhe disse: João Grilo é este o último estrilo que rebenta tuas dores
João Grilo desta vez passou na última estica adivinhar uma coisa nojenta que se pratica fugir da sorte mesquinha pois dentro da lata tinha um pouquinho de xinica
O rei disse: João Grilo veja se escapa da morte o que tem nesta latinha? responda se tiver sorte toda aquela populaça queria ver a desgraça do Grilo franzino e forte
— Minha mãe profetizou que o futuro è minha perda — Dessas adivinhações brevemente você herda faz de conta que já vi como esta hoje aqui parece que dá em merda
O rei achou muita graça nada teve o que fazer João Grilo ficou na corte com regozijo e prazer gozando um bom paladar foi comer sem trabalhar desta data até morrer
E todas as questões do reino era João que deslindava qualquer pergunta difícil ele sempre decifrava julgamentos delicados problemas muito enrascados e João Grilo desmanchava
Certa vez chegou na corte em mendigo esfarrapado com uma mochila nas costas dois guardas de cada lado seu rosto cheio de mágoa os olhos vertendo água fazia pena o coitado
Junto dele estava um duque que veio denunciar dizendo que o mendigo na prisão ia morar por não pagar a despesa que fizera por afoiteza sem ter como lhe pagar
João Grilo disse ao mendigo: e como é, pobretão que se faz uma despesa sem ter no bolso um tostão me conte todo passado depois de eu ter-lhe escutado lhe darei razão ou não
Disse o mendigo: sou pobre e fui pedir uma esmola na casa do senhor duque levei a minha sacola quando cheguei na cozinha vi cozinhando galinha numa grande caçarola
Como a comida cheirava eu tive apetite nela tirei um taco de pão e marchei pro lado dela e sem pensar na desgraça botei o pão na fumaça que saia da panela
O cozinheiro zangou-se chamou logo o seu senhor dizendo que eu roubara da comida o seu sabor só por eu ter colocado um taco de pão mirrado aproveitando o vapor
Por isso fui obrigado a pagar essa quantia como não tive dinheiro o duque por tirania mandou trazer-me escoltado para depois de ser julgado ser posto na enxovia
João Grilo disse: está bem não precisa mais falar: então perguntou ao duque: quanto o homem vai pagar? – Cinco coroas de prata ou paga ou vai pra chibata não lhe deve perdoar
João Grilo tirou do bolso a importância cobrada na mochila do mendigo deixou-a depositada e disse para o mendigo: balance a mochila, amigo pro duque ouvir a zuada
O mendigo sem demora fez como Grilo mandou pegou sua mochilinha sem compreender o truque bem no ouvido do duque o dinheiro tilintou
Disse o duque enfurecido: mas não recebi o meu, diz João Grilo: sim senhor, isto foi o que valeu deixe de ser batoteiro o tinido do dinheiro o senhor já recebeu
– Você diz que o mendigo por ter provado o vapor foi mesmo que ter comido seu manjar e seu sabor pois também é verdadeiro que o tinir do dinheiro representa o seu valor
Virou-se para o mendigo e disse: estás perdoado leva o dinheiro que dei-te vai pra casa descansado o duque olhou para o Grilo depois de dar um estrilo saiu por ali danado
A fama então de João Grilo foi de nação em nação por sua sabedoria e por seu bom coração sem ser por ele esperado um dia foi convidado para visitar um sultão
O rei daquele país quis o reino embandeirado pra receber a visita do ilustre convidado o castelo estava em flores cheio de tantos fulgores ricamente engalanado
As damas da alta corte trajavam decentemente toda corte imperial esperava impaciente ou por isso ou por aquilo para conhecer João Grilo figura tão eminente
Afinal chegou João Grilo no reinado do sultão quando ele entrou na corte que grande decepção! de paletó remendado sapato velho furado nas costas um matulão
O rei disse: não é ele pois assim já é demais; João Grilo pediu licença mostrou-lhe as credenciais embora o rei não gostasse mandou que ele ocupasse os aposentos reais
Só se ouvia cochichos que vinham de todo lado as damas então diziam: é esse o homem falado? duma pobreza tamanha e ele nem se acanha de ser nosso convidado?
Até os membros da corte diziam num tom chocante pensava que o João Grilo fosse dum tipo elegante mas nos manda 1 remendado sem roupa, esfarrapado um maltrapilho ambulante
E João Grilo ouvia tudo mas sem dar demonstração em toda a corte real ninguém lhe dava atenção por mostrar-se esmolambado tinha sido desprezado naquela rica nação
Afinal veio um criado e disse sem o fitar: já preparei o banheiro para o senhor se banhar vista uma roupa minha e depois vá pra cozinha na hora de almoçar
João Grilo disse; está bom; mas disse com seu botão: roupas finas trouxe eu dentro de meu matulão me apresentei rasgado para ver neste reinado qual era a minha impressão
João Grilo tomou um banho vestiu uma roupa de gala então muito bem vestido apresentou-se na sala ao ver seu traje tão belo houve gente no castelo que quase perdia a fala
E então toda repulsa transformou-se de repente o rei chamou-o pra mesa como homem competente consigo, dizia João: na hora da refeição vez ensinar esta gente
O almoço foi servido porém João não quis comer despejou vinho na roupa só para vê-lo escorrer ante a corte estarrecida encheu os bolsos de comida para toda corte ver
O rei bastante zangado perguntou pra João: por que motivo o senhor não come da refeição? respondeu João com maldade: tenha calma, majestade digo já toda razão
Esta mesa tão repleta de tanta comida boa não foi posta pra mim um ente vulgar a toa desde sobremesa a sopa foram postas à minha roupa e não à minha pessoa
Os comensais se olharam o rei pergunta espantado: por que o senhor diz isto estando tão bem tratado? disse João: isso se explica por está de roupa rica não sou mais esmolambado
Eu estando esfarrapado ia comer na cozinha mas como troquei de roupa como junto da rainha vejo nisto um grande ultraje homenagem ao meu traje e não a pessoa minha
Toda corte imperial pediu desculpa a João e muito tempo falou-se naquela dura lição e todo mundo dizia que sua sabedoria era igual a Salomão.
Literatura de Cordel quinta, 07 de setembro de 2017
A CHEGADA DA PROSTITUTA NO CÉU
Do rosto da poesia eu tirei o santo véu e pedi licença a ela para tirar o chapéu e escrever a chegada da prostituta no céu…
Sabemos que a prostituta é também um ser humano que por uma iludição fraqueza ou desengano o seu viver é volúvel sempre abraça ao engano…
Vive metida em orgia e cheia de vaidade é raro uma que trabalha e usa honestidade por isso fica odiada perante a sociedade…
Todas as religiões para ela escala uma pena se o homem lhe abraça a mulher casada condena mas sabemos que Jesus perdoou a Madalena…
Falar sobre prostituta é um caso muito sério que é um ser sofredor sua vida é de mistério e para sobreviver sempre usa o adultério…
Perante a sociedade ela é marginalizada existe umas mais calmas e outras mais depravadas e quem tem mais ódio delas é a própria mulher casada…
Ela vive aqui na terra enfrentando um sacrifício se vende para os homens muitas se entrega no vício e nova se estraga e faz da miséria ofício…
Aconteceu que uma delas morreu em um certo dia e pela vida que levava o o povo sempre dizia ela vai para o inferno pelos atos que fazia…
Assim que foi enterrada a alma se destinou querendo ir para o céu mas primeiro ela passou pelo portão do inferno e o diabo lhe acompanhou…
Saiu correndo atrás dela dizendo vem cá bichinha um bocado como tu faz tempo que aqui não vinha e eu estou gamadão nesta garota novinha…
Mas na carreira que vinha o diabo e a prostituta passaram no purgatório e no sindicato das puta e lá no portão do céu foi que começou a luta…
Porque já se encontrava uma mulher bem casada arengando com o marido que morreu de uma virada e queria entrar no céu com uma faca afiada…
Essa mulher que morreu era muito ciumenta quando viu a prostituta entortou o pau da venta e disse: vou te furá foi uma luta cinzenta…
Furou a mulher na perna o marido puxou no braço o diabo pegou também dizendo já sei que faço vou levar mesmo sem perna mas levo o melhor pedaço…
Nessa zuada São Pedro se apresentou no portão e disse: não tem lugar pra mulher com bestalhão só tem pra mulher sozinha e foi logo estirando a mão…
E pegou logo no braço da mulherzinha assanhada disse: você pode entrar aqui não lhe falta nada vai dormir na minha cama até alta madrugada…
Mas atrás dela já vinha outro cara de complô e disse: eu entro também pode dá o estupô porque na terra eu era dessa mulher gigolô…
São Pedro lhe respondeu mas aqui é diferente sou o chaveiro do céu e aqui neste batente só entra quem eu quiser que sou velho, mas sou quente…
Disse: vocês lá na terra fazem tudo quanto quer maltrata as prostitutas e usam como quiser mas aqui eu trato bem a todos que aqui vier…
E entrou de braço dado com a mulherzinha singela com uma perna furada mas São Pedro tratou dela e deu apoio a prostituta que ninguém bulia nela…
Depois disso a prostituta foi fazendo o que bem quis botou galha em São Pedro namorou com São Luiz tirou sarro com São Bento no beco do chafariz…
Uma noite de São João dançou com São Expedito levou xêxo de São Brás namorou com São Carlito e no fim da festa foi dormir com São Benedito…
E não quis Santo Oscar por ser barbudo demais deixou ele na espera e foi dormir com São Brás Santo Oscar quando acordou Falou alto e bem voraz…
Disse ele: hoje mesmo antes de tomar café eu vou contar a Jesus essa puta como é depois de sua chegada o céu virou cabaré…
Ele foi e disse a Jesus que ela era depravada Jesus respondeu calmo deixa essa pobre coitada se na terra sofreu tanto como vai ser castigada?
Na terra não teve apoio em meio a sociedade levou a vida sofrendo e fazendo caridade aceitando preto e branco que tinha necessidade…
Mesmo com as prostitutas vive cheio de tarado correndo atrás das moças e mulher de homem casado se não houvesse prostituta qual seria o resultado?
Ele ficou cabisbaixo e respondeu: muito bem se o sol nasce pra todos pra mulher nasceu também se um dia eu pegar ela trituro e deixo um xerém…
Aí ficou sem efeito a denúncia de Santo Oscar pediu perdão a Jesus e voltou pra seu lugar e encontrou Mariano num sarro de admirar…
Aqui termino o livrinho em favor das prostituta para vender aos homens a rapaz, a corno e puta pessoas de baixo porte e aos de boa conduta…
Literatura de Cordel quarta, 06 de setembro de 2017
RUI BARBOSA, CORDEL DE CRISPINIANO NETO
Quero contar a história Verdadeira e gloriosa De um diplomata de peso De carreira luminosa; Um crânio cheio de graça, O nosso gênio da raça, O baiano Rui Barbosa.
Rui foi um líder político, Deputado e senador, Ministro por duas vezes, Foi filólogo e escritor, Tradutor e jornalista Um consagrado jurista E um gênio como orador!
Porém existe um detalhe Nas muitas aptidões Deste crânio brasileiro. Que deixou tantas lições: É seu lado DIPLOMATA, Onde ele compôs a nata Do concerto das nações!
Foi aí que Rui Barbosa Consagrou-se de verdade, Tornou-se a “Águia de Haia” Com tal legitimidade Que armado de mente e lábios Tornou-se um dos “Sete Sábios” Maiores da humanidade.
Seu tipo físico era frágil: Quase anão na estatura. Um metro e cinquenta e oito, Setenta e dois de cintura. Corpo encurvado e franzino, Fisicamente um menino Mas um titã na cultura!
Só quarenta e oito quilos De peso e de sapiência; A fragilidade física Escondendo a inteligência… Mas provou aos seus carrascos Que “é nos menores frascos Que mora a melhor essência”!
Rui Barbosa de Oliveira, De Salvador, bom baiano. Nasceu em mil e oitocentos E quarenta e nove, o ano; Foi a cinco de novembro Que a luz viu o maior membro Do saber brasiliano.
Seu pai, Doutor João José, Viu no anão um titã, Ensinou-lhe amar os livros, Do saber tornou-lhe um fã. Maria Adélia gerou-lhe E com carinho ensinou-lhe Amor e moral cristã.
Com a mãe também aprendeu Amar os descamisados Aos que a vida excluiu, Aos pobres e explorados, Ao humilhado e ao cativo… Por isso tornou-se ativo Defensor dos humilhados.
Com cinco anos de idade Rui na escola ingressou; Seu mestre Antônio Gentil Muito espantado exclamou: Meu Brasil, eu lhe apresento O mais incrível talento Que a Bahia já criou!
Aprendeu em quinze dias Distinguir as orações E dos verbos regulares Fazer as conjugações, Juntar letras, soletrar, E com um ano a destrinchar As mais difíceis lições.
Aos onze anos de idade Já no Ginásio Baiano, Professor Abílio César Disse a seu pai: Não me engano. Tudo que eu sei, Rui já sabe. Portanto, João, já lhe cabe Colocar Rui noutro plano.
Foi quando Rui recebeu Sua maior honraria, Uma Medalha de Ouro, Do arcebispo da Bahia… E entre milhões de imagens De glórias e de homenagens Desta, nunca esqueceria.
No ano sessenta e quatro Conclui o ginasial. Só tinha quatorze anos Não tinha idade ideal Para a faculdade e então Foi estudar Alemão Até o prazo normal.
Ao fazer dezesseis anos, Já tendo idade e conceito Foi para Olinda cursar Faculdade de Direito, Provando o fato verídico Que para o mundo jurídico Era o cérebro mais perfeito. 1 Porém em 68 Contraiu um grande mal Adoeceu gravemente De um “incômodo cerebral” Deu um tempo em quase tudo Paralisou o estudo Até voltar ao normal
E enquanto ficou em casa Por um bom tempo abrigou O poeta Castro Alves Que Eugênia Câmara largou; Castro, de Rui era um mano, Pois no Ginásio Baiano Na mesma turma estudou.
Rui fica bom e de novo Sua faculdade enfrenta, Se transfere pra São Paulo, Curso que mais fama ostenta; Ali virou bacharel. Ganhou diploma e anel Já no ano de 70.
Doutor, voltou à Bahia, Seu solo amado e natal. De novo sofreu as dores Do “incômodo cerebral” Mas foi logo advogar Passando rápido a provar Ser grande profissional.
Nesse tempo Rui Barbosa, Mesmo sem ganhar fortunas Por advogar pra os pobres Já brilhava nas tribunas, E os embates sociais Travava pelos jornais Com artigos e colunas.
No Diário da Bahia Escrevia a pura prosa. Neste tempo, o coração Do genial Rui Barbosa Por Brasília, jovem bela, Caiu na triste esparrela… A primeira crise amorosa.
Mas a dor-de-cotovelo Ele logo compensou. Discursos e conferências Onde fazia, era show. Pela força da Oratória Em pouco alcançou a glória, Seu nome se consagrou.
Casou-se em 76 Com uma bela baiana Com quem construiu família: Maria Augusta Viana Bandeira da sua vida, Amada e deusa querida, Fantástica figura humana.
Augusta e Rui produziram Uma família garbosa: Que tinha nos nomes o Sobrenome “Ruy Barbosa”. Cinco filhos exemplares Diplomatas, militares E um político bom de prosa!
Rui ergueu-se em seu talento Para enfrentar a ganância. A ditadura e a maldade Ele enfrentou com tal ânsia Que esqueceu banca e saúde Para abraçar com virtude A causa e a militância!
No ano 77 De muita seca e horror Rui se elegeu deputado Erguendo um novo valor. Pela grandeza exibida Foi escolhido em seguida Pra ser nosso senador.
Nabuco disse que Rui Fez a República garbosa; Benjamim lhe atribuiu Revolução luminosa. Patrocínio, disse então: “Deus acendeu um vulcão Na cabeça de Barbosa”.
E veio a Abolição Da escravidão malvada; Vimos três anos depois A República proclamada, Cujo primeiro decreto Teve o talento completo Da sua mão consagrada!
Fez a Constituição Da República brasileira; Poucos retoques fizeram Sobre a redação primeira Seu texto estava perfeito Na política e no Direito, Uma obra verdadeira.
E ao nascer a República, Pelo seu saber notório Foi primeiro vice chefe Do Governo Provisório. Brilhante, firme, empolgado O Brasil foi transformado Em seu gigante auditório!
Rui Barbosa e Deodoro Neste governo de início Separaram Estado e Igreja Evitaram o precipício Com o tumulto controlado Acabaram deputado E Senado vitalício.
Rui, Ministro da Fazenda, Pegou um cofre falido Pela provisoriedade Do governo instituído Não conseguia dinheiro… Nenhum país estrangeiro Deu-lhe o empréstimo pedido
Emitiu papel-moeda Sem lastro em ouro na mão. Mas desviaram o dinheiro Do foco da produção Que Rui Barbosa queria. Por isso a Economia Desandou na inflação.
Se afastou do Ministério Mas inda fez uma ação. Mandou queimar os papéis Dos tempos da escravidão Para evitar que ex-senhores Ganhassem grandes valores Pedindo indenização!
Logo veio Floriano Com um chicote na mão. Então as coisas mudaram, Começou a repressão E a liberdade sonhada E democracia esperada Fora para o rés do chão.
As revoltas começaram. Rui contra o autoritarismo Buscando o entendimento Defendendo o legalismo E Floriano, no berro, Virou “Marechal de Ferro” Na mão do militarismo!
Rui Barbosa ergueu a voz Contra a intensa repressão. Aos revoltosos da Armada, Aos generais na prisão, Também aos federalistas Que queriam que as conquistas Não sucumbissem ao canhão!
Pra os que estavam desterrados Nas brenhas do Cucuí Rui entrou com Habeas Corpus Para tirá-los dali… Dizia Barbosa: eu sei Que um Brasil sem ter a lei Não é Brasil é “brasí”!
Chegou a ser exilado. Forçado deixou a terra Que amou e foi pra o Chile, Argentina e Inglaterra E escreveu famosas cartas Fazendo acusações fartas Contra ditadura e guerra.
Combateu a intervenção Militar contra Canudos Provou que aqueles beatos Pobres, sofridos barbudos Não queriam monarquia Queriam cidadania Comida, trabalho e estudos!
Do nosso Código Civil Ele fez a revisão Mil e oitocentos artigos Em tudo a observação Corrigindo o Português E a redação das leis Pra não ter nenhum senão.
Mil novecentos e cinco Resolveu ser candidato Contra Hermes da Fonseca. Seu discurso era um retrato De um Brasil progressista Contra um Brasil feudalista De atraso e de maltrato.
Em 07 ele foi a Haia Conferência Mundial Defendeu a igualdade Na Lei internacional Nada de fraco e de forte Rico e pobre, Sul e Norte Com direito desigual.
Derrubou todas as teses Da força da prepotência, De Inglaterra, França, States, De tudo que foi potência Derrubou a força insana De canhão, de bomba e grana Com a força da inteligência.
Seu nome se destacou. Foi primeiro sem segundo. Entre Choate e Nelidoff, O Barão Marshall profundo, Meye, Tornielli e Leon Foi ele quem deu o tom Dos Sete Sábios do Mundo!
Tornou-se a “Águia de Haia”, Do mundo recebeu louvo, Quebrou a “lei do mais forte” Criando um Direito novo. E quando voltou pra o Rio Foi só descer do navio E cair nos braços do povo!
Da Academia de Letras Foi dos membros varonis Fundador da ABL, Seu presidente feliz; Provou seu grande valor Ao se tornar sucessor De Machado de Assis!
As suas obras são tantas, De temas tão variados Que fica muito difícil Dizer em versos rimados Os títulos que publicou E a obra que legou Nos seus geniais traçados.
“Contra o Militarismo”, “Visita à Terra Natal”, A grande “Oração aos Moços”, “Acre Setentrional”, Discursos, artigos, cartas, Foi das produções mais fartas Da Cultura nacional!!!
Português, Rui conhecia Mais que os mestres portugueses Fez um discurso em francês Para saudar os franceses. E diz até um ditado Que quando foi exilado Ensinou inglês a ingleses!
Contra Hermes da Fonseca Mil novecentos e dez Candidatou-se gritando Contra atitudes cruéis Na Campanha Civilista Contrária ao militarista Regime dos coronéis.
Ainda participou De mais de uma eleição Levando a campanha às ruas Dando início na nação Às campanhas democráticas Chamando em frases enfáticas O próprio povo à ação!
Em 18 recebeu Uma agradável surpresa Grande Oficial de Honra De uma legião francesa Mostrando um prestígio grande E aí seu nome se expande Pelo mundo com certeza!
Continuou escrevendo Com sua verve eloquente, No Senado fez trincheira Mostrando ser combatente Pela causa que lhe move… Foi, de novo em dezenove, Candidato a presidente!
Mas no ano 21 Demonstrou grande canseira Renunciou ao mandato De senador de primeira Declarando estar cansado E “o coração enjoado Da política brasileira”!
Rejeitou ser chefe de Grande Congresso em Paris. De, na Liga das Nações, Representar o País. E no Tribunal de Haia Como farol e atalaia, Ser delegado e juiz!
Por tudo quanto ele fez, Pela grande sapiência, Por seu saber filosófico, Saber jurídico e Ciência Política, História e Gramática, Seu nome virou, na prática, Sinônimo de inteligência!
Na TV e no cinema Foi personagem famoso Foi retratado no filme “Vendaval maravilhoso” Brilhou em “Mad Maria”, Minissérie que trazia Um Brasil conflituoso.
E no “Brasília 18 Por cento”, filme recente Rui aparece também Trazendo exemplos pra gente E há vinte anos passados Na nota de dez cruzados Seu rosto surge de frente.
Seu nome é nome de ruas, De praça e Grupo Escolar, De colégios e farmácias, De cidade potiguar, É nome de quase tudo Só não vi em meu estudo Seu nome em nome de bar.
A “Casa de Rui Barbosa” Preserva sua memória; “Instituto Rui Barbosa” É relicário da História Deste gênio brasileiro. Baiano bravo, altaneiro Que encheu o Brasil de glória!
Na grande guerra de ideias, Na lei da fala macia, Na batalha de argumentos, Atuou com maestria… Sem ser profissional Foi “Pai intelectual Da nossa diplomacia!!!”
Os princípios defendidos, Suas argumentações, As leis por ele propostas, Seus motivos e razões Pra os países serem iguais São as colunas centrais Do Concerto das Nações.
Se um dia Brasil reler Suas imensas verdades Se pautando pela ética Respeitando as liberdades Quando todos formos “Rui” O nosso Brasil não rui Nem triunfam nulidades!
Literatura de Cordel domingo, 03 de setembro de 2017
ZÉ LIMEIRA, TRECHOS DO LIVRO DE ORLANDO TEJO
Quem vem lá é Zé Limeira, Cantô de força vulcânica, Prodologicadamente Cantô sem nenhuma pânica, Só não pode apreciá-lo Pessoa semvergonhânica.
*
Meu nome é José Limeira, Cantô que não é pilhérico, Mais já sofreu d’alguns males, Foi atacado de histérico, Chame logo a junta médica, Faça o exame cadavérico.
*
Esse é Lourisvá Batista, Que é Batista Lourisvá, É filho da cobra preta, Neto da cobra corá, Tanto faz daqui pra ali , Como dali pra acolá
*
Às tantas da madrugada, O vaqueiro do Prefeito Corre alegre e satisfeito Atrás da vaca deitada, Deitada e bem apojada Com a rabada pelo chão… A desgraça de Sansão Foi trair Pedro Primeiro… O aboio do vaqueiro Nas quebradas do Sertão
*
Frei Henrique de Coimbra, Sacerdote sem preguiça, Rezou a Primeira Missa Na beira duma cacimba. Um índio passou-lhe a pimba, Ele não quis aceitá E agora veve a berrá Detrás dum pau de jureme… O bom pescador não teme As profundezas do mar
Frei Henrique descansou Nas encosta da Bahia, Depois fez a travissia Pra chegá onde chegou, Pegou a índia, champrou, Ela não pôde falá, Assou carne de jabá, Misturou com queroseme… O bom pescador não teme As profundezas do má
A noite vinha saindo Pru dentro da ventania, Vi o rastro da cutia Na minha rede dormindo, A tremela foi caindo, Gritei pelo meu ganzá, Anum preto, anumará, Só gosto de nega feme… O bom pescador não teme As profundezas do má
*
Minha mãe era católica E meu pai era católico, Ele romano apostólico, Ela romana apostólica, Tivero um dia uma cólica Que chamam dor de barriga, Vomitaro uma lumbriga Do tamanho dum farol, Tomaro Capivarol, Diz a tradição antiga
*
Minha avó, mãe de meu pai, Veia feme sertaneja, Cantou no coro da Igreja, O Major Dutra não cai, Na beira do Paraguai Vovó pegou uma briga, Trouve mamãe na barriga, Eu vim dentro da laringe, Quage me dava uma impinge, Diz a tradição antiga
*
Não sei onde fica esse tá de oceano, Nem sei que pagode vem sê esse má… Eu sei onde fica Teixeira e Tauá, Que tem meus moleques vestido de pano… A minha patroa é quem traça meus prano, Cem culha de milho inda quero prantá, Farinha, lugume, feijão e jabá, Com mói de pimenta daquela bem braba, Valei-me São Pedro, Limeira se acaba, Cantando galope na beira do má.
*
O navi navega só Como a muié nos espeio Pru dentro do mar vermeio Que sai lá no Moxotó O poeta vive só. A lua tem mais calô, O jardim logo murchô, Quage morri da patada… Nos olhos da minha amada Brilham estrelas de amor
*
Peço licença aos prugilos Dos Quelés da juvenia Dos tofus dos audiacos Da Baixa da silencia Do Genuino da Bribria Do grau da grodofobia
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Eu sou corisco pastando No vergel da vantania Oceano disdobrado No véu da pilogamia No dia trinta de maio Pelei trinta papagaio Santo Deus, Ave-Maria.
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Heleno, que bicho é esse Que tem fala de homem macho? Parece um tatu quadrado Cum cinturão no espinacho É uma coisa tão pouca Mas ninguém sabe se a boca Fala pro riba ou pro baixo
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Lá na Serra do Teixeira Nasci, sendo bem criado Na Alemanha os japonês Já sabe lê um bucado Conheço esse mundo inteiro Fica tudo no estrangeiro Do Teixeira do outro lado
*
Eu me chamo Zé Limeira Cantadô que tem ciúme Brisa que sopra da serra Fera que chega do cume Brigada só de peixeira Mijo de moça sorteira Faca de primeiro gume
*
Os Hemisférios do prado As palaganas do mundo Os prugis da Galiléla Quelés do meditabundo Filosomia Regente Deus primeiro sem segundo
*
Canto repente no Norte Arranco feijão no Sul Toco fogo no paul Não tenho medo da morte Uma mulata bem forte Uma novilha parida Uma sala bem comprida Um cangote, duas perna Poço, cacimba e cisterna Tenho saudade da vida
*
Viajou Nossa Senhora Naquele passado dia, Perto duma travissia Descansou sem ter demora. Cortou de pau uma tora Debruçada sobre o vento. Ali, naquele momento, São José sartou do jegue, Jesus passou-lhe um esbregue. Diz o Novo Testamento.
*
Gritou Dom Pedro Primeiro No tempo da monarquia: Jesus, filho de Maria. Trovão do mês de janeiro, São Pedro sendo o porteiro Da capela de Belém. Thomé comendo xerém Com sarapaté de figo. Se eu não me casar contigo. Não caso com mais ninguém.
Literatura de Cordel sábado, 02 de setembro de 2017
DOIS GLOSADORES - BARRA MANSA E TORCE-BOLA
Barra Mansa
Fui um dos apaixonados No vício da bebedeira Muitas vezes na poeira Dormi de pés espalhados Dando milhões de cuidados Aos que me eram leais Pelas calçadas e cais Exposto à chuva e ao vento Por isso digo e sustento Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Tenhas a capacidade De conheceres também Que a tal bebida já vem Da alta sociedade Dizem que até o frade Bebe que fica cabano Se isto não for engano De alguém que fala dele Eu vou me juntar com ele Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa É uma propensão feia Injuriosa e horrenda Um homem beber na venda Cair na calçada alheia Ou marchar para a cadeia Na mão dos policiais Gritam os meninos atrás: – Segura, Chico, não caia!… Eu que não gosto de vaia Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Até numa sentinela Bebe-se ali tudo junto Para vestir-se o defunto E não pegar a mazela As mulheres bebem dela Também pra não causar dano Depois que cosem o pano Todos bebem da branquinha No rezar da ladainha Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa Vive um homem acreditado Honesto e de confiança Farto de perseverança Por demais conceituado Mas chega-lhe o triste fado Com tentações infernais Deixa sem crença e sem paz Sem honradez, sem pudor Deus me livre desse horror! Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Em qualquer reunião De passatempo na vida Pode faltar a comida Porém, a bebida, não Porque dentro do salão É só quem brilha e faz plano Diz um ao outro: – Fulano Traz o vidro e corre a mão Eu fico de prontidão Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
Desde que o homem entrega Seu corpo à embriaguez A corrupta invalidez Tira-lhe o senso e lhe cega Se tem filho, arrenega Desconhece até os pais Aliado a seus iguais Pratica tristes papéis Por essas razões cruéis Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Uma velha reclamava Sua idade avançada Outra sua camarada Pra beber lhe aconselhava Dizendo: – Eu também estava Já no grau do desengano Peguei beber este ano Já danço, pinoto e corro Sei que tão cedo não morro Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
Mulher que dá pra beber Na rua faz palhaçadas Que quem está nas calçadas Baixa a vista pra não ver Se for moça, perde o ser De seus papéis virginais Isto não é satanás Que atiça, manda e quer? Diz predileta mulher: Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Minha sogra quis privar Eu tomar minhas bicadas Hoje ela toma copadas Que depois pega a chorar Pra ninguém desconfiar Enxuga a boca num pano Dá-me um palpite tirano Quando vejo ela no chão Eu pego no botijão Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
A mulher do cachaceiro Costuma beber também Alguns dos filhos que tem Marcham no mesmo roteiro Vezes que um filho ordeiro Desobedece aos seus pais Transforma-se num voraz Devido à embriagues Por isso digo outra vez Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Minha bisavó bebeu Certo dia uma reimada Quase quebrava a ossada Da grande queda que deu Gritou quando se estendeu: – Com isto é que eu me dano Rasguei meus vestes de pano Combinação, saia e fralda Agora, noutra bicada Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
O homem jogue por cem Seja ladrão com a prole Porém, não bebendo um gole Governa os vícios que tem Mas esse vício é quem Governa todos fatais E tira o senso dos tais Dá para fazer horrores Digam comigo, senhores Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Hoje, bebe o bacharel Quase toda a majestade O povo da irmandade Da contrição mais fiel Só não bebe, no quartel Recruta nem veterano Porém eu chamo um paisano Quando eu assentar praça E mando buscar cachaça Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
Passei meu tempo perdido Mergulhado no abismo Sustentando o fanatismo Pela cachaça atraído Por demais desconhecido Nos vícios descomunais Porém, Deus mandou-me a paz Graças à sua mercê Me sinto feliz porque Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Aguardente é otimista De toda forma faz bem Tira enfado de quem tem Desperta mais, limpa a vista Nos traz louro de conquista Comanda qual um decano Faz do boçal, praciano Dá-lhe riso e dá prazer Por isso volto a dizer Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
Vezes que um cachaceiro Vai comprar uma encomenda Abusa o dono da venda Cospe a sala e o terreiro Tagarela o dia inteiro Com frases discordiais Se para os tempos finais Vir a convenção antiga É quando talvez que diga Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Ninguém pode calcular Os prodígios da aguardente Refresca quem está quente Faz quem tem frio esquentar Depois que dela tomar Esquenta o quengo do mano Quer seja bom ou profano Fica transformado e forte E grita: – Ninguém se importe Bebo até lascar o cano.
Barra Mansa
O homem vai para feira Traz tudo que vai comprar Porém, é se não tomar Bebendo, só faz asneira Porque a tal bebedeira Todo desmantelo faz As encomendas que traz Ele perde ou dá ao povo Por isso digo de novo Já bebi , não bebo mais.
Torce-Bola
Eu não desprezo cachaça Intimamente a venero Quanto mais bebo, mais quero Mais meu coração lhe abraça Sem ela não tenho graça O meu gosto é desumano Não posso acertar um plano Que chega a melancolia Por isso é que todo dia Bebo até lascar o cano.
Literatura de Cordel sexta, 01 de setembro de 2017
O ADVOGADO, O DIABO E A BENGALA ENCANTADA - CORDEL DE MARCOS MAIRTON
Meus amigos e amigas O caso que eu vou contar Ocorreu em Fortaleza Na calçada de um bar: Fingindo ser meu amigo O diabo bebeu comigo E depois não quis pagar.
Eu era advogado E tinha uma mania De segunda a quinta-feira Trabalhava noite e dia Mas não fazia segredo Sexta parava mais cedo E uma cerveja bebia.
Assim, numa sexta-feira Estava anoitecendo Eu saíra do trabalho E estava no bar bebendo Quando um sujeito chegou Da mesa se aproximou E foi logo me dizendo:
– Boa noite cidadão, Posso me sentar aqui? Pra ouvir sua conversa E você também me ouvir? Tomarmos uma cerveja Comer um pouco que seja Desse feijão com pequi?
Eu disse: – Não lhe conheço, Mas tenho educação. Se quer beber, vá bebendo, Pode comer do feijão, Mas antes se identifique Até pra que eu não fique Pensando que é ladrão.
O cabra disse: – Pois não, Eu sou muito conhecido E embora com você Eu nunca tenha bebido Se eu contar minha história E você tiver memória Vai ver que não sou bandido.
Faz muito tempo que eu ando Por esse mundo cruel Viajando sem destino Vagando sem rumo, ao léu Desde que, por uma intriga, Me meti em uma briga Logo com o dono do céu.
Foram dizer para ele Que eu havia falado Que ao povoar a terra Ele havia se enganado Pois num mundo tão bacana Não podia a raça humana Por aqui ter se espalhado.
E, de fato, eu tinha dito Mas sem qualquer intenção Que ao entregar o planeta A essa população Ele condenou a Terra À violência e à guerra Não havia salvação.
Uma terra tão bonita A natureza tão bela Que Ele desse para mim E eu viveria nela Se Ele me criou perfeito Eu saberia o jeito De cuidar muito bem dela.
Quando Ele soube o que eu disse Mandou logo me chamar Perguntou: “É o que desejas? É lá que queres morar? Seja feita a tua vontade Junto com a humanidade Haverás de habitar”.
Foi grande a humilhação Que senti nesse momento Não havia precisão De tal achincalhamento Um anjo tão preparado Não podia ser tratado Como um cão rabugento.
Desde então vivo na Terra Com a determinação De provar que eu tava certo Em minha avaliação: Mostrar que a humanidade Não detém capacidade De cuidar desse rincão.
É por isso que se diz Que eu sou o rei do mal Mas mal mesmo é o homem Eu sou um anjo, afinal Eu só faço incentivar O homem a se enterrar No seu próprio lamaçal.
Quando ouvi aquela história Exclamei: – É o diabo! Só não sei cadê os chifres Onde escondeu o rabo! E ele, muito polido, Perfumado, bem vestido, Perguntou: – Quer um quiabo?
– Nem quiabo, nem pequi Não finja ser meu amigo Eu tão quieto no meu canto, O que o diabo quer comigo? Diga sua intenção Pois tenho a impressão Que estou correndo perigo!
O diabo disse: – Tá não! Eu estou aqui em paz Só quero um advogado Inteligente e capaz Que esclareça meu passado Pois de tão caluniado Já não aguento mais.
Por isso ao ver o doutor Sozinho aqui nesse bar Pensei: essa é a hora De com ele conversar Vou contar meu sofrimento E ele com muito talento Vai virar esse placar.
Respondi: – Tu não me enganas Me elogiando assim Não venha com essa conversa Logo pra cima de mim Não vai ser por vaidade Que vou chamar de bondade O que tu faz de ruim.
– O que é isso, doutor, Não rejeite esse cliente O senhor vai ser bem pago Vai enricar de repente Vai ganhar tanto dinheiro Que até seu perdigueiro Vai ter banho de água quente.
Vai ter casa com piscina, Cinco carros na garagem Passear no estrangeiro Todo mês uma viagem E pra ganhar tudo isso Quero só seu compromisso De melhorar minha imagem.
Além de ganhar dinheiro Inda vai ficar famoso Todo mundo vai falar: “Que advogado jeitoso Fez do diabo um inocente Querido de toda gente O doutor é poderoso!”
– Essa história, Seu Diabo, Eu já conheço de perto Desde quando tu tentaste O bom Jesus no deserto Não me prometa mais nada A conversa tá encerrada Vá embora que é o certo!
Mas também não se ofenda Com a minha reação Só não peça minha ajuda Para sua pretensão Não posso ter competência Se da sua inocência Não tenho convicção.
Ele ouviu e não gostou Ficou calado me olhando Percebi que a cerveja Já estava terminando Pedi a conta e falei: – Seu diabo, é “mei-a-mei” Minha parte eu tô pagando!
Ele fez uma careta E falou: – É engraçado! Você bebeu quase tudo E quer o custo rachado Veja com quem tá mexendo Pois assim você tá sendo Por demais desaforado!
– Eu sei com quem tô mexendo E não sou desaforado Mas se você bebeu pouco Não sou eu que sou culpado Se não tem como pagar Também não vamos brigar Pode ir, tá perdoado.
Quando eu disso isso pra ele Despertei o animal. Batendo a mão na mesa Com força descomunal Deu um rugido estridente E falou por entre os dentes Com uma voz de metal:
– Não diga que me perdoa Pois nem Deus me perdoou Desde aquele triste dia Que do céu me escorraçou Tu agora me ofendeu E pra desespero teu Um inimigo arranjou.
Eu aqui faço uma pausa Pra explicar pro leitor Que se não gosto de briga Também não sou morredor Desconheço o que é o medo Durmo tarde, acordo cedo Não sinto frio nem dor.
Não mexo com Seu Ninguém Também não mexam comigo Cumprimento todo mundo Todo mundo é meu amigo Mas quem pensa em me enfrentar É melhor se preparar Pra aguentar o castigo.
Assim, quando o capeta Fez aquela cara feia Olhei bem pra ele e disse: – Se vier, meto-lhe a peia! Dou-lhe na “tauba do queixo” E depois ainda lhe deixo Trinta dias na cadeia!
Ele não acreditou Veio pra cima de mim Eu saltei meio de banda E dei-lhe um chute no rim Ele saiu tropeçando Nas mesas foi esbarrando Gritei: – Diabo, hoje é teu fim!
Nessa hora ia passando Um rapaz pela calçada O diabo se apoderou Daquela alma penada E o rapaz dominado Por aquele cão danado Me deu logo uma pedrada.
Pra me defender da pedra De uma mesa fiz escudo Depois peguei uma cadeira E saí quebrando tudo Ao me ver tão irritado O diabo assustado Perdeu a voz, ficou mudo.
Aí eu me aproveitei Daquela situação E com muita agilidade Dei outro chute no cão E o rapaz da pedrada Eu derrubei na calçada E dei-lhe um “mata leão”.
Foi nessa hora que ouvi O diabo dar um gemido Percebi que ele tava Ficando todo doído Mas eu não sou brincadeira Com um pedaço de madeira Acertei-lhe o “pé-do-ouvido”.
Eu bati, ele caiu Eu pensei: tá terminado. Mas, que nada, a confusão Só havia começado Mal ele caiu no chão Apareceu tanto cão Vinha de tudo que é lado.
Vinha cão grande e pequeno Vinha preto e vinha branco Uns descendo a ladeira Outros subindo o barranco Deles, o mais abusado Era um baixinho, entroncado, Só de cueca e tamanco.
Vinha nu, vinha vestido Vinha pelado e peludo Tinha cão que era mocho E cão que era chifrudo Uns armados de tridente Outros com espeto quente Vinham espetando tudo.
Enfrentei aquela corja E a luta foi sangrenta Do baixinho de tamanco Quebrei logo o “pau da venta” Um gritou: – Pega o sujeito E mete a faca nos peito Quero ver se ele aguenta!
Naquela briga danada Eu apanhava e batia Às vezes eu atacava Outras eu me defendia Mas o que preocupava: Cada um que eu derrubava Outro logo aparecia.
Sentindo, então, que não dava Para enfrentar sozinho A legião de demônios Que estava em meu caminho Resolvi pedir ajuda Gritei: – Meu Deus, me acuda! Valei-me aqui meu Padinho!
Nessa hora se ouviu O estrondo de um trovão E diante dos meus olhos Fez-se um grande clarão No meio de tudo isso Apareceu Pade Ciço Me entregando seu bastão.
Com a bengala na mão Que meu padrinho me deu Criei mais disposição Minha coragem cresceu Saí dando bengalada E logo a diabarada Fugiu, desapareceu.
Enquanto eles corriam Eu fiquei parado, vendo O rapaz que eu derrubei Foi então se reerguendo E me dizendo: – Sei moço, To com uma dor no pescoço O que está acontecendo?
Eu disse: – Fique tranquilo Que o pior já passou Estava havendo uma briga Mas agora terminou Aí toquei o bastão Na nuca do cidadão E a dor dele sarou.
Quanto às mesas e cadeiras Que eu havia quebrado Calculei o prejuízo E deixei tudo acertado Quando paguei a quantia O dono do bar tremia Tava um mau cheiro danado.
E fui para minha casa Sem querer mais pensar nisso Tentando esquecer um pouco Todo aquele rebuliço Mas carregando contente Em minhas mãos o presente Que ganhei do Padre Ciço.
Foi assim, caros amigos Como tudo aconteceu No dia que o diabo Me enfrentou e perdeu Nada disso eu inventei Simplesmente lhes contei Da maneira que ocorreu.
Infelizmente o que conto Já não posso mais provar Pois pra alargar a rua Onde funcionava o bar Demoliram o recinto E o dono, Seu Zé Felinto, Não sei onde foi morar.
O rapaz que me atacou Me jogando uma pedrada Eu não sei de quem se trata Desconheço sua morada Mas será que ajudaria, Se naquele mesmo dia, Não se lembrava de nada?
O leitor perguntaria: – Por que não mostra o cajado? Que o Padre Ciço lhe deu Lhe fazendo abençoado? Presente tão valioso Que lhe fez tão poderoso Você deve ter guardado.
Por muito tempo guardei Como quem guarda dinheiro Mas no dia em que cheguei Pra morar no Juazeiro Ouvi uma voz dizer: – Já pode me devolver Pro meu dono verdadeiro.
Ouvindo a voz entendi Que a hora era chegada De devolver para o Santo A bengala encantada E entre ex-votos de madeira Escondi a companheira Que no museu foi deixada.
Pro isso do que eu conto Não faço comprovação Se o leitor não acredita E quer ter confirmação O mundo tá tão moderno Telefone pro inferno E vá perguntar pro cão!
Para mim o importante É ter comigo a certeza Que amando nosso irmão Preservando a natureza Deus está do nosso lado Pode ficar descansado Vencer o diabo é moleza.
Literatura de Cordel sexta, 01 de setembro de 2017
CACIMBA DE POESIA - CORDEL DE DALINHA CATUNDA
1 Na cacimba da poesia Eu meti minha cumbuca Cada cuiada que dou Mais verso brota da cuca Pra cacimba renovar Estou sempre a esgotar Sou eu mesma quem cavuca.
2 Vou cutucar meu passado Palestrar sobre meu chão Pra falar da minha terra Tenho boca de surrão Dela retiro a tramela Escancarando a janela Eu descortino o sertão.
3 Eu nasci nas Ipueiras Também me criei por lá Tibunguei muito no rio Já pesquei de landuá E no meio da futrica Pulava da oiticica Nas águas do jatobá.
4 No caminho para o rio Só singela brincadeira Brincava com a malícia A plantinha dormideira Canapum eu estourava A mutuca eu espantava Na meninice brejeira.
5 Meu caminho era florido Nas veredas muçambê Com flores de espirradeira Eu montava meu buquê Nas cercas as jitiranas Chão bordado de chananas E eu delas a mercê.
6 Cada árvore nativa Eu bem sabia apontar O espinho da jurema Não chegou a me espantar Na sombra do imbuzeiro Às vezes do juazeiro Parei muito pra brincar.
7 Jurema é pra carvão Para estaca é sabiá Marmeleiro é bom pra lenha Surra grande é de jucá Para alimentar o mico Tem resina no angico Boa sombra é de juá.
8 O canto da passarada Eu guardei no coração No leque da carnaúba Cantava o corrupião Encantava meus ouvidos Ver o bando de cupidos Cantando em meu rincão.
9 Nas cercanias do açude Faz seu ninho a lavandeira Vem a garça e se alimenta Concentrando-se na beira Em bando chega o tetéu Que vive de déu em déu Fazendo a maior zueira.
10 Seu moço como eu gostava Desta vida campesina Tomando água de pote Tomando banho de tina Meu peito às vezes chora Pois tive que ir embora Para cumprir minha sina.
11 Confesso que doeu muito Deixar a minha cidade Achava a vida um encanto Vivendo a simplicidade Hoje sou um passarinho Cantando fora do ninho Essa é a realidade.
12 Tem horas que fecho os olhos E sonho com meu torrão Chego até sentir o gosto Da paçoca de pilão Que mamãe sempre fazia Eu bem gulosa comia Misturada com baião.
13 Tomava banho de bica No tempo da invernada Tomava banho na chuva Junto com a meninada Era sensacional As biqueiras do quintal Ou as bicas na calçada.
14 Eu vi chover alegria E escorrer animação Criança chamando a chuva Na folclórica canção “Cai chuva de lá do céu Cai chuva no meu chapéu. E a chuva molhando chão.
15 Quando o corisco riscava Flamejando o infinito O trovão abria a boca E sapecava seu grito O rio dava enchente Alegrando a minha gente Tudo era tão bonito!
16 A chuvinha que chegava Era sinal de fartura O sertanejo contente Cuidava da agricultura Era milho era feijão O verde da plantação Era uma belezura.
17 Na época da colheita Não faltava animação Na festa dos três santos Fogueiras e tradição A quadrilha era sagrada E sempre bem ensaiada Com casamento e rojão.
18 O milho e a batata doce Assava-se na fogueira Tinha canjica e aluá E faca na bananeira Quem queria matrimônio Pedia pra Santo Antônio Para não ficar solteira.
19 A saudade chega ardendo Que nem surra de chicote Quando escuto um sanfoneiro Puxando fole num xote Recordo mais que ligeiro Dos fungados e do cheiro Que eu ganhava no cangote.
20 Já fui moça dançadeira Usando laço de fita Vestidinho de babado Todo florido e de chita Nunca me faltava par Pois eu sabia dançar Era metida a bonita.
21 Mas também já fui anjinho Na santa coroação Ia à missa e comungava Fiz primeira comunhão Na festa da padroeira Eu entrava na fileira Pra seguir a procissão.
22 Ainda hoje relembro O menino que passava Seu pirulito vendendo E bem alto ele gritava Quem vai querer pirulito? Me encantava aquele grito Toda vez que ele passava.
23 Saudade grande eu tenho Da festa da Conceição Da bandinha que tocava Trazendo animação O ponto alto da festa A minha lembrança atesta Era o famoso leilão.
24 Tinha parque tinha circo E som no alto-falante No namoro de mãos dadas Beijos na roda gigante No carrossel da saudade Girava a felicidade No peito de cada amante.
25 Nas brincadeiras de roda Pegando de mão em mão Eu cantava o carneirinho “Carnerim, nerim nerão” A ciranda cirandinha E também a machadinha Brinquei de bão, balalão.
26 Menina moça enxerida Era eu na pouca idade Pretendente não faltava Digo com sinceridade Não faltava seresteiro Cantando no meu terreiro Em tempos de alacridade.
27 Da lembrança eu resgato O que nunca esqueci As cadeiras na calçada Aguardando o Aracati Vento da boca da noite Que chegava como açoite Era gostoso e eu senti.
28 Daqueles tempos de então Saudades tenho demais Das moagens na fazenda Das calçadas e quintais Das noites enluaradas Do beiju nas farinhadas Dos antigos rituais.
29 Das feiras de antigamente Na minha velha Ipueiras E da bolacha fogosa Nas bancas das cafezeiras Da pitomba e do cajá Do gosto do cambucá E das ervas milagreiras.
30 As saudades do manzape Bolo comprado na feira E que vinha enroladinho Na folha da bananeira Do alfenim da batida Da rapadura querida Da reza da benzedeira.
31 Saudades do meu sotaque Do meu velho linguajar Do arre égua, do oxente Que eu gostava de falar Eu não estou de frescura Distante desta cultura Falto pouco é me lascar.
32 Fui à fonte buscar versos A cacimba estava cheia Porque a musa me ajudou Eu fiz sem morrer na areia Naveguei com emoção Nadei na recordação Nas águas da minha aldeia.
Literatura de Cordel segunda, 17 de julho de 2017
GABRIELA PEQUENINA, OU A HISTÓRIA DE UMA GAROTINHA DE PROGRAMA (FOLHETO DE AUTOR DESCONHECIDO)
Eu, viajando outro dia lá pras bandas de Agrestina num posto de combustível deparei com uma menina que, se eu bem não me engano tinha dez ou onze anos corpo pequeno e franzino pareceu meio perdida aquele taco de vida sem eira, beira ou destino.
Se dirigindo pra mim falou que estava com fome me pedindo uma ajuda eu falei pra ela: – tome! Lhe entreguei algum trocado e um pouco desconfiado perguntei se estava só, a sua mãe onde estava se ela ali esperava o pai, a tia ou a avó!
Ela deu um riso choco e disse sem muito drama que devido ao sufoco vivia a fazer programa que ali por qualquer dinheiro deixava o caminhoneiro fazer dela uma mulher e se ele oferecesse algo que ela comesse lhe fazia o que quiser.
Fiquei meio estarrecido ouvindo a pobre menina falar feito gente grande sendo assim tão pequenina, então perguntei pra ela, qual seu nome? Gabriela, ela disse bem feliz me deu um singelo abraço e eu notei que em seu braço tinha uma cicatriz.
– Quem lhe causou este dano? Lhe perguntei assustado. – Foi meu pai, um certo dia, quando estava embriagado. Deu de garra da peixeira tentado fazer besteira e eu, de pronto recusei ele sem muito embaraço rodou a faca em meu braço me espancou e eu desmaiei.
Algumas horas mais tarde envolta em sangue acordei meu pai, caneiro e covarde ali não mais avistei olhando ao meu redor notei que não estava só vi minha mãe soluçando com meu irmãozinho no braço um outro lá no terraço e um no bucho esperando…
Minha mãe muito sofrida se entregou à bebedeira velha, magra e carcumida vivia na gafieira meu pai, cortador de cana quando recebia a grana ia tomar de cachaça eu, sem comida ou escola vivia pedindo esmola na avenida ou na praça.
Meus dois irmãos pequeninos iam comigo também três crianças, três destinos sem apoio de ninguém limpando os vidros dos carros levamos gritos e esparros de motoristas cruéis eu, pedia em minhas preces que Deus um dia fizesse uma inversão de papéis.
Faminta e maltrapilha cheguei nesse posto um dia estava desfigurada pois há muito não comia aproximou-se um bacana e me mostrando a grana que levava a tiracolo me levou pro caminhão e sem muita enganação me colocou no seu colo.
No momento eu não gostei lembrei do meu genitor pois recebia carícias sem um pingo de amor o homem, um velho gorducho esfregava em mim seu bucho e os meus seios beijava senti um nó na garganta mas a fome era tanta que eu fingia que gostava.
Quando o velho terminou me lambuzando DAQUILO puxou a nota do bolso e me entregou bem tranquilo apenas cinco reais não foi nem menos nem mais a paga pelo que eu fiz, lembrando a fome que eu tinha me deu arroz com galinha e eu fiquei até feliz.
Depois do fato ocorrido me senti com depressão mas uma outra menina me deu cana com limão e disse, com ironia você se acostuma um dia ou se saia se puder se tu não achar um rumo daqui um mês eu te arrumo um emprego num cabaré…
Lá tu vai ficar famosa sendo nova no pedaço porque das moças antigas de lá, só tem o cangaço a vida de rapariga lhe dá cansaço e fadiga e deixa o corpo em frangalho mas se não tem opção lhe garanto a refeição um teto e um agasalho.
Fiquei na casa de Lia no fim da rua da lama passo o dia aqui no posto de noite, lá, ganho fama pois sou nova na orgia e os fãs da pedofilia gostam de me ver pelada se sinto eles me beijando finjo que estou gostando mas ali não sinto nada.
Abandonei a escola porque não tinha merenda a professora faltava pois se queixava da renda pra aprender ler e escrever eu tinha que percorrer dois quilômetros e meio arrastando meu irmão que tinha desnutrição – Pense, no meu aperreio?
Saía de casa virgem de um gole de café às vezes comia uma fruta quando caia do pé quando na aula chegava que a professora faltava ficava lá de bobeira sem merenda e sem lazer não tendo o que fazer pegava a fazer besteira.
Ia pra feira, no centro pedir esmola ou roubar ficando até irritada se alguém não quisesse dar me acostumei nessa vida vendo a educação perdida sem futuro e sem escola passei a viver na rua vivendo ao sabor da lua aprendi a cheirar cola.
Meu irmão, menor que eu tendo a mente meio fraca de olho nuns pirulitos que tinha numa barraca de pedir não teve jeito resolveu meter o peito pegando alguns escondido o dono, vendo a malícia mandou chamar a polícia e ele foi apreendido.
Como ele era menor foi levado pra FEBEM lá apanhou de dar dó, foi estuprado também. e seus próprios companheiros malvados e traiçoeiros menores enlouquecidos em cada surra que o davam sem querer ali talhavam no meu irmão, um bandido.
Quando meu irmão saiu daquela casa de horrores me contou seu sofrimento, os seus traumas, suas dores. demente e contrariado foi morar com um viado que na prisão conheceu e pra pagar a guarida hoje está na mesma vida: faz programa que nem eu!
Seu moço, minha vontade era poder estudar aprender algum ofício ter dinheiro, trabalhar casar, ter minha família e educar minha filha mostrando o valor da luta dar tudo que ela precisa suando a minha camisa pra ela nunca ser puta.
E se arranjasse um marido alguém que enfim, me quiser eu ia mostrar pra ele o valor de uma mulher. Pra mamãe muitos carinhos eu dava e meus irmãozinhos de existência sofrida na escola particular eles irão estudar quando eu sair dessa vida.
Ao ouvir aquilo tudo fiquei um tanto chocado resolvi não ficar mudo e ousei mandar o recado pra que a criança leia e a mãe não fique alheia e lute sempre por ela pra que ela nunca queira pensar, nem por brincadeira em ser uma Gabriela.
E faço um apelo aos governos que olhem nossas crianças, a delinquência infantil é a pior das heranças. a falta de educação é da prostituição o principal descaminho o jovem sem assistência não tem força ou competência para caminhar sozinho.