O OURO EM SERRA PELADA - A LUTA DO GARIMPEIRO
Celestino Alves
Vinde, ó Musa Sacrossanta
Dai-me a inspiração
Para eu descrever um caso
Que me chamou atenção
E está abalando o povo
Do Pará ao Maranhão
Desde a colonização
Que o ouro é um mistério
Nos áureos tempos, em Minas
Houve problema tão sério
Revolução, luta, briga
Só por caus ado minério
Nem sempre as lutas trouxeram
Ao garimpeiro a glória
Mas eles sempre lutaram
E conquistaram vitória
Través do tempo escreveram
Linda página da história
É sempre um homem pacífico
Trabalhador e ordeiro
Valente como um leão
E manso como um cordeio
A palavra independência
Tem cheiro de garimpeiro
O garimpeiro é o homem
Que vive em demandada
Escala serra e montanha
Tabuleiro e baixada
Vai dormir tarde da noite
Levanta de madrugada
O ouro no Amazonas
No Pará, no Maranhão
Creio que foi explorado
No tempo de Salomão
Mas ninguém tinha encontrado
Desde a colonização
A Floresta Amazônica
Era mistério insondável
Depois da Transamazônica
Essa obra admirável
A mata desvirginou-se
Tornou-se mais penetrável
Houve o tempo da borracha
Que foi uma escravidão
Porque o capitalista
Formava expedição
Milhares de seringueiros
Sujeitos a um patrão
Compravam um barracão
Do preço que ele queria
A borracha que tiravam
Somente a ele vendia
Ante a febre malária
Sem nem uma garantia
A produção da borracha
Normalmente era explorada
Grava muita riqueza
Para a firma organizada
O pobre do seringueiro
Sempre ficava sem nada
Através dessas empresas
Todas mistas estrangeiras
Foram levadas sementes
E mudas de seringueiras
Para fazer seringais
Além das nossas fronteiras
Lá nas terras estrangeiras
O seringal foi plantado
Com boa técnica e adubo
Fácil acesso e bem cuidado
Assim puderam colher
Muito melhor resultado
Esse crime lesa-pátria
Ainda não foi punido
Fez o nosso seringueiro
Ficar no mato perdido
Sem nem uma aspiração
No mundo desiludido
O estrangeiro é vivo
E de ninguém sente dó
Também levaram a semente
Do nosso algodão mocó
Lá plantaram, ele nasceu
Mas quando floriu, morreu:
Saudade do Seridó
O seringueiro jogado
No imenso matagal
Tendo perdido o trabalho
Que teve no seringal
Apelou para viver
Em busca do mineral
Encontrou Serra Pelada
Sem calças e Carajá
E foi descobrindo ouro
Aqui, ali, acolá
Na Floresta Amazônica
No Maranhão, no Pará
E assim foi trabalhando
Nosso velho seringueiro
Meteu-e na mata adentro
Vencendo desfiladeiro
Sem ter outra alternativa
Transformou-se em garimpeiro
A Região Amazônica
É do mundo o brilhante
O farol que ilumina
Com seu raio fumegante
Ela era o berço esplêndido
Onde dormia o Gigante
Está sendo explorada
Mas sua exploração
Deve ser bem planejada
Evitar devastação
Para num futuro próximo
Não termos desilusão
A sua verde floresta
Faz nos chamar atenção
Seu subsolo é riquíssimo
Em ouro de aluvião
A Região está crescendo
Em verdadeira explosão
Ninguém tinha penetrado
Ainda em Serra Pelada
Por ser difícil o acesso
Meio longe da estrada
A grande reserva aurífera
Estava ali bem guardada
Certo dia em Marabá
Formou-se uma expedição
Cerca de dez companheiros
Tomaram uma decisão
De irem a Serra Pelada
Pesquisar a região
João Vieira dos Santos
E mais nove companheiros
Fazendo um total de dez
Destemidos garimpeiros
Caçadores de minério
Verdadeiros pioneiros
Saíram de Marabá
Numa linda madrugada
Que vai ficar na história
Para sempre registrada
Às nove horas do dia
Chegaram em Serra Pelada
São pequeninas fagulhas
Invés de grande pepita
Mas João Vieira vê nelas
O símbolo de sua dita
Deve contar a história
Quando um dia for escrita
Genésio e os companheiros
Puderam assim constatar
A existência de ouro
Abundante no lugar
Distribuíram os barrancos
Começaram a trabalhar
Não havia ambição
No meio dos companheiros
Começaram trabalhando
Os chegaram primeiro
A notícia se espalhou
No mundo dos garimpeiros
A notícia correu logo
Do Pará ao Maranhão
Começo a chegar gente
A pé e de caminhão
Em pouco tempo formou-se
Verdadeira multidão
O povo foi aumentando
Formando aglomeração
Onde existe muita gente
Nem sempre há união
Vindo às autoridades
Despertar a atenção
O Coronel Curió
Comandava o Batalhão
Destacado em Marabá
Lá perto da região
Resolveu ir visitar
Aquela população
O Coronel, um Tenente
Com a sua ordenança
Calmo, moderadamente
Com sua maneira mansa
Fez com que todos sentissem
Nele toda confiança
Foi em vinte e um de abril
O seu contato primeiro
Com sua categoria
Seu bom jeito de mineiro
Conquistou a confiança
De cada um garimpeiro
Em dezenove de mail
Começava seu labor
Voltava a Serra Pelada
Sendo Coordenador
Deu tudo de seu trabalho
Como organizador
No meio dos garimpeiros
Demonstrou eu heroísmo
Calmo, moderadamente
Como quem dá catecismo
Pregando a fraternidade
Sem dispensar o civismo
Foi logo criado um Posto
Da Polícia Federal
Que policia o garimpo
Em sua área central
E todo o dia se canta
O Hino Nacional
Nessa administração
Serra Pelada estourou
Muita gente, muito ouro
Muita riqueza gerou
Muita união fraternal
Lá jamais alguém brigou
Em junho de oitenta e dois
Deixou a Coordenação
Candidato a Deputado
Por aquela região
Consegui por voto livre
Sua primeira eleição
Começou a nova luta
Em favor dos garimpeiros
Pois o direito de lavra
Foi concedido a terceiros
Pararam a mina e quiseram
Expulsar os pioneiros
No Brasil, foi sempre assim
Desde a colonização
O homem descobre a mina
Trabalha como um leão
Mas jamais teve direito
À sua exploração
Hoje já está bem melhor
Porque é dos brasileiros
Pois antigamente era
Privativo do estrangeiro
O que não se deu ainda
Foi direito ao garimpeiro
Agora, em Serra Pelada
Tudo mudou e feição
Curió fez um projeto
Chamou da Câmara atenção
Permitindo ao garimpeiro
Cinco anos de exploração
Em cinco do mês de outubro
Sendo o projeto aprovado
Na Câmara, no dia sete
Aprovaram no Senado
Porem pelo Presidente
O projeto foi vetado
Os garimpeiros vieram
Assistir à votação
Eu gostei muito de ver
Deles a compreensão
Deram as suas presenças
Sem alarde nem pressão
Presidente Figueiredo
Teve um gesto decisivo
Viu que para os garimpeiros
Não tinha paliativo
Então mandou ao Congresso
Um projeto executivo
Concedendo aos garimpeiros
Três anos de exploração
À Vale do Rio Doce
Concede indenização
De setenta e oito bi
Pela sua concessão
Curió apresentou
Emenda e com razão
Que a Vale do Rio doce
Faz jus à indenização
Se provar o seu direito
Com a documentação
Antônio Lopes Carvalho
Vulgo Antônio Mineiro
Movimentou novamente
Um grupo de garimpeiros
Aqui veio acompanhar
O projeto alvissareiro
Novamente demonstraram
Civismo e educação
No Plenário acompanharam
Calmamente a votação
Sem alarde nem barulho
Sem qualquer agitação
O Deputado Curió
Deve estar bem satisfeito
Defendendo o garimpeiro
Mostrando o que tem direito
Vendo que o seu trabalho
Está surtindo efeito
No Estado do Pará
Pássaros fazem sucesso
Tem pássaro no Ministério
Tem um pássaro no Congresso
Se aumentar mais um pássaro
Vamos ter maior progresso
O Curió no Congresso
Bate as asas, canta, cisca
Em favor de garimpeiro
Cutuca, pula e belisca
Invés de cair no laço
Sempre está tirando a isca
Só entram para o cordel
Os autênticos brasileiros
O mundo dos cordelistas
São os fatos verdadeiros
Meus parabéns, Curió
Meu abraço aos garimpeiros
Chamaria Guerra Santa
A luta do garimpeiro
Lutando sem agressão
Vivendo sem desespero
Elegantemente mostra
Seu trabalho pioneiro
Brasília, 31 de maio de 1984
Celestino Alves - CALVES