Caros apreciadores
Na Feira do Caldeirão
Eu ouvi a propaganda
De um matuto do sertão
E já portanto escrevi
Tudo que vi e ouvi
Na sua conversação
Não é só a propaganda
Com também a disputa
Do fiscal com o matuto
Que quase dá-se uma luta
O mesmo livro contém
O comentário também
De uma mulher matuta
Quando o matuto chegou
Às Nove horas do dia
Com um balaio de maxixe
Era o que ele trazia
E dez almas de banana
Se o espírito não me engana
Foi essa a mercadoria
Espalhou no meio da Feira
Fez propaganda e gritou
Em tenho os maxixe grande
Agora mesmo encostou
Banana comprida e prata
Ma eu num vendo barato
Cá banana levantou
São 10 penca de banana
6 prata e 3 solancó
E uma penca comprida
Qui ainda é mai mió
Quer dizer que forma dez
Dou por um conto de réis
Entra a penca no cocó
As banana é de primeira
Os maxixe são graúdo
Um rapaz lhe perguntou
Quanto o senhor quer por tudo
Disse ele novecentos
Disse o rapaz dou quinhentos
Disse o matuto é canudo
Sendo somente as banana
O senhor por quanto dá
Ficando os maxixe fora
As banana pode entrar
Dou tudo por oitocentos
Não bote os maxixe dento
E vamos negociar
Minha banana tá mole
Pruque eu sou cuidadoso
Se trago a banana dura
Num vendo, fico raivoso
De madura tá vermeia
A casca por fora é feia
Mai o miolo é gostoso
Se os maxixe são grande
As banana inda são mai
Eu trouxe foi pra vender
Todo negócio se fai
Porém se ninguém compra
De tarde eu vou vortá
Com os maxixe pra trai
Ali chegou um parente
De tal matuto beócio
E lhe disse meu cumpade
Cuma vai o teu negócio
Cumpade, eu vou bem pur cá
Vai me dizendo pua lá
Cuma vai passando os nosso
Cuma vai cumade Chica
Sá Caboca e Zé Vintém
As menina de Tingole
E todos mai que lá tem
Tá todo bem e disposto
Disse o matuto é meu gosto
Qui tudo lá teja bem
Gosto danosa catinga
Pru muito seca que seja
Tu dá lembrança a Tingole
Pruque tra vei eu num veja
Recebi de Zé Bochudo
Lembrança pá cá pá tudo
Dessa terra sertaneja
Disse o matuto não sabe
Zefa fugiu com Fernande
Quem é esse, meu cumpade
Aquele que vende frande
Roubou ela da Serrinha
Correu a noite todinha
Passou na Pindoba Grande
Chegou o fiscal da Feira
Trazendo uns papéis na mão
E disse vamos matuto
Pague o direito do chão
Disse o matuto seu guarda
Ainda não vendi nada
Não tenho dinheiro não
Tinha 200 mil-réis
Comi de sarapaté
Comprei 4 pão fiado
E 3 chica de café
Isso aqui não é meu só
Porque a penca maió
E os maxixe é da muié
Não estou lhe perguntando
Pelos seus particulares
Estou cobrando imposto
Isto é e todos lugares
Não quero articulação
Se não quiser pagar chão
Vá negociar nos ares
Disse o matuto eu num pago
Nem um tostão dessa asneira
Qualquer coisa que se bota
No Mercado ou nessa Feira
O senhor vem com espanto
Cobrando tanto e quanto
Isso não é ladroeira?
O cobrador respondeu
Não admito porfia
Você não pode vender
Retire essa porcaria
Porcaria não senhor
Disse o matuto é favor
Tratar por mercadoria
A mulher do tal matuto
Chegou nessa ocasião
E um filho deles dois
Acabaram a discussão
Pagando a justa quantia
Que o cobrador queria
Pelo direito do chão
Venderam tudo de vez
Por mais ou menos dinheiro
Porque o retalhador
Que se chama verdureiro
Botou preço e atacou
Depois de justo pagou
Por quanto eu não dou roteiro
Foi-se embora o cobrador
Começaram a conversar
A mulher disse meu veio
Agora vou te contá
Quando tu vei mai João
Na tua costa um ladrão
Fo no poleiro roubá
Eu não peguei mai no sono
Já era de manhãzinha
Eu vi bulir no poleiro
Estrumei a cachorrinha
Quando Piaba peitou
O ladrão se abaixou
E vi ele cá galinha
Arribei os 3 cachorro
Peixim, Cascudo e Xerém
Pela brecha da parede
Vi mai não conheci bem
Dispoi reparei por baixo
Vi que era um cabra macho
Por um buraco que tem
E eu já hoje avisei
A cumade Manuela
Que é pa cumade ter
Cuida do ca casa dela
E cuma ela é vizinha
Ela pode ter ca minha
E eu muito mai ca dela
Disse o matuto muié
Nós precisa se cuidá
Se tranca todos os bicho
Mode o ladrão num roubá
Fale com a Fulozina
Venda os bicho das menina
Mas o seu deixe ficar
Venda a porca da Zefa
A cabra da Filismina
O capado da Zabé
A jumenta da Firmina
A besta russa da Chica
E a castanha da Lica
Vai ficá pra Bernardina
Venda o burro do Cosme
E o galo de Damião
A bezerra da Quitéria
O cachorro do Gusmão
A bacorinha da Terta
A borrega da Roberta
E o bode azul do Simão
A muié disse meu véio
Você com uma faceta
Já falou nos bicho todo
Es as garça da Riqueta?
Quanto são, nós também tranca
Disse ela 8 é branca
E 9 ca garça preta
E que se foi dos cachorro
O Pintado e o Felpudo
E o Melado ele disse
Num se vende fica tudo
Chico fica cu Pintado
Eu vou ficar cu Melado
E você cu Cabeludo
Depois da Feira voltaram
Às quatro horas e meia
Não sei eu horas chegaram
Talvez na hora da ceia
Quando os pobres camponeses
Por não erem luz às vezes
Acendem a pobre candeia
Finalmente terminei
Me desculpa populaça
A linguagem do matuto
Hoje é diversão na praça
Porque a conversação
É torta que só cordão
Dentro do bolso da calça
Quando eu era criança meu pai falava tudo de cor e eu acabei decorando.achava lindo! sou hoje apaixonado por cordel, herança de meu pai Sr Manoel . muitos outros decorei.
Muito bom cordel. Muito humor. Gosto muito desta literatura. Desde pequeno que aprecio. Cheguei a conhecer o grande mestre cordelista Rodolfo Coelho Cavalcante quando morou em Jequié.