Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 05 de maio de 2020
DIRETOR-GERAL: POR QUE O HÍFEN?
A troca do diretor-geral da Polícia Federal foi o pomo da discórdia. Bolsonaro queria substituí-lo. Moro queria mantê-lo. No sai, não sai, ambos saíram. O fato virou manchete. Com a notícia, pintou a polêmica. Uns escreveram o cargo em disputa com hífen. Outros sem. E daí?
A reforma ortográfica uniformizou o emprego do hífen com o adjetivo geral. Geral sempre pede o tracinho: secretário-geral, diretor-geral, coordenador-geral, orientador-geral, procurador-geral.
Olho vivo
Se o cargo tiver certidão de nascimento escrito sem hífen, permanece sem tracinho. Como no jogo do bicho, vale o que está escrito.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 04 de maio de 2020
CÂMARA OU CÂMERA?
Os deputados federais se reúnem na Câmara dos Deputados. Os estaduais, nas assembleias legislativas. Os da capital da República, na Câmara Legislativa (Câmara Distrital não existe. Os deputados é que são distritais). Na acepção de instrumentos que captam imagens, valem as duas grafias – câmara e câmera: câmara fotográfica, câmera fotográfica.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 03 de maio de 2020
A FOLHA TROPEÇOU NA LÍNGUA
“Bolsonaro chama Moro de Judas”, escreveu a Folha de S.Paulo. Cochilou. Esqueceu pormenor para lá de importante. Judas, como Maria, João, Amélia e Pará, joga em dois times:
Num, é substantivo próprio: Judas traiu Jesus. São Judas Tadeu tem muitos devotos.
Noutro, é substantivo comum. Aí, significa traidor: Bolsonaro chama Moro de judas. Você vai participar da malhação do judas? Há muitos judas no nosso mundo.
Outros exemplos
Nome próprio: Maria é a mãe de Jesus. João é um dos apóstolos de Cristo. Minha amiga Amélia mora em São Paulo. O Pará fica na Região Norte.
Nome comum: Ela é maria vai com as outras. Esta gostosura se cozinha em banho-maria. Muitos consideram o joão-de-barro o arquiteto da natureza. Há muitas amélias no Brasil? Os médicos recomendam comer uma castanha-do-pará por dia.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 02 de maio de 2020
DIA DO TRABALHO: HISTÓRIA
Lá pelo século 18, os operários trabalhavam até 20 horas por dia. Não se falava em repouso aos domingos. Muito menos em semana inglesa. Com o tempo, houve melhoras aqui e ali. Mas a carga continuava pesada. Como não há bem que sempre dure nem mal que nunca se acabe, veio a reação. Em 1º de maio de 1886, 110 mil operários de Chicago cruzaram os braços. Em três dias, a greve cresceu. A polícia reprimiu o movimento com violência. Não adiantou. Ele só crescia. A PM de lá atirou contra a multidão. Em resposta, os grevistas explodiram bombas. Depois de xilindrós e enforcamentos, as conquistas vieram em 1º de maio de 1890. Entre elas, a jornada de oito horas. A Segunda Internacional Socialista, da França, decidiu: o 1º de maio seria dedicado aos trabalhadores e às suas lutas.
Curiosidades
1. Os Estados Unidos não comemoram o Dia do Trabalho em 1º de maio. Fazem a festona na primeira segunda-feira de novembro.
2. Dia do Trabalho é dia comemorativo. Nome próprio, escreve-se com inicial pequenina como Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia dos Namorados, Dia da Criança. E por aí vai.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 01 de maio de 2020
EUA TÊM? TEM?
Apareceu na telinha durante o Jornal da Band: “EUA tem 55 mil mortos por coronavírus”. Viu? Pisaram a concordância. Substantivo próprio no plural tem manhas:
- Se o nome é usado só no plural e precedido de artigo = o verbo concorda com o artigo. Em siglas, o artigo não aparece. Mas conta como se estivesse presente: Os Estados Unidos têm 55 mil mortos. EUA são, hoje, o epicentro da crise sanitária. Os Andes ficam na América do Sul. O Amazonas banha o Brasil e países vizinhos. O Palmeiras disputa a taça.
- Se o nome se usa sem artigo = verbo no singular: Minas Gerais fica na Região Sudeste. Alagoas tem as praias mais bonitas do país.
Diquinha
Ter e vir jogam no mesmo time. As terceiras pessoas do presente do indicativo apresentam capricho semelhante: Ele tem, eles têm; ele vem, eles vêm.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 30 de abril de 2020
CONJUGAÇÃO: LER, CRER E DAR
Ler, crer e dar pertencem à equipe de ver: ele lê, eles leem; ele crê, eles creem; (que) ele dê, eles deem.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 29 de abril de 2020
UM DOS QUE CHEGOU FOI RAMAGEM? UM DOS QUE CHEGARAM?
Relaxado, sorridente, Bolsonaro contava como conheceu Alexandre Ramagem. Foi depois das eleições. Na qualidade de futuro presidente, podia escolher seguranças. Vários policiais militares se apresentaram. “Um dos que chegou lá foi Ramagem”, disse ele. Repórteres se entreolharam. Chegou ou chegaram?
Um dos que é expressão gilete. Corta dos dois lados. Topa o singular e o plural. Mas o sentido muda. O singular é egoísta. Diz que a ação se refere a um só indivíduo. O plural, a todos. No caso da frase de Sua Excelência, vários chegaram. Ramagem foi um deles. Só o agora diretor-geral da PF mereceu a referência do morador do Palácio da Alvorada. Os outros sobraram.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 28 de abril de 2020
PLEONASMO: ELO DE LIGAÇÃO
Olho vivo, marinheiro de poucas viagens. Fuja do tal “elo de ligação”. Baita pleonasmo. Todo elo é de ligação, assim como todos os países são do mundo, todo habitat é natural e todo panorama é geral. Elo, país, habitat e panorama, solitários, dão o recado.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 27 de abril de 2020
VACINA: ETIMOLOGIA E HISTÓRIA
O objeto de desejo de Europa, França e Bahia? É a descoberta da vacina contra o coronavírus. Cientistas do mundo inteiro buscam uma gotinha ou uma injeção capaz de imunizar adultos e crianças. Dinheiro não falta. Nem apoio. O problema é o calendário. Há etapas que devem ser respeitadas. Cada uma exige tempo. Enquanto esperamos, que tal uma curiosidade? A história vem de séculos atrás.
A história
O que a vacina tem com a vaca? O nome. O trissílabo vem do latim vaccina. Quer dizer “da vaca”. Em 1796, o médico inglês Edward Jenner clinicava em Berkeley. O danado vivia de olho nas moças que ordenhavam as vacas. No espia-espia, observou que elas contraíam varicela ou catapora. Mas não pegavam varíola.
Eureca! Teve uma ideia. Preparou uma cultura de varicela com o material das mãos de uma das trabalhadoras. Inoculou-a num garoto de oito anos. Semanas depois, inoculou o vírus da varíola. O menino não pegou a doença. Viva! Estava descoberta a vacina.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 26 de abril de 2020
SOCIOECONÔMICO OU SOCIO-ECONÔMICO?
No noticiário da CNN, apareceu na telinha a palavra socio-econômico. Dali a pouco, socioeconômico. Qual a forma correta? Socioeconômico joga no time de sociopolítico, socioambiental, socioeducativo e sociocultural. Tudo colado.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 25 de abril de 2020
PLEONASMO: HÁ... ATRÁS
Na entrevista coletiva sobre o coronavírus, o ministro-chefe da Advocacia-geral da União desperdiçou palavras. “O recurso foi feito há 10 dias atrás”, disse André Mendonça. Abusou.
1. Há indica tempo passado.
2. Atrás também indica tempo passado.
Melhor ficar com um ou outro:
O recurso foi feito há 10 dias.
O recurso foi feito 10 dias atrás.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 24 de abril de 2020
VÍRGULA ANTES DA CONJUNÇÃO E? DEPENDE.
A GloboNews escreveu na telinha: “Bolsonaro tentou trocar o diretor-geral da Polícia Federal, e Moro ameaça pedir demissão”. Assinantes estranharam a vírgula antes da conjunção e. Está correta? Está.
O e detesta excessos. Por isso, dispensa a vírgula:
Trabalho e estudo.
Vou a Pernambuco e depois à Paraíba.
Bolsonaro quer demitir um diretor e nomear outro.
Só num caso o e aceita a vírgula. Aí, impõe duas condições:
1.as orações têm que ter sujeitos diferentes.
2. haver a possibilidade de provocarem confusão.
Bolsonaro tentou trocar diretor-geral da Polícia Federal, e Moro ameaça pedir demissão.
Percebeu? O período tem orações com sujeitos diferentes. Um é Bolsonaro. O outro, Moro.
Uma leitura rápida dá a impressão de que Bolsonaro tentou trocar o diretor-geral da PF e Moro.
O que fazer? Usar a vírgula antes do e:
Bolsonaro tentou trocar diretor-geral da Polícia Federal, e Moro ameaça pedir demissão.
Outros exemplos
Os Estados Unidos invadiram o Iraque, e a Rússia reagiu.
Falou com o repórter, e o presidente aprovou a iniciativa.
Atenção
A vírgula aparece antes da conjunção. Não depois.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 23 de abril de 2020
70% DA POPULAÇÃO VAI SE CONTAMINAR? VÃO SE CONTAMINAR?
Reabre o comércio ou mantém as portas fechadas? Retoma as aulas ou mantém a meninada em casa? Libera missas e cultos ou mantém os fiéis distantes de padres e pastores? As respostas variam. Um dos defensores do retorno aos tempos pré-coronavírus é Jair Bolsonaro. O presidente jura que 70% da população … ops! Vai ou vão se contaminar? Trata-se de questão de concordância.
A concordância tem caprichos. Um deles é a colocação – o verbo vem antes ou depois do numeral? O outro é a companhia. O numeral aparece solitário ou acompanhado? Dominadas as manhas, a alternativa é uma só. Acertar ou acertar.
Capricho 1
Se o número vem antes do verbo, você escolhe. O verbo pode concordar com o numeral ou com o complemento: 70% da população vão se contaminar (concorda com 70). 70% da população vai se contaminar (concorda com população).
Olho vivo
Confundir liberdade com libertinagem? Nem pensar. A liberdade de escolha não significa ausência de análise. Às vezes, o numeral e o complemento têm o mesmo número. Aí, adeus, alternativa: 1% da população vai se contaminar. 10% dos brasileiros vão se contaminar.
Companhia
Se o numeral for determinado (acompanhado de artigo ou pronome), a concordância só se fará com ele: Uns 70% da população vão se contaminar. Este 1% de indecisos decidirá o resultado. Bons 30% do corpo docente faltaram à convocação.
Capricho 2
Com o número percentual posposto ao verbo, a concordância se faz obrigatoriamente com o numeral: Abstiveram-se de votar 30% da população. Tumultuou o processo 1% dos candidatos inconformados com a flagrante discriminação. Saiu da sala apenas 1% dos alunos.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 22 de abril de 2020
ELE DEPÕE NA PF? ELE DEPÕE À PF?
O verbo depor exige a preposição em: O acusado depõe na polícia. Paulo vai depor na CPI. Maria depôs na PF.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 21 de abril de 2020
CRASE 2: PRONOME DE TRATAMENTO
Pronome de tratamento começado por Vossa ou Sua tem alergia ao artigo. Sem ele, adeus, crase:
Dirijo-me a Vossa Senhoria para apresentar a proposta de prestação de serviços.
Encaminho a Vossa Excelência o documento solicitado.
Digo a V. Sª que o livro está esgotado.
O presidente fez referência a Sua Excelência para justificar a resposta.
É isso. Com pronomes de tratamento começados com Vossa e Sua, xô, crase!
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 20 de abril de 2020
CRASE 1: O PORQUÊ DO ACENTO
“A crase não foi feita pra humilhar ninguém”, disse F. Gullar. Foi feita pra indicar a união de dois aa. O a pode ser artigo (a casa) ou a 1ª sílaba do pronome demonstrativo aquele, aquilo. Só substantivo feminino é antecedido do artigo a. Daí por que só ocorre crase antes de quem usa batom e saia.
Com crase ou sem crase? Na dúvida, recorra ao troca-troca. Troque o nome feminino por masculino. Não precisa ser sinônimo. Mas do mesmo número (singular ou plural). Se no troca-troca der ao (aos), sinal de preposição + artigo. No feminino, à (às):
1.Vai à cidade. (Vai ao clube.)
Viu? Ao chama à.
2. Em meio a lutas? Em meio à lutas?
No troca-troca, olho no número: (em meio a combates). Xô, acento grave.
3. Em meio às lutas? Em meio as lutas?
Vamos à troca (em meio aos combates).
Aos exige às: em meio às lutas.
4. O cão é fiel à dona? Fiel a dona?
Com o troca-troca, fiel ao dono. O ao responde: O cão é fiel à dona.
5. Refiro-me à questão da prova? Refiro-me a questão da prova?
No troca-troca: Refiro-me ao debate da prova. O ao impõe à: Refiro-me à questão da prova.
6. Quanto à prova, nada posso informar? Quanto a prova, nada posso informar?
No troca-troca: Quanto ao tema, nada posso informar. Vem, crase! Quanto à prova, nada posso informar
7. Recebe à amiga? Recebe a amiga?
No troca-troca: Recebe o amigo. Sem preposição, só o artigo tem a vez. Xô, crase!Assim: Recebe a amiga
8. Bebê a bordo? Bebê à bordo?
Bordo é nome masculino. O artigo a não tem vez com ele. Sem a, nada de crase: Bebê a bordo.
9. Vale a pena? Ops! Vamos ao troca-troca: Vale o trabalho. Viu? Falta preposição. Sem ela, adeus, grampinho.
Àquele? Àquilo?
1.Luiz se dirigiu àquele vendedor que sorria.
Viu? A gente se dirige a alguém O a exigido pelo verbo se encontra com o a do pronome aquele. É casamento na certa.
2. Em relação àquilo, nada sei. O a da locução em relação a dá de cara com o a de aquilo. Não dá outra. Os trapinhos se juntam.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 19 de abril de 2020
PARA A FRENTE? PARA FRENTE?
Andamos para a frente ou para frente? Vale a comparação: Andamos para os lados. Andamos para a direita. Andamos para a esquerda. Logo, andamos para a frente.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 18 de abril de 2020
PLEONASMO: LIMITE MÁXIMO, PISO MÍNIMO
“Atingimos o limite máximo de ocupação de UTIs em cinco unidades da Federação”, diz a notícia. Viu? Desperdiçou palavras. Limite máximo joga no time de teto máximo e piso mínimo. O adjetivo sobra. O limite é sempre máximo, o teto também. O piso é sempre mínimo. Os adjetivos não têm vez: Atingimos o limite de ocupação de UTIs em cinco unidades da Federação. Com a pandemia, o governo não tem de respeitar o teto de gastos. Categorias profissionais têm diferentes pisos salariais.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 17 de abril de 2020
PRONOMES DE TRATAMENTO EXIGEM VERBO NA 3ª PESSOA: POR QUÊ?
Porque não são pronomes pessoais. Os pessoais são as próprias pessoas. Daí o nome. Eu e nós emitem mensagens (falam ou escrevem). Formam o time das primeironas. Tu e vós recebem as mensagens (escutam ou leem). Compõem a equipe das segundonas. Ele e eles são a mensagem (o assunto). O verbo, vassalo das donas do discurso, concorda com elas em pessoa e número: eu falo, tu falas, ele fala, nós falamos, vós falais, eles falam.
Os pronomes de tratamento pertencem a outra estirpe. Foram inventados pra manter distância das pessoas. A história vem do tempo dos reis que se julgavam deuses. Os súditos não podiam se dirigir a eles. Quem o fizesse perdia a cabeça — na forca ou na guilhotina. Pra manter a vida, os sabidos criaram o jeitinho.
Ao dizer Vossa Majestade, não se dirigiam ao rei, mas à majestade do poderoso. Ao dizer Vossa Excelência, dirigiam-se à excelência real. Ao dizer Vossa Senhoria, dirigiam-se à senhoria coroada. Depois, o cordão dos puxa-sacos se encarregou de bolar mais e mais formas: Vossa Santidade, Vossa Eminência, Vossa Alteza e por aí vai. Ora, se a majestade do rei pede o verbo na 3ª pessoa, e excelência vai atrás. O mesmo ocorre com santidade, eminência, senhoria.
Entendeu a jogada? O pulo do gato é este: fala-se com alguma virtude real, não com a pessoa.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 16 de abril de 2020
INFECTOCONTAGIOSO OU INFECTO-CONTAGIOSO?
A covid-19 joga no time de varíola, pólio, cólera, sarampo & cia. são doenças infectocontagiosas. Assim mesmo: tudo colado.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 15 de abril de 2020
15 DICAS RAPIDINHAS
1
Beneficência e beneficente se escrevem assim — sem tirar nem pôr: Fiz o tratamento na Beneficência Portuguesa. A igreja promove campanhas beneficentes.
2
Afora tem essa cara — tudo coladinho: casa afora, Brasil afora, mundo afora.
3
Sem bobeira, moçada. Extender com x não existe. Só existe estender com s. Logo, a garantia é estendida.
4
Aficionado tem alergia a qualquer dose dupla. O c reina solitário: Sou aficionado por cinema. E você?
5
A fruta pretinha 100% nacional? É a jabuticaba. Jaboticaba? Valha-nos, Deus! Dá indigestão.
6
Você joga um baralhinho? A carta pra lá de cobiçada se chama curinga. Coringa não está com nada. Rouba a sorte. Xô!
7
O lugar onde se bebem umas e outras? É o boteco, preferência dos mineiros. (Não vale buteco.)
8
Olho vivo! Cincoenta não existe. A palavra é cinquenta.
9
Protocolar ou protocolizar? Protocolar, claro. Protocolizar joga no time do cruz-credo. Rua!
10
Exceção se escreve assim — com ç. Ela deriva de excetuar: Toda regra tem exceção? Dizem que a exceção confirma a regra.
11
O adjetivo derivado de Acre? É acriano. Assim mesmo — com i.
12
Quem nasce na Argentina é argentino. Quem vem ao mundo em Buenos Aires, portenho. É como paulista e paulistano. Quem nasce no estado de São Paulo é paulista; na capital, paulistano.
13
Peça um prato à la carte. A expressão é francesa. Daí o acento. Engoli-lo? Valha-nos, Deus! O estômago protesta.
14
Alface é nome feminino e não abre: a alface, a alface americana, alface crespa. Trocar o gênero? A folha não desce. Engasga.
15
Ciclo vicioso? Círculo vicioso? Olho vivo. Ciclo tem fim (ciclo do ouro, ciclo da cana). O círculo não. Nota 10 para círculo vicioso.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 14 de abril de 2020
A PÁSCOA E A LÍNGUA: TERMOS VICÁRIOS
A religião fala em morte vicária. A língua, em termo vicário. Ambos têm dois pontos comuns. O primeiro: a substituição. A morte de Cristo substituiu a dos homens. O termo vicário toma o lugar de outro que foi citado. O segundo: o objetivo nobre. Jesus salvou os homens. O termo vicário evita repetição.
Termos vicários
Generosa, a língua oferece montões de possibilidades para evitar que repitamos palavras. É o caso dos pronomes. Muitos ocupam o lugar de um nome referido. Com eles, evita-se a monotonia. Quer ver?
Muitas pessoas têm triplo expediente. Vale o exemplo de Maria. Ela trabalha das 8h às 18h. Depois, estuda.
João e Rafael estudam na UnB. Este cursa engenharia. Aquele, medicina.
Você viu o coelho por aí? Vi-o escondendo ovos coloridos.
Mais exemplos
Na vida, há pessoas sem caráter. Macunaíma é uma delas. Na língua também há. O campeão da turma é o verbo fazer. Num piscar de olhos, lá está ele no lugar de outro. Vale o exemplo da frase jocosa atribuída a Jânio Quadros. Nela, o bigodudo abusa do vicário:
— Por que o senhor renunciou?, perguntou o repórter.
Fi-lo (renunciei) porque qui-lo (quis renunciar), respondeu o homem da vassourinha.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 13 de abril de 2020
PÁSCOA: DERIVADOS
O substantivo Páscoa sentiu-se solitário. Para formar família, recorreu ao sufixo –al. Com ele, formou os adjetivos pascal e pascoal. As duas letrinhas aparecem em montões de adjetivos. Em todos, têm o mesmo significado. Querem dizer relacionado com, pertinente a.
Pascal e pascoal são relacionados com a Páscoa (festa pascal, Monte Pascoal). Campal, com campo (batalha campal).
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 12 de abril de 2020
PÁSCOA: HISTÓRIA
Páscoa é palavra hebraica. Quer dizer passagem. É tão antiga quanto o rascunho da Bíblia. Bem antes de Moisés vir ao mundo, os pastores nômades comemoravam a Páscoa. Cantavam e dançavam pela chegada da primavera. Na nova estação, a neve se ia. Os campos de cobriam de pastagens. Os alimentos abundavam.
Mais tarde, os judeus começaram a festejar a Páscoa. Lembravam, com sacrifícios, a saída do povo de Israel do Egito. Era a passagem da escravidão para a liberdade. No livro Êxodo, a Bíblia conta toda a história.
Em 325, os cristãos instituíram a Páscoa. Com ela, exaltam a ressurreição de Cristo. Em outras palavras: a passagem da morte para a vida. Para católicos e protestantes, a Páscoa simboliza a morte vicária. Jesus morreu no lugar dos homens. Para salvá-los.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 11 de abril de 2020
14h15 OU 14:15?
Nesta alegre Pindorama, fala-se português. Por isso, a abreviatura de horas não suporta dois pontos (2:15), coisa do inglês. Aqui, a redução segue regras próprias: 2h, 2h15, 2h15min40.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 10 de abril de 2020
SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO: POR QUE LETRAS MAIÚSCULAS?
Use maiúsculas e minúsculas como manda o dicionário. É assim: semana santa, quinta-feira santa, sexta-feira santa, sábado de aleluia escrevem-se com a inicial mixuruca. Páscoa e Sexta-feira da Paixão jogam em outro time. Nomes próprios, grafam-se com a primeira letra pra lá de exibida. Quem pode…pode.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 09 de abril de 2020
ETIMOLOGIA: PRECONCEITO
Preconceito pertence à família de conceito. Nele aparece o prefixo pre. As três letrinhas querem dizer antes de. Pré-escola, por exemplo, é o período que antecede a escola. Prefixo, o elemento que se coloca antes do radical. Preconceito, juízo concebido ou gerado precipitadamente — antes do conhecimento de fatos que podem contestá-lo.
Preconceituosas são tristes criaturas que têm ideias formadas. Para elas, muçulmano é terrorista. Mulher, pessoa de segunda classe. Pobreza, sinônimo de violência. Vamos combinar? O preconceituoso vive num mundinho estreito que só. Sem preconceitos: é ignorante digno de pena.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 08 de abril de 2020
HÍFEN: EGÓLATRA E EGO-HISTERIA
Com as bicadas de Mandetta e Bolsonaro, duas palavra ganharam destaque. Uma: ególatra. A outra: ego-histeria. Elas têm história. De ego nasceu eu. E deu origem a conhecida prole. Egoísta é um de seus membros. Egocêntrico, outro. Ególatra, mais um. Todos têm os dois olhos postos no próprio umbigo. Adorar a si mesmo é tão velho quanto o céu e a Terra. A mitologia grega tem até um deus pra representar a egolatria. É Narciso. O mancebo era o belo entre os belos. As ninfas não resistiam a seus encantos. Batiam o olho nele e caíam de amor. O moço não estava nem aí.
Como lidar com as três letrinhas pra lá de atuais? É fácil. Ego pede hífen quando seguido de h ou o. No mais, é tudo juntinho como unha e carne: ego-histeria, ego-organização, egocêntrico, egolatria, egoidealizado.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 07 de abril de 2020
NA PÁG. 10? À PÁG. 10?
A gente diz “As provas estão insertas na página 10 ou à página 10”? Trata-se de adjunto adverbial de lugar. Na linguagem dos mortais, dá-se a vez à preposição em: Fiz marcas em várias páginas do livro. Preste atenção à nota referida na pág. 8. As provas estão insertas na pág. 10.
É tradição na linguagem jurídica o emprego da preposição a. É tradição, não obrigação: Provas insertas à página 10 do processo. Provas insertas às páginas 10 e 20 do processo. Provas insertas na pág. 10 do processo. Provas insertas nas páginas 10 e 20 do processo.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 06 de abril de 2020
MAIÚSCULAS E MINÚSCULAS: COVID-19 E AIDS
Em tempos de pandemia, as mudanças ocorrem em tempo real. É o caso da covid-19. Quando nasceu, o nome era uma sigla. O c se refere a corona. Vi, a vírus. D, a doença. O numeral indica o ano em que a enfermidade apareceu. A grafia obedecia à regra das siglas. Só a inicial maiúscula, como Detran, Embrapa, Sesi, Senac.
Com o passar dos dias, ela passou a designar a doença. Entrou, então, no time de gripe, câncer, hepatite. Tornou-se substantivo comum. Outra seguiu o mesmo caminho. Quando nasceu, Aids era uma sigla. Hoje dá nome a doença. Escreve-se, por isso, com inicial pequenina — aids.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 05 de abril de 2020
SERGIPE, OU O SERGIPE? GOIÁS, OU O GOIÁS? PERNAMBUCO OU O PERNAMBUCO?
Guarde isto: Goiás, Sergipe e Pernambuco são estados solteirinhos convictos. Não aceitam, nem a pedido dos deuses do Olimpo, aliança no anular esquerdo. Por isso dispensam o artigo. Livres e soltos, circulam sem companhias indesejadas: Goiás fica no Centro-Oeste. Nasci em Goiás. Ele chegou de Goiás. Você conhece Goiás? Quem nasce em Sergipe é sergipano ou sergipense? Sergipe fica no Nordeste. Nasci em Sergipe, mas passei a vida em Goiás. Os holandeses invadiram Pernambuco. Trabalho em Pernambuco. Mudou-se para Pernambuco.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 04 de abril de 2020
SIMPLES DE FAZER? SIMPLES DE SE FAZER?
Ao falar sobre a possibilidade de produzir máscaras domésticas, o ministro disse que “é a coisa mais simples de se fazer”. Viu? Desperdiçou um pronome. Em época de vacas magras, poupar é preciso.
O pequenino se não tem vez com o infinitivo: É a coisa mais simples de fazer (não: de se fazer). Para obter sucesso (não: para se obter). A forma mais exitosa de decorar a tabuada (não: se decorar). Para morar bem (não: se morar bem).
Com verbos pronominais, o pronome é presença obrigatória: Para se aposentar aos 65 anos… A melhor forma de se manter no poder é… Para se formar na universidade, precisa completar os créditos.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 03 de abril de 2020
ABRIL: ETIMOLOGIA
Por que abril se chama abril? Abril se chama abril porque homenageia Vênus. Tem a ver com aprilis — a comemoração sagrada dedicada à deusa do amor e da entrega.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 02 de abril de 2020
DIA DE MENTIRA: POR QUÊ?
A história veio ao mundo no século 16. Naqueles tempos idos e vividos, comemorava-se o ano novo durante uma semana — de 25 de março a 1º de abril. Mas, como quem fica parado é poste, em 1564 veio a mudança. O rei da França Carlos IX instituiu um novo calendário. Resultado: o ano novo passou a ser celebrado em 1º de janeiro.
Sem internet, muitos cidadãos não tomaram conhecimento da decisão real. Continuaram com a data antiga. Os informados passaram a zombar deles. Chamavam-nos de bobos de abril. Não só. Mandavam convites falsos para festas de ano novo e presentes divertidos. Não deu outra. Pregar peças nesse dia bateu asas e voou.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 01 de abril de 2020
A COVID-19? O COVID-19?
Covid é sigla formada de três elementos: corona + vírus + doença. A concordância se faz com doença: doença causada pelo coronavírus. O numeral corresponde ao ano em que a enfermidade apareceu (2019).
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 31 de março de 2020
SORDIDEZ: POR QUE O Z?
Sordidez joga no time de maciez e limpidez. É substantivo abstrato derivado de adjetivo: sórdido (sordidez), macio (maciez, límpido (limpidez), fluido (fluidez), sensato (sensatez), mesquinho (mesquinhez), surdo (surdez), mudo (mudez).
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 30 de março de 2020
RISCO DE VIDA OU RISCO DE MORTE?
David Uip, médico que estava no comando do enfrentamento do coronavírus em São Paulo, se contaminou. Precisou isolar-se. Em entrevista, disse: “Não sou nenhum herói. Tive medo, como todo mundo. Senti que poderia obviamente correr risco de vida”. Leitores ficaram intrigados. Não seria risco de morte? A questão mereceu debates calorosos na seção de cartas. Uns defendiam risco de vida porque subentendiam o verbo perder (risco de perder a vida). Outros interpretavam o que estava escrito. Risco é perigo. Perigo de vida? Que bom! Consultada, a Academia Brasileira de Letras bancou o Salomão. Disse que ambas as formas merecem nota 10. Risco de vida pela tradição. Risco de morte pela lógica. O freguês escolhe.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 29 de março de 2020
AUTRAN DOURADO ENSINOU
“Um autor só é autor no momento em que escreve. Depois, passa a ser um leitor a mais da própria obra.”
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 28 de março de 2020
PROTESTO: A FAVOR OU CONTRA?
Protesto joga em times opostos. Depende da preposição:
Protestos contra = oposição: Protestos contra o Congresso tomaram as ruas.
Protesto por, a favor = clamor: Foram às ruas para participar de protestos a favor do governo.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 27 de março de 2020
GRIPEZINHA COM Z. RESFRIADINHO SEM Z. POR QUÊ?
Guarde isto: o sufixo formador de diminutivos é –inho. Ele pede licença à vogal átona do fim da palavra e se emenda ao radical: casa (casinha), menino (menininho), garota (garotinha), livro (livrinho), gripe (gripinha), resfriado (resfriadinho).
A ponte
O zê, que aparece em -zinho e -zinha, é ilustre convidado. Ele funciona como ponte que liga o radical ao sufixo: café (cafezinho), sofá (sofazinho), caju (cajuzinho), mulher (mulherzinha), jornal (jornalzinho), lâmpada (lampadazinha).
Dois times
Há palavras flexíveis como cintura de político mineiro. Elas jogam nos dois times. É o caso de gripe. Uns dizem gripinha. Outros, gripezinha. É o caso, também, de resfriado. Ora é resfriadinho. Ora resfriadozinho. Também menino (menininho, meninozinho), mesa (mesinha, mesazinha), livro (livrinho, livrozinho).
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 26 de março de 2020
CRÔNICA: O DICIONÁRIO INSPIRA
As mãos.
O dicionário dedica mais de uma página ao verbete mão: ela é a parte final dos nossos membros superiores; ela é a extremidade do membro de um quadrúpede (o mesmo que pata); ela é lance de um jogo de baralho; ela é uma camada de cal, tinta ou verniz; ela é um sentido no trânsito; ela é também auxílio, ajuda — “me dá uma mão”.
Os dedos das mãos não dão conta do número de expressões que têm mão. Mão de vaca é o cara pão duro, mão fechada. Largar de mão é o mesmo que abrir mão de, ou seja, é deixar pra lá. Em primeira mão é ser o primeiro a saber uma notícia. De segunda mão é coisa que já foi usada. E ter mãos de fada significa possuir mãos habilidosas.
Mãos ao alto é um assalto, um assalto à mão armada. Ser uma mão na roda é uma boa e oportuna ajuda. Passar a mão na cabeça significa perdoar. Sair com uma mão na frente e outra atrás é sair sem levar nada. Voltar com as mãos abanando é voltar com as mãos vazias. Pedir a mão (de) é pedir autorização ao sogro para casar com a filha dele.
Dar de mão beijada é entregar muito fácil uma coisa, sem exigência nenhuma. Meter as mãos pelos pés é trapalhada. Já meter a mão em cumbuca é se meter em coisa que vai causar prejuízo ou confusão. Colocar as mãos no fogo é confiar cegamente em alguém. E não ter mãos a medir é fazer algo com bastante empenho e esforço.
Corro eu as mãos, os dedos entre as teclas, e acho citações à mão cheia. Olha lá o Drummond, abrindo os braços: “Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo”. Ali Augusto dos Anjos vem dizendo que o “beijo é a véspera do escarro, a mão que afaga é a mesma que apedreja”.
E por falar em mãos, reconto uma historinha que ouvi no tempo de menino. Em algum lugar vivia um homem que sabia das coisas, não havia pergunta sem resposta. Um dia um menino pegou um pássaro vivo na gaiola, botou na mão e foi lá fazer um desafio ao velho.
Chegou com as mãos para trás e o passarinho em uma delas: “O senhor sabe o que eu trago nas mãos?”. O sábio disse: “Um pássaro”. O menino concordou com a cabeça e fez a pergunta fatal: “Ele tá vivo ou tá morto?” O sábio respondeu sereno: “A vida do pássaro está em suas mãos”.
Era um menino, um sábio, um pássaro, agora é Rosa, João Guimarães Rosa, chegando em seu cavalo, vindo lá do sertão: “Porque eu só preciso de pés livres, de mãos dadas e de olhos bem abertos”. E vem lá de Porto Alegre o Caio Fernando, traz nas mãos morangos mofados: “Espero mãos pesadas, ópio na veia, sol de giz riscado no chão”.
Outro gaúcho aparece, Carpinejar, poeta de pai e mãe: “É aquela vontade danada de andar de mãos dadas durante o dia e de pés dados durante a noite”. Ouço agora Bob Marley: “Se todos dermos as mãos, quem sacará as armas?” Por fim, Shakespeare: “Aquilo que pedimos aos céus na maioria das vezes se encontra em nossas mãos”.
Pois é, o que pedimos aos céus pode estar em nossas mãos, mas vamos com calma, excepcionalmente nestes tempos, neste ano sem graça de dois mil e vinte, nestas águas de março fechando o verão, nesses dias de abril, esse abril que nem chegou ainda e já é despedaçado, porque, nestes tempos, amigo, tudo o que precisamos é deixar as suas mãos separadas das minhas.
Calma, é só um tempo, dois meses, três talvez, pouco menos, pouco mais. De modo que vai ser uma noite, uma longa noite de espera, noite de travessia, de paciência, entanto nós vamos travessar; depois vem o alvor da manhã, os fios de sol tecidos, o canto dos galos tecendo uma nova manhã. E aí sim: olhos abertos, pés livres, mãos dadas.
(Marcelo Torres > marcelocronista@gmail.com)
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 25 de março de 2020
BRIGA ENTRE MIM E MANDETTA? BRIGA ENTRE EU E MANDETTA?
Bolsonaro dava entrevista. Estava tenso. Num momento de descontração, resolveu brincar. Disse que a imprensa inventa brigas “entre eu e o Moro, entre eu e o Mandetta”. A Neusa ouviu. Duvidou dos próprios ouvidos. Mais tarde, assistiu à reprise da fala. Era verdade. “Xô! Xô! Xô”, gritou ela.
Explica-se a reação. A moça aprendeu na escola que o pronome eu não tem vez quando antecedido de preposição. Ora, entre é preposição. Dá passagem ao pronome mim. Veja exemplos variados: Gosta de mim. Trabalha para mim. Falou sobre mim. Inventa brigas entre mim e o Moro, entre mim e o Mandetta.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 24 de março de 2020
ENTREGA EM DOMICÍLIO? ENTREGA A DOMICÍLIO?
“Com mais movimento, supermercados apostam na entrega em domicílio”, escreveu o site do Estadão. Certo? Certíssimo. As entregas são feitas em escolas, em hospitais, em supermercados e, claro, em domicílio.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 23 de março de 2020
HISTÓRIA CHINESA: ISTO TAMBÉM PASSA
São tempos de guerra. O coronavírus ataca com a rapidez do raio. Recolhimento é a ordem. Netos ficam longe dos avós. Escolas, cinemas, teatros mantêm as portas fechadas. A praia tem de ser esquecida. O trabalho é feito a distância. Ufa! Desesperar-se? Nem pensar. Vale a historinha que vem da China.
Um monge educou muitos jovens. Velhinho, despedia-se do derradeiro discípulo que lhe pediu:
— Mestre, me dê um último conselho.
Sem pressa, o mestre pegou um pedaço de papel, escreveu uma frase e o entregou ao rapaz:
— Só a leia quando estiver num momento extremo, sem saída.
Passaram-se anos. O homem, já maduro, se perdeu num safári. No meio do descampado, tinha à frente um abismo. Dos demais lados, feras o perseguiam. Lembrou-se então da mensagem do mestre. Abriu-a. Lá estava escrito com letra cuidadosa: “Isto também passa”.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 22 de março de 2020
TRADUÇÃO: TO PLAY
O leitor João Moreira Coelho escreve: “O modismo parece ter-se originado na área diplomática. Trata-se de tradução equivocada do verbo to play. Em inglês, to play tem vários significados:
The children are playing. = As crianças estão brincando.
She plays the piano. = Ela toca piano.
They play basket ball. = Eles jogam basquete.
Brazil plays an important role in the world economy. = O Brasil desempenha (melhor ainda, tem) papel importante na economia mundial.
Mas os diplomatas dizem que “o Brasil joga um papel importante na economia mundial”. O Brasil não joga papel nenhum. Papel joga-se no lixo. Tampouco “Fernanda Montenegro joga papel central na nova peça”. A tradução equivocada cheira a esnobismo caipira.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 21 de março de 2020
ESTUDO A DISTÂNCIA? ESTUDO À DISTÂNCIA?
O novo coronavírus trouxe ao cartaz a locução a distância. Com o distanciamento social, o ensino passou a ser a distância. O trabalho também. Por isso convém lembrar as manhas da duplinha. Pra lá de especial, ela só ganha o acentinho indicador da crase quando a distância for determinada. Compare: Viu Luciana a distância. Viu Luciana à distância de uns 200m. A escola oferece ensino a distância. Com a crise, estou trabalhando a distância. Autoridades sanitárias recomendam: fique à distância de 1 metro.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 20 de março de 2020
PANELAÇO & CA.: SIGNIFICADO
É panelaço a favor. Panelaço contra. Enquanto os extremos se manifestam, vale uma diquinha de português. Qual o significado do sufixo –aço? Ele é aumentativo. A gente o usa a torto e a direito. Valem exemplos: jogaço, animalaço, ricaço, carteiraço, golaço. E por aí vai.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 19 de março de 2020
RECIFE OU O RECIFE? TANTO FAZ!
Férias viraram pesadelo. Um passageiro estava com coronavírus. O navio que transportava turistas pelo litoral brasileiro ficou retido no porto … de Recife ou do Recife? A gramática abona ambas as formas. Mas, se você estiver na charmosa cidade de Manuel Bandeira, João Cabral, José Paulo Cavalcanti & cia. talentosa, diga o Recife. O artigo acaricia os ouvidos de adultos e crianças. Oba!
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 18 de março de 2020
FRONTEIRA, DIVISA OU LIMITE?
“O Brasil fechará parcialmente as fronteiras”, disse Jair Bolsonaro. Acertou. O coronavírus trouxe ao noticiário questão de propriedade vocabular. Qual a palavra adequada para nomear a linha que separa os dois países? Alguns falam em fronteira. Outros, divisa. Limite também aparece. Os três substantivos separam, mas entes diferentes. Guarde isto: Fronteira separa países. Divisa separa estados. Limite separa cidades.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 17 de março de 2020
FACE A FACE: COM CRASE OU SEM CRASE?
Hoje estreia a CNN Brasil. Uma das atrações é o programa comandado por William Waak. Chama-se Face a Face. A questão: com crase ou sem crase? Palavras repetidas têm alergia ao acento grave. Não aceitam o sinalzinho nem a pedido dos deuses: face a face, cara a cara, semana a semana, frente a frente, uma a uma, gota a gota.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 16 de março de 2020
ÁLCOOL GEL OU ÁLCOOL EM GEL?
Dizemos sabão líquido, sabão em pó ou sabão em barra. Também dizemos guaraná em pó e guaraná em comprimidos. A forma vale para álcool: álcool líquido e álcool em gel.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 15 de março de 2020
TESTOU POSITIVO? TESTOU NEGATIVO? NÃOOOOOOOOO!
Em época de coronavírus, fake news fazem a festa. Não só. Fake língua também. É o caso de “testar positivo” e “testar negativo”. A pessoa não testa. É submetida a teste. Em bom português, o teste dá positivo ou dá negativo: O teste de Bolsonaro deu negativo. O teste de Maria deu positivo.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 14 de março de 2020
PLURAL: PAUTA-BOMBA & CIA.
“Desgraça pouca é bobagem”, diz o povo sabido. O Congresso lhe dá razão. Num geste de irresponsabilidade, Suas Excelências aprovaram aumento de despesa de R$ 20 bilhões por ano. “É pauta-bomba”, disse o ministro. “Virão outras”, responderam deputados e senadores. Pintou, então a questão. Qual o plural de pauta-bomba? A duplinha joga em dois times. Um: pautas-bomba. O outro: pautas-bombas.
Por falar em dois times…
Outros substantivos jogam no time de pauta-bomba. É o caso de carta-bomba (cartas-bomba e cartas-bombas), carro-bomba (carros-bomba, carros-bombas), carro-chefe (carros-chefe, carros-chefes), carro-forte (carros-forte e carros-fortes), carro-guincho (carros-guincho, carros-guinchos), carro-leito (carros-leito, carros-leitos), carro-pipa (carros-pipa, carros-pipas).
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 13 de março de 2020
PLEONASMO: SAFRA AGRÍCOLA
“Safra agrícola de 2020 deve bater recorde e chegar a 246,7 milhões de toneladas”, escreveu o jornal. Baita pleonasmo. Em época de vacas magras, desperdiçar é proibido. Toda safra é agrícola. Basta safra. Se quiser especificar, diga o produto: safra de soja, safra de arroz, safra de feijão, safra de grãos.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 12 de março de 2020
CORRIMÃOS OU CORRIMÕES?
O Houaiss registra os dois plurais – corrimão e corrimões. Portanto, ambas as formas estão corretas. Mas… a língua é como a mulher de César. Não era suficiente a primeira-dama de Roma ser honesta. Ela tinha de parecer honesta. Mudando o que deve ser mudado, dizemos que a língua não só tem de ser correta. Tem de parecer correta. Neste país tropical, corrimões está certo, mas parece errado.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 11 de março de 2020
REGÊNCIA: IMPLICAR
“A redução do crescimento chinês implica em forte desaceleração geral”, escreveu o colunista. Ele se esqueceu de pormenor pra lá de importante. Implicar implica e complica. Tem três regências:
1.No sentido de produzir como consequência, é transitivo direto. Não pede preposição: Guerra implica aumento da corrida armamentista. A mudança do ministro implicou alteração da equipe. A redução do crescimento chinês implica forte desaceleração geral.
2.Na acepção de envolver, comprometer, é transitivo direto e indireto: O delator implicou o deputado no escândalo. A empresária paraguaia implicou Ronaldinho na falsificação do passaporte.
3.No sentido de ter implicância, é transitivo indireto. Pede a preposição com: O professor implicou com o novato no primeiro encontro. O estagiário implica com os colegas. É natural que irmãos impliquem um com o outro.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 10 de março de 2020
MUSSE E ALFACE: GÊNERO
Feminino ou masculino? Há palavras que têm o gênero bem definido. Mas nem todos o conhecem. Na dúvida, chutam. Têm 50% de possibilidade de acertar e 50% de cair numa esparrela. Em geral, a Lei de Murphy pede passagem. O que pode dar errado dá.
Pra não dar chance ao azar, guarde esta dica. Ela se refere a duas delícias. Alface e musse são femininas sim, senhores — a alface e a musse. Mudar-lhes o gênero tem consequência. É indigestão.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 09 de março de 2020
MULHEREZINHAS OU MULHERZINHAS?
Mulher tem plural. É mulheres. Tem diminutivo. É mulherzinha. E tem requintes. É o plural do diminutivo. Pra chegar a ele, temos de vencer três etapas. Uma: pôr o nome no plural. A outra: apagar o s. A última: acrescentar o sufixo – zinhas. Assim:
mulher — mulhere(s) — mulherezinhas
Mesmo requinte
O requinte contagia outros diminutivos. Além das palavras terminadas em r como mulher, entram na roda os terminados em l, ão, m :
colher — colhere(s) — colherezinhas
flor — flore(s) — florezinhas
botão — botõe(s) — botõezinhos
animal — animai(s) — animaizinhos
pão — pãe(s) — pãezinhos
professor — professore(s) — professorezinhos
papel — papéi(s) — papeizinhos
homem — homen(s) — homenzinhos
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 08 de março de 2020
ENTRE MIM E DEUS. POR QUE MIM VEM NA FRENTE?
As pessoas do discurso são três. A primeira fala (eu, nós). A segunda escuta (tu, vós, você). A terceira serve de assunto (ele, ela). Qual a mais importante? A primeira.
Por isso o mim, pronome de 1ª pessoa, tem prioridade sobre as demais pessoas: acordo firmado entre mim e Deus, acordo firmado entre mim e ti, acordo firmado entre mim e eles, acordo firmado entre mim, ti e eles.
Antigamente, os professores diziam “o burrinho vai sempre na frente”. Jeito deles de ajudar na fixação da prioridade das pessoas.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 07 de março de 2020
ESCREVER: PAPEL DO LEITOR
Escrever é verbo transitivo. Escreve-se para o leitor. O desafio: atrair a atenção da criatura mais importante do processo. Se ela se interessar pelo texto, viva! O esforço de organizar palavras em frases, frases em parágrafos, parágrafos em narrações, descrições ou dissertações alcança o objetivo. Caso contrário, o autor fracassa. O verbo muda a regência. Vira intransitivo.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 06 de março de 2020
HISTÓRIA E NARRATIVA: DIFERENÇA
De algum tempo a esta parte a palavra “narrativa” entrou na moda. A impressão que fica é a de que não existem mais fatos, apenas narrativas, ou seja versões, todas igualmente válidas. As pessoas sempre nos perguntam se isto faz sentido para nós, historiadores.
A verdade é que os próprios historiadores, em muitas ocasiões, resolvem recontar o acontecido. Então, como é que fica? Afinal, se uma coisa aconteceu, já faz algum tempo, e se já foi devidamente registrada e “contada”, qual o sentido de ser retomada por uma nova narrativa?
O historiador deve explicar que vários fatores nos permitem e até determinam uma nova visão. Pode ocorrer que novos registros sobre os acontecimentos foram encontrados, registros escritos ou mesmo arqueológicos, por exemplo. Se novas escavações comprovam a existência de uma civilização em uma região até há pouco inexplorada, temos que recontar a história da região. Se um novo documento esclarece a atuação de um papa com relação ao nazismo, a história precisa ser recontada.
Além disso, é importante ressaltar que História não é simplesmente aquilo que aconteceu, mas a maneira pela qual nós nos apossamos, incorporamos e registramos o acontecido. Esse registro varia também em função de nossas preocupações atuais. Por exemplo, o processo de empoderamento das mulheres faz com que passemos a olhar o acontecido também sob uma ótica feminista e isto muda nossa perspectiva sobre o mesmo fato, antes narrado sem considerar essa ótica.
É importante notar que não estamos falando de mudar o passado a partir de nossa vontade atual. O nazismo, por exemplo, não teve vergonha alguma de inventar uma inexistente raça ariana para justificar sua política racista. Esse olhar presentista é uma deturpação da História, pois implica em reinventá-la, o que é puro exercício de ficção. Já ter uma perspectiva atual, ser perspectivista, é outra coisa.
Há questões na História francamente favoráveis a um olhar mitificado. Guerras, por exemplo. Não por acaso costuma-se dizer que a primeira vítima das guerras é a verdade. Às vezes cria-se um mito assim que o fato bélico ocorreu. Às vezes faz-se isso depois, por diversos motivos. A União Soviética, que durante alguns anos, foi aliada das potências ocidentais contra a Alemanha e o Japão, logo se tornou a grande inimiga. Nas narrativas ocidentais a enorme importância dos países comunistas na derrota dos nazistas acabou sendo flagrantemente subestimada. Mitos servem para isso.
Talvez melhor do que teorizar, seja exemplificar. Um livro recentemente publicado na França (e agora traduzido no Brasil) mostra como os mitos de guerra surgem e são usados. Podemos aprender algumas coisas com essa obra chamada, não por acaso, Os mitos da Segunda Guerra Mundial.
O livro ensina muito. É uma excelente aula sobre temas da guerra que remodelou o mundo, a partir de informações fidedignas e documentos devidamente checados. Também é uma bela aula sobre os chamados “usos da História” (como nações e grupos tentam moldar a narrativa histórica de acordo com seus interesses) e o papel do historiador (como alguém que busca desconstruir mitos e tem um duplo compromisso, com o fato/o acontecido e com as questões do tempo presente). Utiliza documentos variados, como jornais, revistas, sites, filmes, relatórios militares, diários, memórias, memorandos secretos, depoimentos, julgamentos de criminosos de guerra, material diplomático, propagandas, estatísticas, dados técnicos a respeito de armas, táticas e estratégias.
Os 14 capítulos desvelam mitos. Mais do que isso, mostram como, quando eles foram construídos e por que se perpetuaram (quais os interesses que fazem com que se mantenham vivos na memória coletiva até hoje). Assim, ficamos sabendo que a ideia de que Hitler se antecipou a um ataque de Stalin ao invadir a União Soviética é apenas uma tese revisionista alimentada bem depois do Julgamento de Nuremberg. Pearl Harbor, uma vitória japonesa é uma falácia perpetuada tanto pelos americanos (por conta da percepção dos contemporâneos surpreendidos pelo ataque) quanto pelos japoneses (para justificar a continuidade de uma luta que desde cedo seus governantes sabiam perdida). Esses são apenas alguns dos exemplos da vasta gama de assuntos tratada no livro, que vão de bombardeios aéreos ao papel das mulheres, dos camicases aos carismáticos discursos de Churchill.
Seria bom que políticos, cientistas sociais e jornalistas, em vez de continuar dando versões e narrativas desencontradas e inconsequentes, lessem bons livros que os fizessem entender melhor o sentido da releitura da História.
(Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky)
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 05 de março de 2020
NÓS OU A GENTE?
Depende. A gente é a língua informal, descontraída, próxima do falar quotidiano. Monteiro Lobato a chamava de “língua de bermuda e chinelo”. O Aurélio registra a duplinha sem restrições. Cita como exemplo versos do poeta Augusto dos Anjos, que viveu de 1885 a 1914:
De Jesus Cristo resta unicamente
Um esqueleto; e a gente vendo-o, a gente
Sente vontade de abraçar-lhe os ossos.
Provérbio africano diz: “A gente nasce com um montão de palavras na barriga. Na vida, vai gastando o estoque. Quando todas acabam, a gente morre”.
Há quem prefira o pronome nós. A língua é um sistema de possibilidades. Nosso desafio: escolher a mais adequada para o contexto.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 04 de março de 2020
TER DE DIZER? TER QUE DIZER?
As duas formas merecem nota 1000. Você escolhe. A alternativa é acertar ou acertar: Tenho de estudar pra me sair bem na prova. Tenho que estudar pra me sair bem na prova.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 03 de março de 2020
CATORZE OU QUATORZE?
Catorze alterna com quatorze. Mas cinquenta é único. Xô, cincoenta!
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 02 de março de 2020
ETIMOLOGIA: MARÇO
Abram-lhe alas. O deus da guerra vai passar. Ele se chama Marte. Forte, valente e mau, está sempre preparado pra luta. Dia e noite usa armadura e capacete. Na mão esquerda carrega um escudo. Na direita, uma espada.
Onde há guerra, lá está ele. Aparece de surpresa, num carro puxado por quatro cavalos. No campo de batalha, não deixa por menos. Fica no meio dos soldados e luta com vontade. Todos morrem de medo dele.
Em homenagem a Marte, o planeta Marte se chama Marte. O homem verdinho que nasce lá é marciano. O terceiro mês do ano recebe o nome de março. Judô, caratê e aiquidô são lutas marciais.
Sabe por quê? Há muiiiiiiiiitos anos, os guerreiros japoneses e chineses não tinham armas. Para atacar ou se defender, usavam o próprio corpo. Aprendiam, então, as lutas da guerra. São as lutas marciais.
Nome de gente
Você se chama Márcio ou Márcia? Pois o nome pertence à família de Marte, marciano e marcial. São todos guerreiros.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 01 de março de 2020
DESCRIMINAR E DISCRIMINAR: DIFERENÇA
Descriminar é inocentar. A palavra vem de crime. O prefixo des- dá ideia de negação. É o mesmo que aparece em desobedecer: Gabeira luta para descriminar o uso da maconha. Ele luta pela descriminação da ervinha.
Discriminar é distinguir, tratar de maneira diferente: A Constituição diz que discriminar mulher é crime. Há possibilidade de demissão nos casos de discriminação racial.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 29 de fevereiro de 2020
DAR À LUZ UMA MENINA? DAR À LUZ A UMA MENINA?
“Mãe de Isabella Nardoni dá à luz uma menina”, escreveu o site do Correio Braziliense. Certo? Certo. Dar à luz significa trazer para a luz (mulher traz menina para a luz, para o mundo). Nada do a antes da criaturinha: Maria deu à luz uma menina. Adolescente dá à luz criança prematura. Teresa deu à luz menino de quase quatro quilos.Carla deu à luz gêmeos.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 28 de fevereiro de 2020
A QUARESMA E A LÍNGUA
As letras têm a própria quaresma. Como os religiosos, submetem-se a sacrifícios. As ortodoxas chegam ao extremo. Emudecem. Escrevem-se, mas não se pronunciam. Chamam-se dígrafos. O nome diz tudo. São duas letras, mas um som. Velha, por exemplo, tem cinco letras. Mas quatro fonemas (sons). O lh tem companheiros: ch (chefe), nh (tamanho), sc (consciente), sç (nasça), xc (exceto), rr (acarretar), ss (processo), qu (fraqueza), gu (alguém).
Rebelião
Na língua como na vida, há os dissidentes. “Xô, fundamentalismo”, dizem eles. “Nós queremos falar.” Resultado: nem sempre qu, gu, sc, xc formam dígrafos. O grupo, então, se dissolve. Antes da reforma ortográfica, as rebeldes qu e gu eram indicadas pelo trema. Os dois pontinhos davam um recado: ali estava uma heterodoxa. Por isso o u deve ser pronunciado. O sinal se foi. Mas a insubordinação se mantém. Em frequente, tranquilo, lingueta e linguiça, o número de letras corresponde ao de fonemas.
Mesma escola
O mesmo ocorre com pescar, excluir & cia. insubmissa. Para elas, impera a lei do jogo do bicho. Vale o que está escrito. Os grupos sc e xc deixam de ser dígrafos. Entram na regra geral — um fonema, uma letra. Em suma: ortodoxas e heterodoxas não constituem problema só da língua. A opção delas interfere na pronúncia e na separação silábica. Sobra pra nós.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 27 de fevereiro de 2020
AS MÁSCARA E AS VOGAIS
No carnaval, fantasias pedem passagem. Com elas, máscaras fazem a festa. Invadem as ruas e exibem caras famosas ou sonhadas. Mulheres viram homens. Homens, mulheres. Meninos ganham os poderes do Super-Homem, a destreza do Homem Aranha ou a graça do Mickey. Meninas, a força da Pucca, a capacidade das Superpoderosas ou os malabarismos da Hannah Montana. Gente comum se transforma em celebridade. Anônimos invisíveis se tornam foco de mil olhares.
Travestir-se não constitui privilégio humano. Máscaras fazem parte do mundo das letras. As 26 criaturas do alfabeto não são 26. Graças aos disfarces, viram multidão. Ora aparecem manuscritas. Ora impressas. Ora cursivas. Ora por extenso. Ora maiúsculas. Ora minúsculas. Ora com acento. Ora livres e soltas. Ora representam um som. Ora outro ou outros. Em suma: as letras têm o dom da multiplicação.
O português tem cinco vogais (a, e, i, o u). Mas, com os recursos da camuflagem, a meia dezena vira uma dúzia. O a, por exemplo, soa oral (casa), soa nasal (irmã), soa aberto (sofá), soa reduzido (folha). O e não fica atrás. Ora se escuta oral (belo), ora nasal (bem), ora aberto (café), ora fechado (você), ora reduzido (bate).
A versatilidade do quinteto enriquece a língua. O português é foneticamente muito mais rico que o espanhol. O idioma de Cervantes tem cinco vogais. Avessas a disfarces, as duronas soam cinco. Resultado: nós entendemos melhor o espanhol do que eles o português. Hispanofalantes não conseguem distinguir vovó de vovô. Sem ter sons abertos, eles só escutam os fechados. Pra nossos vizinhos, vovô e vovó são vovô. Entenda quem quiser. Ou puder.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 26 de fevereiro de 2020
AS MÁSCARAS E AS CONSOANTES
Consoantes têm várias leis. Uma delas: quanto mais confusão melhor. Pra obedecer à determinação tão divertida, nada mais adequado que usar e abusar das máscaras. Com elas, uma letra multiplica os sons. E, claro, dá nó nos miolos dos pobres mortais. Vale o exemplo do x. A danadinha adora trocar os disfarces. Em certas palavras, pronuncia-se ch (enxoval). Em outras, z (exame). Em outras, ainda, s (excelência). Chega? Não. Há os casos em que a gloriosa soa ks (táxi). Ufa!
O s, então, abusa. Salta de galho em galho com tal destreza que faz inveja a Tarzã. No começo da palavra, soa cê (sala). Entre duas vogais, z (pesquisa). É aí que a porca torce o rabo. Caprichoso, o versátil quer manter a originalidade entre duas vogais. Impossível? Ele dá um jeito. Apresenta-se em dose dupla (massa). Mantém a originalidade também quando aparece entre vogal e consoante (cansar). Ops! Em trânsito, ele se exibe entre n e i. Mas soa z. Quem entende? Calma. É carnaval.
Uma ilustre senhora tem fascínio por fantasias, máscaras e badulaques. Quem é? É a letra c. Seguida de a, o e u, soa k (casa, coisa, cuia). Seguida de e e i, pronuncia-se cê (cedo, cidade). Partidário do s, o c teima em soar cê quando seguido de a, o, u. Recorre, então, à marca que faz o Brasil Brasil. Dá um jeito. Calça um sapatinho e ganha a parada (calçado, aço, açude).
Moral da história
Mário Quintana disse que a mentira é a verdade que se esqueceu de acontecer. No carnaval das letras, a mentira acontece.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 25 de fevereiro de 2020
SAMBA-ENREDO: HISTÓRIA E PLURAL
No começo não havia samba-enredo. Valia o samba mais cantado nos ensaios de quadra. Em 1932, o jornal Mundo Esportivo, dirigido por Mário Filho, irmão de Nelson Rodrigues, organizou o primeiro torneio de escolas de samba. A Mangueira venceu. No ano seguinte, O Globo assumiu a festa, e a Mangueira levantou o bicampeonato.
Mas o destaque foi o samba da Unidos da Tijuca, coerente com o enredo, por isso mesmo apontado como o primeiro samba-enredo da história. Só 16 anos depois, foi gravado o primeiro samba-enredo: “Exaltação a Tiradentes”, de Mano Décio da Viola, Fernando Barbosa Júnior, Estanislau Silva e Penteado.
Samba-enredo joga no time de samba-canção, samba-choro, samba-exaltação & cia. Os membros da equipe têm um denominador comum — aceitam dois plurais: sambas-enredos, sambas-enredo, sambas-canções, sambas-canção, sambas-choros, sambas-choro, sambas-exaltações, sambas-exaltação.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 24 de fevereiro de 2020
FILHOTES DO CARNAVAL
O carnaval deitou e rolou nesta terra mestiça. Deu filhotes. Dele nasceu carnavalesco. O sufixo –esco é velho conhecido nosso. Aparece em adjetivos. Mas não qualquer adjetivo. Só nos derivados de substantivos. Quer dizer semelhante, parecido. Carnavalesco é semelhante a carnaval. Dantesco, a Dante. Burlesco, a burla (zombaria). Momesco, a momo.
A família cresceu. Veio o neto — o advérbio carnavalescamente. Reparou? Ele é filho do adjetivo (carnavalesco). Cuidado ao usá-lo. Dizer que uma pessoa se comporta carnavalescamente às vezes ofende. O recado é este: você age como se estivesse no carnaval. Parece palhaço.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 23 de fevereiro de 2020
CARNAVAL E SATURNAIS ROMANAS
Carnaval é sinônimo de alegria, descontração, irreverência. Blocos, escolas e foliões aproveitam os dias de momo pra exercitar a liberdade. De certa forma, retomam o tempo das saturnais romanas. Era um período alegre.
Os servidores públicos entravam em recesso. Os tribunais fechavam as portas. Nenhum criminoso podia ser punido. Libertavam-se os escravos para assistir aos festejos. As famílias ofereciam banquetes.
Durante as celebrações, invertiam-se as posições sociais. Os escravos davam ordens aos senhores. Os senhores lhes serviam iguarias à mesa. Todos se mascaravam para ficar mais à vontade. Há quem diga que as máscaras nasceram aí. No Brasil, reservam-se quatro dias no calendário pra brincar — com disfarces ou sem disfarces.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 22 de fevereiro de 2020
O CARNAVAL E A IGREJA
Carnaval é coisa séria. Tão séria que a Igreja o controla. É a Santa Sé que manda na festa. Começa pelo calendário e chega ao nome. Ela diz: “O momo só pode reinar 40 dias antes da quaresma. Vai do Dia de Reis (6 de janeiro) à quarta-feira de cinzas. Depois disso, o mundo se veste de roxo”.
Cadê autonomia?
A quarta-feira de cinzas depende da Páscoa. A ressurreição de Cristo se comemora no primeiro domingo depois do primeiro domingo de Lua cheia de março. Em que dia cai? Varia. Depende dos caprichos do satélite da Terra.
O batismo
A Igreja foi além do calendário. Interferiu no nome. Carnaval vem de carne. Significa dias em que a carne é liberada. Opõe-se à quaresma, período de abstinência. Como festa pagã, escreve-se com inicial minúscula.
Antes de chegar a esta alegre Pindorama, a palavrinha bateu pernas. Desembarcou aqui por via do italiano carnevale. Mas seu berço é o latim. Na língua dos Césares, significava “adeus à carne”.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 21 de fevereiro de 2020
MEGARROUBOS: POR QUE RR?
“DNA e digitais ligam bandidos envolvidos em megarroubos milionários”, escreveu o site do Estadão. Leitores ficaram com a pulga atrás da orelha. Por que rr? Por questão de pronúncia. Com um r, a pronúncia muda. Compare caro e carro. A dobradinha tem uma única função — respeitar o jeitinho de dizer.
A mesma regra vale para o ss: minissaia, multissistema, macrossolução.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 20 de fevereiro de 2020
O ACENTO FAZ A DIFERENÇA
Um poeta escreveu “Entre doidos e doídos, prefiro não acentuar.
Às vezes, não acentuar parece mesmo a solução.
Eu, por exemplo, prefiro a carne ao carnê.
Assim como, obviamente, prefiro o coco ao cocô.
No entanto, nem sempre a ausência do acento é favorável…
Pense no cágado, por exemplo, o ser vivo mais afetado quando alguém pensa que o acento é mera decoração.
E há outros casos, claro.
Eu não me medico; eu vou ao médico.
Quem baba não é a babá.
Você precisa ir à secretaria para falar com a secretária.
Será que a romã é de Roma?
E você, prefere ser uma pessoa vívida ou vivida?
Seus pais vêm do mesmo país?
Seria maio o mês mais apropriado para colocar um maiô?
Quem sabe mais entre a sábia e o sabiá?
O que tem a pele do Pelé?
O que há em comum entre o camelo e o camelô?
O que será que a fábrica fabrica?
E tudo que se musica vira música?
Será melhor lidar com as adversidades da conjunção mas ou com as más pessoas?
Será que tudo que eu valido se torna válido?
Melhor doidos que doídos?
E entre o amem e o amém, que tal os dois?
Na dúvida, com um pouquinho de contexto, garanto que o público entenda aquilo que publico.
E paro por aqui, pois esta lista já está longa.
[Carol Pereira]
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 19 de fevereiro de 2020
HÍFEN: PRÉ-CARNAVAL & CIA
O pré-carnaval está a toda. Blocos fazem a festa nas ruas. O samba no pé impera. A alegria, além da festa, trouxe às manchetes o prefixo pré-. A questão: quando usá-lo com hífen? A resposta é meio tucana. Em geral, o trio exige o tracinho, sobretudo quando a pronúncia aberta se torna bem clara. É o caso de pré-escola, pré-vestibular, pré-estreia, pré-datado, pré-escolar, pré-diluviano, pré-história, pré-encolhido, pré-natal, pré-primário, pré-operatório, pré-santificado, pré-universitário.
O prefixo tem muitas exceções. Eis algumas: preanunciação, preaquecer, precogitar, precondição, predefinido, predelineado, predeterminado, predisposto, preestabelecido, preexistente, prefigurado, prefixado, pregustado.
Superdica
Com hífen? Sem hífen? Na dúvida, consulte o dicionário.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 18 de fevereiro de 2020
CURIOSIDADE: FLAMENGO - ETIMOLOGIA
Viva! O Flamengo é campeão da Supercopa do Brasil. Na partida decisiva disputada em Brasília, o clube goleou o Athlético Paranaense (3 x 0). “Campeão! Campeão! Campeão!”, gritava a torcida. Passado o alarido da festa, vale a curiosidade etimológica.
A palavra campeão nasceu na Alemanha. Quando usava fraldas, tinha significado muito especial. Designava o cavaleiro medieval que combatia em campo fechado em defesa de uma causa. Não raro a causa era uma mulher. Naquele tempo, o apaixonado matava. Não a amada. Mas o rival. Depois, campeão alargou o sentido. Passou a dar nome aos vencedores de competições esportivas.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 17 de fevereiro de 2020
NOITE: CURIOSIDADE
Em muitos idiomas europeus, a palavra noite é formada pela letra “n” acrescida a seguir com o número 8 na respectiva língua. O n é o símbolo matemático de infinito, e o 8 deitado também simboliza infinito.
Assim, em todas as línguas, noite significa a união do infinito. Vamos lhe dar uns exemplos. Procure em outros idiomas:
português: noite = n + oito
inglês: night = n + eight
alemão: nacht = n + acht
espanol: noche = n + ocho
francês: nuit = n + huit
italiano: notte = n + otto
Interessante, não?
(Colaboração da seguidora Janete.)
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 16 de fevereiro de 2020
PLURAL: BATE-BOCA & CIA.
Bate-boca na Câmara. Sérgio Moro foi à comissão especial que trata da prisão em segunda instância. O deputado Glauber Braga pediu a palavra. Chamou o ministro de “capanga da família Bolsonaro”. O presidente Marcelo Ramos interveio. Disse que não admitia o uso do adjetivo capanga no recinto. Ops! Pior a emenda que o soneto. Capanga é substantivo.
Novo capítulo
A discussão correu solta. Os deputados se dividiram em dois grupos. Um atacava. O outro defendia. Agressões faziam a festa. Em meio a tanto tumulto, abriu-se espaço para uma diquinha de português. Bate-boca joga no time de arranha-céu, guarda-roupa, beija-flor, vira-lata. Só o segundo membro da composição se flexiona: bate-bocas, arranha-céus, guarda-roupas, beija-flores, vira-latas.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 15 de fevereiro de 2020
ESTADA OU ESTADIA?
A Folha anunciou que Paulo Guedes recebe mais de R$ 8 mil para pagar moradia e comida na capital da República. Em resposta, a assessoria disse que “o valor é inferior aos gastos do ministro em sua estadia em Brasília”. Ao ler a frase, pintou a questão: estada ou estadia? Prefira:
1. estada para designar a permanência de pessoa em algum lugar: Minha estada em Nova York será de 10 dias. Quantos meses durará sua estada em Porto Alegre? A assessoria diz que o valor é inferior aos gastos do ministro em sua estada em Brasília.
2. estadia para designar permanência de navio no porto, avião em aeroporto ou veículos automotores em garagem ou estacionamento: A estadia dos navios no porto de Santos custa caro. A pane obrigou a estadia do avião no aeroporto por dois dias. Mesmo pagando estadia, é difícil conseguir vaga nos estacionamentos de Brasília.
Mulher de César
Muitos, como a Folha, escrevem estadia no lugar de estada. Certo? Errado? O Aurélio abona a forma, mas diz que é emprego criticado. Vale lembrar: a língua é como a mulher de César. A primeira-dama do Império Romano não tinha só de ser honesta, tinha de parecer honesta. A língua não tem de ser só correta. Tem de parecer correta. Melhor manter a tradição. Estada para pessoas. Estadia para navio, avião, carro.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 14 de fevereiro de 2020
PLURAL: TROCA-TROCA & CIA
Dança das cadeiras no Planalto. Bolsonaro promove troca-troca de ministros. Rogério Marinho deixa a Previdência. Assume o Desenvolvimento Regional. Gustavo Canuto deixa o Desenvolvimento Regional. Assume a Dataprev. Onix Lorenzoni deixa a Casa civil. Assume a Cidadania. Osmar Terra deixa o Cidadania. Fica no ora veja. Faz companhia aos 12 milhões de desempregados desta alegre Pindorama.
No muda-muda, pinta a questão. Qual o plural da duplinha formada por palavras repetidas? Só o segundo elemento se flexiona. Assim: troca-trocas, tico-ticos, reco-recos, quero-queros, quebra-quebras, muda-mudas.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 13 de fevereiro de 2020
QUADRUPLICAR OU QUADRIPLICAR?
“Brasil vai quadriplicar a fonte de energia solar”, anuncia a chamada de capa do jornal. Tropeça na língua. O verbo é quadruplicar, que significar multiplicar por quatro.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 12 de fevereiro de 2020
OS BOLSONAROS OU OS BOLSONARO?
“Ex-capitão do Bope próximo dos Bolsonaro morre após confronto com a polícia na Bahia”, escreveu o Valor Econômico de hoje. Cochilou. Esqueceu que nome próprio tem plural. Na dúvida, basta lembrar Os Maias, clássico da literatura portuguesa: os Marotas, os Silvas, os Mouras, os Castros, os Bolsonaros.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 11 de fevereiro de 2020
ENXURRADA COM X E ENCHENTE CH. POR QUÊ?
O que é certo no Brasil? As chuvas. Apesar da certeza, sai ano, entra ano, as águas nos pegam desprevenidos. Há pouco, foi a vez de Minas Gerais. Agora, do Rio e de São Paulo. Com as tempestades, duas palavras voltam às manchetes. Uma: enxurrada. A outra: enchente. Pinta, então, a pergunta: por que uma se grafa com x e a outra com ch?
A questão procede. É que, depois de en-, o x pede passagem: enxada, enxofre, enxoval, enxugar, enxergar, enxaqueca, enxurrada. E por aí vai.
Enchente joga em outro time. Faz parte da equipe que mantém a família acima de tudo. Derivada de cheio, conserva o ch: cheio, encher, enchente.
Vale lembrar
Na pronúncia, as duas letrinhas do en- formam ditongo (ein). Por isso, a regra se amplia. Depois de ditongo, o x ganha banda de música e tapete vermelho: coisa, caixa, baixa, faixa, ameixa, deixar, feixe, gueixa, paixão, caixão, peixe, queixa, Teixeira.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 10 de fevereiro de 2020
OSCAR: PLURAL
Há quem ambicione receber a estatueta mais de uma vez. Vale, pois, a questão: Oscar tem plural? Tem. É Oscars.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 09 de fevereiro de 2020
ESTE, ESSE OU AQUELE? EIS A QUESTÃO.
Luíza vai publicar um livro de crônicas. Ao revisar os textos, pintou a dúvida sobre o emprego dos demonstrativos. Ela explica: “Gostaria de ver a explicação sobre o uso de este e esse, que provavelmente esclarecerá também o deste e desse. Estou tão insegura que troco seis por meia dúzia. Substituo os termos. Mas quero aprender. Pode ajudar?”
A dúvida não é só da Luíza. Jornalistas, professores, estudantes, advogados, todos se confundem na hora de empregar os demonstrativos. Ariscos, os pronomes não se deixam captar. Quando usar um? Quando é a vez do outro? O papel deles é bem definido — indicam situação no espaço, situação no tempo e situação no texto. Que tal jogar luz o tema? Vamos lá.
Pessoas do discurso
Para dominar os demonstrativos, lembremos as pessoas do discurso. Discurso, aí, significa conversa. As pessoas do discurso são as que tomam parte em um bate-papo. Para haver diálogo, são necessárias três pessoas. Algumas interessantes, outras nem tanto. Uma fala (1ª pessoa), outra escuta (2ª pessoa) e o assunto, que é a pessoa de que se fala (3ª).
Imagine que Rafael telefone para João e lhe pergunte se vai ao cinema. No caso, Rafael fala. É a 1ª pessoa. João escuta. É a 2ª. Do que eles falam? Da ida ao cinema. É a 3ª.
Situação no espaço
Este — diz que o objeto está perto da pessoa que fala (eu, nós). Pode ser reforçado pelo advérbio aqui: esta sala (a sala onde a pessoa que fala ou escreve está); esta revista aqui (a revista que tenho em mão). Esta carta (a carta que está comigo).
Esse — diz que o objeto está perto da pessoa com quem se fala (você, tu). Pode ser acompanhado pelo advérbio aí: essa sala (a sala onde está a pessoa com quem falamos ou a quem escrevemos), esse livro aí (o livro está perto da pessoa com quem falamos), essa instituição (a instituição em que o leitor está).
Aquele — diz que o objeto está longe da pessoa que fala e da pessoa com quem se fala: aquele quadro lá (o quadro está longe das duas pessoas), aquele cartaz, aquela torre.
Situação no tempo
Este — indica tempo presente: esta semana (a semana em curso), este mês (mês em curso), este ano (ano em curso).
Esse / aquele — exprime tempo passado (esse: passado próximo; aquele: passado remoto): Estive em Granada em 1992. Nesse (naquele) ano, visitei toda a Andaluzia.
Eis um nó. Como saber se o passado é próximo ou remoto? Depende de cada um. O tempo é psicológico. Uma hora com dor de dente é uma eternidade. Com o amado, voa.
Situação no texto
Quem escreve enfrenta desafios. Um deles: situar o leitor. Dizer-lhe se a pessoa, o fato ou a frase foi referida no texto. Ou, ao contrário, vai ser referida. É o 3º emprego do demonstrativo. E, cá entre nós, o que oferece mais dificuldade. Mas, bem entendido, torna-se fácil como tirar pirulito de criança.
Este — olha pra frente. Anuncia o que será referido em seguida:
Fernando Pessoa escreveu este verso: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”.
Reparou? O verso é anunciado: “escreveu este verso”. Depois, expresso: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”.
Esse — olha pra trás. O fato é referido antes; depois, retomado:
“Tudo vale a pena se a alma não é pequena.” Esse verso figura no livro Mensagem, de Fernando Pessoa.
Iguaizinhas
As mesmas regras valem para o isto, isso, aquilo e as combinações de preposição com os pronomes (deste, neste, disto, nisto, disso, nisso, daquilo, daquele, naquele, naquilo).
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 08 de fevereiro de 2020
HÍFEN: MAL-ESTAR E BEM-ESTAR
O professor de Brasília que tomou um suco de uva e sentiu fortes dores foi para o hospital. Lá, mandou um áudio para o amigos. Falou de mal-estar crescente. Ao transcrever o diálogo, jornais escreveram mal estar. Bobearam. Mal-estar se grafa com hífen. Bem-estar também.
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 07 de fevereiro de 2020
BRASILEIRO E CHINÊS = SINO-BRASILEIRO
A China sobressai nos noticiários de Europa, França e Bahia. A razão: ali começou a epidemia do coronavírus, que ameaça disseminar-se pelos cinco continentes. O mundo está com as barbas de molho. Teme que o surto se transforme numa pandemia. Em meio a mil informações, pintou uma questão. Qual o adjetivo composto que engloba chinês e brasileiro? É sino-brasileiro. Na flexão, só o segundo muda: relação sino-brasileira, relações sino-brasileiras, tratado sino-brasileiro, tratados sino-brasileiros.
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 06 de fevereiro de 2020
GÊNERO: MILHÃO, BILHÃO, TRILHÃO
“Em 2019, foram colhidas 96 bilhões de laranjas”, escreveu o Correio Braziliense. Ops! Tropeçou no gênero. Milhão, bilhão, trilhão & cia. são machinhos da silva. Eles, em coro, avisam aos navegantes: “Não temos nenhum interesse de mudar de gênero”. Melhor respeitá-los: Em 2019, foram colhidos 96 bilhões de laranjas. Um milhão de reais é muito dinheiro. Dois milhões de pessoas devem comparecer às manifestações. Quantos trilhões de moedas vão entrar em circulação?
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 05 de fevereiro de 2020
ATRASO, ATRASAR: O PORQUÊ DO S
Quem vai enfrentar o republicano Donald Trump nas eleições presidenciais americanas? Os democratas têm vários candidatos a candidato. Precisam disputar a indicação no voto. Iowa é a partida. Quem sai na frente ganha muita visibilidade.
Mas a prévia foi um fiasco. Até agora não saiu o resultado. O destaque, em vez de ser o vencedor, ficou por conta do verbo atrasar. Ele ganhou as manchetes e levantou uma questão: por que atrasar & família se grafam com s?
A história tem a ver com regra pra lá de produtiva. Trata-se da todo-poderosa família. “Tal pai, tal filho”, prega ela. Em bom português: as palavras derivadas seguem a primitiva, ou seja, mantêm a grafia original sem tossir nem mugir. O clã atrasado obedece à norma. Trás se grafa com s. Os filhotes também — atrás, traseiro, atraso, atrasar, atrasado.
Mais exemplos:
casa — casinha, casebre, casarão, caseiro, casamento, acasalar
cruz — cruzar, cruzinha, cruzada, cruzeiro
exame — examinho, examinador, examinar, examinado
gás — gasolina, gasoduto, gasoso, gaseificado
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 04 de fevereiro de 2020
PLEONASMO: HÁ... ATRÁS
Haver é verbo cheio de compromissos. Entre os 1001 empregos, encontra-se a indicação de tempo. Ele sempre olha pra trás. Indica o passado:
Trabalho na Câmara há 10 anos.
Juscelino inaugurou Brasília há quase 60 anos.
A reunião terminou há pouco.
O futuro fica por conta da preposição a:
Chego daqui a pouco.
Estamos a poucos dias do carnaval.
A dois meses da mudança, não sabe para onde ir.
Pleonasmo
Há pleonasmos e pleonasmos. Alguns estão na cara. É o caso de subir pra cima, descer pra baixo, entrar pra dentro, sair pra fora, elo de ligação, países do mundo.
Só se sobe pra cima, só se desce pra baixo, só se entra pra dentro, só se sai pra fora. Todo elo é de ligação. Todos os países são do mundo. Basta subir, descer, entrar, sair, elo e país. Eles dispensam a companhia redundante.
Assim como há os pleonasmos vira-latas, há os nobres. É o caso de há… atrás, que aparece em frases como “Há 10 anos atrás”.
Ora, há indica passado. Atrás também indica passado. Fiquemos com um ou outro:
Comecei a trabalhar na Câmara há 10 anos.
Dez anos atrás comecei a trabalhar na Câmara.
É isso. Na indicação de tempo, o haver joga no time do eu sozinho. E se sai bem.
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 03 de fevereiro de 2020
ENTRE E DENTRE: QUANDO USAR
Entre ou dentre? Na dúvida, use entre. Em 99% dos casos você acerta.
Dentre só tem vez quando significa de entre. É substituível por no meio de:
Cristo ressurgiu dentre os mortos. (Cristo ressurgiu do meio dos mortos.)
Tirou uma dentre as cinco frutas. (Tirou uma do meio de cinco frutas.)
Olho vivo! Na tentação de usar dentre, pare, pense e faça o troca-troca. O resultado é um só. Dentre é raro como viúvo na praça.
Dad Squarisi - Dicas de Português domingo, 02 de fevereiro de 2020
O MORAL E A MORAL: O GÊNERO FAZ A DIFERENÇA
O moral = ânimo, disposição: O resultado da pesquisa esmoreceu o moral dos militantes. Com o 7 X 1, os brasileiros ficaram com o moral baixo. Inscritos no Sisu ficaram com o moral baixo com a decisão da Justiça de impedir a publicação dos resultados.
A moral = conjunto de preceitos de conduta: moral duvidosa, a moral da fábula, pessoa sem moral.
Dad Squarisi - Dicas de Português sábado, 01 de fevereiro de 2020
SABOTAGEM: ETIMOLOGIA
Que coisa! Ao falar sobre a balbúrdia do Enem, o presidente disse que pode ser sabotagem. Sem saber, Sua Excelência buscou uma palavra árabe que deu muitas voltas até chegar ao português.
Sabotagem vem de sabbat. Na língua de Kalil Gibran, a dissílaba dá nome à madeira perfumada chamada sândalo. Com ela se faziam tamancos. Em francês, sabot. É aí que a história começa. Os camponeses, sem dinheiro pra comprar sapato de couro, usavam o de madeira. Com ele, pisavam as plantas tenras dos grandes proprietários. Daí nasceu sabotar — pisar com o tamanco.
A palavra cresceu e apareceu. Ganhou novas acepções. Designa, sobretudo, ato de destruição intencional de um trabalho ou de uma máquina. Sabotam-se projetos. Sabotam-se casamentos. Sabotam-se candidaturas. Sabotam-se acordos. Sabotam-se instalações industriais. Sabotou-se o Enem? Valha-nos, Deus!
Dad Squarisi - Dicas de Português sexta, 31 de janeiro de 2020
ADMISSÃO E DEMISSÃO: POR QUE SS?
Ora, ora! O vai e vem não dá folga. Bolsonaro demitiu o segundo da Casa Civil. A demissão foi publicada no Diário Oficial. Horas depois, contratou o demitido para assessoria na Casa Civil. Ouviu gritas de gregos, romanos, troianos, baianos, sergipanos e goianos. Não deu outra. Voltou atrás. Demitiu a criatura. A demissão repercutiu com ironia generalizada. Vale a questão: por que demissão e admissão se escreem com ss? As duas letrinhas têm a ver com a família. Os verbos do clã terminam em –itir. O substantivo deles derivados ganham dose dupla: admitir (admissão), demitir (demissão), emitir (emissão), transmitir (transmissão).
Dad Squarisi - Dicas de Português quinta, 30 de janeiro de 2020
IMINENTE E EMINENTE: DIFERENÇA
O coronavírus desembarcará no Brasil? “O perigo é iminente”, diz o ministro da Saúde. Ops! Alguns dizem eminente. Enganam-se. A diferença é uma letra, mas ela muda os significados:
Eminente joga no time das excelências. Significa elevado, superior: O eminente ministro proferiu a sentença.
Iminente quer dizer prestes a acontecer: A chegada do coronavírus ao Brasil parece iminente. O diretor está na iminência de renunciar.
Dad Squarisi - Dicas de Português quarta, 29 de janeiro de 2020
ENDEMIA, EPIDEMIA E PANDEMIA: DIFERENÇAS
O coronavírus criou asas e voou. Saiu da China e se espalhou mundo afora. Há suspeitas de que tenha chegado ao Brasil. Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul têm pacientes em observação. Fala-se em pandemia. O que é isso?
A palavra vem de família pra lá de conhecida. Panaceia, pandemônio, panorama, panteísmo, panteão são alguns de seus membros. Todos têm um denominador comum. É pan. Gregas, as três letrinhas têm senhora amplitude. Querem dizer tudo, todos. Panaceia é remédio pra todos os males. Panorama, visão total. Pandemônio, confusão generalizada. Panteísmo, a manifestação de Deus em tudo e todos. Panteão, templo consagrado a todos os deuses. Pandemia, doença epidêmica, amplamente difundida.
Endemia, epidemia e pandemia
O trio — endemia, epidemia e pandemia — se refere a doença contagiosa. Mas não é qualquer doença. É doença que atinge grande número de pessoas:
1. A endemia incide em dada população ou região: A malária é endemia na Amazônia.
2. A epidemia infecta mais de uma cidade, mais de uma região, mais de um estado: A dengue atinge praticamente todos os estados do Brasil.
3. A pandemia se espalha por continentes ou pelo mundo: Teme-se que o coronavírus seja a pandemia de 2020.
Dad Squarisi - Dicas de Português terça, 28 de janeiro de 2020
MEIA: EMPREGOS QUE CONFUNDEM
Na recepção do salão de convenções em Fortaleza:
— Por favor, gostaria de fazer minha inscrição no Congresso.
— Pelo seu sotaque vejo que o senhor não é brasileiro. O senhor é de onde?
— Sou de Maputo, Moçambique.
— Da África, né?
— Sim, sim, da África.
— Pronto, tem palestra agora na sala meia oito.
— Desculpe, qual sala?
— Meia oito.
— Podes escrever?
— Sessenta e oito, assim, veja: 68.
— Entendi, meia é seis.
— Isso mesmo, meia é seis. Mas não vá embora, só mais uma informação: a organização cobra uma pequena taxa se quiser ficar com o material. Quer encomendar?
— Quanto pago?
— Dez reais. Mas estrangeiros e estudantes pagam meia.
— Hmmm! que bom. Aqui está: seis reais.
— Não, não, o senhor paga meia. Só cinco, entende?
— Pago meia? Cinco? Meia é cinco?
— Isso, meia é cinco.
— Tá bom, meia é cinco.
— Não se atrase, a palestra é às 9 e meia.
— Então, já começou há 15 minutos. São nove e vinte.
— Não, não, ainda faltam 10 minutos. Só começa às 9 e meia.
— Pensei que fosse às 9h5, pois meia não é cinco? Pode escrever a hora que começa?
— 9 e meia, assim, veja: 9:30
— Entendi, meia é 30.
— Isso, 9h30. Mais uma coisa, aqui o fõlder de um hotel com preço especial para congressista. Já está hospedado?
— Sim, na casa de amigos.
— Em que bairro?
— No Trinta Bocas.
— Trinta Bocas? Não existe esse bairro em Fortaleza, não seria no Seis Bocas?
— Isso mesmo, no bairro Meia Boca.
— O bairro não é meia boca, é um bairro nobre.
— Então deve ser cinco bocas.
— Não, Seis Bocas, entende, Seis Bocas. Chamam assim por causa do encontro de seis ruas, por isso seis bocas. Entendeu?
— Acabou?
— Não, senhor. É proibido entrar de sandálias. Calce uma meia e um sapato.
O africano infartou.
(Autor desconhecido)
Dad Squarisi - Dicas de Português segunda, 27 de janeiro de 2020
MATOU A PAULADA? À PAULADAS?
Ele matou os jovens a pauladas. Ocorre crase? Ou não? Crase é o casamento de dois aa. Um é a preposição. O outro, em geral, o artigo. Pauladas é substantivo plural. Se estivesse acompanhado, o artigo seria as. A contração, às. Em “a pauladas”, o plural não tem vez. Conclusão: sem artigo, nada de união. Xô, acentinho!