Raimundo Floriano
Zito Borborema
Eram três cabras danados, forrozeiros de talento que, depois de baterem cabeça e darem muito murro em ponta de faca por aí, desembarcaram no Rio de Janeiro em busca de um lugar ao sol na cidade maravilhosa. Seus nomes de batismo não ajudavam nada no cenário artístico: José Domingos de Morais, sanfoneiro, João Batista de Lima Filho, zabumbeiro, e Manoel Valdivino de Souza, vocalista, triangueiro e pandeirista. Por isso, ostentavam pseudônimos pelos quais passaram a ser conhecidos dali pra frente: Dominguinhos, Zé Minhoca – depois, Miudinho – e Zito Borborema.
Como não poderia deixar de ser, acoitaram-se na proteção de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, que os acolheu e os abençoou. Deu-lhes a mão e, com peso de seu prestígio, arranjou serviço para os três.
Tocando nos forrós cariocas, ora isoladamente, ora reunidos, vez em quando com o próprio Gonzagão, foram se afirmando no meio musical e desenvolveram trabalhos que os projetaram para o sucesso.
Foto histórica e inédita, de 1956:
Luiz Gonzaga, Miudinho e Zito Borborema
No começo do ano de 1957, Luiz Gonzaga, reuniu os três e organizou um conjunto a que deu o nome pioneiro de Trio Nordestino, inspirado por Helena, sua mulher. O grupo durou apenas dois anos com sua formação original. Mais tarde, o título, que não detinha patente oficial, foi disputado pelos trios Baiano, formado por Lindu Cobrinha e Coroné, e Paulista, formado por Xavier, Heleno e Toninho.
Depois de desfeito o Trio Nordestino inicial, cada qual seguiu rumos diferentes, cada um com sua história, que pretendo aqui apresentar de forma resumida.
Foto histórica e inédita, de 1957:
Miudinho, Zito Borborema e Dominguinhos
DOMINGUINHOS nasceu em Garanhuns, Pernambuco, a 12.02.1941. Aos seis anos, com seus irmãos, já tocava sanfona de oito baixos nas portas dos hotéis e nas feiras de sua cidade natal, de Caruaru e de municípios vizinhos. Aos sete anos, foi ouvido por Luiz Gonzaga, que lhe deu seu endereço no Rio de Janeiro.
Seis anos depois, ainda conhecido como Neném, indo morar com o pai e o irmão mais velho no subúrbio carioca de Nilópolis, onde participava de forrós nos finais de semana, resolveu procurar Luiz Gonzaga, que lhe presenteou com uma sanfona. Daí pra frete, sua carreira deslanchou.
Depois da morte de Luiz Gonzaga, em 1989, passou a ser considerado o seu substituto no cenário forrozeiro, assim como o maior sanfoneiro do País.
Com a cantora e compositora Anastácia, manteve durante certo tempo parceria musical e amorosa e lançou, em 1973, um xote que foi o maior sucesso da dupla, tocado em todas as casas de forró do Brasil e também, em ritmo de marchinha, no Carnaval daquele ano, permanecendo até hoje como uma das mais pedidas no reinado momesco: Eu Só Quero Um Xodó!
Dominguinhos, mercê de Deus, ainda não é passado. Tem a agenda lotada de shows e seus discos continuam à disposição nas boas discotecas, com vendagem compensadora.
MIUDINHO foi o único zabumbeiro de que eu tenho notícia a se dar bem na vida! Esse apelido lhe foi botado por Luiz Gonzaga, devido à sua pequena estatura: pouco mais de 1,50m! No dizer de Dominguinhos, foi o maior – na acepção de melhor – zabumbeiro do velho Lua!
Nascido em Fortaleza, Ceará, em 22.01.1931, encontrava-se em São Paulo, no início dos anos 50, trabalhando como servente de pedreiro, quando conheceu o sanfoneiro Zé Gonzaga, irmão do Rei, que lhe ensinou a arte da zabumbagem e lhe deu o nome artístico de Zé Minhoca, e com quem passou a tocar nos forrós da pauliceia, num trio sem nome formado pelos dois e pelo triangueiro Passinho.
Mudando-se para o Rio, militou no ambiente musical e forrozeiro até o final de 1959, quando o Trio Nordestino se desfez. Naquele ano, transferiu-se para Brasília, integrando o elenco da Rádio Nacional como percussionista.
Aqui, ao lado do trombonista Tio João, do saxofonista Tio Nilo, de Bide da Flauta, do violonista Alencar Sete Cordas, da flautista Odeth Ernest Dias e de Pernambuco do Pandeiro, foi presença constante nas rodas de choro comandadas pelo citarista Avena de Castro, fundador e presidente do Clube do Choro. Em 1961, passou a funcionário do Senado Federal, onde se aposentou.
Conheci-o em 2004, um ano antes de sua morte a 24.03.2005, aos 74 anos de idade vítima de enfarte. Era casado com Maria Auxiliadora, a Dona Sinhá, num enlace harmonioso que durou quase 51 anos. Residia em bela casa no Guará II, aonde tenho ido constantemente aperrear Dona Sinhá na busca de informações.
Muitos dos fatos que aqui narro, desconhecidos até agora, e as fotos históricas e inéditas acima estampadas me foram gentilmente repassados por ela, a quem sou imensamente grato e a quem estarei persistentemente recorrendo em minhas pesquisas.
Dona Sinhá é a memória viva do Forró. Marinês jamais deixou de ir a sua casa quando vinha apresentar-se em Brasília. Assim como Anastácia, Guadalupe, Dominguinhos e outros que, estando por aqui, sempre arranjam jeito de dar uma chegadinha lá, para lhe pedir sua bênção.
ZITO BORBOREMA nasceu na cidade de Taperoá, Paraíba, em data incerta e não sabida. Pouco se conhece de sua biografia. Consta que foi casado com Chiquinha do Acordeom e é pai de Perpétuo Borborema, integrante do atual Trio Pé-de-serra. É muito pouco, é quase nada.
Com voz aguda e excelente ritmo, não só na divisão vocálica, mas também no triângulo e no pandeiro, viveu grandes momentos na música nordestina.
Fez sua estreia em disco no ano de 1956, apresentando-se como Zito Borborema e Seus Cabras da Peste. São seus maiores sucessos e até hoje continuam pedidos nas rodas forrozeiras: Mata-Sete, Padre Cícero, Alegria da Festa, Gente da Gente, Bebendo nos Botequins, Corinthiano de Coração, O Mestre Não Quer, e Zé da Onça, este com a participação de Chiquinha.
Conheci-o nos Anos 1980, quando ele já morava em Brasília. Certa vez, num boteco de sua propriedade em Taguatinga, acompanhei-o em animada forrozada, ele na voz e no pandeiro, e eu dando vigorosas palhetadas no meu enjoadinho banjo. Muitas vezes o encontrei com seu conjunto, nas manhãs de sábado, fazendo propaganda em portas de lojas como Ponto Frio, Casas Nordeste, Lojas Riachuelo e Fofi.
Já faz mais de 20 anos que ele faleceu, segundo Dona Sinhá. A última vez em que estive com ele foi em 1984, no quintal do poeta e escritor Orlando Tejo, no casamento de nossos amigos Maurício Melo e Yara, do qual foi padrinho o Papa Berto I. Nesse dia, ele ainda tinha um grupo organizado no esquema tradicional: vocal, sanfona, zabumba e triângulo. Depois disso, perdi o contato.
Estas são as músicas de Zito que possuo em meu acervo:
Em singela homenagem, e pela grande admiração que sempre tive por sua marcante voz, suas inspiradas composições e seu agradável repertório, aqui vai pequena amostra do que nos deixou:
Zé da Onça, baião de João do Vale e Abdias, com a participação de Chiquinha do Acordeom:
Bebendo nos Botequins, samba de José Pereira:
Gente da Gente, samba de Antônio Brasil, Nilza Brasil e Haidée Santos:
Mata-Sete, rojão de Venâncio e Corumba:
Oito de Dezembro, samba de Kozó:
Sigo Meu Destino, baião de Zito e Antônio Cunha: