Zé Grande, era um sujeito grandão e largo mas o sobrenome Grande, não era porisso não, era de família, pois ele era irmão de Joãozinho Grande, que vem a ser o pai do nosso Ronaldo Piquinha do Bom Fim de São José do Egito.
Zé Grande foi aquele matuto que nasceu pra ser boêmio e assim viveu até que se finou, na década de oitenta. Deixou, como recompensa para a viúva que carregou nas costas toda a sua vida boêmia e preguiçosa, uma gorda pensão por um bom emprego que os seus muitos amigos e admiradores lhe arrumaram no Estado.
Zé Grande apesar de ter nascido na pequena vila do Bomfim, sempre foi um sujeito além do seu tempo, sempre na frente daquela gente matuta de lá.
Quando ainda era meninote, deu na cabeça de roubar umas melancias no roçado de duas velhas tias sovinas, que não davam nada a ninguém. Melancia naquele tempo nos roçados sertanejos era coisa rara, ao contrário de hoje, encontrada aos montes nas feiras da região, vindas da agricultura irrigada.
Bom, a melancia, como outras raridades, as poucas que existiam eram guardadas como jóias de família, nos roçados. Os matutos procuravam escondê-las cobertas por ramas e galhos secos num cuidado tão grande que acabavam chamando a atenção, de longe a gente já sabia aonde elas estavam. Coisas vindas da inocência daquele povo do mato.
Elas eram também o correio sentimental dos apaixonados, era na casca da melancia que os namorados escreviam num alfabeto grosseiro, com a ponta da faca, as iniciais do nome da amada. Já as matutinhas escreviam, numa caligrafia mais elaborada, os nomes dos namorados, usando a curva do birilo de cabelo.
Mas voltando pra Zé Grande, um dia ele cismou de dar um abalo nas melancias das velhas tias, que eram guardadas com todo cuidado, para serem presenteadas pro padre Sebastião, quando viesse celebrar missa no povoado. Fora do padre, não davam nenhuma pra nenhum cristão, nem pra remédio.
Zé, para completar o plano sinistro, convidou um molecote bem mais novo do que ele, chamado Edvaldo de Siá Merença, moleque ligeiro e ladino, velho conhecedor dos roçados locais. Numa boca de noite, se juntaram no pé de um serrote detrás do arruado e foram traçar o plano:
– Edvaldo, tu pulas a cerca pra dentro e eu fico do lado de fora pra pegar o saco. Agora, tem uma coisa: tu só não podes pegar as melancias que tão marcadas com uma cruz, que são as grandes, do padre Sebastião, essas tu nem chegas perto.
Edvaldo pulou a cerca que nem um gato e não demorou muito, já jogou o saco de estopa com as melancias dentro.Zé abriu o saco e tava lá a desgraceira, justamente as maiores, tudo com uma cruz do tamanho do mundo.
– Edvaldo, desgraçado, eu não disse que era pra deixar as melancias da cruz? Tu tais doido? Essas melancias são as melancias do padre!
E Edvaldo respondeu:
– Zé, eu não sou o cão não! O cão é quem tem medo de cruz!