Às quatro e meia levanta
Para cuidar da ordenha
Faz o fogo e lasca a lenha,
Pra fazer almoço e janta,
Vai para o roçado e planta,
Feijão, milho, amendoim,
A batata e o gergelim,
Jerimum, alho e verdura,
Pra que garanta a fartura,
Viver na roça é assim.
Joga milho no terreiro
Para as galinhas e o galo,
Bota reação pra o cavalo,
Ceva o porco no chiqueiro,
Chama o cachorro trigueiro,
Cujo nome é “arlequim”,
Irriga um pé de jasmim,
Pra que brote a flor cheirosa,
Também rega o cravo e a rosa,
Viver na roça é assim.
Para enrolar o cigarro
Usa uma palha de milho,
Bate a enxada no trilho,
Pega a quartinha de barro,
Logo atrela os bois no carro,
Um é “brinco” outro é “marfim”
Convida o filho Crispim,
E juntos vão pra campina,
Para cumprir a rotina,
Viver na roça é assim.
Monta no velho alazão
Que se chama “pirilampo”,
E vai percorrer o campo,
Pra cuidar da criação,
Vai buscar um boi ladrão,
Que tem instinto ruim,
Quando encontra o bicho, enfim,
Leva e prende no curral,
Confinando o animal,
Viver na roça é assim.
Leva e amarra no mato
A sua cabra bonita,
E junto vai a cabrita
Gorda pra mais de contrato,
Lá na beira do regato
Tira um feixe de capim
Traz para o boi “Aladim”
Que ficou lá na cocheira,
Vai num jumento pra feira
Viver na roça é assim.
Leva a porca parideira
E acomoda num galpão,
Pra que haja a parição,
Em cima da velha esteira,
Sai revisando a madeira
Pra ver se não tem cupim,
Manda chamar Serafim,
Pra trocar a caibraria
Depois que a porca der cria,
Viver na roça é assim.
Vai olhar se o cacimbão
Necessita de limpeza,
Conserta o pé de uma mesa,
Bota lenha no fogão
Vai à fazenda “Agrião”
Que pertence a seu Joaquim
Comprar três quilos de aipim,
Pra comer com um bom guisado
Que já está cozinhado,
Viver na roça é assim.
Passa o dia trabalhando
Nos labores do roçado,
Apanha ração pra o gado
Ao lado de Zé Fernando,
Que sempre está lhe ajudando
Pra ganhar algum “dindim”
Sequer sente farnizim
E nem esboça cansaço
Que cause algum embaraço
Viver na roça é assim.
Revisa o silo de milho
Também olha o de feijão,
Traz massa num caldeirão
Pra mulher fazer sequilho
Vai reparar um novilho
Lá na Fazenda Betim,
Pra ver se compra e enfim
Casa de vez a boiada
Que ora está descasada
Viver na roça é assim.
Pega a corda de laçar
Botas, perneira e gibão,
Sela o cavalo “plutão”
Vai ao mato campear,
E começa a procurar
O garrote “canarim”
Pra vendê-lo a seu Delfim
Que insistia em comprá-lo
Pra num touro transformá-lo
Viver na roça é assim.
Quando chega o São João
Muito alegre o povo fica,
Sobra pamonha e canjica,
Cachaça, vinho e quentão,
Na frente do casarão,
A fogueira faz festim,
Quando acende o estopim,
Explode o som da roqueira,
Que ecoa na cordilheira,
Viver na roça é assim.
Logo a moçada sadia
Começa a fazer a farra,
Só finda ao quebrar da barra
No início de um novo dia,
Juntam-se Marta e Luzia,
Carolina e Iasmim,
Maquiadas com carmim
E seus vestidos de chita,
Deixando a festa bonita
Viver na roça é assim.
Logo a festança prospera
E fica mais animada,
Pois chega a rapaziada
Que a moçada tanto espera
Pra começar a paquera
Num namorico sem fim,
Cada uma está afim
De namorar e noivar,
Para depois se casar
Viver na roça é assim.
Dezembro se aproxima
Já se pensa num renovo,
Pra natal e ano novo,
Todo pessoal se anima,
Começa esquentar o clima,
Na vila de Camocim!
Tuba, pistão e clarim,
Garante a animação,
Logo após a procissão,
Viver na roça é assim.
O camponês no domingo
Sempre comparece a missa,
E sem que haja cobiça,
Vai a quermesse ou ao bingo,
Bem vestido qual um gringo,
Usa uma calça de brim,
E a camisa de cetim,
Pra seduzir a donzela,
E depois casar com ela,
Viver na roça é assim.
Do campo sinto saudade
Daquela vida modesta,
Bem no meio da floresta,
Longe da modernidade,
Na maior tranquilidade,
Sem revolta nem motim,
Quem habita esse confim,
Sente a leveza da brisa,
Que bem fagueira desliza,
Viver na roça é assim.