VELHOS CAMARADAS, O DOBRADO
(Publicada em 26.12.2011)
Raimundo Floriano
Karl Teike, compositor alemão
Quando eu era menino pequeno – sim, porque hoje sou um menino grande, cresci apenas no tamanho –, era proibido a toda a criançada balsense cantar a marchinha Lá Vem o Trem, que abaixo transcrevo:
Lá vem o trem, pi-pi, lá vem o trem
Mandei buscar minha mulher lá em Belém
Lá vem o trem, pi-pi, lá vem o trem
O diabo é que a minha sogra vem também
Minha mulher é camarada
Mas minha sogra é desgraçada
Eu vou fugir com minha mulher
E minha sogra com quem quiser
A censura não era motivada pela avacalhação da sogra, mas pelo vocábulo camarada que, naquele longínquo sertão, tinha o significado de amigada, concubina, amancebada, mulher teúda e manteúda.
O tempo encarrega-se de modificar todas as coisas, principalmente os costumes. A partir dos oito anos de idade, quando vivíamos os tempos da Guerra, entoávamos todos os dias, no Grupo Escolar Professor Luiz Rego, vários cânticos patrióticos, sendo um dos mais bonitos o Avante, Camaradas, música de Antônio Manuel do Espírito Santo e letra de autor desconhecido, cuja primeira parte aqui reproduzo:
Avante, camaradas,
Ao tremular do nosso pendão,
Vençamos as invernadas
Com fé suprema no coração.
Avante, sem receio,
Que em todos nós a Pátria confia,
Marchemos com alegria, avante!
Marchemos sem receio.
Foi quando percebi que a palavra camarada trazia em si um sentido muito benéfico. Camarada era eu, camaradas eram meus coleguinhas, camaradas eram os pracinhas que sacrificavam suas vidas no front europeu, em defesa da Pátria Brasileira.
Esse sentimento se arraigou em meu coração desde que me incorporei ao Exército Brasileiro, onde servi durante onze anos. Foi na caserna que conheci o verdadeiro sentido da camaradagem, talvez por se viver ali um dia a dia de convivência íntima e agradável, participando do mesmo alojamento, da mesma comida, da mesma instrução, da mesma formação cívica, das mesmas difíceis missões, compartilhando a barraca nos acampamentos com colegas que se tornaram quase irmãos. Por isso, essa fraternidade recebe o nome de camaradagem.
Prestando o Juramento do Sargento, na EsSA - Escola de Sargentos das Armas, em Três Corações (MG), constatei que tal sentimento é uma das mais fortes características da vida militar, conforme adiante se vê:
“Ao receber o Diploma da Escola de Sargentos das Armas, confirmo meu compromisso à Bandeira Nacional e, pela minha honra, prometo ainda exercer com dignidade e zelo as funções de Sargento do Exército, ligando-me ao oficial pela lealdade, afetividade e respeito, ao soldado pelo exemplo, aptidão, firmeza de atitude e amizade, e aos meus companheiros pela sã camaradagem, tudo fazendo pela eficiência e grandeza do Exército Brasileiro, na paz e na guerra!”
No domingo retrasado, dia 18.12, participei duma confraternização familiar com veteranos da EsSA – três deles fazendo parte comigo do embrião pioneiro do futuro BPEB - Batalhão de Polícia do Exército de Brasília –, a exemplo do que vimos fazendo uma vez por mês, no decorrer de todos os anos. O sentimento de amizade e empatia que nos une, transcorridas mais de cinco décadas que nos conhecemos, só pode ser expresso por esta mágica palavra: camaradagem. Leve-se em conta que eu, na reserva há 44 anos, continuo com o espírito de um jovem recruta, sempre que usufruo da ventura de reunir-me a esses velhos camaradas, grupo inspiradamente autodenominado Amigos Para Sempre.
A camaradagem é atributo intrínseco do labutar castrense em qualquer parte do mundo. Dele imbuído, foi que o músico militar alemão Karl Teike compôs, em 1889, o dobrado Alte Kameraden/Velhos Camaradas. É das mais belas marchas militares já conhecidas, tocada e gravada por todas as Bandas de Música deste Planeta. E que aqui disponibilizo com a Banda de Música da 10ª Região Militar.
Alte Kameraden/Velhos Camaradas
Nos últimos três meses, começou a chegar-me, quase que semanalmente, um bem elaborado vídeo gravado pela Orquestra do Maestro André Rieu, com o dobrado Alte Kameraden.
No final, em parte que foi cotada do vídeo, o Maestro André Rieu dá uma explicação que, no alemão macarrônico falado aqui neste Cardinalato, se traduziu como tendo ele convocado músicos de sopro da cidade para participarem da peça, imaginando que apareceriam uns 50, surpreendentemente, apresentaram-se 400.
André Rieu, maestro e violinista holandês
Tomo a liberdade agora de aqui apresentá-lo, na esperança de que ele seja do agrado de todos, assim como soeu comigo acontecer. Copie este link e cole-o em seu navegador:
https://tvuol.uol.com.br/video/alte-kameraden--marcha-militar-andre-rieu-04024C19356CDC912326
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lindo dobrado, queria muito ter ele em meus arquivos. como faço para receber !!!
Prezado Marcos, Vou enviar o áudio para seu e-mail. Um abraço!
Muito bom o texto sobre a Camaradagem. Sou seu conterrâneo de Caxias/MA. Sou flautista. Abraços