Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Do Jumento ao Parlamento quarta, 25 de janeiro de 2017

TROÇO PRA BURRO

TROÇO PRA BURRO

Raimundo Floriano 

 

         O fenômeno é mundial. A posse de um chefe de governo, em qualquer nação do planeta, seja nos Estados Unidos, na Rússia, na Alemanha, na Bósnia-Herzegóvina ou no Paraguai, caracteriza-se por conchavos de gabinetes e acertos nos bastidores, estrelados pelas maiores capacidades do país, pressurosas em dar sua cota de sacrifício na composição dos primeiro, segundo e terceiro escalões do organograma governamental.

 

         A Nova República do Brasil, iniciada em 1985, não foi exceção. Deixo de lado, aqui, a formação do estado-maior e preenchimento dos demais cargos na administração do saudoso Presidente Tancredo Neves, porque o centro das operações se situou, como foi amplamente divulgado na época, nas mãos de Dona Antônia, a quem cabia a confecção do nacionalmente famoso Mapa de Nomeações. Refiro-me à segunda fase, quando principiou a Era Sarney.

 

         Aí, sim, a coordenação ficou pulverizada, espargindo-se sobre muitos gabinetes parlamentares do Congresso Nacional, cujos membros eram assediados, como já disse, por desprendidos patriotas, incondicionalmente dispostos ao holocausto na aceitação de qualquer incumbência, a mais espinhosa que fosse, no intuito de colaborar para o fortalecimento das instituições, a consolidação da democracia e a rápida inclusão de nossa Pátria no fechado círculo dos novos integrantes do Primeiro Mundo.

 

         Talvez devido à pressa, alguns se descuidavam na apresentação de seus currículos, trazendo-os manuscritos em papel de rascunho. A quase totalidade, em compensação, compunha-se de reconhecidas sumidades, caprichosas e perspicazes, cujos nomes tornariam fulgurante a gestão do Presidente José Sarney, caso este os agraciasse com a deferência de sua escolha.

 

         Na época, eu chefiava o gabinete do Deputado Jorge Cury, PTB-RJ, primeiro líder do Partido Trabalhista Brasileiro na atual fase, solicitadíssimo por seus conterrâneos e correligionários, que nele viam o caminho seguro para o almejado atendimento às suas postulações.

 

         Trabalhar com o Deputado Jorge Cury foi um inestimável prazer e enriqueceu sobremaneira minha vida funcional. Um dos mais brilhantes advogados do fórum trabalhista, redação primorosa, oratória fluente e inflamada, invejável cultura geral, sólido conhecimento da gramática e do léxico, o Deputado Jorge Cury detinha como qualidades principais a sinceridade, a franqueza, a amizade, a generosidade, o desapego às coisas materiais e um coração do tamanho do mundo.

 

         De projetos seus derivaram-se a lei dispondo sobre a emissão regular, pela Caixa Econômica Federal, de extratos individuais correspondentes às contas vinculadas do FGTS, e a que permite às viúvas pensionistas do INSS contraírem novas núpcias sem perderem o direito ao benefício, porquanto pela legislação anterior eram forçadas à vida em concubinato ou ao restante da existência em completa castidade.

 

         Sem o Deputado Jorge Cury, a sigla PTB estaria, desde 1981, em poder de Leonel Brizola. Com o Deputado Jorge Cury e sua destemida dissidência em 1984, revogou-se o instituto da fidelidade partidária, possibilitando a esmagadora vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.

 

         Exigente no comando, sabia valorizar um chefe e não renunciava aos preceitos da autoridade e hierarquia. Como todo bom sírio-libanês, tinha seus momentos de exaltação e ciclotimia, e o desempenho das atividades junto a ele requeria muito manejo e diplomacia, o que não me faltou, resultando do nosso quotidiano um relacionamento respeitoso e fraterno, que soubemos consolidar com o passar do tempo.

 

         Mas retomemos o fio da meada.

 

         Naquela conjuntura, a mim competia o recebimento e a guarda dos currículos, entregando-os ao deputado conforme sua determinação. Cabia-me, também, atender a todos os candidatos, proporcionando-lhes infraestrutura, apoio e orientação na Casa. Paulatinamente, estabelecemos uma afável convivência, caracterizada pela cordialidade e singeleza, chegando um deles a me perguntar, certa vez, com visível curiosidade:

 

         – Raimundo, o que é que tu apitas?

 

         Foi aí que me dei conta da minha total indigência no campo das credenciais. De todos os engravatados presentes naquele gabinete, eu era o único a não possuir um registro organizado de seus títulos e aptidões, e essa constatação provocou-me a imediata resolução de elaborar um documento que, sendo simples e resumido, chamasse logo a atenção do leitor e externasse concisa e precisamente as seletas habilidades a mim inerentes. Produzi, assim, o seguinte cartão:

  

         Traduzo, embora tudo se encontre no Aurélio, no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, ou algumas palavras sejam formadas obedecendo-se à etimologia:

 

         Dona Carmem: Pessoa tão importante na Bahia, que um ato oficial saíra publicado mais ou menos assim: “...no uso de suas atribuições, nomeia Fulana de Tal (sobrinha de Dona Carmem) para o cargo de...” Carmem, igualmente, é o nome de uma comadre minha, baiana, residente em Taguatinga.

 

         Maranhense: Nascido no Maranhão.

         Conterrâneo do Homem - O homem que nomeava, também era de lá.

         Amanuense - Servidor público.

         Cinesíforo - Motorista.

         Alectoromaquista - Apreciador de brigas de galo.

         Melômano - Apaixonado pela música.

         Banjoísta - Batedor de banjo.

         Íncubo - Anjo sedutor.

         Rapsodo - Seresteiro.

         Vascaíno - Torcedor do Clube de Regatas Vasco da Gama.

         Diascevasta - Revisor de textos.

         Partenomante - Perito na arte de adivinhar se é virgem ou não uma mulher, ministrando-lhe beberagens ou mediante outros expedientes.

         Cruciverbista - Viciado em palavras cruzadas.

         Parafrasta - Tradutor.

         Calemburista - Trocadilhista.

         Abencerragem - De extrema dedicação.

         Fescenino - Sacana.

         Decifrador - Solucionista de enigmas, problemas e charadas.

         Discófilo - Colecionador de discos.

 

         O sucesso do cartão foi estrondoso, transformando-o rapidamente em matéria do Jornal do Brasil, Diário de Pernambuco, Estadão e Coluna do Millôr Fernandes. O primeiro frequentador do gabinete a recebê-lo apressou-se em mostrá-lo ao deputado, que achou genial a ideia e me chamou à sua presença:

 

         –Doutor Raimundo, por que o senhor não acrescentou aqui: “Chefe do gabinete do deputado Jorge Cury?”

 

         –Porque, deputado, conhecendo-o tão bem como conheço, sei que a estas horas o senhor estaria me dizendo: “Que é isso, doutor? Misturando o serviço com brincadeira? Pode tirar meu nome disso aí!”

 

 

Deputado Jorge Cury,

o primeiro líder do PTB moderno

 


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