Ambos haviam saído da adolescência quando começaram a namorar. Num piscar de olhos o amor disse sim e tudo começou como num conto de fadas à moda Marie-Catherine d’Aulnoy, no final do século XVII.
Não havia tempo ruim para os dois. Qualquer incidente bizarro do cotidiano, por desimportante que fosse, era motivo para rirem e mostrar ao mundo que estavam felizes. Coisas da juventude.
Depois de três meses de namoro ambos resolveram noivar. À moda antiga, românticos, os dois passaram de frente a uma loja de vender alianças e ele perguntou-lhe qual a que ela mais se identificava. E ela, feliz da vida, indicou uma da vitrine, simples. Ele comprou e ambos ficaram noivos ali mesmo dentro da Loja Alianças, sob o olhar emocionado da atendente.
Depois do noivado, começaram a organizar a vida. Compraram enxoval e demais utensílios domésticos de uso diário para uma casa de um casal que se preze organizada.
Menos de um ano de noivado, estavam os dois pombinhos à frente do Juiz da Vara de Família e Casamentos dizendo sim à liberdade de escolha; e um mês depois, para a felicidade da família materna, estavam no altar da igreja de frente para o pároco, prometendo estar com a amada na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, amando-a, respeitando-a e sendo-lhe fiel em todos os dias da vida, até que a morte os separe.
Dois anos depois de casados, sem filhos, sem motivos, sem desentendimentos, ambos resolveram separar. Ela foi para um lado em busca não se sabe do quê, e ele também. Depois, ela arrumou um novo companheiro e resolveu com ele ficar, sem se casar. Ele fez o mesmo; porém casou-se.
Vinte e cinco anos depois de separarem, ambos se encontram. O amor e a admiração que um nutria pelo outro não mudou anda. Ela com dois filhos, viúva; e ele com dois filhos, casado. O mesmo sorriso, a mesma admiração, o mesmo prazer da juventude emergiram nos corações de ambos, como a lua após o sol se por. Abraçaram-se, beijaram-se, choraram. Curiosamente, ele a abraça como no passado, as lágrimas correndo dos olhos, pergunta-lhe:
– Amor, se a gente se amava tanto. Gostava tanto a ponto de até hoje o amor continuar vivo, latente, latejante, por que a gente se separou?
E ela, fingindo não lhe dar ouvido, mas aplicando-lhe um beijo demorado, responde:
– Era porque nós dois éramos dos adolescentes irresponsáveis; mas hoje somos maduros e eu estou viúva!
Beijou-lhe mais uma vez e se foi sem olhar para trás.
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Comentários sobre o filme “Cenas de Um Casamento” do genial diretor Sueco Ingmar Bergman