Ultimamente, tenho encontrado nos jornais, com certa frequência, textos escritos por analistas políticos ou econômicos usando a expressão “tiro no pé”. A cada vez que isso acontece, lembro de um caso que julguei em Fortaleza, sobre um assalto a uma agência dos Correios.
A expressão é relativamente comum, mas não custa lembrar que “tiro no pé” é “algo que foi feito ou planejado errado, e a pessoa que o executou, pensando que ia se dar bem, acabou se prejudicando”. As aspas estão aí porque fui buscar a explicação no site Dicionário Informal. É sempre bom usar referências bibliográficas.
Mas de onde teria surgido a expressão? Quem teria dado o primeiro tiro no pé?
Fiz uma rápida pesquisa no Google e nada encontrei. Muitos sites explicam o que a expressão significa, mas ninguém diz de onde ela surgiu.
Diante do vazio informativo, busquei na minha própria experiência a resposta para as indagações acima.
Porque, afinal de contas, não sou leigo no assunto quando se trata de manusear armas de fogo. Quando me registrei, em 2019, no Clube Esportivo de Atiradores, Caçadores e Colecionadores do Distrito Federal (CEACC-DF), já havia feito, por razões profissionais, vários cursos de autoproteção, todos eles incluindo o uso de armas de fogo para defesa pessoal.
Nesses cursos, uma lição sempre se repetiu: em deslocamentos com a arma pronta para uso, manter o cano para baixo, em um ângulo de 45 graus em relação ao eixo vertical.
O motivo do cano direcionado para baixo é evitar um disparo acidental contra alguém que esteja à sua frente, mas o ângulo de 45 graus serve para que não aconteça o fato sobre o qual tratamos aqui: um tiro no pé.
Lembro então de uma cena que vi em um filme cuja trama se passava no século XVIII, talvez XIX. Dois jovens se enfrentavam em um duelo com pistolas. De costas um para o outro, caminhavam dez passos em sentidos opostos. Depois, viravam-se e atiravam.
Durante a caminhada, mantinham as pistolas com o cano apontado para baixo, mas sem observar a regra dos 45 graus. Talvez tenha surgido assim a expressão “tiro no pé”. Algum duelista mais nervoso deve ter apertado o gatilho antes da hora e acertado a extremidade de um de seus membros inferiores.
Foi mais ou menos o que aconteceu naquele caso do assalto à agência dos Correios que um dia julguei.
Os dois assaltantes estavam dentro do estabelecimento, quando chegaram ao local dois policiais, alertados por populares.
Os militares foram recebidos à bala. Depois de uma breve troca de tiros, um dos assaltantes pegou para refém uma senhora de aproximadamente 50 anos de idade. Saiu da agência fazendo da mulher um escudo humano. O outro assaltante vinha logo atrás.
Já na calçada, a arma do assaltante disparou. Um tiro no pé. Não dele, mas da refém. A mulher caiu ao solo. Um dos policiais, demonstrando grande habilidade, aproveitou o momento e disparou também a sua arma, alvejando o assaltante no abdômen. O outro indivíduo levantou as mãos, rendendo-se. Foram presos.
É por isso que sempre que ouço alguém dizer que “fulano deu um tiro no pé”, no sentido figurado, lembro desse caso, quando o tiro no pé foi literal. Não foi no pé de quem atirou, mas quem atirou acabou se dando mal também.
Neste ano de eleições para vagas de presidente da república, governador, senador, deputado federal e deputado estadual, estratégias eleitorais aparentemente geniais podem acabar resultando em verdadeiros tiros no pé. Espero que apenas no sentido figurado.