Os anos 60 vestiam fraldas. Corria célere o de 62, ou o de 63, não tenho certeza. Na casa do Tenente Aguiar, bairro de Nazaré, em Fortaleza, morava o único televisor da região. Luxo de poucos. O militar, caladão, abusado, cochilava e peidava em sua poltrona, sonhando um dia ser Capitão. Sua esposa, Dona Madalena, ao contrário dele, era afável, talvez para compensar a cara-durice de sua cara-metade. Aquela casa ficava na rua paralela à nossa Francisco Parrião (nunca descobri quem era ou o que fez esse cidadão para merecer nome de rua), e, para lá íamos ficar parados em frente à única janela aberta para a rua, eu e muitas outras crianças, olhos arregalados, esperando entrar no ar o Vídeo Alegre, TV Ceará, início de carreira de Renato Aragão. Tempos em que não havia o Faustão. Como demorava bater 8 horas da noite! Às risadas se juntava a frustração da falta de um assento, um tamborete que fosse, para a gente se sentar. As trapalhadas, nas quartas-feiras, eram a diversão maior de todos nós. Sobravam gargalhadas e pernas doídas depois de uma hora em pé na janela da casa do Tenente. Tempos depois, lembro bem, meu pai conseguiu comprar uma TV, SEMP, acho que de 20 polegadas, com uma antena em forma de ‘V’ sobre ela. Na época inventaram um plástico colorido, vermelho-amarelo-verde que se colava à frente da tela preto e branca e aí tínhamos a TV colorida. Literalmente colorida. Ficamos todos felizes. Pedi a meu pai, e ele atendeu, que colocasse na sala um banco grande que coubesse os 7 ou 8 meninos que comigo assistiam Renato Aragão se transformar em Didi Mocó, em sua fase pré-Trapalhão. Além de sentados, víamos o programa ‘a cores’ e sem precisar ouvir o ronco do quase velho Tenente Aguiar. Aquela era a única TV ‘a cores’ da Região. Até dona Madalena rendeu-se aos apelos ‘tecnológicos’ da época e um dia foi assistir a novela colorida, sentada no banco da meninada que, àquela hora, jogava bola de meia na rua Francisco Parrião. Inocente e alegremente, sem notícia de trapalhadas como as que hoje frequentam as não-esquinas de um Planalto brasileiro. Só muito tempo depois soube que o Tenente Aguiar fora para a reserva sem realizar seu sonho de ser Capitão.