Era dia de eleições municipais. Nas cidades do interior, os caminhões começavam a transportar, ainda pela madrugada, os eleitores da zona rural, que votariam nas zonas eleitorais da cidade.
Nesse tempo, as cabines de votação eram verdadeiros quartinhos fechados, e o voto era mesmo secreto. O eleitor ficava mais à vontade, para votar.
Muitos eleitores da zona rural só sabiam assinar o nome. Eram semianalfabetos e os votos eram de cabresto, fiscalizados pelos políticos e donos de propriedades rurais, onde eles trabalhavam. Era fácil votar, pois bastava colocar um “X” no quadrinho ao lado do nome do candidato escolhido e depois colocar na urna eleitoral. A apuração dos votos era manual e demorada. O resultado das eleições somente era divulgado, no mínimo, dois ou três dias depois.
Para votar, a matutada vinha para a cidade, vestida com a melhor roupa que tivesse. Os homens que tinham paletó, iam votar todos enfatiotados. O dia da eleição era um dia de festa, nas cidades do interior.
Em Nova-Cruz (RN), a prefeita em exercício abria as portas de sua enorme casa, oferecendo ao eleitorado de cabresto, comida farta, ponches e água para beber, à vontade.
Da mesma forma, acontecia na casa do candidato da oposição. Era o dia em que a pobreza aproveitava para se empanturrar de comida, tirando, literalmente, a barriga da miséria.
Havia eleitores inescrupulosos, que aproveitavam o dia da fartura e enchiam a barriga, exageradamente, com tudo o que havia de comida boa, nas casas dos candidatos dos partidos da situação e da oposição. O PSD e a UDN eram os partidos principais. Os eleitores chegavam a se empanzinar com tanta comida. Essa fartura durava até o fim do dia. Ainda havia almoço farto, em algumas casas de outros cabras eleitorais dos dois partidos.
Havia, nesse tempo, as fraudes de se entregar a chapa ao eleitor já marcada, como também de se trocar a chapa que o eleitor levava para lhe servir de modelo, por outra do outro partido, com o nome do outro candidato. Essas fraudes eram feitas por pessoas que faziam “boca de urna”.
Fora isso, ainda havia as famosas “BREJEIRAS”, nome que se dava ao “roubo” de urnas, depois do encerramento das eleições. Essas “brejeiras”, onde os votos eram trocados, eram chefiadas por verdadeiras quadrilhas, especializadas em fraudes eleitorais, compostas por “gente grossa”, incluindo políticos e advogados.
Conta-se que em uma conhecida cidade do interior nordestino, um matuto entrou na cabine para sufragar o seu voto, sentindo cólicas intestinais. Não deu tempo de olhar para a chapa, e só lhe restou se acocorar e evacuar ali mesmo. Para se higienizar, fez uso da chapa eleitoral onde teria que marcar seu candidato com um X e de santinhos de diversos candidatos, que trazia no bolso.
Quando o mesário bateu na porta da cabine, avisando que seu tempo de votação havia se esgotado, o eleitor gritou:
-TEM GENTE!!!