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Marconi Perillo, que ficou em quinto lugar na eleição para senador, teve decretada prisão preventiva. Defesa tenta habeas corpus |
Derrotado na disputa pelo Senado Federal por Goiás, o ex-governador do estado Marconi Perillo, do PSDB, foi preso na tarde de ontem sob suspeita de recebimento de propina nas campanhas eleitorais de 2010 e 2014. O tucano foi detido enquanto prestava depoimento na sede da Polícia Federal (PF) em Goiânia sobre as acusações apresentadas pelos delatores da Odebrecht Fernando Reis e Alexandre Barradas. Os dois acusaram Perillo, que agora não conta com prerrogativa de foro especial, de receber repasses milionários indevidos da Odebrecht nos pleitos em que foi eleito e reeleito governador do estado. Ele é investigado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O mandado é de prisão preventiva, que não tem prazo.
Desde o fim de setembro, Marconi Perillo enfrenta barreiras na vida política. A operação Cash Delivery (entrega em dinheiro, em português) executou 14 mandados de busca e apreensão em endereços ligados a ele e cinco mandados de prisão temporária, um deles contra Jayme Rincón, coordenador de campanha do governador José Eliton (PSDB). Perillo trabalhou para que o governador, eleito como seu vice, fosse confirmado no cargo pelas urnas, mas ele acabou ficando em terceiro lugar. Fernando Reis e Alexandre Barradas, delatores da Odebrecht, citaram repasses ilegais de cerca de R$ 10 milhões às campanhas de Perillo — R$ 2 milhões em 2010 e R$ 8 milhões em 2014.
Os mandados miraram o ex-governador que, depois de três décadas em cargos públicos, acabou derrotado no pleito deste ano, ficando em quinto lugar nos votos do eleitorado goiano para o Senado Federal. Perillo seguia na liderança das pesquisas, mas a deflagração da operação Cash Delivery, da Polícia Federal, que veio à tona no dia 28 de setembro, o deixou mais distante da vitória. Foram eleitos Vanderlan Cardoso, do PP, com 31,35%, e Jorge Kajuru, do PRP, com 28,23%. O tucano obteve apenas 7,55% dos votos válidos, atrás de estreantes como Kajuru. Nesse cenário, o ex-governador de Goiás, que atua na política desde 1991, ficou pela primeira vez sem mandato.
Primeira instância
A advogada criminalista Lissa Moreira explica que, com a perda do foro privilegiado, Marconi ficou submetido ao julgamento de um juiz de primeira instância. “Quando o político não tem mais prerrogativa de foro, todos os atos são apreciados por um juiz de primeira instância. Por não haver denúncia, e o Ministério Público não formar convicção sobre os fatos, o governador não teve direito ainda ao contraditório”, analisa. O caso estava antes no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Passou à primeira instância em abril, quando Perillo deixou de ser governador.
Até o fechamento desta edição, Perillo continuava preso, mas a defesa, representada pelo advogado Antônio Carlos Almeida, o Kakay, já havia impetrado pedido de habeas corpus no Tribunal Regional Federal 1 (TRF-1). Desde o momento da prisão, a equipe de Kakay se posicionou contra o decreto de prisão e a tratou com “completa indignação”. Ainda segundo a equipe do advogado, “uma prisão por fatos supostamente ocorridos em 2010 e 2014, na palavra isolada dos delatores, afronta pacífica jurisprudência do Supremo, que não admite prisão por fatos que não tenham contemporaneidade”.
A prisão preventiva, ou seja, por tempo indeterminado, é decretada, entre outras motivações, com a finalidade de assegurar a aplicação da pena. Mas, segundo Lissa Moreira, baseando-se no que acompanhou sobre o caso, os objetivos pareceram não se efetivar integralmente. “A prisão, também chamada cautelar, busca dar segurança para um processo investigativo e pode ser decretada para assegurar a aplicação da lei. Nesse caso do ex-governador, parece-me que nenhum dos pré-requisitos estavam presentes. Não havia fato novo”, sustentou a advogada, baseada no artigo 312 do Código de Processo Penal.
Com a prisão de Marconi Perillo, o PSDB enfrenta mais uma derrota. A legenda, que pela primeira vez desde 1994 ficou fora do segundo turno presidencial, passa por um racha interno entre novos e antigos nomes, caso de Geraldo Alckmin e João Doria, que concorre com Márcio França (PSB) ao governo de São Paulo. Na Câmara dos Deputados, o partido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também sofreu derrota expressiva. Passou de terceira maior bancada eleita, em 2014, para nona, a partir de 2019.
Para o cientista político Max Stabile, doutor pela Universidade de Brasília (UnB), a prisão de Marconi Perillo revela, além do mau momento pelo qual os “partidos que estiveram na cadeira por muito tempo passam”, uma marca negativa para a legenda tucana. “Sem sombra de dúvidas, os governadores do PSDB, além de Perillo, Beto Richa e Reinaldo Azambuja, foram indiciados bem próximo ao pleito. Isso com certeza influenciou na campanha”, argumenta.
* Estagiário sob supervisão de Paulo Silva Pinto
Perfil
Quatro
décadas
Detentor de quatro mandatos no Palácio das Esmeraldas, na capital goiana, Marconi Perillo, do PSDB, começou a vida política em 1980, quando foi presidente da Juventude do então PMDB. Nascido em Goiânia, em 1963, Marconi é casado, tem duas filhas e é formado em direito pela Universidade Católica de Goiás. Antes de chegar ao partido do qual faz parte, foi membro de outros quatro: MDB, PST, PP e PPB.
Em 1990, foi eleito deputado estadual e, em 1994, elegeu-se deputado federal pelo PP. Em 1998, ganhou a eleição para o governo e foi reeleito em 2002. Quatro anos depois, conquistou uma vaga como senador. Voltou ao governo goiano em 2010 e, em 2014, conseguiu a reeleição mais uma vez. Renunciou em abril deste ano para disputar o Senado Federal.
Com trajetória ascendente nas eleições que disputou, o tucano travou historicamente uma disputa direta com Iris Rezende, do PMDB. Nas três vezes em que competiram pelo eleitorado goiano, Perillo saiu vitorioso. Contudo, nas eleições de 2018, o percurso de Perillo foi interrompido por escândalos de corrupção e pela ascensão de Ronaldo Caiado, do DEM, no estado. O ruralista levou a disputa no primeiro turno, com quase 60% dos votos, e apoiou Jorge Kajuru (PRP) e Vanderlan Cardoso (PP) para as vagas do Senado. Eles conquistaram, com ampla margem, o eleitorado.
Marconi Perillo havia se envolvido em outro caso suspeito, quando assumiu o governo em 2010. Segundo a Polícia Federal, o ex-governador havia vendido uma casa a Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, por valor maior que o declarado. Depois disso, com a compra de imóveis e com cotas de participação em uma empresa, o tucano conseguiu dobrar seu patrimônio.
No ano passado, Perillo foi denunciado pelo crime de corrupção passiva pelo Ministério Público, que suspeitou de recebimento de vantagens indevidas durante o terceiro mandato do tucano. Mas o processo que apurava possíveis improbidades administrativas em relação ao suposto envolvimento de Perillo com Cachoeira foi arquivado. (MF e CV)