Saúba dos Bonecos e o Preto Velho Zé Cosmes
Antônio Elias da Silva, eis o nome registral desse exímio artesão rústico nascido em Carpina-PE aos 09 de maio de 1953.
Artesão empírico, com extraordinária habilidade no trato com a madeira tosca – o mulungu – árvore apropriada para a confecção de seus bonecos artísticos, cedo teve de sorver a puberdade lúdica, na palha da cana dos engenhos da região da Zona da Mata Norte, sob o sol causticante e inclemente do trabalho com a enxada, limpando matos dentro dos canaviais íngremes para sobreviver e ajudar a família.
Autodidata, nunca pisou o batente de uma escola oficial. Seu mestre, professor, instrutor, inspirador é sua espantosa capacidade observativa e habilidade intuitiva em transformar tudo que é madeira tosca de mulungu em verdadeiras obras-primas artesanais.
Devido à sua extrema habilidade arteira manual, esse carpinense casual, cedo começou a divertir e maravilhar sua sofrida gente nas festas juninas no bairro de Santo Antônio, em Carpina, com seus mamulengos cômicos e satíricos, ridicularizando os costumes e o comportamento da sociedade local nos teatros de pano improvisados ao ar livro.
Além de escultor, Mestre Saúba é um exímio dançarino e juntamente com D.ª Lindalva, uma boneca de madeira em tamanho natural, faz um espetáculo pitoresco que sempre atrai centenas de pessoas nos lugares onde se apresenta. Mestre Saúba também é ventríloquo e contracena com o divertido boneco Benedito. Dona Quitéria, Mané Pacaru, Dona Lilia, João Gago, Simão, Coquinho, Laré e Dona Liprosina são alguns dos outros personagens nascidos pelas mãos do artista. Outra criação que marcou muito seu trabalho foi os ciclistas, que pedalam e mexem a cabeça.
Apesar de seus trabalhos correrem o país e o mundo, serem expostos em galerias de luxo, maravilharem o Brasil em shows nos canais de televisão mais populares, tanto locais quanto nacionais, esse autêntico e verdadeiro artista mamulengueiro continua pobre e miserável, devendo até os pentelhos aos agiotas, e sem dinheiro para alimentar a prole numerosíssima, filhos de várias manteúdas que dele se aproximam pensando ser detentor de uma grande fortuna em dólar ganhada de gringos e guardada em uma botija debaixo da cama de lona comprada na feira de mangaio em Caruaru.
É doloroso vê-lo trôpego, cheio de manguaça, todo cagado cambaleando pelas ruas cheias de bueiros de guabirus na sua terra natal, Carpina, com as mãos e os pés melados de cola de madeira, com os bolsos mais lisos do que pau de tarado, dando murro no ar e rogando pragas ao vento por lhe faltar os caraminguás.
Espera-se que não se deixe acontecer com ele as mesmas injustiças e indiferenças que houve ao maior pintor pós-impressionista do século XIX, o Neerlandês Vincent Willen Van Gogh – “lúcido e louco; dócil e violento” -, que depois de morto, seus quadros alcançaram a glória, sendo vendidos em leilões suntuosos por fortunas incalculáveis; seu busto virou estátua no mundo; seu nome virou rua em todo o planeta; seu túmulo, adoração; mas em vida só conheceu a miséria, o desprezo, o abandono, a indiferença e as loucuras dos choques elétricos nos manicômios.