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Imagens históricas de uma complexa construção: o terminal rodoviário do Plano Piloto começou a ser erguido ainda nos anos 1950, a partir de projeto do arquiteto e urbanista Lucio Costa. Após a inauguração, em 12 de setembro de 1960, o terminal virou referência, ligou as asas Sul e Norte e passou a direcionar a movimentação dos primeiros habitantes de Brasília
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O coração é um dos maiores símbolos da vida. Sempre em movimento, ele é vital para todas as outras partes do corpo. Por isso, não à toa, a Rodoviária do Plano Piloto é considerada o “coração” de Brasília. No centro da asa do avião, o local recebe cerca de 700 mil pessoas diariamente: brasilienses de diferentes idades, regiões e ocupações, que passam, muitas vezes, em ritmo acelerado. Os sons dos alto-falantes instalados nas plataformas acabam se confundindo com o barulho dos ônibus, dos passos e dos gritos de ofertas dos comerciantes, um cenário bem diferente do projeto inicial de Lucio Costa. Entre reclamações, como a falta de acessibilidade e a insegurança, o espaço acumula histórias que se misturam com as de Brasília. Na segunda matéria da série Brasília Sexagenária, o Correio reencontra o espaço localizado no coração da cidade e que completa 60 anos em 12 de setembro.
A rodoviária parece um lugar à parte no meio do Eixo Monumental. Se, no gramado central, a calmaria e a visita de turistas predominam, no terminal, o que ganha destaque são os ruídos, a correria do dia a dia, as filas de espera e os veículos lotados. “Aqui não tem essa história de rico ou pobre, todo mundo se encontra, toda hora. É um ponto com metrô, ônibus, perto de shopping”, opina Agna da Cruz, 35 anos, usuária do transporte público. A baiana, que mora na capital, sente gratidão por Brasília, mas pede mais cuidado. “O governo tem oportunidades boas na rodoviária, porque é um espaço grande que poderia ser bem aproveitado. Penso que seria ótimo se tivesse, por exemplo, uma galeria de arte, com acessibilidade, garantindo um complemento à educação e trazendo segurança”, sugere.
Para o historiador Wilson Vieira, a rodoviária reflete a realidade de Brasília. Ali, estão moradores do Plano Piloto, das demais regiões administrativas e do Entorno. “Ela se tornou um grande centro metropolizado da população do Distrito Federal. Foi além do planejado, virou um espaço popular”, ressalta. Vieira explica que o projeto inicial era um centro de conveniência, com cafés e restaurantes, algo parecido com o que é o aeroporto hoje. “À medida que a cidade foi crescendo, a população foi assumindo este espaço. A presença do comércio formal e informal é característica da nossa história como formação da cidade. São coisas que demonstram que o desenho de um arquiteto não consegue planejar a tomada popular do espaço. O povo é muito mais forte e mais presente do que a prancheta de um profissional”, destaca.
Um dos habitantes da capital que fazem parte desse processo é Joabem José da Silva, 49. Ele chegou ao DF em 2004 em busca de oportunidades e hoje reclama do tratamento dado aos espaços públicos. “Tenho dificuldades de locomoção, uso muletas e moro nas ruas, então sinto ainda mais os problemas. Faz anos que a escada rolante não funciona. Lembro-me de poucas vezes que pude usar, que estava normal. Isso é algo grave, as pessoas se machucam por falta de acessibilidade. É caso de direitos humanos”, avalia. Procurada, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) informou que “o processo licitatório das escadas rolantes e dos elevadores está dentro da normalidade” e que o órgão “está analisando as propostas das empresas que participaram da concorrência para, em seguida, fazer a homologação”.
Obra complexa
A construção da Rodoviária do Plano Piloto é considerada por especialistas uma das mais complexas da época em que ocorreu. Atrás dos paredões que seguem sentido Eixos Sul e Norte, há grandes vãos. “São caixas, espaços livres enormes. Dava para construir um shopping ali dentro”, detalha o historiador Wilson Vieira. O professor de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Antônio Carlos Carpintero explica que as vigas de construção da rodoviária são protendidas, ou seja, construídas com ferros internos, que pressionam o concreto e aumentam a possibilidade de fazer grandes vãos.
Para Antônio Carlos, apesar da importância da obra, ela não exigiu um trabalho inédito. “Os vãos que ela tem são grandes. A rodoviária estava no limite máximo da construção da época, mas não era nenhuma técnica desconhecida”, avalia. Porém, ele alerta que essas ferragens, assim como toda a obra, exigem manutenção constante, pois podem diminuir a capacidade de sustentação se oxidarem.
O arquiteto ainda comenta que a rodoviária foi construída a 750 metros do lugar do projeto original, em direção à Torre de TV. “Ela estaria na altura da W3, mas, para a própria construção, foi feita essa mudança, e o Lucio Costa encarregou-se de projetar a rodoviária da forma que foi feita”, conta. Antônio acrescenta que a plataforma superior ficaria no chão, ligada aos setores bancários e comerciais. “O pedestre poderia circular livremente nesse plano.”
Segurança
Citada constantemente como ponto negativo do terminal, a segurança acaba sendo uma barreira até mesmo para a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). “O alto índice de reincidência é uma grande dificuldade. Muitos detidos no DF voltam a praticar outros crimes, por vezes na mesma região, devido às brechas contidas na legislação, que facilitam o retorno dos criminosos às ruas e geram a sensação de impunidade”, informou a corporação, em nota oficial. Porém, nos primeiros dias de 2020, um novo esquema de policiamento passou a atuar na área. “Antes, os policiais ficavam no posto fixo na parte superior da estação. Agora, o patrulhamento é feito em viaturas e assessorado pelo Comando Móvel estacionado na rodoviária”, disse a PMDF.
Reformas constantes
Os problemas da rodoviária são antigos. O terminal passa por constantes reformas. Em junho do ano passado, parte da estrutura foi interditada após riscos de desabamento. Técnicos do governo identificaram crescimento de algumas fissuras, o que poderia provocar um desmoronamento, caso não fossem feitos os reparos necessários. Para garantir a segurança, o trânsito de carros na parte superior, sentido sul, foi interrompido.
A estrutura precisou ser demolida e reconstruída. Segundo a Novacap, a obra foi concluída no início de novembro. Também foram feitas novas instalações elétricas e hidráulicas; instalados ar-condicionado e sistema de som; executado novo piso em granitina em toda a extensão da rodoviária; trocado o piso tátil direcional; e substituída toda a iluminação interna e de borda.
Parceria público-privada
A parceria público-privada é a saída defendida pelo GDF para melhorar a oferta de serviços para a população na Rodoviária do Plano Piloto. A reclamação dos milhares de brasilienses que usam o local diariamente é constante pelos problemas históricos de infraestrutura. Em novembro, seis grupos empresariais foram selecionados pela Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) para apresentar estudos de viabilidade técnica para a concessão da rodoviária. O prazo para que eles apresentassem o projeto que definirá os moldes da nova gestão era de 120 dias a partir da definição. Após a entrega, os estudos serão analisados por comissão técnica instituída pela pasta. A escolha do projeto não garante que a empresa ou o consórcio responsável pela elaboração seja vencedor da licitação.
700
mil
pessoas circulam pela Rodoviária do Plano Piloto diariamente
149
Quantidade de bancas abertas no terminal