|
|
A matriarca Rita Aucélio Valim faz aniversário hoje
|
Dona Rita aguardava a chegada da reportagem com o passatempo preferido: assistir a jogos de vôlei. Campeonato brasileiro ou mundial, qualquer partida do esporte a faz ficar com os olhos atentos, acompanhando cada movimento. O volume da tevê precisa estar bem alto para que ela analise, com o juiz, as jogadas.
Em 106 anos de vida, celebrados hoje, Rita Aucélio Valim nunca praticou o esporte, mas a senhora radiante guarda essa paixão ao lado de tantas outras histórias que a fizeram feliz e muito amada por todos que a conheceram em mais de um século de vida. Acorda todos os dias por volta das 10h, toma banho, passa perfume, coloca o relógio que vai usar no dia — sempre um modelo diferente do dia anterior — e vai para a frente da tevê assistir às partidas de vôlei. Rodeada de familiares, também conversa pelo telefone com os sobrinhos que moram longe.
Mineira de Uberaba, dona Rita é a sexta de nove filhos de Antônio Aucélio e Maria Alves do Nascimento. Menina arteira durante a infância e a adolescência, ela conta, entre muito risos, que vestia um vestido preto da sua mãe, pintava o rosto com pó de café e ia assombrar os irmãos durante a noite. Outra peça que pregou foi na cunhada Pérola. “Peguei o quadro da minha avó falecida e coloquei debaixo do travesseiro dela. Ela foi se deitar e deu de cara com a assombração, saiu correndo no carreirão”, recorda-se.
|
|
Fotos antigas lembram o dia do casamento com Joaquim de Assis Valim e momentos de alegria com os filhos
|
A menina travessa estudou em Uberaba, completou o antigo ginásio e ao conhecer, aos 21 anos, Joaquim de Assis Valim, durante um jogo de futebol, se apaixonou. À época, ele era noivo, mas rompeu o compromisso para ficar com dona Rita. “Tive que tomar ele da moça, que ficou com raiva de mim”, conta.
O casamento demorou sete anos para acontecer, pois seu Joaquim sofreu reumatismo severo e acabou desenvolvendo deficiência na perna direita. Depois de casados, tiveram cinco filhos e viveram juntos por 20 anos em Uberaba, onde cuidavam de um armazém. Aos 47 anos, porém, dona Rita perdeu o seu primeiro e único amor. Ao ficar viúva, cuidou do estabelecimento e dos herdeiros sozinha.
Entre as memórias dessa época, ela não se esquece das histórias dos filhos. José Aucélio, o único homem e o segundo mais velho, era o mais levado. Fugiu duas vezes de casa e veio morar em Brasília. O garoto trouxe o revólver do pai e confessou para a mãe, durante a entrevista, que alugava o quarto que dormia de noite e lavava pratos em restaurantes para ganhar um dinheiro extra. Dona Rita, atenta à conversa, sobressalta-se. “Isso ele nunca me contou!”
O coração aperta ao lembrar das duas filhas que morreram, a última, há dois meses. Todo amor que deu a elas, a matriarca distribui. Adotou como filhas de coração a nora, Selma, e sua cuidadora, Cristiane. “Eu tive cinco filhos, 20 netos, 28 bisnetos e quatro tataranetos”, diz, sem perder o sorriso e o orgulho do que considera ser sua maior conquista.
Mudança
Em 1967, ela se mudou com a família para Brasília. Ao ser questionada se tinha ajudado a construir a capital, afirma de prontidão: “Cheguei e ela já estava toda pronta”. Hoje, mora em um condomínio com quatro casas, todas de parentes, em Arniqueiras, próximo a Águas Claras.
Vilma Valim Gomes Pereira, 74 anos, filha do meio de dona Rita, afirma que o alto-astral da mãe é uma das características marcantes. “Hoje, ela agrega todos, desde nós, que somos filhos, os netos e os bisnetos, a maioria crianças, que chegam aqui e dão o maior abraço nela, de carinho, de amor. O bom astral dela é contagiante, as pessoas que cuidam dela, quem a conhece, todo mundo a adora.”
O filho mais travesso, José Aucélio Valim, 76, concorda que a energia da mãe é única. “Eu agradeço por ela estar viva até hoje, porque mãe é para sempre e, igual a ela, não tem. Ela tem um astral muito bom, quando ela está triste, eu faço molecagem. Ela fala que vai me bater e me dá alguns tapinhas bem leves. Ela está com 106 anos, e eu vou até os 110”, garante.
A segunda filha mais nova, Dilma Aucélio Valim Liberal Ferreira, 73, destaca que a mãe sempre foi muito vaidosa e adora sair e se divertir até hoje. “Mamãe sempre gostou de festa, de sair, de passear, até hoje ela é assim. Se precisar ficar até três horas da manhã, ela fica”, afirma. “Ela está vivendo tanto porque ela ama a vida. É incrível ter uma mãe assim.”
* Estagiária sob supervisão de Mariana Niederauer