RELEMBRANÇAS
Relembranças I
O homossexualismo entre a lua e a noite
Agosto era o mês preferido, porque a lua parecia ser feita de gelo, e trazia uma temperatura mais amena para quem passara o dia no sol, capinando a terra dura e quente, na esperança de “pingar uma chuvinha” prumode prantar milho e feijão.
A poltrona em fila única, e sem numeração ou estofado francês, era um cambito tirado do jumento no início da noite, depois da labuta de mais alguns “caminhos d´água” no açude. Eu ficava ali, cavucando os dentes, retirando uns pedaços de castanha de caju, que, junto com batata doce cozida, enganavam o bucho e amenizavam o ronco das tripas.
O privilégio do espetáculo colorido, frio, límpido, do sexo da lua com os gravetos da caatinga – resultando disso a prenhez do nada, mas gerando uma ode poética de vida. Talvez as estrelas fossem o resultado desse incesto, num momento tão poético quanto o esconder-se do sol no avermelhado das nuvens.
Bonito de descrever – lindo de ver, e transcendental de sentir.
A repetição tem o valor de um prêmio maior para os humanos: a obra divina das coisas do Criador. Repetidas, vistas quantas vezes nossos estados de espírito nos permitirem.
Eram assim, as noites de agosto, vistas da latada da casa da minha Avó. A beleza que a gente vê, e que infelizmente muitos não enxergam.
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Relembranças II
Reencontrando a infância livre
As brincadeiras da infância mudaram. Mudaram muito, e para pior. As crianças, embora a fase da idade continue a mesma, já não são mais crianças.
Nos anos que já se foram, brincar era fácil e se brincava com pouca coisa. Qualquer pouca coisa, para ser mais preciso.
Uma bacia com água, umas bolinhas de papel, e um estágio espiritual voltado apenas para a brincadeira. Era o suficiente.
Nos dias atuais – onde o capitalismo impõe todas as diretrizes das fases das vidas das pessoas – a brincadeira virou algo “comercializado” e embrulhado em papel celofane. Muitos só “brincam” nos “playground” dos shoppings. E aí, obrigatoriamente, precisam estar equipados com uma parafernália de protetores para não acontecerem os machucados. É viadagem demais! É frescura demais!
Quer dizer, se você não tem o “capital” para custear esses momentos, a criança não vai brincar. E dá os primeiros passos para virar um “nerd”.
Repare nessa foto postada, de uma criança feliz da vida, brincando. Uma inservível câmara de pneu de bicicleta, um pedaço de pau; descalço, correndo sem nenhuma proteção – apenas com a alegria da liberdade que a idade exige.
Liberdade com limites, diga-se!