Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Coluna do Calixto - Onde Reminiscências, Viagens e Aventuras se Encontram sábado, 13 de janeiro de 2018

QUEM SÃO OS ROHINGYAS E POR QUE SÃO PERSEGUIDOS PELOS BUDISTAS DE MYANMAR

 

QUEM SÃO OS ROHINGYAS E POR QUE SÃO PERSEGUIDOS PELOS BUDISTAS DE MYANMAR

(Robson José Calixto)

 Foto: Hannah Mckay Reuters.

 

Os rohingyas (ou ruaingás) é um povo que vive há séculos na região que compreende a divisa de Bangladesh, a sudeste, com a Birmânia (Burma), atual Mianmar, sendo que alguns estudiosos indicam a possibilidade de lá viverem desde o século VII, mas com toda certeza a partir do XV. Mais precisamente no atual estado de Rakhine, a oeste de Mianmar, sendo 1/3 da sua população, isto é, cerca de 1.000.000 pessoas.

 

 Fonte: AKM Ahsan Ullah.

 

A principal característica do povo rohingya é ser mulçumano arakenese, proveniente de Arakan (Arracão), bem como sunita. A principal característica da Birmânia é ser majoritariamente budista. Outra característica, como no Irã, na Birmânia há uma amálgama entre religião e estado, como dizem: “ser birmanês é ser budista”.

 

Os birmaneses dizem que os rohingyas são, na verdade, mulçumanos bengalis que migraram para Rakhine (anteriormente Rohang), durante e após o fim da colonização britânica (1824-1948), daí não tendo direitos sobre a terra, nem à cidadania birmanesa e nem serem considerados oficialmente como um grupo étnico, devendo voltar para a antiga Bengala Oriental (atual Bangladesh). Assim, os rohingyas fariam parte de um povo sem cidadania e pátria, isto é, sem proteção social-política e apátrida. O governo da Birmânia os considera "residentes emigrantes", que dizer, não são cidadãos da Birmânia e não são natos daquele país. Ademais, foram tomados deles documentação oficial. Sem documentos, sem status legal, sem permissão para estar no país, estabeleceu-se um círculo vicioso que impõe tremenda pressão nos rohingyas, além de lhes retirar direitos fundamentais.

 

Uma segunda característica dos rohingyas, mais voltada aos homens, é que são polígamos, tendo várias esposas e de cada esposa podem ter vários filhos e isso, supostamente, torna-se uma vantagem competitiva em relação aos birmaneses budistas, podendo superá-los em prole, na busca de empregos, de melhores oportunidades e, mesmo, se conseguissem, de poder. Para fins de controle do estado quanto à expansão das famílias muçulmanas, em termos de procriação, confinamento racial e profissão de fé religiosa, o grupo budista Ma Ba Tha apresentou conjunto de propostas de leis, sendo que uma delas já adotada, proibindo a poligamia. O homem que for pego com mais de uma esposa ou tendo uma esposa, mas convivendo maritalmente com outra mulher, poderá pegar pena de até sete anos de prisão. Restrições e objeções quanto a casamentos entre pessoas de diferentes religiões também foram impostas, só podendo se casar se não tiverem qualquer objeção e as mulheres de menos de 20 anos precisam ter consentimento dos pais. As mulheres não budistas precisam, também, esperar determinado tempo entre gestações, não podendo passar de dois filhos. Tudo isso para impedir que homens muçulmanos possam espalhar suas sementes de vida em mais de um ventre feminino e, que, por meio do casamento com budistas - o amor e a paixão não conhecem muito os limites religiosos - possam solicitar a cidadania birmanesa ou conversão ao budismo.

 

Nesse cenário de imensa tensão social, permitindo o surgimento de dois grupos: os que odeiam os rohingyas - ódio incentivado pelo estado - e os que defendem a causa. O ódio e a falta de cidadania dão abertura para abusos e perseguições (coletivas, pessoais e de gênero), restrições no direito de ir e vir, acesso à educação e atendimento médico, para a imposição de trabalhos forçados (ou isso ou a morte) e vexatórios, confisco de bens e propriedades e abusos sexuais, em particular a moças e mulheres em situações vulneráveis e sem defesa masculina de parente próximo, por policiais e outros representantes do estado.

 

A Birmânia se tornou independente em 1962, após golpe de militares, e o Partido Socialista tomou o poder, desestruturando a organização político-social preexistente dos rohingyas. Os militares fizeram, inicialmente, de tudo para isolar a Birmânia do resto do mundo, para suprimir a dissidência e a oposição e, ainda, para manter o controle da economia do país. Só posteriormente houve distensão e a realização de reformas democráticas e econômicas, visando realinhamento com o resto do mundo. Todavia a marca colonial permaneceu engendrada na alma dos birmaneses, por terem sido considerados como uma classe inferior, de nível mais baixo em relação a migrantes estrangeiros, que compreendia hindus muçulmanos, resultando em desconfianças, traumas e sentimentos de xenofobia. Daí evitar-se qualquer movimento estrangeiro que possa ameaçar a soberania do país. Esse ressentimento nacional contra estrangeiros alcança igualmente os rohingyas, por não serem considerados natos e por rememorarem que os birmaneses estiveram sob o jugo do colonialismo. Exemplo dessa bifurcação social ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, quando os birmaneses se alinharam com os japoneses e as minorias étnicas ao lado dos britânicos.

 

Em regra, monges budistas são pacifistas, mas antes da colonização britânica eles que retinham o poder sobre a Birmânia, cuidando em particular do sistema educacional. O fim das vantagens econômicas, sociais e pessoais dos budistas claro que gerou irritação, ressentimento e animosidade em relação aos não budistas. Com fim do colonialismo britânico, militares e monges budistas, esses organizados em um Grupo denominado 969, entraram em aliança, de forma que quem se opunha ao governo militar se opunha também ao budismo. Assim, enquanto os militares acendiam a chama nacionalista e movimentos de auto-preservação, os monges abatiam sua fúria ressentida e violenta contra quem não era budista, com foco nos muçulmanos, os rohingyas fazendo parte desse grupo. Ademais, os monges buscavam tornar o país mono-religioso. Contra a opressão houve resposta armada, que acirrou mais a situação.

 

Em 1977 os militares registraram os cidadãos considerados birmaneses, em ação prévia a censo nacional, visando excluir quem não era considerada cidadão da Birmânia. Com isso, no ano seguinte, cerca de 2000.000 rohingyas foram obrigados deixar o país e partir para Bangladesh. Nesse mesmo ano, o governo militar da Birmânia elevou o grau de abuso a partir de ação organizada brutal contra a população muçulmana, possibilitando prisões indiscriminadas, desabrigo, retirada de meios de renda, trabalho forçado, estupros, assassinatos e práticas de tortura.

 

Aproveitando-se dos atentados realizados em diferentes partes do planeta por jihadistas, autoridades birmanesas procuram colar a pecha de que os rohingyas são terroristas muçulmanos, incitando a população budista contra eles.

 

Notícia do G1, de 10 de janeiro de 2018 confirma o relatado acima: "O exército birmanês admitiu nesta quarta-feira (10) seu envolvimento no massacre de dez rohingyas, reconhecendo pela primeira vez a existência de cova comum para integrantes desta minoria muçulmana no estado de Rakhine, no norte do país. Moradores da aldeia de Inn Din e membros das forças de segurança admitiram que mataram dez terroristas bengalis, indicou o escritório do chefe do exército em uma publicação no Facebook (...)". (https://g1.globo.com/mundo/noticia/exercito-de-mianmar-confirma-existencia-de-fossa-comum-de-rohingyas.ghtml)

 

 

Com tanta perseguição e falta de perspectivas, a fome e a inanição se espalharam entre os rohingyas, cenário já visto em outras situações históricas quando se impõe a determinado seguimento a guetização, a falta de alimentos e auxílio médico. O taro (espécie de inhame), quando permitido ser obtido, não tem sido suficiente como alimento básico para os rohingyas. As perseguições institucionalizadas e a fome têm provocado novas ondas de migração, fazendo com que cerca de 500.000 os muçulmanos procurassem abrigos nos países vizinhos, aumentando as tensões sociais entre países

 

A migração para países vizinhos ou mais distante talvez fosse a opção mais segura, ao contrário, tem-se mostrado exposição ao terror e à maldade que pode impulsionar o ser humano, principalmente se o destino for a Tailândia, que também são predominantemente budistas (theravada), onde os rohingyas se tornam vítimas de tráfego humano para diferentes destinos. A pressão internacional, contudo, fez com que a Tailândia tomasse alguma atitude, concedendo proteção e abrigo humanitário. Os contrabandistas de seres humanos temendo a ação coercitiva começaram a abandonar as embarcações repletas de refugiados no mar aberto ou ilhas costeiras, deixando os migrantes rohingyas em situação precária, sem comida ou água. O pesadelo nessas viagens é tão grande, quando até o choro é proibido, que rohingyas desesperados preferem se lançar ao mar, afogando-se em suicídio, do que continuarem a ser martirizados.

 

 Foto: Christophe Archambault/AFP.

Foto: Christophe Archambault/AFP. 

Os migrantes rohingyas podem, também, ser abandonados em campos de transição visando a Malásia - que é majoritariamente muçulmana, onde também são vítimas de maus tratos e espancamentos, e as mulheres vítimas de estupro, violência e escravidão sexual. Muitas vezes são pedidos resgates às famílias de rohingyas para reaver parentes que se tornaram vítimas de sequestro ou mantidas em cativeiros. Quem consegue sobreviver a esses horrores e se estabelece em outros países, com pequenos negócios, busca ajudar seus parentes na própria Birmânia ou na Tailândia.

 

Pressão internacional vem buscando fazer com que os países que recebem migrantes rohingyas não os repudiem e não os devolvam para a Birmânia ou a Tailândia, mas assumam a proteção dos apátridas desassistidos.

 

Três rohingyas foram acusados, em maio de 2012, de estuprarem e assinarem uma mulher budista em Rakhine. A tensão explodiu e ambos os lados pegaram em armas, resultando em cerca de 200 mortes e milhares de pessoas, a maioria rohingyas, desalojadas e dispersas. Em 2014 foi realizado em censo, sem a opção das pessoas se autodeclararem rohingyas, a não ser bengalis. Se são bengalis não são birmaneses, portanto sem pleno direitos civis e sociais.

 

Aung San Suu Kyi, política de oposição birmanesa, vencedora do Prêmio Nobel da Paz em 1991 e secretária-geral da Liga Nacional pela Democracia (LND), é filha de Aung San, considerado o pai da Birmânia moderna (atual Mianmar). Ela vem recebendo críticas, entre outros, da jovem prêmio Malala Yousafzai, também Nobel da Paz, por ficar em silêncio a respeito da situação ou por considerar que a mídia internacional e a ONU exageram sobre o que está acontecendo com os rohingyas em Mianmar. (http://anoticia.clicrbs.com.br/sc/noticia/2017/09/malala-critica-suu-kyi-por-permitir-perseguicao-dos-rohingyas-9887714.html).

 

Aung San Suu Kyi se tornou Ministra das Relações Exteriores de Mianmar, mas internamente sabe-se que ela é que governa o país, inclusive sugeriu que não se usasse mais os termos "rohingyas" ou "bengalis" como referência ao grupo étnico sob opressão, visando "facilitar solução pacífica".

(https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/05/internacional/1483640044_209400.html).

 

O Papa Francisco chamou a atenção, em fevereiro de 2017, da comunidade internacional, durante a oração do Ângelus, sobre o a situação dos rohingyas em Mianmar, expressando a sua preocupação da seguinte forma: "Vão de um lugar a outro porque não lhes querem. São bons. Não são cristãos. São gente pacífica. São nossos irmãos e irmãs e há anos sofrem, são torturados, assassinados, simplesmente por seguir sua fé muçulmana". Ele esteve em visita pastoral a Mianmar, após relações restabelecidas com o Vaticano, sendo que em seus discursos e homilias oficiais, evitou usar o termo rohingya. (http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2017-11/papa-chega-mianmar-em-meio-pedidos-de-que-ignore-o-termo-rohingyas).

 

 Foto: Anadolu Agency/Getty Images. 

A situação dos rohingyas em Mianmar e na Tailândia é complicadíssima e como qualquer povo que ainda não tem sua situação territorial definida, vide os palestinos, precisam de um lar, de uma terra para chamar de sua, vivendo em paz com seus vizinhos, tendo garantias de alimentação, estudos e atividades culturais, cuidados médicos, de trabalho honesto e igualitário, de voto, de sonhos. Alguns comentaristas indicam que a perseguição institucionalizada imposta pelo governo de Mianmar e, mesmo, algo inimaginável, por monges budistas, aos rohingyas, já se trata de limpeza étnica, apesar de, irônica e maliciosamente, as autoridades birmanesas não considerarem os rohingyas um grupo étnico. Os registros sobre o que aconteceu em Kosovo estão aí. Queira Deus que os descendentes rohingyas tenham a compaixão em suas mentes, e não a vingança. As pessoas e a comunidade internacional precisam fazer pressão, em termos econômicos e na formação da opinião pública, para uma solução que seja duradoura para essa crise humanitária.

 

Obs.: O presente texto foi compilado a partir, principalmente, das seguintes referências:

 

  • Ullah, AKM A. - Rohingya Migration: Is It a Function of Persecution. University Brunei Darussalam.
  • Warzone Initiatives. Rohingya Briefing Report. October, 2015.
  • DW To Stories. Myanmar passes controversial ´anti-polygamy` law. 31.08.2015.
  • El País. Tragédia no ‘Mediterrâneo da Ásia`. https://brasil.elpais.com/brasil/2015/05/15/album/1431681891_076688.html#foto_gal_1.

 

Brasília - DF, 12 de janeiro de 2018. 

 


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