No dia 5 de setembro deste ano de 2018, por ocasião da apresentação do meu livro “Breves Anotações de um Andarilho”, declamei o poema “Poesia e Magistratura”, no Espaço Cultural STJ.
Acompanhou-me, ao violão de sete cordas, o também juiz federal Márcio Barbosa Maia.
POESIA E MAGISTRATURA
Certa vez, fui perguntado
Sobre como eu conseguia
Dedicar-me à poesia
Sendo eu um magistrado.
Vivendo tão ocupado,
Com as questões do Direito,
Como é que dava jeito
Para escrever rimando,
E também metrificando,
Fazendo verso perfeito?
Eu, antes de responder,
Calado, pensei assim:
Quem pergunta isso pra mim
Não conhece o “métier”
De quem tem que resolver
Toda sorte de conflito.
Que de perto escuta o grito
Da nossa sociedade
Clamando por igualdade,
Pedindo pena ao delito.
Ser poeta e ser juiz
O que há de estranho nisso,
Pra quem tem o compromisso
De ouvir a parte o que diz?
Que vê o olhar feliz
De quem ganhou a questão
E tem a satisfação
De sentir que fez Justiça
Reparando a injustiça
Que atingiu o cidadão?
Eu penso que a poesia
Está em todo lugar,
E quem vive a julgar
A encontra todo dia:
Quando o parquet denuncia
Quando o réu faz sua defesa
Quando a polícia traz presa,
Gente por ela detida,
É a poesia da vida
Que me chega de surpresa!
A poesia aparece
Quando o advogado
No pedido formulado
Diz: – Doutor, ela merece,
Todo dia sobe e desce
A ladeira da “Queimada”
Carregando uma enxada
Para trabalhar na roça
Não é justo que não possa
Ser agora aposentada.
A poesia é presente
No olhar do acusado
Seja quando é culpado,
Seja quando é inocente.
Na testemunha que mente,
E na que fala a verdade.
Na imparcialidade
Que todo juiz queria.
Veja quanta poesia
Em nossa realidade.
Por isso eu acho normal
Que todo bom magistrado
Venha a ser considerado
Poeta em potencial.
Incorre em erro fatal
Quem quiser fazer sentença
Somente com o que pensa
Sem revelar o que sente.
Um juiz desse, é urgente
Que se afaste, de licença.
Tulio Liebman lecionava,
Que a sentença é assim,
Vem de “sentire”, em latim,
E, dessa forma, ensinava:
Que na sentença se grava
Não somente o pensamento,
Mas também o sentimento
Do juiz que a profere.
Que ninguém desconsidere
Esse grande ensinamento.
Se o poeta, realmente,
Não é mais que um “sentidor”.
Que chega a sentir que é dor
“A dor que deveras sente”,
Juiz não é diferente
Quando cumpre sua função.
Mesmo quando a decisão
Em versos não se transforma
Na aplicação da norma
Há uma carga de emoção.
Fique tranqüilo, portanto,
Meu colega, magistrado,
Se, agora, aí sentado,
Lhe surpreender o pranto.
Pois não será por encanto,
Magia ou maldição.
É só manifestação,
Que nesse instante sentiste,
Do poeta que existe
Dentro do seu coração.