15 de outubro de 2019 | 04h00
A primeira edição brasileira da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC, na sigla em inglês) foi menos um simpósio sobre o conservadorismo, seus pensadores, suas ideias e pertinência na atualidade, e mais um evento político-partidário em defesa não só do governo, como da reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
Perdeu-se uma importante oportunidade de realizar no País uma apresentação séria do ideário conservador, há muito flagelado pela ignorância dos que o tomam como expressão do atraso ou, como foi o caso da CPAC Brasil, pelo sequestro do termo “conservador” por quem, na verdade, defende uma agenda autoritária e obscurantista.
A CPAC foi criada em 1974 nos Estados Unidos pela União Conservadora Americana, em conjunto com diversos grupos de ativistas, políticos e intelectuais ligados ao conservadorismo. O discurso inaugural foi proferido por Ronald Reagan, então governador da Califórnia e futuro presidente dos Estados Unidos pelo Partido Republicano (1981-1989). O evento ocorre anualmente com o objetivo de discutir estratégias para favorecer a difusão do ideário conservador e sua presença no debate público norte-americano por meio da representação política de seus defensores.
Fora a apresentação de alguns convidados norte-americanos, pouco se falou de conservadorismo propriamente dito. O que se viu nos dias 11 e 12 deste mês em um hotel de São Paulo foi uma louvação ao presidente Donald Trump, ao presidente Jair Bolsonaro e ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), saudado como “mitinho” em alusão a um dos apelidos de seu pai.
Essa reprodução histriônica e um tanto iletrada do evento conservador norte-americano em solo brasileiro serve mais para o divertimento de uns ou para a vergonha de outros, a depender de como as palestras foram recebidas pela audiência não convertida. O discurso da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, particularmente, diverte e envergonha em igual medida.
Mas o que deve causar preocupação verdadeira nos liberais democratas é o tom de algumas palestras em relação às oposições, sobretudo por terem sido proferidas por membros do atual governo. Não foram poucas as manifestações de desapreço e de hostilidade em relação a partidos e indivíduos que se opõem ao governo do presidente Jair Bolsonaro.
A julgar pelo que disse na CPAC Brasil, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, vê seu chefe como o ungido que fará o Brasil ressuscitar após a “morte” provocada pela ação dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula da Silva. FHC foi comparado à aids por Weintraub, aquele que teria “enfraquecido o País” e permitido que a “tuberculose” (Lula da Silva) se instalasse e “matasse” o Brasil.
A já citada ministra Damares Alves classificou as oposições como o “cão”, no sentido diabólico do termo. O governo e seus simpatizantes, na visão da ministra, devem se organizar para impedir o triunfo do “mal”. A mesma mensagem, embora menos caricata, foi a tônica das apresentações dos ministros das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Ou seja, para o governo Bolsonaro dar certo, seus opositores hão de ser neutralizados.
Não só as oposições foram alvos na CPAC Brasil. Coube à imprensa livre e profissional uma boa dose de hostilidade. Nada a que não esteja acostumada, posto que não seria “livre” e tampouco “profissional” caso se deixasse levar por pressões de governos e seus adeptos.
A primeira edição da CPAC no Brasil não foi um evento conservador. Foi um evento reacionário. Os conservadores continuam carentes de uma representação política à altura de sua importância.