SÃO PETERSBURGO - Philippe Coutinho está na Rússia acompanhado dos pais, dos irmãos e de Aine, sua mulher. Tem sido assim há 11 anos, desde que iniciou o namoro com a menina que viria a se transformar em esposa e mãe de sua filha. No casulo onde vivem, só há espaço para eles e meia dúzia de amigos. É com eles que verbaliza algo que dificilmente será dito diante das câmeras ou de um gravador — Neymar que o perdoe, mas ele também chegou à Copa do Mundo disposto a ser protagonista. Nesta sexta-feira, às 9h, enfrenta a Costa Rica na Arena Zenit, em São Petersburgo, em busca do segundo passo nesta direção. O golaço contra a Suíça, na estreia, foi o primeiro. Coutinho é daqueles jogadores que falam com os pés.
Aos 26 anos, Coutinho disputa seu primeiro Mundial — ficou fora da Copa de 2014, e seu estilo retraído talvez tenha colaborado para ser preterido por Luiz Felipe Scolari. De tão tímido, não possui assessoria de imprensa há tempos. Prefere vender seu peixe em campo. Impossibilitado de atuar pela esquerda, lugar cativo de Neymar, não se fez de rogado ao surgir a oportunidade de trocar o lado direito do ataque da seleção de Tite pelo meio de campo. Aceitou e passou a ser ainda mais importante para a equipe. Contra a Suíça, recebeu passes em 11 dos 18 quadrantes do campo, de acordo com as estatísticas da Fifa. Ninguém se movimentou mais do que ele.
É dentro das quatro linhas que o jogador revelado no Vasco sai da toca e hipnotiza. Nas comemorações dos gols, um traço recorrente, tanto na seleção quanto nos clubes que defende: o tímido Coutinho celebra sempre com raiva, os punhos cerrados, as veias do pescoço dilatadas, é como se extravasasse de uma só vez tudo aquilo que não se permite dizer quando não está calçando as chuteiras. Dancinhas ou homenagens não são com ele.
O CHUTE CERTEIRO
Outra maneira que Coutinho encontrou para se expressar foi nas tatuagens pelo corpo. Além do Mickey Mouse no abdômen, quatro delas chamam a atenção: cada naipe do baralho pintado em um dedo da mão esquerda. Sua cartada em campo, porém, é sempre a mesma. Philippe Coutinho lembra Robben, o veterano craque holandês do Bayern de Munique.
Todo mundo sabe que ele vai pegar a bola no lado esquerdo, carregá-la para o meio e chutar com o pé direito. Mesmo assim, evitar o chute certeiro é tarefa árdua para qualquer goleiro. Foram quatro finalizações contra a Suíça. Somente Neymar buscou tanto o gol na estreia quanto ele.
Esse protagonismo do jogador do Barcelona faz jus ao número que carrega nas costas na Rússia. Coutinho veste a 11, um dos números mais importantes da história da seleção brasileira e que, ironicamente, carrega muita irreverência. Foi com ele que Romário brilhou mais do que todos na conquista do tetracampeonato, em 1994, nos Estados Unidos, e que Ronaldinho Gaúcho levantou o penta, em 2002, na Ásia. Robinho também dava suas pedaladas com a 11 em 2010. Todos eles jogadores, em termos de personalidade, completamente opostos a Philippe.
A timidez vem de casa — no hotel que concentra todas as famílias dos jogadores da seleção brasileira em Sochi, seus familiares estão entre os mais discretos no saguão — e não revela nem mesmo a história já escrita.
Apesar de idolatrado pelo Vasco — é considerado o último craque revelado em São Januário —, ele se deixa levar pela timidez e tem vergonha de visitar sozinho o clube onde surgiu para o futebol.
Mas de vez em quando o clã Coutinho se permite sonhar. No jogo inaugural da Copa da Rússia, a câmera deu um close na Taça Fifa e gerou um pensamento em voz alta:
— Imagina ele segurando essa taça no final...