Existem nomes que são fáceis de o torcedor brasileiro associar com os Jogos Paralímpicos. Na natação, Daniel Dias. No atletismo, Terezinha Guilhermina. No futebol de 5, onde o Brasil se prepara para a semifinal, contra Marrocos, nesta quinta, às 7h30 (de Brasília), basta falar de Ricardinho que gols e medalhas vêm à mente. É o ícone de uma modalidade que nunca deixou o país fora do lugar mais alto do pódio no evento.
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Desde que o futebol de 5 foi introduzido no calendário, em Atenas-2004, a seleção foi ouro em todas as edições (quatro no total). Na história dos Jogos, atuou 25 vezes, com 20 vitórias e cinco empates. Além disso, desde o vice-campeonato da Copa do Mundo de 2006, os brasileiros só não ocuparam o topo do pódio em algum torneio na Copa América de 2017, quando perderam na final para a Argentina e interromperam a sequência de 24 títulos seguidos na modalidade.
O sucesso brasileiro passa por uma mistura de talentos, investimento e organização. Mas, antes de tudo, vem a cultura do esporte. Embora ele esteja há apenas 17 anos no programa paralímpico e o primeiro Mundial tenha sido realizado em 1998, a prática no país remonta há cerca de 70 anos.
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Desde a década de 1950 há relatos de jogos em instituições voltadas para cegos. Embora o Comitê Paralímpico Internacional considere um torneio de 1986, na Espanha, como o primeiro entre clubes da história, a Confederação Brasileira de Desportos para Deficientes Visuais (CBDV) relata que o Brasil já organizava competições desde 1978. É a entidade quem gere o esporte no país.
— Ela organiza os campeonatos regionais, estaduais e o Brasileiro, nas séries A e B. Atualmente existem 91 equipes cadastradas que participam de todo o calendário de competições — explica Renato Redoválio, professor do Instituto Benjamin Constant, no Rio, e comentarista do SporTV e da TV Globo durante a Paralimpíada.
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Destas dezenas de clubes, três formam a base da seleção brasileira que está em Tóquio. Quatro deles atuam juntos na Associação Gaúcha de Futebol para Cegos (Agafuc), de Canoas. Casos do goleiro Luan, de Tiago Paraná, de Ricardinho (eleito três vezes o melhor do mundo) e do artilheiro da Paralimpíada de Tóquio, Nonato. A Associação Maestro da Bola, de Curitiba (do ex-jogador de futebol convencional Ricardinho), e a Associação Paraibana de Cegos (Apace) completam este tripé.
— Todos os atletas da seleção brasieira são profissionais, vivem exclusivamente do futebol de 5. Na Argentina, nossa maior rival, por exemplo, a maioria são amadores — aponta Felipe Menescal, gerente técnico e de eventos da CBDV e que, em Tóquio, atua como coordenador da seleção. — Sem dúvida, a profissionalização da modalidade é um dos pilares que mantém a seleção forte.
O alto nível técnico e de organização do mercado brasileiro atrai, inclusive, atletas de outros países. Como Argentina e Colômbia.
— Se você tem competição nacinal forte vai potencializar a técnica do atleta. E isso se reflete na convocação da seleção — completa Menescal.
A preparação é outro trunfo. Normalmente, os jogadores se reúnem mensalmente no CT paralímpico, em São Paulo. À medida que as principais competições se aproximam, este período chega a ser de dez dias por mês. A cada encontro, dois atletas de linha e um goleiro da seleção sub-23 também são convocados para treinar junto com a equipe principal. Antes da pandemia, a comissão técnica convocava equipes tanto sub-23 quanto sub-15, uma forma de preparar a renovação.
Mais trocas de passes
O país não reina sozinho no esporte sem concorrência. Únicos campeões mundiais além do Brasil (2002 e 2006), os argentinos são a segunda força do esporte. Eles farão a outra semifinal do torneio contra a China, exemplo de evolução no cenário mundial.
— O campeonato argentino é forte, com um trabalho de renovação interessante. Outras seleções que evoluíram foram a chinesa e a japonesa. Também a Tailândia, que começou a jogar futebol de 5 há pouco tempo e já vem dando trabalho no campeonato asiático; e Marrocos, atual campeã africana — aponta Redoválio.
O estilo de jogo também diferencia o Brasil de seus concorrentes. Mesmo com muitos talentos individuais, a seleção não abre mão da coletividade.
— O Brasil em estilo de jogo dferente da maioria dos países. Tem muito toque de bola, passe, o que é mais difícil no futebol de 5. Em geral, o atleta pega a bola, faz uma jogada individual e chuta para o gol. A gente troca passes para desgastar a defesa e conseguir avançar — conclui Menescal.