Aos 16 anos, Renderson de Oliveira, hoje com 31, limpava cocheiras. Chegou a viajar para duas edições de Jogos Pan-Americanos como tratador de cavalos. E na segunda-feira, subiu ao pódio como atleta do Time Brasil, em Santiago, no seu primeiro ano disputando grandes prêmios. Pode ainda deixar o Chile com mais uma conquista: hoje, ele disputa a prova individual no Freestyle (Top 20), na Escola de Equitação do Exército em Quillota, região de Valparaiso, sede do hipismo nos Jogos. O Brasil terá três conjuntos.
Após 48 anos da conquista do primeiro bronze por equipes no Pan de 1975, o Brasil arrematou a primeira prata por equipes. E teve além de Renderson, João Victor Oliva, filho de Hortência, Manuel Tavares de Almeida e Paulo Cesar dos Santos. Na prova, o vencedor foi os EUA com 450,670% e o Canadá, bronze (431,937%). O Brasil obteve 443,343%.
— Frequento esse ambiente do esporte como tratador de cavalos há tempos. Sonhava estar em um Pan, uma Olimpíada, em competições internacionais deste porte. E pude realizar em Santiago. E sabendo do cavalo especial que tenho nas mãos... é ainda mais gratificante. É mais do que um sonho — disse Renderson, sobre o garanhão Fogoso, que foi a Tóquio-2020 com o português Rodrigo Torres: — O nosso conjunto está preparado para Paris.
Com a prata, o Brasil garantiu vaga nos Jogos de Olímpicos-2024, mas precisa habilitar um terceiro cavaleiro. Renderson e João Victor têm pontuação suficiente, só que é preciso ter três conjuntos (alguns cavaleiros têm chance).
— A prata empolgará os cavaleiros. Tenho certeza que confirmaremos a vaga — acredita Renderson, que se emocionou por ter feito a melhor prova da vida, com 72% de aproveitamento.
Representatividade
Renderson diz que “sempre foi atleta” e que gosta de competir. Montando Fogoso, da Campline (em Portugal), o brasileiro pode quebrar um tabu: ser o primeiro cavaleiro preto a representar o Brasil em Jogos Olímpicos.
No pódio do Adestramento em Santiago, ele era o único cavaleiro preto. Renderson, que se diz orgulhoso com a façanha, afirma que a dificuldade de ter acesso ao mundo elitizado do hipismo se potencializa para pretos.
— É um esporte caro, de difícil acesso, independentemente da cor da pele. Tem muita gente com força de vontade e que poderia estar aqui. E o que falta para elas são oportunidades. Eu era o único preto ali, mas conheço vários com capacidade para estar no mesmo lugar — diz Rederson:
Renderson teve como padrinho Rogério Clementino, que era cavaleiro no haras Ilha Verde, da família de João Victor. Foi lá que ele trabalhava.
Vida na Europa
Natural de Ituiutaba (MG), ele se mudou para Araçoiaba da Serra (SP), perto da capital paulista. Morava com os avós e limpava 30 cocheiras por dia. Depois passou a ser tratador de cavalos e chegou a montar pelo haras, estreando em competições nacionais.
Rogério Clementino, que ensinou Renderson a montar, poderia ter sido o primeiro brasileiro preto a disputar uma Olimpíada, em Pequim-2008, mas o cavalo dele não passou na inspeção veterinária e não competiu.
— Minha vontade de estar lá é grande. Não como o primeiro preto, mas como atleta brasileiro — afirma Renderson, que chegou a seu atual haras, em Portugal, após os Jogos de Tóquio, quando foi o tratador do cavalo de João Victor:
— O meu ciclo começou há cerca de dois anos e meio. Morar na Europa, estar perto dos melhores... Uma baita oportunidade. Mais uma. Quando se tem um bom cavalo, tudo é possível. E quero esse pódio inédito.
*A repórter viaja a convite da Panam