Palmares, cidade localizada na região da Mata Sul do Estado de Pernambuco quase fora varrida do mapa pelas águas das duas enchentes devastadoras ocorridas em 2010 e 2011. Depois desses tsunamis temporais ergueu-se soberana com a sobriedade de sua gente guerreira que a ama e hoje é uma cidade linda, encantadora, recuperada das tragédias e em plena ebulição progressista.
Passadas as enchentes que transbordaram o Una, o que se via era um cenário de campo de batalha a perder de vista, destruição total, como se um bombardeio intenso onde o inimigo não escolheu em quem atirar. Casas, lojas, cartórios, delegacia, prefeitura, cemitério, igrejas, praças, parques de diversão, padarias, supermercados, cinemas, teatros, nada escapou à enxurrada devastadora das enchentes, que tiveram como elemento determinante para a tragédia a junção do sangramento de várias barragens circunvizinhas pressionando o Una, que não suportando a pressão das águas acumuladas em sua cabeceira, rompeu-se e destruiu Palmares.
Era triste e doloroso, assustador e deprimente vê aquele cenário de destruição, logo após baixar as águas. Tudo que havia ali catalogado, identificado, organizado, historiado, virou um amontoado de escombro, lixo não reciclável, onde até mesmo os moradores mais antigos da cidade desconheciam onde estavam, e indagavam se aquela era realmente a sua cidade ou uma cidade qualquer de outro país qualquer, devastada por uma guerra civil onde o inimigo saiu atirando e jogando bombas a esmo em tudo que via pela frente para nada escapar com vida. Assim ficou Palmares após as enchentes acachapantes, que vieram como um inimigo letal para destruí-la, varrê-la do mapa do Nordeste, como nas antigas cidades romanas destruídas pelas lavras dos vulcões em erupção.
Em meio a esse cenário triste, doloroso, deprimente e quase irrecuperável, uma cena hilária e improvável chamava a atenção. Um sujeito que havia se separado de sua esposa há mais de três anos, parasita, morando no primeiro andar de uma casa em ruína, no Centro, imóvel que ficou de pé depois das enchentes, cantava de galo feito um galo capão, sendo conservado para ser degustado em véspera de natal.
Energúmeno de uma classe que cresce assustadoramente no mundo moderno, essa espécie humana é capaz de mil e uma facetas para ficar perto da ex amada, para saber que se ela está feliz, com quem está feliz, e se parece estar feliz, porque ele, o capão, não teve a capacidade de fazê-la feliz quando junto estavam. Nem teve a sensatez de ajudá-la no momento mais crucial da destruição devastadora da cidade pelas enchentes
É público e notório constatar o espaço que hoje a mulher ocupa na sociedade na busca sóbria pela independência de ser feliz, está junto de quem ama e a faz feliz; e o homem, antes varão e potentado, dominador, ver a mulher se lhe distanciando em busca de sua felicidade, independe dele!
Sujeito insensível, incapaz de um gesto de carinho, cortesia, solidariedade. Sua alegria consistia no sofrimento e dor da ex, que, sem ele, deu a volta por cima, recuperou a loja de móveis que foi destruída pelas enchentes e mostrou que a vida “é bonita, é bonita, e é bonita”, e que “tudo vale apenas quando a alma não é pequena”. E que lutar é preciso. E venceu!
Eis uma grande lição de vida para que não fique à margem da realidade humana: o tempo é o senhor de todas as certezas e incertezas da vida. O que hoje parece utopia, com luta, determinação, humildade e trabalho, amanhã se torna uma linda vitória de superação. E o homem-capão ficará sem entender por que sua ex deu a volta por cima e recuperou o que não perdeu: a felicidade, a determinação, a dignidade, a coragem e a vontade de vencer.
Passados mais cinco anos das duas tragédias que quase varria Palmares do mapa, o homem-capão, continua lá feito um piolho-de-cobra, um sanguessuga, parasitando feito um chupa-cabra, morrendo lentamente de desamor, e a sua ex se ergue vencedora, com trabalho, determinação, coragem, luta e cantado: Olhos nos olhos, quero ver o que você diz, quero ver como suporta me ver tão feliz, e que venho até remoçando, me pego cantado, sem mais nem porquê, e tantas águas rolaram, quantos homens me amaram bem mais e melhor que você, do gênio de Chico Buarque, como uma resposta do amor que tudo refaz, reconstrói, se ergue e que ele, o capão, não soube reconhecer nem cuidar.
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Palmares é uma das cidades mais tradicionais de Pernambuco. O seu nome recorda o Quilombo dos Palmares, localizado em Alagoas, que, no começo do século passado, se constituiu em República Independente, sob a denominação de República dos Palmares. Com a chegada dos trilhos da estrada de ferro sul de Pernambuco, em 1862, a população cresceu consideravelmente. Tendo em vista a posição privilegiada da cidade, a estrada de ferro instalou no local o escritório central da administração, oficinas, almoxarifados e armazéns, tornando Palmares o centro comercial da região.
Palmares foi elevada à categoria de cidade pela Lei provincial nº 1.093, em 24 de maio de 1873, desmembrando-se do município de Água Preta.
Administrativamente, Palmares está constituída pelos distritos sede de Santo Antônio dos Palmares e pelo povoado de Usina Serro Azul. Anualmente, a cada dia 09 de junho Palmares comemora a sua emancipação política.
Seu nome é também uma homenagem ao Quilombo dos Palmares, que se instalou na região durante muito tempo.
Terra dos poetas. É assim que Palmares é conhecida por ser berço de grandes poetas e romancistas. Poetas da importância dum Ascenso Ferreira (1895-1965), Adalberto Marroquim, Afonso Paulo Lins, Aloisio Fraga, Amaro Matias. Ângelo Mayer, Antônio Veloso, Artur Griz, Calazans Alves D’ Araújo, Eliseu Pereira de Melo, Eurípedes Afonso Ferreira, Juarez Correya, Luiz Alberto Machado, Manoel Bentevi, Paulo Profeta, Raimundo Alves de Souza, dentre outros.
Romancistas do quilate de Hermilo Borba Filho (1917-1976), autor de Os Caminhos da Solidão (1957), A Porteira do Mundo (1967), Deus no Pasto (1972), entre outros; Luiz Berto Filho, autor do Romance da Besta Fubana (1984), Memorial do Mundo Novo (2001), A Guerrilha de Palmares (1987), dentre outros.
Palmares tem muita história para contar. Além de grandes poetas, romancistas, cantadores, repentistas, o município possui o primeiro teatro a funcionar no interior e o terceiro mais antigo do Estado, além de abrigar a primeira loja maçônica de Pernambuco.