Toninho era um homem de quarenta anos, boêmio, poeta, namorador e escritor. Vivia apaixonado…Separado da mulher, tinha desistido de se amarrar novamente. Gostava de paixões violentas e aventuras amorosas complicadas.
Mulher casada safada, se fosse bonita e gostosa, era com ele mesmo. Bonitão e insinuante, era também devorador de livros. Um intelectual.
Nas suas andanças pelas portas dos comes e bebes dos bares da vida, conheceu Rosalinda, quando ela e o marido saboreavam um opíparo almoço, em um dos melhores restaurantes da cidade.
A mulher, loura, nova e bonita, dona de um corpo escultural, cravou-lhe os olhos verdes, e Toninho se sentiu fortemente atraído por ela. Flertaram descaradamente, e o marido, almoçando de cabeça baixa, nem ao menos percebeu a troca de olhares entre os dois. Em certo momento, aproveitando a ida do marido da beldade ao banheiro, o conquistador Toninho arranjou um jeito de passar pela mesa do casal. Discretamente, entregou à mulher o seu cartão de apresentação, com telefone e endereço. Ela o guardou imediatamente.
No dia seguinte, Rosalinda lhe telefonou e os dois combinaram um encontro. Tornaram-se amantes fervorosos, passando a frequentar motéis, sempre durante o dia, no horário em que o marido se encontrava no seu consultório.
O tempo passou, e o romance se estendeu por meses.
Muito coquete, Rosalinda traía o marido, desde o início de sua vida de casada. Ele, muito ingênuo, vivia para o trabalho. O homem levava mais chifres do que pano de toureiro. Suspeitava da traição da mulher, mas não queria acreditar, pois a amava loucamente. Era o chamado corno “cuscuz” (abafado).
Os amigos já haviam tentado alertá-lo para os boatos maldosos que circulavam na cidade, sobre a suposta infidelidade da sua mulher, mas ele cortava o assunto, dizendo que isso tudo era inveja, por causa da beleza dela. Não se cansava de dizer que ela era uma santa.
O casal não tinha filhos, pois a mulher dizia que, por enquanto, não queria deformar seu belo corpo.
Num certo dia, o marido viajou para um congresso da área odontológica, em Fortaleza (CE). Avisou à esposa que somente estaria de volta no domingo pela manhã.
Feliz da vida, Rosalinda deu o sinal verde para que, no sábado, o namorado viesse encontrá-la em seu próprio apartamento. A farra foi grande. Foi um início de tarde maravilhoso, e tinha tudo para ser inesquecível. Os dois amantes não se cansavam de trocar carinhos, e o encontro prometia superar os anteriores. O sabor do fruto proibido contribuiu para isso. Afinal, eles usavam a própria cama onde Rosalinda e o esposo dormiam.
Mas a vida apronta grandes surpresas…
O marido de Rosalinda, sem “aviso prévio”, e pensando em agradá-la, antecipou sua volta para o sábado.
Quando menos esperavam, os amantes, quase exaustos da maratona amorosa, foram surpreendidos pelo barulho do carro do dono da casa entrando na garagem.
Apavorados, pularam da cama. Toninho vestiu a cueca, agarrou a calça e a camisa nos braços, e pulou a janela do quarto, correndo para o apartamento do vizinho, seu velho e conhecido amigo. Como era sábado, a rua estava deserta. Por sorte, o amigo ouviu sua voz e mandou que entrasse. Dentro do apartamento do vizinho, Toninho terminou de se vestir e, bastante nervoso, já se preparava para ir embora, quando pôs no rosto os óculos que trazia nas mãos. Notou, então, que aqueles óculos não eram os seus. Estava sem enxergar absolutamente nada, pois usava um grau muito mais forte´, chamado “fundo de garrafa”.
A ficha, então, caiu!!! Ele trocara seus óculos pelos óculos do marido da amante!!!
Apelou, então, para o amigo, e insistiu para que ele fosse ao apartamento do dentista traído, efetuar a troca. Velho conhecedor das peripécias amorosas do poeta, mesmo vendo a sua aflição, o amigo recusou-se a atendê-lo. Naquela hora, isso seria coisa de louco! Seria humanamente impossível!!!
Rindo muito, disse para o poeta que ele criasse juízo. Não aprovava suas loucuras, nem iria arriscar sua vida, se envolvendo num caso sórdido e leviano.
De repente, o dentista traído bateu na janela do vizinho, trazendo nas mãos os óculos do poeta e pedindo pelo amor de Deus que ele devolvesse os seus. Tinha percebido que o traidor, seminu, entrara no apartamento do vizinho, carregado de pertences, e com certeza havia, por equívoco, deixado os seus óculos “fundo de garrafa” e levado os dele.”