08 de abril de 2020 | 03h00
O presidente Jair Bolsonaro esteve a ponto de demitir seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, segundo informações de bastidores que circularam em Brasília ao longo de toda a segunda-feira. Não o fez, mas isso não significa que não venha a fazê-lo no futuro próximo, a julgar pelo clima de crispação criado pelo próprio Bolsonaro, empenhado nos últimos dias em desmoralizar publicamente o ministro Mandetta mesmo diante da brutal crise sanitária causada pela epidemia de covid-19.
O motivo do recuo de Bolsonaro não ficou muito claro, assim como já não eram muito claros os motivos pelos quais o presidente estava investindo contra um de seus ministros – e não um qualquer, mas sim, justamente, aquele sobre cujos ombros está a responsabilidade de organizar os esforços do governo federal para enfrentar a epidemia. Sob a Presidência de Bolsonaro, a rigor, nada parece fazer muito sentido, a não ser para a chamada ala “ideológica” que assessora o presidente, e para a qual tudo se resume à luta pelo poder contra os “comunistas” – nome genérico de todos os que essa turma considera como inimigos.
Seja como for, o recuo de Bolsonaro em sua escalada contra o ministro Mandetta, ainda que provavelmente seja apenas momentâneo, é um indicativo de que o presidente se viu limitado pelas circunstâncias. Ou seja, teve que se conformar com as coisas como elas são, e não como os bolsonaristas radicais que o cercam gostariam que fossem.
Essa informação confirma o papel de “gerente” do governo assumido pelo ministro Braga Netto, formalmente escalado para comandar o comitê de crise que coordena as ações do governo durante a epidemia. A Casa Civil tem entre suas funções primárias justamente a de coordenar a ação do Ministério, mas atualmente, em razão das características caóticas da governança de Bolsonaro, seu titular também está tendo de fazer entrar em forma a própria Presidência.
Assim, o ministro Braga Netto, general que se destacou ao liderar a intervenção federal no Rio de Janeiro em 2018, parece trabalhar ao mesmo tempo como uma espécie de moderador no Palácio do Planalto em face do avanço da ala “ideológica” dentro do governo – a ponto de um de seus principais expoentes, o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente e líder do chamado “gabinete do ódio”, ter ganhado uma sala ao lado do gabinete do pai. Não à toa, partem de Carlos Bolsonaro alguns dos piores ataques nas redes sociais aos militares que estão no governo e que, como Braga Netto, tratam de temperar os ímpetos voluntaristas do presidente.
A tarefa dos militares hoje lotados no governo, portanto, tem sido a de proteger o presidente Bolsonaro de si mesmo e do tal “gabinete do ódio”, dirigido a distância por um ex-astrólogo que mora nos Estados Unidos. Essa figura extravagante, ao exigir a demissão de Luiz Henrique Mandetta, escreveu nas redes sociais que o ministro da Saúde “é o exemplo típico do que acontece quando um governo escolhe seus altos funcionários por puros ‘critérios técnicos’, sem levar em conta a sua fidelidade ideológica”.
Ao desestimular a demissão do ministro Mandetta, o general Braga Netto e outros que nisso se empenharam provavelmente atuaram pela lógica segundo a qual essa atitude intempestiva minaria o governo a ponto de ameaçar sua própria continuidade. É justamente esse clima de confronto e até de ruptura que interessa muito aos fanáticos do “gabinete do ódio”, que apostam no caos, mas não interessa nada ao País, que precisa desesperadamente de tranquilidade política para atravessar a tormenta.