Otto Karpfen nasceu em Viena, Áustria, em 9/3/1900. Ensaísta, crítico literário e de artes, jornalista, doutor em filosofia, estudou matemática (em Liepzig), sociologia (em Paris), literatura (em Nápoles) e política (em Berlim), além de dedicar-se à música. Foi um dos poucos intelectuais onde o termo “polímata” (a pessoa, que conhece muitas ciências) é bem aplicado. Filho do judeu Max Karpfen e da católica Gisela Schmelz Karpfen, cursou o ginásio em Viena. Por sugestão dos pais, ingressou num curso de direito, mas fez apenas o 1º ano. Em seguida concluiu diversos cursos superiores nas ciências exatas, porém “nunca me aproveitei praticamente desses estudos. Mas aí aprendi algo de método e precisão de pensar, o que é vantajoso no mundo sempre um pouco vago das letras”.
Dedicou-se intensamente à literatura e ao jornalismo político, carreiras que exerceu em Viena como redator da revista “Berichte zur Kultur und Zeitgeschichte” e articulista do jornal “Neue Freie Presse”. Em 1930 casou-se com Hélene Silberherz e converteu-se ao catolicismo em 1933. Era bem relacionado em Viena e tornou-se homem de confiança de dois primeiros-ministros: Engelbert Dollfuss e Hurt Schuschnigg. Com a tomada da Áustria por Hitler, foi obrigado a seguir para o exílio, em 1938. Primeiro para Antuérpia, onde trabalhou na “Gazet van Antwerpen”. Com a expansão do nazismo, sente-se inseguro na Europa e embarca para o Brasil em 1939. Mudou seu sobrenome germânico Karpfen para o francês “Carpeaux”. Chegou aqui de “mala e cuia”, com a mulher, sem conhecer nada do idioma e sem conhecidos, mas com uma enorme bagagem cultural e falando diversos idiomas.
Após um ano de trabalho como imigrante em fazendas do Paraná, e com o domínio do português, partiu para São Paulo. Com dificuldades, foi sobrevivendo com a venda de alguns pertences, incluindo seus livros de arte. Em 1941 escreveu uma carta ao crítico literário Álvaro Lins oferecendo um artigo sobre Eça de Queiroz. Recebeu como resposta um convite para trabalhar no “Correio da Manhã” (RJ). Assim, inicia a carreira de crítico e ensaísta dos mais conceituados na literatura brasileira. No ano seguinte naturalizou-se brasileiro e publicou seu primeiro livro de ensaios: Cinzas do purgatório, revelando uma inteligência e uma erudição incomum na intelectualidade local. Pouco depois foi trabalhar num lugar privilegiado para um autodidata interessado em conhecer melhor a cultura que abraçou: a Biblioteca da Faculdade Nacional de Filosofia (1942-1944).
Em seguida foi dirigir a Biblioteca da Fundação Getúlio Vargas (1944-1949), onde encontrou tempo para publicar sua monumental História da Literatura Ocidental (1947), uma das mais importantes obras publicadas no Brasil no séc. XX. A obra já foi lançada em diversos volumes pela Editora Cruzeiro (1959), Alhambra (1978) e Editora do Senado Federal (2008). Em seguida a Editora Leya, lançou a obra em 4 volumes e mais tarde (2019), toda a obra numa caixa em 10 volumes, Tornou-se um dos pesos pesados da “intelligensia” brasileira, assumindo o cargo de redator-editor do Correio da Manhã, em 1950. No ano seguinte publicou a Pequena bibliografia crítica da literatura brasileira, reunindo em ordem cronológica mais de 170 autores nacionais. A partir daí sua produção literária é intensa e variada, publicando ensaios, artigos políticos, crítica literária etc.
Seu trabalho na imprensa e a obra que deixou publicada constituem-se numa expressiva contribuição às nossas letras, dando um novo rumo à história da literatura brasileira. O fato de ser gago, o afastou da cátedra e das universidades para confiná-lo aos gabinetes e redações. Em 1968, anunciou o fim da carreira literária, prometendo dedicar o resto de seus dias à luta política, fazendo oposição ao regime militar instaurado em 1964. Por essa época trabalhou ao lado de Antônio Houaiss, como coeditor da Grande Enciclopédia Delta-Larousse. Além de ensaios sobre literatura, publicou livros sobre música, história da arte e política. Faleceu em 3/2/1978 vitimado por um infarto.
Seu livro Uma nova história da música, lançado em 1958, passou por diversas reedições até 2001, quando teve o título mudado para O livro de ouro da música: da Idade Médica ao século XX, lançado pela Ediouro. A Editora Topbooks lançou seus Ensaios Reunidos em 1999 (vol. 1) e 2005 (vol. 2), contendo quase duas mil páginas. Ao todo, teve oito publicações póstumas, sendo a última, O canto do violino e outros ensaios, publicada pela Ed. Danúbio em 2016. A Editora do Senado Federal conta com uma versão digital para download gratuito de alguns volumes da História da Literatura Ocidental.
Como se vê, Carpeaux continua vivo entre nós compartilhando seu arsenal de conhecimentos na literatura, na música, na política, na vida. Para Antônio Cândido, ele era uma espécie de “herói civilizador”, que se instala no país e contribui de forma decisiva para a atualização do meio literário e a formação de novas gerações da crítica literária. Alfredo Bosi, um de seus discípulos, chegou a reconhecer em breve ensaio sua dívida com o mestre. Sergio Augusto acha que ele foi o maior intelectual brasileiro de todos os tempos. Consta que sua mais completa biografia foi publicada por Mauro Souza Ventura: De Karpfen a Carpeaux: formação política e interpretação literária na obra do crítico austríaco-brasileiro, lançada pela Topbooks em 2002.