OS BRASILERIOS: Manuel Bandeira
José Domingos Brito
Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho nasceu em 19/4/1886, no Recife, PE. Crítico literário e de arte, professor, cronista, ensaísta, tradutor e essencialmente poeta. Foi chamado por Mario de Andrade “São João Batista do Modernismo brasileiro”, por ter antecipado certos postulados do novo movimento artístico. Seu poema -Os Sapos- foi o abre-alas da Semana de Arte Moderna, em 1922.
Filho de Francelina Ribeiro e Manuel Carneiro de Souza Bandeira, tradicional família do Recife, mudou-se para o Rio de Janeiro ainda criança e estudou no Colégio Pedro II. Em 1903 mudou-se para São Paulo, onde ingressou na Escola Politécnica para estudar arquitetura, mas logo interrompeu o curso devido a uma tuberculose. Voltou ao Rio de Janeiro na busca de tratamento e morou em algumas cidades serranas: Petrópolis, Teresópolis e Campanha. Não encontrando melhora, partiu para a Suíça, em 1913, e ficou internado mais de um ano no Sanatório Clavadel.
Lá conviveu com o poeta Paul Éluard, através do qual teve contato com a vanguarda francesa. Levado pela perspectiva da morte, passou a fazer poesia “para de certo modo iludir o sentimento de vazia inutilidade”, como dizia. Com a eclosão da I Guerra Mundial, voltou para o Brasil em 1914. Publicou seu primeiro livro -A cinza das horas- em 1917, ainda parnasiano e simbolista. Em 1919 publicou Carnaval já se utilizando do verso livre e incursionando na linha modernista. O primeiro verso esbanjava: “Quero beber, cantar asneiras”. Um crítico do Diário de Pernambuco escreveu: “O sr. Bandeira conseguiu plenamente o que queria” e arrancou gargalhadas do poeta.
Em 1921, numa reunião na casa de Ronald de Carvalho, conheceu Mario de Andrade, Oswald de Andrade e Sergio Buarque de Holanda, protagonistas da Semana de Arte Moderna de 1922. Não participou diretamente do evento, mas colaborou nas revistas Klaxon, Revista de Antropofagia, Lanterna Verde, Terra Roxa e A Revista. Em 1924 publicou Ritmo absoluto, reiterando a transição para uma nova poesia, cuja feição definitiva foi alcançada em 1930, com a publicação de Libertinagem. Em 1935 foi nomeado inspetor federal do ensino secundário pelo ministro Gustavo Capanema. No ano seguinte foi publicada a Homenagem a Manuel Bandeira, coletânea de estudos sobre sua obra, assinada pelos grandes críticos da época. Em 1937, recebeu o prêmio da Sociedade Filipe de Oliveira pelo conjunto da obra. A consagração pública viria 3 anos depois ao entrar na ABL-Academia de Letras, em 1940.
A literatura não o afastou do magistério. Nos anos 1938-1942 lecionou literatura no Colégio Pedro II e, mais tarde, na Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil (atual UFRJ) lecionando Literatura Hispano-Americana até se aposentar em 1956. A produção literária foi se ampliando na poesia: Poesias completas (1948), Mafuá do malungo (1948), Estrela da tarde (1958) etc. e na prosa: Crônicas da província do Brasil (1936), A autoria das cartas chilenas (1940), Noções de histórias das literaturas (1944), Literatura hispano-americana (1949), Itinerário de Pasárgada (1954). Flauta de papel (1956) etc. Em 1958 sua obra completa foi incluída nas “edições da plêiade”, publicada pela Editora Aguilar. Ao completar 80 anos a Editora José Olympio lançou sua obra poética reunida: Estrela da vida inteira.
Sua obra reflete o quotidiano, porém marcada de um apuro técnico e musicalidade. Não obstante estar vinculado ao modernismo, nunca deixou de utilizar as formas tradicionais, como sonetos, redondilhas e baladas. Segundo os críticos, seu estilo é simples e direto, conforme se vê no poema Autoretrato:
Provinciano que nunca soube
Escolher bem uma gravata;
Pernambucano a quem repugna
a faca do pernambucano;
Poeta ruim que na arte da prosa
envelheceu na infância da arte,
E até mesmo escrevendo crônicas
Ficou cronista de província;
Arquiteto falhado, músico
Falhado (engoliu um dia
Um piano, mas o teclado
ficou de fora); sem família,
Religião ou filosofia;
Mal tendo a inquietação de espírito
Que vem do sobrenatural,
E em matéria de profissão
Um tísico profissional.
Seu círculo amizades era extenso e mantinha um bom relacionamento com seus colegas João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade, que o consideravam o grande poeta brasileiro. No entanto viveu solitariamente e mesmo sendo um apaixonado pelas mulheres, nunca se casou. Dizia que “perdera a vez”. Vivia num pequeno apartamento na Lapa e faleceu em 13/10/1968 vitimado por uma parada cardíaca e não de tuberculose que o acompanhara durante grande parte da vida.
A bibliografia sobre o poeta e sua obra é extensa, com destaque para o livro de Ivan Junqueira -Testamento de Pasárgada-, publicado em 1981 e reeditado em 2003, contendo uma crítica literária acrescido de uma bela antologia. Merecem destaque também as obras de David Arrigucci Jr.: Humildade, paixão e morte - a poesia de Manuel Bandeira (2003); Stefan Baciu: Manuel Bandeira de corpo inteiro (1966) e Yudith Rosebaum: Manuel Bandeira – uma poesia da ausência (1993). Duas entrevistas dão conta da simplicidade, do bom humor e da seriedade do poeta. A primeira, em meados da década de 1940, conduzida por Homero Sena, e a segunda em março de 1964, realizada por Pedro Bloch podem ser vistas no link Manuel Bandeira (tirodeletra.com.br).
O Habitante de Pasárgada - Manuel Bandeira - YouTube