OS BRASILEIROS: Landell de Moura
José Domingos Brito
Roberto Landell de Moura nasceu em 21/1/1861, em Porto Algre, RS. Sacerdote, cientista e inventor mais conhecido pelo pioneirismo na área das telecomunicações. Para muita gente e instituições como o IEEE-Institute of Electrics and Electronics Engineers, ele é um dos principais inventores do rádio. Em 1893 suas transmissões sem fio alcançavam 8 quilômetros; enquanto o aparelho de Guglielmo Marconi alcançava apenas alguns metros.
Filho de tradicional família gaúcha, estudou no colégio jesuita de São Leopoldo até 1873. No ano seguinte retornou à Porto Alegre e ingressou noutro colégio, onde estudou línguas, humanidades e gramática. Conta-se que aos 16 anos inventou um tipo de telefone, mas não deixou uma descrição do aparelho. Em 1876 mudou-se para o Rio de Janeiro, afim de estudar na Escola Politécnica. Porém teve uma grande mudança de rumo nos estudos. Seu irmão queria estudar em Roma para ser padre e convenceu-o a seguir o mesmo caminho. Igressou no Colégio Pio Americano, em 1878, e na Universidade Gregoriana, ordenado sacerdote em 1886. Enquanto estudava Direito Canônico, interessou-se também pela ciência e concebeu sua teoria sobre a unidade entre as forças físicas do Universo e sua harmonia. De volta ao Rio de Janeiro em 1887, foi capelão do Paço Imperial e, além de rezar missa, trocava ideias com o imperador Pedro II, conhecido amante das ciências. Pouco depois mudou-se para Porto Alegre, em 1891, onde foi padre e professor de História no Seminário Episcopal. Em seguida foi vigário em Uruguaiana.
No ano seguinte foi transferido para São Paulo, atuando nas paróquias de Santos, Campinas e na capital, como pároco da Capela de Santa Cruz, no bairro de Santana, onde permaneceu até 1900. Ficou mais conhecido através de suas pesquisas científicas, uma atividade mal recebida pelos paroquianos, que chegaram destruir seu laboratório; e pela Igreja, que não admitia a possibilidade vida fora da terra. Ele previa a possibilidade de comunicação entre mundos diferentes. Em 1892 teria construído o 1º transmissor de mensagens sem fio, antes de Guglielmo Marconi, na Itália. Nos anos seguintes realizou experiências de transmissão de som por meio de ondas hertzianas e fez testes com um telégrafo e um telefone sem fio. No entanto a falta de documentação sobre as datas prejudicouu seu reconhecimento internacional. Porém, existem testemunhos de algumas pessoas sobre estes fatos, e em 1899 o Jornal do Commercio puublicou nota sobre seu pioneirismo mundial no campo da transmissão do som sem fio.
Em 1900 ocorreu a 1ª demonstração pública de seus inventos e foram “coroadas de êxito”, conforme noticiou a edição brasileira do jornal La Voz de España, de 10/12/1900. Em 1901 conseguiu a 1ª patente brasileira para seu aparelho sem fio e uma viagem para Itália, França e EUA, onde montou um laboratório em Nova Iorque e ficou lá por 4 anos. Queria obter patente, também, nos EUA. Não conseguiu a patente, mas o jornal New York Herald publicou, em 1902, sua foto com a legenda “Padre Landel de Moura, inventor do aparelho de telefone sem fio”, destacando que “por entre os cientistas, o brasileiro Padre Landell de Moura é muito pouco conhecido”. Alguns , empresários dos EUA ofereceram-lhe uma fortuna para autorizar a produção industrial do aparelho, mas ele recusou alegando: “Os inventos já não mais me pertencem. Por mercê de Deus, sou apenas o depositário deles. Vou levá-los para minha Pátria, o Brasil, a quem compete entregá-los à humanidade”. Em 1904, conseguiu obter 3 patentes nos EUA para um telefone sem fio e um telégrafo sem fio. Ao final do ano criou um sistema de transmissão de imagens à distância tornando-se pioneiro também da televisão e do controle remoto. Mas a documentação sobre isto é pobre, impedindo que se conheça até que ponto ele chegou. De volta ao Brasil, em 1905, assumiu a paróquia de Botucatu, SP, e continou com as pesquisas.
Solicitou aos políticos auxílio financeiro para continuar seus trabalhos e concretizar os inventos, mas não conseguiu sensibilizar os deputados de São Paulo. Chegou a apelar ao presidente Rodrigues Alves, pedindo 2 navios da Marinha para demonstrar a transmissão sem fio em longas distâncias, novamente sem êxito. O assessor encarregado de analisar o pedido não lhe deu crédito e disse ao presidente que “o tal padre é maluco”. Conta-se que na ocasião ele teve um acesso de raiva e destruiu alguns aparelhos. Em seguida, foi obrigado pela Igreja a abandonar seus experimentos. Em 1906 assumiu a paróquia de Mogi das Cruzes, SP, e no ano seguinte voltou à seus experimentos. Escreveu um memorial descritivo dos efeitos eletro-luminescentes de um indeterminado campo energético envolvendo os seres vivos, registrando-os numa fotografia, fenômeno conhecido hoje como “efeito Kirlian”. Na ocasião descreveu os efeitos da eletricidade sobre o corpo humano. Passou mais um tempo vagando por algumas cidades do interior de São Paulo e em fins de 1908 pediu exoneração e retornou à Porto Alegre.
Assumiu a paróquia do Menino Deus e tratou de aperfeiçoar seu sistema de transmissão de imagens, dando-lhe o nome de “televisão’. Com a fundação da Faculdade de Medicina Homeopática em 1914, assumiu uma cátedra junto com seu irmão médico e farmacêutico. Na inauguração da escola, profreriu um discurso sobre a lei dos similares, princípio básico da homeopatia. Porém, no mesmo ano uma crise interna provocou a cisão da faculdade em duas: Faculdade de Ciências Médicas e Escola de Médicina-Cirúrgica, e em nunhuma delas a homeopatia foi incluída. No ano seguinte foi nomeado vigário-geral da Arquidiocese de Porto Alegre e a saúde deu sinais de alerta, levando-o a uma série de pedidos de licença para tratamento médico em estações termais. Por esta época dedicou-se ao estudo da psicologia e espiritismo, para desagrado dos fiéis e da cúpula da Igreja.
Em 1916 foi nomeado cônego capitular do Cabido Metropoloitano de Porto Algre e aprofundou os estudos sobre psicologia, chagando publicar em 1919 o livro Apontamentos de psychologia. Em seguida participou da fundação do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, ampliando sua participação no meio social. A Igreja, mesmo não gostando de suas atividades científicas, tinha na cúpula alguns membros que reconheciam seu valor como religioso. Assim, em 1927 recebeu o título eclesiástico de monsenhor e foi nomeado arcerdíago (ou arquidiácono) no ano seguinte. Mas viveu pouco neste cargo. Na condição de fumante inverterado, era portador de uma tuberculose, que se agravou até 30/6/1928, quando veio a falecer.
Nos EUA ele foi reconhecido por outros inventores e seu nome transita entre membros do renomado IEEE, a maior organização profissional técnica do mundo. Seu pioneirismo na invenção do rádio, na telefonia e telegrafia sem fio desde 1893 conta com vários testemunhos, conforme dois artigos numa grande enciclopédia norte-americana e outras publicações internacionais. Porém no Brasil estas primeiras evidências ainda estão sob controvérsia. Não obstante ser pouco conhecido entre em nós, recebeu diversas homenagens. É cidadão honorário da cidade de São Paulo, patrono da Ciência, Tecnologia e Inovação do município de Porto Alegre, patrono dos radioamadores brasileiros, e em 2012 foi inscrito no Livro dos Heróis da Pátria (Lei nº 12614). Em Porto Alegre, o “Memorial Landell de Moura” (http://www.memoriallandelldemoura.com.br/) batalha para promover seu reconhecimento e mantém um grande acervo de informações à disposição do público. Segundo o Dr. Gildo Magalhães, da USP, sua história “é um retrato das vicissitudes que marcam a trajetória da ciência brasileira”.
Trata-se de um dos nossos cientistas pouco divulgado no Brasil, mas não é por falta de biografia. Ivan Dorneles Rodrigues, tido como o maior conhecedor de sua vida e obra, publicou o livro Pe. Roberto Landell de Moura: a história documentada, pela Editora Corag em 2015. Hamilton Almeida, outro entusiasta no resgate de sua memória, publicou Padre Landell de Moura: um herói sem glória, pela Editora Record, em 2006, e Padre Landell: o brasileiro que inventou o wireless, pela Ed. Insular em 2022. Biografias mais antigas: O incrível Pe. Landell de Moura, de Ernani Fornari, (Ed. Globo, 1960), e
Padre Landell de Moura: história de um inventor, de Elida de Freitas e Castro Druck (Ed. Sulina, 1960). A Wikipedia traz um alentado verbete sobre o Padre e o Youtube conta com diversos vídeos sobre sua trajetória.