Josué Apolônio de Castro nasceu no Recife em 05/09/1908. Médico, nutrólogo, geógrafo, sociólogo, professor, político, escritor e autoridade mundial no combate à fome. Seus primeiros estudos se deram em casa com sua mãe professora e continuados no Instituto Carneiro Leão e Ginásio Pernambucano. Durante a infância, morava próximo dos mangues, uma região de mocambos habitada por retirantes e infestada de caranguejos. Foi seu primeiro contato com o problema da fome vista de perto.
Ainda jovem, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi estudar na Faculdade Nacional de Medicina. Não obstante o interesse pela psiquiatria, foi levado a se especializar em Nutrição. Aos 21 anos retornou ao Recife e montou sua clínica. Pouco depois foi contratado numa fábrica para examinar trabalhadores com problemas de saúde indefinidos e acusados de indolência. Numa conversa com os patrões expôs o diagnóstico: “Sei o que meus clientes têm. Mas não posso curá-los porque sou médico e não diretor daqui. A doença dessa gente é fome”. Foi demitido do emprego e passou a encarar a dimensão social da doença, que era ocultada por preconceitos sociais e climáticos.
Sua preocupação social foi aguçada com a Revolução de 30, colocando a política brasileira em estado de ebulição. Por esta época, passou a realizar pesquisas sociais sobre os problemas da alimentação em bairros operários do Recife. Tais estudos levaram-no a ver a fome como uma catástrofe social e não uma consequência das condições físicas, climáticas e étnicas, como alguns estudos afirmavam. Sua conclusão foi que o desnível social resultava de uma estrutura econômica e social imposta no período colonial e mantida nos períodos imperial e republicano. Em 1932 tornou-se professor livre-docente da Faculdade de Medicina de Recife, com a tese “O problema fisiológico na alimentação”. No mesmo ano orientou a realização de uma pesquisa pioneira no Brasil, relacionando a produtividade com a alimentação do trabalhador.
A pesquisa resultou na publicação de seu primeiro livro, em 1935: “Condições de vida das classes operárias do Recife” e serviu como base posterior para a formulação do salário-mínimo. No mesmo ano casou-se com sua ex-aluna Glace Rego Pinto e foi morar no Rio de Janeiro. Após breve período de dificuldades financeiras, passou a lecionar Antropologia na Universidade do Distrito Federal, organizada por Anísio Teixeira. Paralelo a atividade docente, passou a escrever com regularidade e publicou o livro “Alimentação e raça”, em 1936. Embora não fosse filiado à ALN-Aliança Libertadora Nacional, publicou vários artigos em jornais ligados ao partido. Em 1937, publicou o livro “A alimentação brasileira à luz da geografia humana”, causando grande expectativa no meio acadêmico e político-social. Ao todo chegou a publicar 30 livros, incluindo literatura –Festa das letras -, publicado junto com Cecília Meireles, em 1939.
Nesta época foi criada a Universidade do Brasil, onde passou a ocupar a Cátedra de Geografia Humana, defendendo a tese sobre “Fatores de localização da cidade do Recife”. Em 1938 foi convidado pelo governo italiano para realizar conferências nas universidades de Roma e Nápoles sobre a temática “Os problemas de aclimatação humana nos trópicos”. A partir daí, passou a ficar famoso como nutrólogo, sociólogo, geógrafo etc. De 1940 em diante participou de todos os projetos governamentais ligados à alimentação; coordenou a implantação dos primeiros restaurantes populares; dirigiu as pesquisas do Instituto de Tecnologia Alimentar e criou a revista Arquivos Brasileiros de Nutrologia. No mesmo ano, passou a trabalhar no Serviço de Alimentação e de Previdência Social (SAPS), e fundou a Sociedade Brasileira de Alimentação. Em 1944 foi criado o Instituto Técnico de Alimentação, cuja direção ficou a seu cargo. Foi convidado oficial de vários países para estudar os problemas de alimentação e nutrição: Argentina (1942), Estados Unidos (1943), República Dominicana e México (1945) e França (1947).
Em 1946 publicou “Geografia da fome”, causando impacto no meio politico. Enfatizou as origens socioeconômicas da tragédia e denunciou as explicações deterministas desse quadro. No mesmo ano, fundou e dirigiu o Instituto de Nutrição da Universidade do Brasil. Cinco anos após lançou “Geopolítica da fome”, causando impacto ainda maior, passando a analisar o problema em escala mundial. Os dois livros foram publicados em vários países e contribuiu para que, em 1951, assumisse a presidência do Conselho Executivo da FAO-Food and Agricultural Organization (1952-56) e membro da Comissão Nacional de Política Agrária, criada por Vargas em 1951. Dois anos depois, foi nomeado vice-presidente da Comissão Nacional de Bem-estar Social. Naquele ano, ele fora ainda candidato de Vargas, que voltara ao poder pelo voto, a Ministro da Agricultura. Porém, foi impedido pelo PSD-Partido Social Democrático. Uma de suas facetas pouco conhecida é o gosto pelo cinema. Na época em que dirigia a FAO, em Roma, seus escritos interessaram os cineastas Roberto Rosselini e Cesare Zavattini a fazer filmes baseados na geografia e geopolítica da fome. Tal interesse resultou no filme “O Drama das secas”, dirigido por Rodolfo Nanni, em 1958.
Convidado a entrar na Política, ingressou no PTB-Partido Trabalhista Brasileiro e foi o Deputado Federal (1954-58 e 1958-62) mais votado em todo o Nordeste. Em seguida, foi embaixador do Brasil na Conferência Internacional de Desenvolvimento, da ONU, em Genebra e na reunião da FAO, em Roma. Como Deputado, apresentou os projetos de regulamentação da profissão de nutricionista e de reforma agrária. Com o Golpe de 1964, foi destituído do cargo de embaixador do Brasil junto a ONU. Sem condições de voltar à pátria, estabeleceu-se em Paris e foi acolhido pelo governo francês, designado professor do Centro Universitário de Vincennes, lecionando também na Universidade de Paris. Ministrou aulas de pós-graduação no Instituto de Altos Estudos para a América Latina; chefiou o Centro Internacional de Desenvolvimento, atuando sobretudo na África; presidiu o Comitê para a Constituição dos Povos e foi vice-presidente da Associação Parlamentar Mundial. Nesta fase, além da influência sobre os estudantes de todo o mundo que convergiam para estudar em Paris, canalizou esforços para a solução dos problemas da Paz. Aí viveu os 10 últimos anos, onde faleceu em 24/09/1974 e foi sepultado no Rio de Janeiro.
Entre os prêmios e condecorações que recebeu, constam: Prêmio Pandiá Calógeras (1937), Professor Honoris Causa da Universidade de San Domingos e de San Marcos (1950), Prêmio Franklin D. Roosevelt, da Academia de Ciências Políticas dos EUA (1952), Prêmio Internacional da Paz (1954), Oficial de Honra, do governo francês (1955), Grã-Cruz in memoriam, da Ordem do Mérito Cultural do Ministério da Cultura (2006). Foi ainda indicado ao Prêmio Nobel da Paz nos anos de 1953, 1963, 1964 e 1965. Sua memória e legado são mantidos no “Centro de Estudos e Pesquisas Josué de Castro”, fundado em 1979, no Recife. Em 1987 sua família incorporou todo seu acervo documental e biblioteca ao Centro, colocados à disposição do público e pesquisadores. Trata-se de um expressivo acervo de informações referentes aos problemas da fome e do subdesenvolvimento. Para acessar, bata clicar aqui.
Josué de Castro: cidadão do mundo