OS BRASILEIROS: João Caetano
José Domingos Brito
João Caetano dos Santos nasceu em Itaboraí, R.J. em 14/1/1808. Ator, encenador e empresário teatral. Hoje, quando o nome é citado quase ninguém reconhece. É preciso acrescentar Teatro ao nome para saber de quem se trata. Nomeia o primeiro teatro, no Rio de Janeiro, e um importante teatro em São Paulo. É reconhecido como o “Pai do Teatro Brasileiro”.
Ainda jovem foi cadete do batalhão do imperador e esteve no Exército participando da Guerra da Cisplatina (1825-28). Mas, logo sentiu-se vocacionado para o teatro e ingressou numa companhia portuguesa. Aí sentiu na pele a discriminação por ser brasileiro, a quem só cabia papéis secundários. O fato causou-lhe certa insatisfação, que foi percebida pelos atores lusitanos. Para humilhá-lo deram-lhe um papel de destaque numa comédia -O chapéu pardo- de texto fraco. O objetivo era derrubá-lo do salto alto. Mas, o tiro saiu pela culatra quando se viu a plateia se contorcer em gargalhadas. Surgia ali um grande autor.
Sua estreia como ator profissional se deu aos 23 anos, em 1831, com a peça O carpinteiro da Livônia, mais tarde representada como Pedro, o grande. Em seguida criou a Companhia João Caetano, em Niterói, junto com um elenco de atores brasileiros. Em 1838 interpretou o papel principal da tragédia António José, ou o poeta e a inquisição, de Gonçalves de Magalhães, o primeiro drama brasileiro, seguido da primeira comédia: O juiz de paz na roça, de Martins Pena. Foi o primeiro ator brasileiro a interpretar Shakespeare, sob a influência do poeta e dramaturgo Domingos José Gonçalves de Magalhães, em traduções realizadas pelo próprio Magalhães. Antes disso, as montagens de Shakespeare no Brasil utilizavam versões em português lusitano. Hamlet foi a primeira peça a ser traduzida ao português do Brasil.
Ainda em 1938 foi condecorado com medalha de bronze, consagrando-o como o “Talma Brasileiro”, -numa referência a François-Joseph Talma, o maior ator francês da época- e equiparando-o a um ator da linhagem clássica. A plateia ficava encantada com seus arroubos tocados de entusiasmo. Vale ressaltar que o ator surge diante um teatro precário, onde eram raras as cenas com mulheres atrizes, após o edito de D. Maria I, que as proibia de representar. Em muitos casos as mulheres eram substituídas por atores com perucas mal ajambradas e voz masculina. Visando corrigir tal situação, ele preconizava uma junção da “Comédie française” com o mecenato da corte trazido por D. João VI em 1808. Sua intenção era obter do Governo um mecenato no sentido estrito, um tipo de proteção esclarecida e não um estado paternalista.
Conseguiu realizar, em parte, seu ideal de teatro. O Imperial Theatro de São Pedro Alcântara foi-lhe concedido, junto com uma subvenção mensal de 2 contos de reis. Aos poucos a subvenção da Corte foi aumentada para 3 e, mais tarde, 4 contos de reis. Ali o teatro passa a existir, de fato, ou seja, profissionalmente, com uma plateia comporta na maior parte de portugueses ou portugueses naturalizados. O teatro foi inaugurado em 1813 como Real Teatro São João. Em 1826 passou a se chamar Imperial Teatro São Pedro de Alcântara; em 1839 mudou para Teatro Constitucional e se manteve até fins da década de 1920, quando foi demolido, dando origem ao prédio atual, batizado de Teatro João Caetano. Durante muito tempo os cariocas lamentaram a demolição do antigo teatro e seu imponente prédio.
Foi autodidata no estudo do teatro e tinha preferência pela tragédia, mas representou alguns papéis cômicos. Em 1860 fez apresentações em Lisboa e visitou o Conservatório Real, em Paris. Na volta ao Brasil organizou uma escola de arte dramática, onde o ensino era gratuito. Promoveu a criação de um júri, a fim de estimular e premiar a produção nacional. Segundo o pesquisador José Galante de Souza, ele “dotado de verdadeira intuição artística, reformou completamente a arte dramática no Brasil... substituiu aquela cantilena pela declamação expressiva, com inflexões e tonalidades apropriadas, ensinou a representação natural, chamou a atenção para a importância da respiração e mostrou que o ator deve estudar o caráter da personagem que encarna, procurando imitar, não igualar a natureza”. Visando a formação de atores, publicou dois livros: Reflexões dramáticas (1837) e Lições dramáticas (1862).
Quando retornou da Europa foi acometido por uma moléstia grave e veio a falecer, aos 55 anos, em 24/8/1863. Digno representante dos “homens de teatro”, preparou a cena de seu sepultamento e deixou registrado de próprio punho: “Vistam o meu cadáver com o hábito de São Francisco e coloquem-lhe no peito o hábito de Cristo com que meu pai foi sepultado; encerrem-no em um caixão pintado ou forrado de paninho e conduzam-no ao cemitério na sege mais pobre que houver, acompanhando-o somente o meu compadre Afonso e o capuchinho Frei Luiz”. Este último item não foi cumprido e uma multidão seguiu o féretro. Por iniciativa do ator Francisco Correia Vasques, mais tarde, foi homenageado com uma estátua em bronze e tamanho natural frente ao teatro que leva seu nome, na Praça Tiradentes.
Como biografia, temos um apurado trabalho de Décio de Almeida Prado com o livro João Caetano, lançado pela Editora Perspectiva, em 1972, onde, além de cuidadoso levantamento biográfico, apresenta reavaliação crítica do significado histórico-estético de uma época de afirmação de uma arte teatral autóctone. Mais tarde o mesmo autor decidiu aprofundar o caráter artístico do ator e publicou, em 1984, João Caetano e a arte do ator: estudos críticos, pela Editora Ática.
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