OS BRASILEIROS: Roquette-Pinto
José Domingos BRITO
Edgard Roquette-Pinto nasceu em 25/9/1884, no Rio de Janeiro, RJ. Médico legista, escritor, ensaísta, professor, antropólogo, etnólogo e um dos pioneiros da radiofusão no Brasil. Era, de fato, um polímata, i.é, versado em diversas áreas. É considerado o pai de radiodifusão no Brasil com a criação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, em 1923, doada ao MEC-Ministério da Educação, com o objetivo de impulsionar a educação. Com este mesmo objetivo criou o INCE-Instituto Nacional de Cinema Educativo, em 1932.
Ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, diplomado em 1905. Porém, foi estudar os “sambaquis” no litoral gaúcho e no ano seguinte já era professor-assistente de Antropologia no Museu Nacional. Tornou-se um dos mais conceituados antropólogos do País e foi Delegado do Brasil no Congresso de Raças, realizado em Londres em 1911, e aproveitou a viagem para estudar na Europa. Em 1916 foi professor de história natural na Escola Normal do Distrito Federal e retomou a medicina em 1920, lecionando fisiologia na Universidad Nacional de Asunción, Paraguai. Mas a antropologia lhe interessava mais que a medicina. Em 1912 integrou a Missão Rondon e manteve os primeiros contatos com os índios Nambiquaras. Recolheu vasto material etnográfico e publicou, em 1917, o livro Rondônia - Antropologia etnográfica, que veio a se tornar uma obra clássica da antropologia brasileira.
Seus estudos demonstraram que a miscigenação racial brasileira não produziu “tipos raciais” degenerados ou inferiores, conforme pregavam alguns “cientistas” da época. Para ele o problema dos brasileiros não se encontrava na raça miscigenada e sim nas questões sociais e políticas, sobretudo na falta de educação e saúde pública. Foi um entusiasta do cinema e, na condição de diretor do Museu Nacional por 16 anos (1915-1936) organizou a maior coleção de filmes científicos no Brasil. Em 1932, fundou a Revista Nacional de Educação e no mesmo ano, com o decreto do Governo Vargas obrigando a exibição de filmes nacionais, criou e dirigiu o Instituto Nacional de Cinema Educativo-INCE. No mesmo ano criou o Serviço de Censura Cinematográfica. A pedido de Gustavo Capanema, convidou o cineasta Humberto Mauro para trabalhar com ele. O INCE produziu mais 300 documentários no período 1936-1964.
Seu interesse pelo rádio deu-se em 1922, na comemoração do I Centenário da Independência do Brasil, quando foi organizada uma grande feira internacional. O Rio de Janeiro foi visitado por empresários de todo o mundo, quando os norte-americanos trouxeram a tecnologia da radiodifusão, na época o assunto principal dos EUA. Para testar o novo meio de comunicação, instalaram uma antena no morro do Corcovado e realizaram a primeira transmissão radiofônica no Brasil -um discurso do presidente Epitácio Pessoa-, que foi captado em Niterói, Petrópolis e em São Paulo. Sua reação foi imediata: “Eis uma máquina importante para educar nosso povo”.
Tentou convencer o governo federal a adquirir os equipamentos apresentados na Feira, mas não conseguiu. Mas convenceu a Academia Brasileira de Ciências e em 20/4/1923 fundou a segunda rádio do País: Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. A “história oficial” conta que foi a primeira emissora do país. Na verdade, a primeira foi a Rádio Clube de Pernambuco, em 1919. Pouco depois criou e passou a dirigir a revista Electron, especializada na nova tecnologia com diagramas de receptores da época. Em 1936 fez a doação de sua emissora ao MEC, tendo Gustavo Capanema como Ministro, e passou a ser chamada Rádio MEC. Em 1940 foi eleito diretor do Instituto Indigenista Americano do México.
Foi um intelectual com participação ativa em diversas instituições. Desde 1927 integrava a ABL-Academia Brasileira de Letras e foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Academia Brasileira de Ciências, da Sociedade de Geografia, da Academia Nacional de Medicina. Foi Também presidente de honra da Associação Brasileira de Antropologia e um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro. Na condição de diretor do Museu Nacional da UFRJ, em 1926, organizou ali a maior coleção de filmes científicos no Brasil. Foi presidente do 1º Congresso Brasileiro de Eugenia, em 1929, um tema considerado relevante na comunidade científica da época. Para ele o estudo da Eugenia deveria ser aplicado na melhoria das condições físicas e mentais da população brasileira, sem excluir negros e mestiços.
Com o surgimento da TV na década de 1950, esforçou-se para criar uma TV Educativa, tal como tinha feito com o Rádio e conseguiu do governo Vargas a concessão de um canal de TV em 14/3/1952. Apesar de planejada nos mínimos detalhes e possuir financiamento aprovado pela Câmara Municipal do Distrito Federal, o plano não saiu do papel. Não obstante seu empenho neste projeto, não conseguiu realizá-lo e faleceu amargurado em 18/10/1954. Ainda vivo foi homenageado com seu nome dado a mais antiga premiação da televisão brasileira, o “Troféu Roquette-Pinto”, criado em 1950. A última edição desta comenda se deu em 1982. Como homenagem aos seus estudos científicos, seu nome denomina várias espécies de plantas e animais: Endodermophyton Roquettei, Alsophila Roquettei, Roquetia Singularis, Phyloscartes Roquettei e Agria Claudia Roquettei.
Além de um grande número de artigos científicos e conferências, deixou alguns livros publicados, com destaque para Guia de antropologia (1915), Elementos de mineralogia (1918), Conceito atual da vida (1920), Seixos rolados: estudos brasileiros (1927), Ensaios de antropologia brasileira (1933), ensaios brasilianos) 1941. Como biografia e estudos sobre seu legado, temos: Antropologia brasiliana: ciência e educação na obra de Edgard Roquette-Pinto, publicado em 2008 pelas editoras da UFMG e Fiocruz; Edgard Roquette-Pinto, na Coleção Educadores do MEC, de Jorge Antonio Rangel, publicado em 2010 pela Fundação Joaquim Nabuco; Em busca do Brasil: Edgard Roquette-Pinto e o retrato antropológico brasileiro, de Vanderlei Sebastião de Souza, publicado em 2018 pela Editora da Fundação Getúlio Vargas.
Roquete-Pinto, o porta-voz da ciência para o povo