Dois ícones da cantoria nordestina de improviso: Lourival Batista, o Louro do Pajeú (1915-1992) e Severino Pinto, o Pinto de Monteiro (1895-1990)
* * *
PINTO E LOURO – Orlando Tejo
Grande saudade hoje sinto
Das cantorias-tesouro
Do gigante que foi Pinto,
Do uirapuru que foi Louro.
Era uma graça, um estouro
Ouvir em qualquer recinto
Os trocadilhos de Louro
Os desconcertos de Pinto.
Tal qual no Bar do Faminto,
Do Pátio do Matadouro,
Quando Louro aceitou Pinto
E Pinto abençoou Louro.
Mas no Bar Rosa de Ouro
Houve um encontro distinto
Pinto elogiando Louro,
Louro chaleirando Pinto.
Jamais ficará extinto
O meu prazer de ouvir Louro
Querendo derrubar Pinto,
Pinto brigando com Louro.
No Bar Casaca-de-Couro
Vi o maior labirinto:
Pinto depenando Louro
E Louro esganando Pinto.
No Mercado, em Rio Tinto,
Um momento imorredouro
com as emboscadas de Pinto
E as escapadas de Louro.
No Beco do Bebedouro
Um desafio ao instinto:
Pinto superava Louro,
Louro desmontava Pinto.
No bar de Moisés Aminto
(À Curva do Varadouro)
Louro acompanhava Pinto,
Pinto fugia de Louro.
Assisti, no Bar Jacinto,
Luta de cristão e mouro
Quando Louro açoitou Pinto,
E Pinto escanteou Louro.
O sol no nascedouro
E haja mel e haja absinto
Nas divagações de Louro,
Nos ultimatos de Pinto.
Num diálogo sucinto
Reverberavam em coro
Iluminuras de Pinto,
Clarividências de Louro.
Essa dupla, sem desdouro,
Reinou do primeiro ao quinto:
Pinto maior do que Louro,
Louro maior do que Pinto.
Duas fivelas num cinto,
Batéis sem ancoradouro,
Assim foram Louro e Pinto,
Assim serão Pinto e Louro.
Penso, reflito, pressinto
Que em todo o tempo vindouro
Ninguém vai superar Pinto,
Nenhum fará sombra a Louro.
Pois não há praga ou agouro
Que manche a paz do recinto
Das glórias que envolvem Louro,
Dos louros que adornam Pinto.
Aqui faço paradouro
(Ir além me não consinto),
Rendido ao gênio que é Louro,
Curvado ao estro de Pinto.
* * *