Na sala de estar, avó e neto em frente à TV, acompanham uma reunião de Senadores, onde seus membros, do ‘Alto’ e ‘Baixo’ clero, reputação ilibadíssima – abaixo do nível do mar, ambos, se engalfinham numa elegante e respeitosa discussão repleta de amabilidades:
– Conceda-me um aparte. Vossa Excia. é um Ladrão!
– Não lhe concedo o aparte. Exijo a presunção de inocência. Ladrão é Vossa Excia.!
– Com todo o respeito, Vossa Excia. é um Corrupto!
– Data vênia, Corrupto é Vossa Excia.! Fui julgado apenas em duas instâncias colegiadas. Minha corrupção não tem trânsito em julgado.
Propõe a Avó:
– Menino, melhor desligar essa TV. A discussão é inócua. As duas Excelências estão com cobertos de razão. Ambos falam a verdade: são corruptos e ladrões.
Num canto da tela, outros engravatados (colarinhos brancos eivados de escuras manchas), sem prestar atenção aos ‘elogios’ entre colegas, celulares nos ouvidos, conversam ao celular e riem entre si.
– O homem está falando e ninguém presta atenção, vovó. Riem de quem, dos brigões?
– Não, meu querido. Riem de nós que os colocamos lá. Sorriem do povo.
Trocam de canal e assistem a uma sessão de um Tribunal que se diz Supremo, cujos integrantes exigem tratamento de Excelência mas agem de forma a não merecê-lo. A população, verdadeira Excelência, vive a ser por eles insultada. Sob negras togas, mudam o entendimento sobre o mesmo assunto diversas vezes num espaço de tempo diminuto, contrariando o bom senso e todas as regras do Direito, expondo o povo à insegurança jurídica que a eles, ‘donos da Lei’, convém.
Enojados, após irem ao banheiro para uma sessão de vômito em dueto, avó e neto desligam a TV, dão-se as mãos e vão até a banca de jornal mais próxima. Compram uma revistinha imoral, de putaria explícita. Quase tanto quanto. Quase.
Fecha-se a cortina, apagam-se as luzes. Faz-se breu no País. Escuridão total.