O VATE
Gonçalves Dias
No Álbum de um Poeta
Moi... j’aimerai ta victoire;
Pour mon coeur, ami de toute gloire,
Les triomphes d’autrui ne sont pas un affront.
Poète, j’eus toujours un chant pour les poètes,
Et jamais le laurier qui pare d’autres têtes
Ne jeta d’ombre sur mon front
V. Hugo
Vate! Vate! Que és tu? – Nos seus extremos
Fadou-te Deus um coração de amores,
Fadou-te uma alma acesa borbulhando
Ardidos pensamentos, como a lava
Que o gigante Vesúvio arroja às nuvens.
Vate! Vate! Que és tu? – Foste ao princípio
Sacerdote e profeta;
Eram nos céus teus cantos uma prece,
Na terra um vaticínio.
E ele cantava então: – Jeová me disse,
Majestoso e terrível.
“Vês tu Jerusalém como orgulhosa
Campeã entre as nações, como no Líbano
Um cedro a cuja sombra a hissope cresce?
Breve a minha ira transformada em raios
Sobre ela cairá;
Um fero vencedor dentro em seus muros
Tributária a fará;
E quando escravo seus filhos, sobre pedra
Pedra não ficará.”
E os réprobos de saco se vestiam;
Em pó, em cinza envoltos;
E colando co’a terra os torpes lábios,
E açoitando co’as mãos o peito imbele,
Senhor! Senhor! – clamavam.
E o vate entanto o pálido semblante
Meditabundo sobre as mãos firmava,
Suplicando ao Senhor do interno d’alma.
Foram santos então. – Homero o mundo
Criou segunda vez, – o inferno o Dante, –
Milton o paraíso, – foram grandes!
E hoje!... em nosso exílio erramos tristes,
Mimosa esp’rança ao infeliz legando,
Maldizendo a soberba, o crime, os vícios;
E o infeliz se consola, e o grande treme.
Damos ao infante aqui do pão que temos,
E o manto além ao mísero raquítico;
Somos hoje Cristãos.