Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Catulo da Paixão Cearense quinta, 07 de fevereiro de 2019

O SOL E A LUA (POEMA DO MARANHENSE CATULO DA PAIXÃO CEARENSE)

O SOL E  A LUA

Catulo da Paixão Cearense

 

SENHORES! O Sol é homem!
simboliza a Onipotência
da ciência e da energia.
A Lua é mulher, Senhores!
E, sendo mulher, encanta!
Mas, sendo mulher, varia!

Varia, porque, em verdade,
o Sol, másculo e fecundo,
desde o princípio do mundo,
não deixou de iluminá-lo
com o facho do seu clarão!

A Lua, se tem vontade,
nos brinda com a claridade,
para depois, sem piedade,
deixar-nos noites e noites
em completa escuridão!

A ciência regista um fato
de profunda observação: —
a mulher, que é pirracenta,
não faz o mal por pirraça!
Faz o mal por devoção!
E se a Verdade não mente,
toda a Verdade se encerra
neste confronto evidente.

De manhã, heroicamente,
vibrando um canto de guerra,
na crista daquela serra,
pontualmente, fatalmente,
vê-se o Sol aparecer.

E a Lua, com os seus caprichos,
que anda sempre com as estrelas
comadreando em cochichos,
não tem hora de nascer!

Finda a missão da jornada,
o Sol, à hora aprazada,
no esplendor da apoteose,
começa a descer a escada
do horizonte, em rosicler!
A Lua, sempre aluada,
sempre e sempre irrefletida,
não tem hora de partida!
Segundo a sua nevrose,
vai-se embora, quando quer!

O Sol, sempre obediente
às ordens do Onipotente,
com toda a sua energia,
nunca teve a ousadia
de invadir uma só noite
as plagas celestiais!
Mas quem já não viu a Lua
deixar a noite, que é sua,
para andar no céu, de dia,
desrespeitando a harmonia
das próprias leis naturais?!
E por que? Por ser curiosa,
ser vaidosa e nada mais!!

O Sol, que é o Sol, sempre o mesmo,
na severa austeridade,
como o emblema da Verdade,
sempre é o mesmo na altivez!
A Lua, se é hoje inteira,
amanhã, vem por metade;
e, assim, vai escasseando,
vai minguando, vai minguando,
até sumir-se, de vez!

Por isto, o Sol desconfia
que, quando a Lua nos deixa,
sem nós sabermos porque,
vai vagar por outros mundos,
vai seduzir outro amante,
outro Sol, que ele não vê!

Se o Sol, na hora do eclipse,
aproveitando esse ensejo,
na Lua vai dar um beijo,
um ósculo de vulcão,
a Lua finge um desmaio,
vergonhosa, esconde o rosto,
faz tanta macaqueação,
que o Sol, que conhece a Lua,
sem dar sinal de desgosto,
sorridente, continua
sua peregrinação.

Pois assim mesmo, iludido,
reacendendo o seu farol,
o Sol, bem considerando,
continua iluminando
a Lua, pois é sabido
que a luz da Lua é do Sol.

Quando a Lua, a Lua nova,
muito fininha e amarela,
surge, em nova aparição,
não nos parece a costela
que Deus, quando Adão dormia,
tirou do corpo de Adão?!
E por que, sendo tão bela,
sendo a mulher tão perfeita,
foi feita de uma costela,
quando podia ser feita
das fibras de um coração?!

Pois se é costela do homem,
por esta mesma razão,
deve pertencer ao homem
por direito e gratidão!

E as manchas que tem no rosto?
A ciência afirma umas coisas
que são prováveis... talvez!

Porém a Lua tem lábias
para enganar a ciência,
e aquelas manchas nos provam
que alguma coisa ela fez!

Uma lenda dos indígenas
nos diz, positivamente,
que a origem daquelas manchas
é uma história complicada
entre a Lua e um seu parente!

Porque a mulher, como a Lua,
com tantos adoradores,
tem coração leviano!!

E tanto assim, meus senhores,
que outra vítima da Lua
é o velho Mar, soberano,
que vive no mesmo engano,
em noites de lua cheia,
como um doido, a esbravejar,
em suas ânsias supremas
e em brancas espumaradas,
a derramar seus poemas
pelas areias prateadas
das praias enluaradas,
que até parecem risadas
e gargalhadas da Lua,
que está se rindo do Mar!

Como é triste ouvir-se, à noite,
quando ele está concentrado,
o Mar gemendo, ajoelhado,
numa prece, a suplicar
que a Lua deixe as estrelas,
deixe o céu crivado de ouro,
e venha ver o tesouro
que lhe há de ser ofertado,
e que ele guarda encerrado
em tantas conchas de pérolas,
que só Deus pode contar!

É triste, sim, muito triste!

Mas inda é muito mais triste
ver-se o Monstro, acabrunhado,
depois de passar a noite,
contra a Lua revoltado,
morrendo à beira da praia,
sem um gemido, cansado!!
Antes que o Sol desponte
na fronte azul do horizonte,
ver-se a Lua se sumindo,
perfidamente sorrindo
de ver o Mar desmaiado!

A Lua é mulher, senhores,
e tudo está decifrado!

Porque é triste ver-se, à noite,
o Mar abraçando a Terra,
e a Terra beijando o Mar!
É a maneira mais sublime
de um ao outro consolar!
O Mar pensando na Lua,
e a Terra, triste, pensando
no Sol, que só a ilumina
por Deus assim o ordenar!

O Sol não gosta da Terra,
mas nós sabemos que a Terra
tem profundo amor solar!

A Terra também é rica!
É dona de uma fortuna,
de uma herança fabulosa,
tão grande e tão portentosa,
que se ela fosse orgulhosa,
podia erguer sobre a terra
com tanta jóia preciosa,
montanhas e mais montanhas!
Mas, singela, sem vaidade,
sem a escandalosidade
da Lua, com as suas manhas,
esconde a sua riqueza
nas suas próprias entranhas!

É uma modéstia orgulhosa,
que facilmente se explica:
não ostenta; se contenta
em saber que nós sabemos
que ela é rica, é muito rica!

A Terra é mulher... e basta!
É preciosa! É caprichosa!
E as bobices e tolices
da mulher, só Deus explica!

Mas o Sol, que adora a Lua,
por ser um homem de ciência,
é um filósofo exemplar!
Pois enquanto o Rei do dia
sofre com filosofia
as inconstâncias da Lua,
caçoando dos dois amantes,
se rindo dos dois rivais,
o Mar, em crises constantes,
o Mar, o poeta boêmio,
em ímpetos delirantes,
já não vendo mais a Lua,
sentindo saudades dela,
pensando não vê-la mais,
uiva, ruge e se encapela,
o proprio céu desafia,
e quem paga esses rompantes
da sua hiperestesia,
somos nós, pobres mortais!

O sol é homem! É firme!
A lua é mulher! Varia!
Varia! E, se ela morresse,
falta alguma nos faria!
Porém, se o Sol falecesse,
o mundo se extinguiria!
Sem a cabeça do homem,
a mulher não existia!

Agora vêde, Senhores,
como o poder do destino
faz os Gênios deseguaes!

O Mar, gigantesco e belo,
vendo a Lua, o seu tormento,
em trismos de desalento,
transforma-se num Otelo!
E o Rio, calmo e silente,
E o Rio, o poeta romântico,
reflete, serenamente,
o firmamento e as estrelas
no seu leito nupcial,
refletindo a própria Lua,
que nas águas retratada,
parece uma outra Lua,
que ele adora, idealizada
na su’alma de cristal!

E a Lua, assim retratada,
por ele romantizada,
é mais formosa e saudosa
do que a Lua original!

E, enquanto o Mar desespera,
rugindo, como uma fera,
o Rio, na doce calma,
vai levando dentro d’alma
a doce imagem da Lua,
pura, casta e virginal!

Outra vítima da Lua:
— o Rio sentimental!

Eu vou dizer-vos uns versos
que o Mar recitou à Lua,
numa noite tão serena,
que até parece que a noite
silenciava, para ouvir!

O Monstro estava tão calmo,
que eu só ouvia os singultos
do velho Monstro, a carpir!

A Lua, no céu, de bruços,
ouvia aqueles soluços,
indiferente, a sorrir!!

Eis aqui os belos versos
que, muito palidamente,
escrevendo sobre a areia,
eu pude reproduzir.

Ó Lua, que és tão linda e que és tão pura,
“pensas, talvez, que o Mar agigantado
“não pode ter no coração salgado 
“um bocado de luar e de doçura?!

“O amor que te consagro é tão intenso,
“que sempre, ó Lua, que no céu desmaias,
“eu pareço um turíbulo de incenso, 
“incensando de espuma as alvas praias!

“Porque consentes, quando esta alma anseia 
“por te beijar a boca de jasmim, 
“com a tua placidez de lua cheia, 
“que as estrelas no céu riam de mim?!

“Se enfrento todo o horror da tempestade,
“Se adoro só a ti e a Liberdade,
“por que escarneces deste grande amor?! 
“Maldita seja a tua claridade, 
“Se não és o luar da minha dor!

“Se te somes, meus ais são tão profundos, 
“que eu imagino, em meu furor insano, 
“que andas a divagar por outros mundos, 
“beijando a fronte azul de outro oceano!

“Por que és fria e sou frio e tu me escaldas?! 
“Por que minha oração nunca te alcança?! 
“Por que é que eu tenho a cor das esmeraldas, 
“e não tenho a ilusão de uma esperança?!

“Quando espumejo o alvor d asminhas mágoas, 
“não vês, quando na areia me debruço, 
“que o sangue verde destas minhas águas 
“são poemas verdes, que por ti soluço?!

“Tu tens tanto poder, tanta magia, 
“tanta dor, tanto amor, tanta poesia, 
“perfumando de luz a Terra inteira, 
“que até meu acre odor de maresia, 
“com teu cheiro de noiva, que inebria, 
“fica cheirando a flor de laranjeira!

“Tu desprezas o Mar, que tanto te ama, 
“e amas, talvez, o Sol, que não te quer! 
“Por teu amor, pela saudade tua, 
“meu coração se agita e tumultua, 
“mas Deus, que fez o Mar e fez a Lua,
“não te deu coração, porque és mulher!


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