Daniel Gonzaga
A tarde terminando bem “na boquinha da noite” (foi assim que eu aprendi a falar e a viver), e eu fico espiando com meus próprios olhos, o sol se esconder, para voltar amanhã – na mesma hora que chegou hoje, clareando o que a vista de todos vê.
Longe, como que querendo tocar a linha do horizonte distante de mim, mas tocando meu coração, a andorinha, em vão, tenta fazer o verão.
O chocalho no bode tilinta no chiqueiro, enquanto o cão, vigiando a porteira, ladra e chora ao mesmo tempo, como se um lobo fosse, uivando – com certeza pela tristeza que o pôr do sol nos remete.
Definitivamente, a noite cai. Cai como se fora um grande pano escuro cobrindo tudo, sem deixar nenhuma luz – e requer o acendimento de lamparinas e lampiões, para que possamos ver que, a claridade tem seus valores, e a escuridão tem seus segredos.
Sobre a mesa simples na sala, atrás de mim, ouço o rádio tocar (me acompanhe):
Sangrando – Daniel Gonzaga – Compositor: Gonzaguinha
Quando eu soltar a minha voz por favor, entenda
Que palavra por palavra eis aqui uma pessoa se entregando
Coração na boca, peito aberto, vou sangrando
São as lutas dessa nossa vida que eu estou cantando
Quando eu abrir a minha garganta, essa força tanta
Tudo que você ouvir, esteja certa que eu estarei vivendo
Veja o brilho dos meus olhos e o tremor das minhas mãos
E o meu corpo tão suado, transbordando toda raça e emoção
E se eu chorar e o sal molhar o meu sorriso
Não se espante, cante que o teu canto é minha força pra cantar
Quando eu soltar a minha voz por favor entenda
Que é apenas o meu jeito viver
O que é amar…
OBS.: Daniel Gonzaga é filho de Gonzaguinha e, claro, neto de Gonzagão.
* * *
O tempo está passando para a chegada das águas de março
Ampulheta diz que o tempo está acabando
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol
É peroba do campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o Matita Pereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira
É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira
Falta pouco. Muito pouco. Falta pouco, e quem mostra é a ampulheta do tempo – para aqueles que, imaginando defender o País, se posicionaram do lado errado – para que, finalmente, “Justiça seja feita”.
Os 12 dias úteis concedidos pela legislação estão acabando, e não haverá mais tempo para solicitar uma nova “rebimboca da parafuseta”. O pau vai é cantar e o sol vai nascer quadrado para quem precisa saber que a justiça divina nunca falha. Tarda, mas não falha.