Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Poemas e Poesias sexta, 20 de janeiro de 2023

O RÁDIO ABC (POEMA DO CEARENSE PATATIVA DO ASSARÉ)

O RÁDIO ABC

Patativa do Assaré

 

 

 

Vejo que o nosso Nordeste

Ê mesmo a terra da fome,

Onde o matuto não veste,

Onde o matuto não come.

A agricurtura é sentença

E sem havê assistença

O jeito é se escangaiá.

Parece mesmo um pagode!

Seu doto, como é que pode

Este Brasi miorá?

 

Carsando dura apragata

O nosso pobre caboco

Se soca dentro da mata,

Pisando inriba de toco,

Bota um alarme de broca,

Depois nela fogo toca.

Depois da mesma queima

Ainda lhe dá cansêra,

Porque tem a garranchêra

Que é preciso incoivará.

 

Ele, naquele vexame,

Logo o terreno incoivará

Mas porém, não tem arame,

Precisa cerca de vara.

Depois da roça cercada,

De ferramenta pesada

Segue no mesmo rojão,

Pois com nada se aquebranta

E na terra seca pranta

O caroço de argodão.

 

Pranta com munto prazê,

Com munta sastifação,

Proque no rádio ABC

Que comprou de prestação

Todo momento que liga,

Além de munta cantiga,

Escuta uma voz falá,

Uma voz dizendo: «prante,

Que o governo garante».

E o seu desejo é prantá.

 

Pranta no seco a semente

E depois de tê chuvido

Ele diz munto contente:

Meu argodão tá nascido

E vai a limpa fazê

Mode o mato não cresce

Pois, pra pode dá de conta,

É preciso que se arranje,

Puxando um forte frejoge

Com uma inxada na ponta.

 

Vendo o prantio na linha,

Sempre de bom a mió,

Agarra demenhãsinha

Até chega o pôr do só.

A sua manutenção

Meidia é sempre fejão

E de noite muncunzá,

Mas nada de esmorece,

Uvindo o rádio ABC,

Sempre mandando prantá.

 

Esta roça tá firmada

Porém, tem a capoêra,

Esta aqui limpa de inxada

E aquela de roçadêra.

O seu argodão do roço

Tá se tornando um colosso,

A roça tá munto boa,

De fulo toda amarela,

Pode a gente chama ela

Um bordado de açafroa.

 

E ele o trabaio fazendo,

Sempre agüentando o ripuxo,

Aqui e ali já tá vendo

Dasabrochando um capuxo,

E o caboco não descansa,

Cheio de fé e esperança

Por vê o argodão abri,

Diz, alegre e munto esperto:

Já tá chegando bem perto

Do gunverno garanti!

 

A roça no mês de agosto

Tá bem arva de argodão,

Tá mesmo de fazê gosto,

Tá mesmo um manapulão;

Quem de longe repara

Sabendo bem compara,

Logo em sua mente toca

Que aquilo é bem parecido

Com um lenço estendido,

Coberto de tapioca.

 

E o nosso honesto matuto

Sempre da roça pra casa,

Achando que o seu produto

Vai dá lucro e não atrasa.

De noite, perto da mesa,

Com a lamparina acesa,

Todo cheio de inlusão

Destranca o rádio ABC,

Proque deseja sabe

Que preço tem argodão.

 

Com os seus dedo grocêro

 

Passa ali hora e mais hora

Mexendo com o pontêro,

Em toda estação demora.

Porém seu rádio ABC

Desta vez não qué sabe

De negoço de argodão,

Derne o Sú inté o Norte

Só tá falando de esporte,

Pele, Garrincha e Tostão.

 

Bota o pontêro pra lá 10

é sempre uma coisa só,

Puxa o pontêro pra cá

E é o mesmo Futibó

E aquele nosso caboco

Já quage com ar de loco

Vai ficando meio brabo

E diz, bastante raivoso:

Este rádio é mentiroso!

Eu só vendendo este diabo!

 

Cheio de raiva e quisila,

Já de esperança perdida,

Tranca o seu rádio de pila

E fica a pensa na vida,

Dizendo a sua senhora:

É uma grande caipora

Vende argodão barato!

Perdi todo o meu serviço,

Trabaieí com sacrifico,

Pra botá tudo no mato!

 

Na vida de agricurtô

Não há pobre que se saia,

Pra todo lado que vou

Tem um bicho de tocaia;

É grande a desiguardade

Do campo para a cidade!

Você repare, muié,

Que grande escuiambação:

Quinze quilo de argodão

Não compra três de café!

 

E toca lá pra cidade

Quatro carga de argodão,

Mas, porém, mais da metade

Já tá devendo ao patrão.

Com a sobra do dinhêro,

O sobejo dos cruzêro,

Que é bem pequena quantia,

Faz uma fraca merenda,

Depois vai compra fazenda

Mode vesti a famia.

 

Depois que de brim barato

Compra carsa pra José,

Chico Migue, Furtunato

E uma saia pra muié

E seis vestido de chita

Pra Joana, Tereza, Rita,

Josefa, Antônia e Sinhá,

Fica coçando o bigode.

Seu doto, como é que pode

Este Brasi miorá?

 

Veja que negoço chato,

O que foi que aconteceu,

Vendeu o argodão barato,

Que tanto trabaio deu!

Aquele bom camponês,

Com as comprinhas que fez,

Nem um centavo sobrou,

Ficou de bôrsa vazia,

Pensando na garantia

Que o rádio tanto falou.

 

Sem tê no borso um tostão

Vorta o caboco da praça

Pensando em seu argodão

E incabulado, sem graça,

Quando chega na paioça,

Vai derruba nova roça

Pra ôtra safra fazê,

Bem sisudo, resmungando,

Chingando e desconjurando

Aquele rádio ABC.


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