O vento premiando os olhares
Era assim: a partir das 15 horas, estudantes que frequentavam a escola pela manhã, e alguns desocupados, se postavam na frente do Cine São Luiz, ali na Praça do Ferreira, na minha Fortaleza querida.
Antes, “merendava” uma cartola na lanchonete do Romcy Magazine, ou saboreava um pastel com caldo de cana na Miscelânea (hoje, Leão do Sul, mas no mesmo local). Mas o destino seguinte era fazer uma parceria com vento forte que soprava – e a cena final era aquela mesma da Marilyn Monroe: o vento, muito macho, fazia a festa.
Nos fins de semana, bebericando uma cachacinha no restaurante Cirandinha, que ficava na Praia de Iracema, já usufruindo do local onde hoje tem um “espigão”.
Meninas lindas douravam o corpo nas areias da praia. E a gente, sem o açodamento dos dias atuais, apenas “curiava” com uma maravilha de binóculo. Era muito legal.
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Zé Garapa e a peixeira
Copo de garapa
Essa coisa de desarmamento é algo novo. Costume dos evoluídos. A gente sabe que não funciona e por que não funciona – e ainda que andar armado seja “proibido”, o Brasil é o país do planeta que mais mata, e que usa para isso a arma traficada e a arma “branca”.
Mas, esse é um assunto que não queremos discutir agora – até por que as próprias autoridades preferem ficar no mimimi costumeiro.
Quem conhece a Fortaleza dos anos 40, 50 e 60, sabe que a história a seguir é verdadeira, embora seja contada e propalada com ares de estória. Já foi até “causo” contado por Pantaleão, no extinto programa Chico City. Depois, virou anedota, por ter sido contada com outros tons, inclusive o cinza.
Naquele tempo a hoje famosa Praça do Ferreira tinha apenas três atrações maiores que as de hoje: o relógio na mesma coluna antiga; o abrigo onde a grande maioria se reunia para bater papo e discutir futebol; e o Cine São Luís, esse inaugurado nos anos 60.
A praça, provavelmente por estar onde estava, era passagem obrigatória de muitos que se destinavam para o Mercado Central, para a praia ou para a Rua Franco Rabelo, um “puxadinho” da ZBM.
José Gerardo Nepomuceno passava todo dia por ali, a caminho do Mercado São José, que ficava próximo do Mercado Central. Ali ele trabalhava o dia inteiro. Pela manhã vendia carnes bovina e suína. Pela tarde vendia fígado, miúdos e material para panelada. Isso, acreditamos, justificava o “direito de andar” portando o seu instrumento de trabalho: uma faca peixeira de 12 polegadas, sempre envolta numa bainha improvisada feita de jornais velhos.
Morando no acanhado bairro do Siqueira, José Gerardo Nepomuceno, era muito conhecido por “Zé Garapa”, apelido que não gostava e já lhe causara alguns entreveros. O que se sabia era que “Zé Garapa” era casado com uma das mulheres mais “arrumadas” no bairro no aspecto físico e das curvas. Sabia-se, também, que “Zé Garapa” não estava dando conta do recado na hora dos vamos ver. A informação fora passada de forma involuntária pela própria mulher, que disse que, na “hora agá”, além de não dar conta dos afazeres, “Zé” destilava feito uma garapa. E isso pegou e virou apelido. Correu ruas e bairros e chegou no “abrigo da Praça do Ferreira”, por onde “Zé Garapa” passava todos os dias a caminho do trabalho.
Quando alguns avistavam “Zé Garapa” se aproximando, parecendo combinado, diziam:
– Água!
– Limão!
– Açúcar!
E era aí que “Zé Garapa” parava de andar, levava a mão até a cintura, pegava e desembainhava a peixeira, e bradava:
– Mistura, fela da puta!
Nunca foi de bom alvitre alguém ter um apelido, ficar famoso por conta dele, e passar pela Praça do Ferreira.