Caldo de cana gelado aplaca o calor
Dez horas, sol causticante. Cidade sem árvores, assim, também sem sombras. Temperatura subindo e o corpo parece se tornar uma fonte d´água. O suor escorre pela testa.
– Éguas, não corre nem um ventinho!
Estou no Largo do Carmo, olho para o relógio. Mudo de vista, vejo o Ferro de Engomar. Olho de novo para o relógio, ainda são 10 horas.
Na calçada da frente, as bancas do João Marreco, Jorginho e Mondego. Todos procuram um lugar na sombra, que não vai adiantar muita coisa.
Olho de novo para o relógio. Já se passaram mais de 10 minutos e ainda são 10 horas, no relógio.
Porra, essa droga de relógio não funciona! Faz parte do sermão do padre: “no Maranhão, até as nuvens mentem”!
Veio uma ideia: a sombra do Abrigo.
– Siô, um caldo de cana e um pão doce!
– Cadê a ficha? Comprou a ficha?
Quantas vezes fizemos isso, repetimos esse gesto ali no abrigo, para tentar refrescar o calor, bebendo um caldo de cana do Guará!
Caldo bebido, pão doce comido. O calor vai embora, mas volta logo depois. O que não volta mais é o tempo!
* * *
A DACTILOGRAFIA
Antiga máquina de Datilografia
Lá pelos anos 50, 60 e até meados de 70, a grade curricular do ensino brasileiro, hoje rotulado de ensino médio, era recheada de “matérias” que iniciavam o caminho de alguns profissionais. Muitos foram bons profissionais, aproveitando apenas o que aprenderam naqueles tempos, sem a tal especialização.
Dona “Mundica” era a professora. Ensinava Português, Aritmética, História do Brasil, Geografia do Brasil, Caligrafia e Religião. O professor Orlando Leite, um dos mais completos Maestros do Brasil, por três anos nos ensinou Canto Orfeônico – ali aprendemos a ler e escrever música, solfejar, cantar e discernir o que era a primeira e a segunda voz. Clave de sol, e as notas musicais (dó, ré, mi, fá, lá, si). Todas as manhãs, o Hino Nacional Brasileiro.
Uma vez por mês, uma visita a uma instituição pública: museu, quartel, hospital, convento, igreja, tribunal.
A tarde era livre. Não. Não era. Cesta depois do almoço, tarefa escolar para fazer em casa, e, dia sim, dia não, aula prática de Dactilografia.
Lembro bem: mão esquerda – q, w, e, r, t; mão direita – y, u, i, o, p. Abaixo: a, s, d, f, g – h, j, k, l, ç.
Na última aula do curso, a prova prática, com 5 minutos para datilografar uma lauda. Sem erros. E a vida começava ali, para muitas profissões.