Segundo a História, quando Nosso Senhor Jesus Cristo ia levando a Cruz para o Calvário, deteve-se um momento, para descansar, à porta de um sapateiro, que o não deixou parar, dizendo:
“Segue! Segue! Não descansarás aqui”.
E Nosso Senhor Jesus Cristo tomou outra vez a Cruz e disse: “Vou para onde descanse, e terás que caminhar até que eu volte”.
E assim o sapateiro tornou-se o Judeu Errante, que não poderá nunca descansar, enquanto Nosso Senhor não voltar à terra, no Dia de Juízo.
O sinal de uma cruz encarnada apareceu-lhe na testa, e deixou a mulher e os filhos, seguindo Nosso Senhor até ao Calvário. Depois, deixou Jerusalém e começou a sua longa e estranha peregrinação, que nunca terminou.
Seguiu, seguiu sempre, esse velho alto, descalço, com o cabelo caído sobre os ombros e uma ligadura negra em torno da testa para esconder o sinal da Cruz encarnada.
E segue, segue sempre, com o mesmo passo largo, por montanhas e através de desertos, e por todas as estradas longas e brancas do mundo.
Mas, uns momentos de descanso são-lhe por vezes permitidos. Se acontece passar por uma igreja cristã na manhã de domingo, quando vai começar a missa, pode entrar e estar lá parado, a ouvir o sermão. Mas não se senta nunca.
Em 1505, um tecelão da Boêmia, chamado Kokot, estava tentando descobrir um tesouro que o avô tinha escondido no palácio real. E quando andava cavando aqui e ali, ao acaso e sem resultado, passou o Judeu Errante:
“Teu avô estava enterrando o tesouro da última vez que por aqui passei”; – disse o Judeu Errante, “se bem me lembro, enterrava-o ali, ao pé daquele muro”.
Kokot, imediatamente, cavou ao pé do muro e lá encontrou o tesouro que tanto ambicionava. Mas, antes de poder agradecer ao Judeu Errante, o estranho peregrino já tinha desaparecido da sua vista.
O nosso País está cheio de judeus errantes, que ostentam na testa uma cruz encarnada, e vivem sofrendo no corpo e na alma o reflexo das maldades cometidas contra Jesus Cristo, o Messias.
As doenças do corpo e da alma não se curvam ao dinheiro. O poder de Deus é bem maior do que os remédios fabricados em laboratório. Milhões tirados dos mais fracos não tem o poder da cura.
A Cruz encarnada que o Judeu Errante carrega na testa, é o sinal do sangue de Cristo derramado na frente dos cristãos, que urgiam pela sua morte em plena via pública.
“Nem só de pão vive o homem”. O dinheiro compra coisas materiais, tratamento médico sofisticado, mas não compra a vida, nem a qualidade de vida.
Por isso, quem tem contas a ajustar com Jesus Cristo, levará nas costas o peso das maldades cometidas, até o Juízo Final.
Segundo o grande historiador norte-rio-grandense Luís da Câmara Cascudo, em “Dicionário do folclore brasileiro”, Ahasverus, o Judeu Errante, era um sapateiro em Jerusalém, que, ao ver Cristo passando com a cruz sobre os ombros, teria dito ao Salvador, empurrando-o: “Vá andando, vá logo”. Jesus, como represália, o teria condenado a vagar, sem descanso nem rumo certo, até o final dos tempos.
Conforme diz Marie-France Rouart, em “Dicionário dos mitos literários”, distintas denominações foram atribuídas ao herói: para os poetas alemães, ele se tornou o Judeu Eterno; para os ingleses, o Judeu Vagabundo; para os espanhóis, o Judeu que espera por Deus.
O mito recebeu várias interpretações ao longo dos séculos, em diferentes lugares, mas sempre mantendo essa estrutura básica. Embora as primeiras manifestações da lenda datem do século XIII, nos oitocentos é que o mito do Judeu Errante ganhou versões literárias que o celebrizaram: a epopéia “Ahasverus” (1833), de Edgar Quinet; o romance-folhetim “O Judeu Errante” (1844-1845), de Eugène Sue; e o romance inacabado “Isaac Laquedem” (1853), de Alexandre Dumas pai.