A última vez que me vi estava com sono e muito assanhado. Além de cansado, claro. Espantei-me com o que vi. Não era um jovem que estava ali. Afinal de contas havia muito tempo desde que me deparei, pela primeira vez, com a luz do mundo. Passei água nos olhos, penteei os cabelos, mas ainda assim, insatisfeito com a imagem que me foi ofertada, quebrei o espelho e nunca mais quis me ver. Preferi assim para não mais me assistir tão assustado com esse mundo violento e cheio de desesperanças. As olheiras e rugas, lembro bem, estavam ali retratadas, testemunha ocular da maldade do tempo, das transformações estéticas por que passamos em nosso caminhar. Preferi não mais vê-las, por desnecessário ser. A idade pesa muito. Menos mal que a alma, que o velho espelho é incapaz de refletir, é leve, sem peso. Ou, melhor dizendo, ela terá o peso que nos encarregarmos de atribuir-lhe durante a vida. Além do que a alma não tem imagem que possa ser refletida em um espelho. Falta nenhuma, pois, me fará esse artefato adorado pelos narcisistas de plantão. Procurarei, cada vez mais, acreditar no que ouvia de vovô, quando comigo conversava em nossos encontros de fim de tarde: ‘os olhos são o espelho da alma’, dizia-me. Nunca entendi direito o que isto significa, mas ante a sabedoria de meu saudoso avô, acredito piamente na verdade de sua máxima. Seja o que isso queira dizer, espelhos, só os da alma.
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