19 de janeiro de 2020 | 03h00
Embora o declínio tenha sido dramaticamente intensificado pela recessão, ele começou antes, pelo menos desde 2012, quando o desgaste do setor, resultante de mazelas históricas e estruturais, atingiu um nível de saturação que tornou o desenvolvimento industrial insustentável. A política petista dos “campeões nacionais”, com seu protecionismo e sua distribuição arbitrária de anabolizantes fiscais, nada fez para sanar defasagens crônicas, como a logística e a infraestrutura precárias (com estradas malconservadas; ferrovias insuficientes; portos e aeroportos ineficientes), o sistema tributário intrincado, a burocracia excessiva, a mão de obra pouco qualificada ou a insegurança jurídica. Tudo isso veio à tona nos anos de recessão.
Somem-se a isso as transformações globais da 4.ª revolução industrial, mais do que qualquer outra impulsionada por investimentos em inovação, conhecimento, conectividade, novas tecnologias e outras áreas de conhecimento e especialização carentes no Brasil.
Nesse sentido, salta aos olhos no Brasil o contraste entre a indústria e a agropecuária, onde o investimento em pesquisa, inovação e formação, combinado a políticas públicas e programas de crédito eficientes, potencializou a produtividade e a competitividade a ponto de, em meio século, o País deixar de depender da importação para se tornar o segundo maior exportador do mundo, em vias de se tornar o primeiro. Hoje o agro compõe mais de 20% do PIB nacional e é o maior responsável pelo superávit comercial. Prevê-se que a próxima safra será recorde.
Enquanto isso, a indústria, após ter retrocedido ao nível de 2009, está completamente estagnada. Como aponta a pesquisa da CNC, a média histórica do Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci), que mede o quanto o parque industrial está sendo utilizado, é de 80%. Mas a última vez que o País esteve acima disso foi em 2014. Desde 2015 o nível de utilização oscila na casa dos 70%. O fato de a recessão na Argentina, principal importadora dos manufaturados brasileiros, especialmente automotivos, ter influenciado tão sensivelmente a queda acumulada de 1,3% do ano evidencia o quanto a indústria nacional é pouco diversificada e integrada aos mercados internacionais. Em 2020, as demandas da construção civil e o crescimento do consumo podem ajudar, mas as projeções são de fraco desempenho pelo menos até 2022.
Apesar disso, o problema tem sido pouco debatido na esfera pública, no mercado ou na academia. Não se veem em Brasília estratégias para a transição rumo à indústria 4.0 ou para a formação de capital humano, e a política industrial do governo não foi muito além de ensaiar benefícios fiscais, redução de custos trabalhistas e alguma desburocratização. As reformas de Estado em curso são condição necessária, mas não suficiente para a retomada econômica. Não haverá crescimento consistente e sustentável sem uma indústria dinâmica, com tudo o que ela implica: empregos, tecnologia, conhecimento e inovação.
Entre 2015 e 2018, mais de 25 mil unidades industriais fecharam as portas no Brasil, uma média de 17 por dia. Em quatro anos o Rio de Janeiro perdeu 12,7% de suas unidades produtoras, São Paulo perdeu 7% e o País como um todo, 6,6%. A indústria nacional opera hoje 18,4% abaixo do pico alcançado no início de 2011. Estes dados, levantados pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) para o Estado/Broadcast, evidenciam a desventura da indústria brasileira.