O DESTINO DA LIRA
Júlio Dinis
Cantar o amor é destino Quando o seio pulsa ardente, Quando no nosso
horizonte Surge a imagem resplendente Dum sol que a aridez da vida Transforma
em jardim florente.
Mas quando a chama se extingue, Que no peito nos ardia,
A lira não canta amores, Nem os sonha a fantasia; Então natureza
e pátria
Só nos inspiram poesia.
Depois, os anos declinam
Como o Sol no azul dos céus ;
E quando a noite da vida
Já nos estende seus véus,
Todos os cantos da lira
São consagrados a Deus!
12 de Agosto de 1860
À luz do Sol nascente Resplendem pelas selvas Mil pérolas nas
relvas, Nos ares mil rubis; .
No azul do céu nevoado Não brilham as estrelas, Mas são
imagens delas As flores do tapiz.
As aves perpassando
Agitam a ramagem,
E a perfumada aragem
Nos bosques se introduz;
Aí mil vozes falam
Ao céu sereno e mudo;
No bosque é sombra tudo,
No céu é tudo luz.
Ridente madrugada,
Hora em que do oriente
Com o gládio refulgente
O arcanjo da luz vem;
E as trevas se dissipam,
Com as trevas a tristeza,
Que em toda a natureza
A noite eivado tem.
Oh! vinde, vinde ao prado
Que o orvalho inda humedece;
Ali tudo parece
À vida ressurgir.
Em vórtices contínuos,
Em doudejantes ,valsas
Elevam-se das balsas
Insectos a zumbir.
Subi do prado ao vértice
Da florida colina,
Então pela campina,
Os olhos prolongai
Ao longe, ao longe as vagas,
Lutando nos fraguedos;
Mais perto os arvoredos
Que o arroio banhar vai.
A tudo anima a esp’rança No monte e vale e praia; No céu Vésper
desmaia Ao matutino alvor.
O cântico das aves, Das flores o aroma
Nos diz: — O dia assoma I Hosana ao Criador!