O DESERTOR DA POESIA
Paulinho Nó Cego
Para Gerô, uma homenagem em rima.
Ninguém cala o poema
O fruto da inspiração
O sentimento do povo
Nem o pulsar do coração
O poema é o engate
É a válvula de escape
Voz que soa é direção.
Direção contra injustiças
É defensor do explorado
É o desejo da maioria
É sangria do indignado
É ferramenta perfeita
É a voz insatisfeita
É martelo agalopado.
O poema o acompanha
Se move é emocionante
O atrai pra terra firme
O leva a lugar distante
O poema não se cala
Com taca nem com bala
O poema vai avante!
O poema quando surge
Desce na veia da gente
Passa pelo coração
Depois é que vai pra mente
Onde ele é construído
Com tema já definido
É só seguir a corrente
O poema reivindica
Dá a dica, denuncia.
Pois o poder da palavra
Encrava vira poesia
Retrata história de amor
De esperança e de dor
De tristeza e de alegria.
O poeta e o poema
Andam com os pés no chão
No mesmo campo-minado
Dos desmandos do patrão
O seu grande objetivo
É pensar no coletivo
Ser solidário a um irmão.
O poema lhe sustenta
Serve como alimento
É usado como arma
Para ele é instrumento
Às vezes a sua caneta
Transforma-se em baioneta
Se lhe ferem o sentimento
Tem rima, quadra, sextilha;
Na de sete, agalopado;
Tem na de dez, na de doze.
Tem rima de pé quebrado
A rima só vale à pena
Quando resolve problema
Ou denuncia um safado!
Quando escrito em vermelho
O poema é censurado
Quando é escrito em verde
É livre, é elogiado.
O azul é a cor mansa
A rima nela descansa
Mas sempre leva o recado.
Um recado para àqueles
Que quando estão no poder
Esquecem dos compromissos
Do povo não quer saber
O poema tem sua meta
Ninguém cala um poeta
Quem nunca viu venha ver
A força do seu poema
Tem norte, tem precisão.
Se o “cabra” está em pé
É derrubado no chão
Pode até se levantar
E o poeta estará lá
Com a rima em construção
O poeta e o poema
Encenam do mesmo lado
Quando é pra falar de amor
Ou dor de um assassinado
A inspiração exala
O poeta não se cala
Não pode ficar calado.
Só covardia e injustiça
Da polícia temos tido
O Gerô, morto espancado.
Nonato Pudim, sumido!
Às vezes penso, não nego.
Será se agora é Nó Cego
O próximo, o escolhido?
Porque tanta violência
Para com nossos artistas
Vamos dar um basta nisso
Contra atitudes racistas
A coisa tá costumeira
Só resta Nobre e Teixeira
Ou tem alguém mais na lista?
O poema é a voz do povo
É porta voz da razão
O poema não se aquieta
É vivo tem coração
O poema é formado
Tem p.h.d, doutorado.
É especialista em refrão.
O poema pra ele é tudo
É sua válvula de escape
Não tendo porte de arma
A rima é o seu tacape
Depois do esqueleto feito
Não tem juiz de direito
Que dele corra ou escape
O poema é onde o povo
Nele pode se expressar
Lugar de cobrar direito
Poder de reivindicar
Contra toda exploração
Imposta pelo patrão
É o jornal popular
Nunca parar de lutar
Confrontar a covardia
Jamais deixar de sonhar
Amanhã será outro dia!
Ao poeta um dilema:
Ou continuar em cena
Ou desertar da poesia.